sábado, 20 de março de 2021

24 de Março de 2021-Verdade Que Liberta

PERMANECER NA PALAVRA DE JESUS PARA SER SALVO DEFINITIVAMENTE

Quarta-Feira da V Semana da Quaresma

Primeira Leitura: Dn 3, 14-24.49.91-92.95

Naqueles dias, 14 o rei Nabucodonosor tomou a palavra e disse: “É verdade, Sidrac, Misac e Abdênago, que não prestais culto a meus deuses e não adorais a estátua de ouro que mandei erguer? 15 E agora, quando ouvirdes tocar trombeta, flauta, cítara, harpa, saltério e gaitas, e toda espécie de instrumentos, estais prontos a prostrar-vos e adorar a estátua que mandei fazer? Mas, se não fizerdes adoração, no mesmo instante sereis atirados na fornalha de fogo ardente; e qual é o deus que poderá libertar-vos de minhas mãos?” 16 Sidrac, Misac e Abdênago responderam ao rei Nabucodonosor: “Não há necessidade de respondermos sobre isto: 17 se o nosso Deus, a quem rendemos culto, pode livrar-nos da fornalha de fogo ardente, ele também poderá libertar-nos de tuas mãos, ó rei. 18 Mas, se ele não quiser libertar-nos, fica sabendo, ó rei, que não prestaremos culto a teus deuses e tampouco adoraremos a estátua de ouro que mandaste fazer”. 19 A estas palavras, Nabucodonosor encheu-se de cólera contra Sidrac, Misac e Abdênago, a ponto de se alterar a expressão do rosto; deu ordem para acender a fornalha com sete vezes mais fogo que de costume; 20 e encarregou os soldados mais fortes do exército para amarrarem Sidrac, Misac e Abdênago e os lançarem na fornalha de fogo ardente. 24 Os três jovens andavam de cá para lá no meio das chamas, entoando hinos a Deus e bendizendo ao Senhor. 49ª Mas o anjo do Senhor tinha descido simultaneamente na fornalha para junto de Azarias e seus companheiros. 91 O rei Nabucodonosor, tomado de pasmo, levantou-se apressadamente, e perguntou a seus ministros: “Porventura, não lançamos três homens bem amarrados no meio fogo?” Responderam ao rei: “É verdade, ó rei”. 92 Disse este: “Mas eu estou vendo quatro homens andando livremente no meio do fogo, sem sofrerem nenhum mal, e o aspecto do quarto homem é semelhante ao de um filho de Deus”. 95 Exclamou Nabucodonosor: “Bendito seja o Deus de Sidrac, Misac e Abdênago que enviou seu anjo e libertou seus servos, que puseram nele sua confiança e transgrediram o decreto do rei, preferindo entregar suas vidas a servir e adorar qualquer outro Deus que não fosse o seu Deus”.

 

Evangelho: Jo 8, 31-42

Naquele tempo, 31Jesus disse aos judeus que nele tinham acreditado: “Se permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos, 32e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”.  33Responderam eles: “Somos descendentes de Abraão, e nunca fomos escravos de ninguém. Como podes dizer: ‘Vós vos tornareis livres’?”  34Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade vos digo, todo aquele que comete pecado é escravo do pecado. 35O escravo não permanece para sempre numa família, mas o filho permanece nela para sempre. 36Se, pois, o Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres. 37Bem sei que sois descendentes de Abraão; no entanto, procurais matar-me, porque a minha palavra não é acolhida por vós. 38Eu falo o que vi junto do Pai; e vós fazeis o que ouvistes do vosso pai”.  39Eles responderam então: “Nosso pai é Abraão”. Disse-lhes Jesus: “Se sois filhos de Abraão, praticai as obras de Abraão! 40Mas agora, vós procurais matar-me, a mim, que vos falei a verdade que ouvi de Deus. Isto, Abraão não o fez. 41Vós fazeis as obras do vosso pai”.  Disseram-lhe, então: “Nós não nascemos do adultério, temos um só pai: Deus”. 42Respondeu-lhes Jesus: “Se Deus fosse vosso Pai, certamente me amaríeis, porque de Deus é que eu saí, e vim. Não vim por mim mesmo, mas foi ele que me enviou”. (Jo 8,31-42)

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Os Justos De Deus São Valentes Em Qualquer Situação de Vida 

A narrativa da elevação da estátua de Nabucodonosor é uma haggadah. Haggadah é, na literatura de talmud/Midrash (comentários rabínicos referentes aos comentários jurídicos dos livros sagrados), o conjunto das interpretações e das tradições não jurídicas que carece de força de lei. Como hagaddah, algumas coisas nesta narrativa estão romanceadas. Tudo isto foi feito para ajudar os judeus do século II a.C a resistirem às autoridades pagãs. O cântico dos três jovens (Dn 3,46-90) é um texto que parece remontar à época dos Macabeus. Foi inserido no livro de Daniel antes da tradução em grego deste último. 

Nos tempos do rei Antíoco IV Epifânio, os judeus eram obrigados a adorar os deuses pagãos e a seguir as leis ou prescrições que Antíoco lhes dava.  O rei manda erguer em sua honra uma estátua colossal de 30 metros de altura, e 3 metros de largura para ser adorada por todos os povos.

Os babilônios notaram a ausência dos judeus no ato de adoração da estátua aceito por todos os povos. Foram ao rei para denunciar os judeus. Na sua presença, Nabucodonosor ordena os judeus a catarem a ordem e que de outro modo serão castigados: “Se não fizerdes adoração, no mesmo instante sereis atirados na fornalha de fogo ardente; e qual é o deus que poderá libertar-vos de minhas mãos?”. Esta frase soa nos ouvidos dos fieis judeus a blasfêmia e por isso, com toda integridade proclamam que têm fé em seu Deus que poderá livrá-los do fogo ardente: “Se o nosso Deus, a quem rendemos culto, pode livrar-nos da fornalha de fogo ardente, ele também poderá libertar-nos de tuas mãos, ó rei”. Notamos nesta narração que Nabucodonosor não reconhece a superioridade do Deus dos judeus. 

Os mais piedosos judeus não obedeceram à ordem do rei. Consequentemente, alguns foram torturados, inclusive os três jovens. Os “três jovens” do livro de Daniel são extraordinariamente valentes. Eles encontram o sentido de sua vida em Deus, e por isso, não aceitam a ordem para adorar os deuses pagãos, pois eles encontraram em Deus sua razão de viver. 

O que quer se enfatizar na narração dos três jovens que se encontram no fogo ardente e são salvos é ressaltar a providência, proteção e a justiça divinas. Os três jovens representam os justos de Deus. Os justos são aqueles que em meio do fogo das provas e perseguições mantêm a fidelidade e a confiança em Deus, que os faz livres. Os três jovens são imagem do povo fiel que persevera na alegria apesar das dificuldades porque sabem em quem acreditam e se apoiam: em Deus que os salva.  

Nisto aprendemos que em nome de nada nem em nome de ninguém podemos abrir mão de nossos valores e de nossa fé no Deus da vida. Há valores, que apesar dos problemas e dificuldades, dos quais não podemos abrir mão. Precisamos depositar nossa confiança em Deus em qualquer situação. E acreditamos que sempre há providencia divina, como o anjo que Deus mandou libertar os três jovens, seus justos. “É preciso obedecer a Deus (viver conforme os valores) antes de obedecer aos homens” (At 5,29). O Deus que libertou os três jovens do fogo de um forno, também nos libertará de qualquer sufoco. Deus nunca abandona quem Lhe é fiel. Basta crer n’Ele. É preciso crer n’Ele. Não tenha medo nem dúvida de crer n’Ele. É preciso continuar a vivermos de acordo com a bondade de Deus. “Não devemos ter medo de bondade, ou mesmo de ternura” (Papa Francisco). É preciso nos manter justos, como os três jovens do livro de Daniel. 

Por trás desta narração legendária esconde-se uma definição da missão do povo eleito e da Igreja diante dos totalitarismos de todas as espécies. O poder é, muitas vezes, tão poderoso, sua máquina policial tão repressiva, que todo o mundo se curva diante dele e se cala diante de seus excessos. Somente aqueles que encontraram um absoluto mais importante que sua própria vida podem decididamente contestar e encarar tamanho poder. Jesus é o nosso grande exemplo. 

Se soubermos em quem acreditamos e que Aquele em quem acreditamos está acima de tudo, as tribulações, as angústias, as provas perderão suas forças contra nós ou diante de nós. Deus ajuda os fiéis e lhes dá força de que necessitam na luta contra o mal. Por isso, os três irmãos são livres de tudo. Com Deus venceremos apesar das provações e de todo tipo de dificuldades. 

Permanecer Em Jesus Nos Faz Conhecer a Vontade de Deus Sobre nós 

Se permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos, e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”.  

No evangelho lido neste dia destacam-se três temas fundamentais: a fidelidade, a liberdade e a filiação. Seguir Jesus implica manter-se fiel à Sua Palavra, de modo que o verdadeiro cristão já não é somente aquele que crê, mas, sobretudo, aquele que escuta, vive e dá testemunho da Palavra. A Palavra de Deus leva o cristão a conhecer a verdade. 

Se permanecerdes na minha palavra, sereis meus verdadeiros discípulos; conhecereis a verdade e a verdade vos livrará”.  “Se permanecerdes...”. O verbo “permanecer” se encontra frequentemente no evangelho de João (especialmente no discurso da despedida) e nas cartas de Joao, especialmente na Primeira Carta de são João. A formulação em Jo 8,31-32 considera a Palavra de Jesus como o espaço vital no qual o homem deve manter-se sempre para se manter vivo diante de Deus. Por ser o espaço vital, a ligação com Jesus deve ser definitiva, pois fora d´Ele não há a verdadeira vida (cf. Jo 15,1-5). Não se deve abandonar esta ligação, pois esta ligação significa a salvação escatológica. Por isso, aqui “permanecer” tem um significado escatológico e decisivo. Quando essa ligação (permanência) é cortada (por apostasia, abandono, deserção etc.) abandona-se também o âmbito salvífico, isto é, fica fora da salvação. Este “permanecer na palavra de Jesus” é o distintivo do verdadeiro seguidor de Jesus. Para o evangelista João ser discípulo consiste essencialmente no fato de que o seguidor se orienta pela palavra de Jesus como única e definitiva norma. 

Quais serão as consequências dessa permanência em Jesus Cristo? “... Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Mas do que se trata desta verdade nesta afirmação?

A verdade aqui não é só no sentido de um saber prático e útil, ou de um puro conhecimento intelectual da verdade, mas também de uma necessidade da máxima verdade concreta na pessoa de Jesus. Para são João a verdade é vinculada total e absolutamente à pessoa de Jesus. Por isso, Jesus não é somente o Mestre de uns princípios verdadeiros, nem é somente o Portador de uma verdade de revelação que pode expor-se como uma doutrina, e sim, Jesus é, pessoalmente “o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6). Por isso, aqui se trata daquela verdade que proporciona ao homem o sentido último, a claridade suprema acerca de si mesmo que possibilita um conhecimento salvífico. E esse conhecimento leva o homem a direcionar sua maneira de viver e de conviver com os demais. 

Para o homem a única verdade é a plenitude de vida; trata-se de ter uma vida de qualidade humana e divina, ao mesmo tempo, que contém no projeto de Deus realizado em e por Jesus. Por isso, aqui a verdade não é somente no sentido de um saber prático e útil, ou de um puro conhecimento intelectual da verdade, mas aqui trata-se da claridade suprema daquela verdade que proporciona ao homem o sentido último sobre si mesmo que, por conseguinte, possibilita um conhecimento salvífico. E essa verdade está orientada para a ética, a vida e o amor.

O feito dessa verdade é a liberdade radical outorgada ao homem pela fé em Deus e em Jesus Cristo: “... e a verdade vos libertará”. A experiência de salvação e a experiência de libertação. Uma tal libertação é efeito imediato da experiência da verdade da fé. Por isso, não se trata de uma libertação política e social e sim de uma libertação escatológica diante do poder da morte, do pecado, das trevas cujas garras o homem sucumbe. Trata-se, por isso, da libertação do homem de si mesmo. O poder da morte em todas as suas manifestações já não pode dominar o homem que permanece em Jesus Cristo.

A Palavra de Jesus é como um espaço vital em que o homem há de manter-se sempre. A Palavra de Jesus é como um sinal para a vida dos cristãos: o sinal único e definitivo. É a norma suprema na qual o cristão aposta sua vida e sua salvação, pois a Palavra de Deus será a última palavra para o homem.  

Para o cristão fiel Jesus promete o conhecimento da verdade e da liberdade: “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”.  Para João a verdade está vinculada total e absolutamente à pessoa de Jesus, pois ele é “o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6). O efeito imediato da experiência do cristão da verdade é a libertação e a liberdade.  Mas não se trata de uma libertação política ou social, mas trata-se da libertação definitiva diante das potências da morte, do pecado, das trevas às quais o homem sucumbe. Trata-se da libertação do homem de si mesmo. Esta é a liberdade radical outorgada ao homem pela fé em Jesus. No fundo se identificam experiência de salvação e experiência de liberdade. Por isso, a liberdade que Jesus comunica ultrapassa a mera possibilidade de opção, mas situa o homem na sua verdadeira dignidade: o faz partícipe da liberdade do Pai.                                                                                 

Jesus é perfeitamente livre, porque é perfeitamente Filho. Ama seu Pai. Fala dele sem cessar. É livre porque ama: não está apegado a si mesmo. Jesus é livre diante de sua família, dos seus discípulos, das autoridades. É livre para anunciar e denunciar. Segue seu caminho com fidelidade, com alegria, com liberdade interior. Quando estava no meio do julgamento, Jesus era muito mais livre do que o próprio Pilatos. Nada lhe detém. Não há nenhum egoísmo, nenhum obstáculo ao amor. Isto significa que o amor de Deus vivido profundamente faz o cristão livre de tudo, como Jesus Cristo. É o único meio de não estar submetido a nada. Ser livres significa ser filhos, não escravos, na família de Deus. Para João, pecar é converter-se em escravo: ter por pai o “pai da mentira”. Jesus é a Verdade (Jo 14,6), e por isso, só ele pode dar a verdadeira liberdade. 

Celebrar a Páscoa é celebrar a liberdade dada pelo Senhor ressuscitado. A Páscoa de Jesus quer ser para nós um crescimento na liberdade interior, pois a Páscoa é a festa da libertação, a festa do êxodo. Em meio de um mundo que nos oferece muitos “valores”, mas também nos tenta com contra-valores que nos levam irremediavelmente à escravidão, Jesus nos convida a sermos livres. Para viver em Deus, como filhos e filhas, não basta querer, pedir e buscar liberdade econômica, política, cultural, religiosa; é indispensável a libertação do pecado. É preciso parar de fazer o outro sofrer e a si mesmo. É preciso saber se cuidar para poder cuidar dos demais. “Guardar a criação, cada homem e cada mulher, com um olhar de ternura e amor, é abrir o horizonte da esperança, é abrir um rasgo de luz no meio de tantas nuvens, é levar o calor da esperança!” (Papa Francisco). 

Reflitamos: 

Quando caminhamos sem a Cruz, edificamos sem a Cruz ou confessamos um Cristo sem Cruz, não somos discípulos do Senhor: somos mundanos, somos bispos, padres, cardeais, papas, mas não discípulos do Senhor” (Papa Francisco).

P. Vitus Gustama,svd

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