PALAVRA
DE DEUS TEM FORÇA TRANSFORMADORA
Quinta-feira da XXII Semana Comum
05 de Setembro de 2013
Texto
de Leitura: Lc 5,1-11
Naquele
tempo, 1 Jesus estava na margem do lago de Genesaré, e a multidão apertava-se
a seu redor para ouvir a palavra de Deus. 2 Jesus viu duas barcas paradas na
margem do lago. Os pescadores haviam desembarcado e lavavam as redes. 3 Subindo
numa das barcas, que era de Simão, pediu que se afastasse um pouco da margem.
Depois sentou-se e, da barca, ensinava as multidões. 4 Quando acabou de falar,
disse a Simão: “Avança para águas mais profundas, e lançai vossas redes para a
pesca”. 5 Simão respondeu: “Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada
pescamos. Mas, em atenção à tua palavra, vou lançar as redes”. 6 Assim fizeram,
e apanharam tamanha quantidade de peixes que as redes se rompiam. 7 Então
fizeram sinal aos companheiros da outra barca, para que viessem ajudá-los. Eles
vieram, e encheram as duas barcas, a ponto de quase afundarem. 8 Ao ver aquilo,
Simão Pedro atirou-se aos pés de Jesus, dizendo: “Senhor, afasta-te de mim,
porque sou um pecador!” 9 É que o espanto se apoderara de Simão e de todos os
seus companheiros, por causa da pesca que acabavam de fazer. 10 Tiago e João,
filhos de Zebedeu, que eram sócios de Simão, também ficaram espantados. Jesus,
porém, disse a Simão: “Não tenhas medo! De hoje em diante tu serás pescador de
homens”. 11 Então levaram as barcas para a margem, deixaram tudo e seguiram a
Jesus.
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É narrada
no evangelho de hoje a história da pesca milagrosa, ressaltando o papel de
Jesus e o dos pescadores. Pedro que é especialista na pescaria se torna um
pescador frustrado pelo insucesso da noite inteira. Por isso, quando Jesus lhe
disse: “Avança para águas mais profundas e lança redes para a pesca” (v.4) veio
aquela resposta de desconfiança da parte de Pedro: “Mestre, nós
trabalhamos a noite inteira e nada pescamos”(v.5). “Deus
precisou de apenas uma palavra para criar-nos, mas de seu sangue para redimir-nos.
Se às vezes te sentes frustrado por tuas misérias, recorda quanto custaste”, dizia Santo Agostinho (Serm. 36,8). Aqui podemos também citar
muitas das nossas situações de cada dia: cansei-me muito, gastei muita energia
e tempo, empenhei-me a fundo, rezei muito e não aconteceu nada. É aquela
sensação de derrotismo, de desânimo, de desespero. Dá vontade de desistir de
tudo, de fugir, de abandonar tudo.
Eis o
momento delicado no qual Pedro põe em jogo a própria pessoa, a própria vida e o
próprio futuro. Ele e seus companheiros haviam trabalhado a noite inteira sem
conseguir apanhar um só peixe e agora, em pleno dia, Jesus manda-lhes que
lancem as redes para a pesca. Eles conhecem Jesus, mas como Mestre. Por isso,
apesar de todas as objeções que um profissional poderia levantar contra ela, a
palavra de Jesus tem mais força para Simão do que sua longa experiência de
pescador. Pedro tenta superar a própria desconfiança.
A palavra
de Deus é poderosa, mas é preciso que seja posta em prática para que desenvolva
sua força. E Pedro cumpre a palavra de Jesus imediatamente: “Na tua palavra
lançarei a rede” (v.5). Notemos quanto há de profundo neste “na tua palavra”
porque é a expressão que, na Bíblia, especialmente nos Salmos, designa a
atitude do homem diante de Deus. “Confio na Tua Palavra, é Tua Palavra que me
dá vida, Senhor; Tu me afligiste. Tu permitiste tantos sofrimentos na minha
vida, mas na Tua Palavra confio”. Certamente, na força da Palavra de Deus, os
apóstolos encontram a vida ali onde tudo parecia morto; messe abundante onde
tudo parecia vazio; abertura onde tudo parecia fechado.
Aqui
Pedro sai dos cálculos e se atira, confiando na Palavra do Senhor. De fato, à
fé, à obediência incondicional de Simão Pedro segue-se o milagre, a
manifestação do poder da Palavra criadora de Deus. O poder da Palavra de Deus
manifestada em Jesus domina toda esta cena. Toda força, todo poder vem de Deus.
Nesta perspectiva devemos situar-nos para compreender o que segue. Mas antes
disso, vamos tirar alguma lição.
Jesus
nunca permite o aborrecimento pelo insucesso no nosso trabalho. Não cabe a cada
um de nós calcular o último resultado. Cada um deve trabalhar, empenhar-se
todo, confiando unicamente na Palavra do Senhor. Empenhar-se significa dar
tudo, experimentar tudo, estudar, corrigir, mudar e recomeçar. A eficácia de
nossa ação está na obediência à Palavra de Deus. Se agirmos em nome próprio,
nossos esforços serão estéreis. A Palavra de Deus é a semente que tem em si uma
força criadora, uma potência enorme. Então, por que ainda duvidamos dela? Por
que não levamos a sério a Palavra de Deus? Por que não a lemos? Com Deus
podemos pescar onde parece que não há peixe, podemos plantar justiça ou amor
onde outros dizem que não adianta tentar; podemos levar fraternidade onde
parece que a competição é a única lei que funciona.
Vendo a
pesca milagrosa, Pedro descobre a manifestação do poder de Deus em Jesus e se
lança aos pés dele, dizendo: “Afasta-te de mim, Senhor, pois sou
um pecador” (v.8). Ele não chama mais Jesus de “Mestre”, mas de “Senhor”. O
poder de Jesus faz sobressair a pecaminosidade de Pedro: Pedro não estava entre
os maiores pecadores, mas também ele era um homem que, colocado diante do
poder, da santidade de Deus, sentia que muitas coisas de sua vida não
funcionavam. Com clarividência instantânea, Pedro percebe a distância entre seu
pecado e a santidade de Deus, entre sua pequenez e sua fragilidade e a grandeza
e poder de Deus. Pedro sente com uma clareza insuportável que não há lugar para
ele, pecador, na presença do Deus santo. Esta experiência da sua indignidade
diante da manifestação de Deus é o que causa em Pedro e em seus companheiros o
“tremendo espanto” de que nos fala o texto. “A Palavra de Deus nos
ensina a não temer, mesmo que tenhamos medo, e a temer mesmo quando não temos
medo. Temamos, pois, para não temer”,
dizia Santo Agostinho (Serm. 65, 1,1).
Enquanto
vivemos no meio dos outros homens, fracos e frágeis como nós, não nos damos
conta do nosso pecado, de nossa fragilidade, de nossas fraquezas; aliás,
comparando-nos com os que estão ao nosso lado, podemos até pensar que sejamos
justos, honestos, sinceros, caridosos, misericordiosos e irrepreensíveis. Mas
ao entrarmos em contato com Deus, as coisas mudam: constatamos de forma
dramática a nossa pobreza, a nossa indignidade, a nossa miséria. Só quem fica perto
de uma luz percebe a sujeira da própria roupa. Esta experiência é vivida por
todos aqueles que entram em contato com a Palavra de Deus, aquela palavra que é
“viva e eficaz, mais penetrante do que uma espada de dois gumes” (Hb 4,12). É a
experiência vivida por Paulo, quando toma consciência da própria indignidade de
pregador do Evangelho: “Nós carregamos este tesouro em vasos de barro” (2Cor
4,7).
A palavra
de Deus se manifesta em Jesus Cristo como uma palavra que pacifica, que infunde
ânimo, que dá segurança; como uma palavra que escolhe, que chama, que fortalece
e que transforma a existência daquele que é chamado. A palavra de Jesus vai
superar a distância: “Não temas!” São mesmas palavras que ecoam nas
manifestações de Deus no AT (cf. Gn 15,1;21,17;26,24;28,13;Jz 6,23;1Sm 4,20).
Às
palavras de pacificação, de segurança e de coragem, seguem-se as da promessa-
missão: “Doravante serás pescador de homens”. A palavra de Jesus tem esse poder
de fazer começar uma história nova na vida de um homem.
A nova
missão de Pedro e de seus companheiros será a de “salvar vidas”: entrar mar
adentro para tirar os homens das águas profundas, do abismo da morte; “pegar
vivos ou para a vida” os homens, assim como eles mesmos foram colhidos-
escolhidos. A resposta de Pedro e de seus companheiros às palavras de Jesus foi
a disponibilidade absoluta, a da obediência incondicional: “...e deixando tudo,
eles o seguiram” (v.11). A renúncia, o “deixar tudo”, é uma conseqüência, e não
uma condição prévia, do chamamento de Jesus. A vocação é a vocação para uma
missão.
Aprendemos
que pescar- salvar sem Jesus é impossível. Todos os saberes e técnicas humanas,
horas oportunas (a noite), não são capazes de salvar sem a ajuda de Jesus. O
fruto abundante (pesca milagrosa) será constante na atividade missionária se
cada cristão seguir as diretrizes de Jesus. Nossas próprias forças não são
suficientes para superar tudo. Necessitamos da confiança na Palavra d’Aquele
que nos prometeu que nunca nos deixaria sozinhos (cf. Mt 28,20). Quem, como
Pedro, aceitar sua limitação, estará em condições de aceitar que os frutos de
seu trabalho apostólico não são seus e sim d’Aquele que nos convidou para ser
seu instrumento. Jesus chama os apóstolos a serem pescadores de homens, mas o
verdadeiro pescador é Ele.
Diante da
força da Palavra de Deus posta em prática a exemplo de Pedro que resultou na
pesca abundante, devemos, por acaso, desistir diante das dificuldades? Devemos
recusar o convite do Senhor para ser pescadores de homens, para espalhar a
Palavra do Senhor? Temos convicção de que a única força que possuímos é a da
Palavra de Deus que nos foi confiada? Não nos sentimos, por vezes, inclinados a
confiar em outras forças?
P.
Vitus Gustama,svd
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