segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

 
VONTADE DE DEUS E O QUERER HUMANO

NOITES DE DISCERNIMENTO DE SÃO JOSÉ


18 de Dezembro
(Quarta-feira)
 
Jr 23, 5-8; Mt 1, 18-25

18A origem de Jesus Cristo foi assim: Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José, e, antes de viverem juntos, ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo. 19José, seu marido, era justo e, não querendo denunciá-la, resolveu abandonar Maria, em segredo. 20Enquanto José pensava nisso, eis que o anjo do Senhor apareceu-lhe, em sonho, e lhe disse: “José, Filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque ela concebeu pela ação do Espírito Santo. 21Ela dará à luz um filho, e tu lhe darás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados”. 22Tudo isso aconteceu para se cumprir o que o Senhor havia dito pelo profeta: 23“Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de Emanuel, que significa: Deus está conosco”. 24Quando acordou, José fez conforme o anjo do Senhor havia mandado, e aceitou sua esposa.
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No evangelho de Lucas lemos a anunciação do Anjo do Senhor a Maria (Lc 1,26-38). O Evangelho de Mateus nos relata a anunciação do Anjo do Senhor a José, como lemos no texto do evangelho de hoje.


1. Maria e Ação do Espírito Santo


“Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José, e, antes de viverem juntos, ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo”, assim começa o texto do evangelho de hoje.


 O matrimônio judeu é celebrado em duas etapas: o contrato e a coabitação. Entre o contrato e a coabitação transcorre um intervalo que pode durar um ano. O contrato já pode ser feito quando a moça tem doze anos de idade. O intervalo (antes da coabitação) dá espaço para a maturidade física da esposa. Maria está unida a José por contrato, mas ainda não há coabitação como mostra a frase citada acima (v.18). Mas, mesmo não havendo a coabitação a esposa em contrato deve ser fiel ao seu marido como se fosse uma casada. Consequentemente, a infidelidade é, nessa etapa,  considerada como adultério.


“Ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo”, assim o texto nos diz em seguida. Esta frase nos mostra que o Pai de Jesus é o próprio Deus. Sua concepção e nascimento não são casuais, mas tem lugar pela vontade e obra de Deus. Assim o evangelista expressa a eleição de Jesus para sua missão messiânica e a novidade absoluta na história (Nova criação. A desobediência de Adão causou o novo caos. A chegada de Jesus ordena tudo para uma nova criação).


2. José/Israel e a Ruptura Com o Passado


“José, seu marido, era justo e, não querendo denunciá-la, resolveu abandonar Maria, em segredo”.          


José é o homem justo e reto.  Ao usar o termo “justo” (cf. Mt 13,17; 23,29: em ambos os casos “justo” são associados a “profetas”), Mateus quer nos mostrar que José é protótipo de israelita fiel aos mandamentos de Deus. A fidelidade a Deus através do cumprimento da Lei obriga José a repudiar Maria. Consequentemente, Maria seria culpada como adúltera. No entanto, o amor ao próximo como a si mesmo (cf. Mt 22,39) impedia José de difamar Maria. Daí sua decisão de repudiar Maria em segredo e não quer expô-la para a vergonha pública ou para o pudor público.


Porém o Anjo do Senhor intervém: “Enquanto José pensava nisso, eis que o anjo do Senhor apareceu-lhe, em sonho, e lhe disse: “José, Filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque ela concebeu pela ação do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e tu lhe darás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados”. E José que encarna o resto de Israel é dócil à voz de Deus e quer cumprir aquilo que Deus quer que ele realize para Jesus salvar a humanidade. E o uso da expressão “Filho de Davi” aplicada a José indica a relação com Mt 1,1 para sublinhar que o direito à realeza para Jesus vem pela linha de José (cf. Mt 12,23; 20,30).


Percebe-se aqui o significado que o evangelista Mateus atribui à figura de Maria. Ela representa a comunidade cristã em cujo seio nasce a nova criação pela obra do Espírito Santo. A dúvida de José reflete, por isso, o conflito interno dos israelitas fiéis diante da nova realidade: a comunidade cristã. Pela ruptura com a tradição que percebe nessa comunidade (nascimento virginal sem pai ou sem modelo humano), José (=Israel) deve repudiá-la para ser fiel à tradição. Por outro lado, José (=Israel) não tem motivo real algum para difamá-la, pois sua conduta irrepreensível é patente ou óbvia. O Anjo do Senhor, que representa o próprio Deus, resolve o conflito convidando Israel fiel a aceitar a nova comunidade, porque o que nasce nela é obra de Deus. Esse Israel compreende a novidade do messianismo de Jesus e aceita a ruptura com o passado.


3. Noites de Discernimento de José: Mensagem Para Nós

 
O evangelho deste dia nos coloca em destaque José em relação a Maria encontrada grávida sem nenhum contato com ele. É claro que José passa noites para um discernimento para procurar entender o acontecimento. Sabemos muito bem que discernir é fatigoso. Lançam-se muitas perguntas tais como: O que quer Deus de mim? Por que me põe nessa situação tão inédita? Como é que posso aceitar uma mulher já grávida que não é o fruto do meu ato para ser minha mulher? Na sua cabeça surge uma idéia descrita por Mateus da seguinte maneira: “José, seu esposo, sendo justo e não querendo denunciá-la publicamente, resolveu repudiá-la em segredo” (Mt 1,19).


Não há duvida de que o caminho de São José até a decisão final foi escuro e doloroso, pois no processo de discernimento a pessoa tem que distinguir entre o que é bom e o que não o é; o que Deus quer e o que Ele não quer. O objeto preciso do discernimento é a vontade de Deus e comporta uma grande visão de fé. Somente na fé é que posso descobrir que Deus me ama, pensa em mim, me chama, tem uma opção particular para mim, minha vida tem um sentido no plano de Deus e eu tenho meu nome gravado na palma da mão de Deus (Is 49,16), que Deus quer se revelar a mim. Discernimento é uma purificação do coração, um ato de amor ao Senhor, um reconhecer que na minha vida eu estou em dialogo com uma Palavra mais forte que eu, que me criou e redimiu, me sustenta, guia e acompanha. No discernimento, diante de Deus eu me conheço e conheço o desígnio de Deus sobre mim.


Durante o processo de discernimento em que é dada a oportunidade para Deus falar é que se encontra a solução: “José, Filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque ela concebeu pela ação do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e tu lhe darás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados”. O plano e a vontade de Deus são muito maiores e mais fortes do que a própria vontade de José. Na fé em Deus José recebeu Maria


São José revive a dos patriarcas. Como Abraão, pai na , José está disposto a seguir o caminho confiado do projeto de Deus. No evangelho deste dia ele é chamado de um homem justo, isto é, aquele que crê nas promessas de Deus inclusive quando estas parecem estranhas e impossíveis. O justo na Bíblia é aquele que permanece firmemente ancorado em Deus apesar dos pesares, ainda que tenha que ficar . A aparece como a condição na qual descobrimos com nova luz o sentido das coisas e das reações mais preciosas que vivemos.
 

José não é uma pessoa que fala ou ajusta as coisas para a vantagem própria. Ele é uma pessoa de ação. Ele se limita a escutar o que lhe revela o anjo. Para José a verdade de Deus é mais importante do que seu próprio interesse. Maria e José renunciaram à sua verdade para entrar na verdade de Deus.
  

Aceitar ou receber o mistério de Deus é uma das grandes tarefas que todos nós temos ao longo de nossa vida. Aceitar o que o Senhor quer para nós é o principal objetivo da existência; porque detrás do que Deus quer para nóssempre um mistério muito grande que somente é entendido e alcançado/obtido por meio da , da confiança em Deus e através de um coração generoso. Sem este tipo de coração é impossível aceitar o mistério do Senhor.
  

E nós? Nós não podemos ser felizes se não conseguirmos ler em profundidade os acontecimentos de nossa existência. Deus está presente em nossa existência: em cada uma de suas vicissitudes aparece o plano de Deus e Sua intenção de nos dizer algo. É uma verdade que devemos descobrir em cada momento de nossa vida. Quando cada um descobre sua própria impotência e sua pequenez diante da própria existência, então, deve voltar à memória deste relato para descobrir dentro de si a presença de Deus. Deus cumpre Sua promessa e a faz, muitas vezes, em forma desconcertante. Emanuel, Deus-Conosco é a fortaleza feita debilidade. Em uma humilde casa de Nazaré, no seio de uma jovem, chega, discretamente, Aquele que estabelece nossa amizade com Deus. A esse dom contribui a simplicidade de José. Quando pensarmos que tudo discorre “normalmentenós não seremos capazes de perceber o novo no imprevisto.
  

José aceita o desafio de Deus apesar de sua vontade de abandonar Maria. Como na vida de José, também às vezes nos são apresentadas situações difíceis e obscuras. Mas elas servem para nos purificar, para purificar nossa visão desta vida, para ampliar nosso horizonte e para nos aproximar de Deus e dos seus mistérios.
   

Precisamos contemplar a delicadeza deste homem simples e justo, São José. Ele é capaz de entrar nos segredos de Deus, como a própria Maria. Aqui neste texto encontramos um casal que recebeu uma responsabilidade excepcional: ser instrumento de Deus pelo qual a salvação chega aos outros homens.


Além disso, quando uma comunidade cristã de hoje, como no tempo de Mateus, descobre sua impotência e sua pequenez, como José, ela deve voltar à memória desse relato para descobrir dentro de si a presença de Deus que sempre se conecta com ela para a realização da salvação. E como na vida de José, também, às vezes, são nos apresentadas situações difíceis e obscuras. Sabemos muito bem que dentro dos planos de Deus encaramos com freqüência as provas e as tribulações,as quais servem para nos purificar e nos aproximarmos mais de Deus e de Sua vontade.

P. Vitus Gustama,svd

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