CONDIÇÕES
PARA SEGUIR A JESUS
XXIII Domingo Comum “C”
08 de Setembro de 2013
Texto
de Leitura: Lc 14,25-33
(Sb 9,13-19; FM 9b-10.12-17)
Naquele tempo, 25 grandes multidões acompanhavam
Jesus. Voltando-se, ele lhes disse: 26 “Se alguém vem a mim, mas não se
desapega de seu pai e sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas
irmãs e até da sua própria vida, não pode ser meu discípulo. 27 Quem não carrega sua cruz e não
caminha atrás de mim, não pode ser meu discípulo. 28 Com efeito: qual de vós, querendo
construir uma torre, não se senta primeiro e calcula os gastos, para ver se tem
o suficiente para terminar? Caso contrário, 29 ele vai lançar o alicerce e não
será capaz de acabar. E todos os que virem isso começarão a caçoar, dizendo: 30 ‘Este homem começou a construir e
não foi capaz de acabar!’ 31 Ou ainda: qual o rei que ao sair para guerrear com outro, não se senta
primeiro e examina bem se com dez mil homens poderá enfrentar o outro que
marcha contra ele com vinte mil? 32 Se ele vê que não pode, enquanto o
outro rei ainda está longe, envia mensageiros para negociar as condições de paz.33 Do mesmo modo, portanto, qualquer
um de vós, se não renunciar a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo!”
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“Não procures repouso em nenhum
prazer,
pois não foste
criado para o prazer e
sim para a ALEGRIA espiritual.
E, se não conheces a diferença entre prazer e
alegria espiritual, ainda não começaste a viver”
(Thomas Merton)
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Na vida temos que saber tomar
decisões e escolher aquilo que tem mais valor para nossa vida. É preciso abrir mão
do valor inferior para ficar com o superior. É saber renunciar ao que
agarramos, mas não nos edificou mais, para viver com aquilo que nos faz avançarmos
na nossa humanidade rumo aquilo que nos diviniza (salvação). E sabemos que
certas decisões na vida representam uma mudança radical e renúncia e não
combinam com hábitos anteriores. Nisto é que há dor na escolha. Mas não tem
jeito! Ou nós assumimos para valer ou nem dá para começarmos a viver algo novo
que nos edifica e dignifica. Renovar é colocar algo novo. Isso supõe que
preparemos espaço para o novo. O Evangelho de Lucas que lemos neste domingo
aprofunda a idéia da necessidade de fazer opções em nome do seguimento de Jesus
que supõe muitas renúncias.
Jesus continua a dirigir-se para
Jerusalém onde O aguarda a glorificação (Lc 9,51-19,58) e nós acompanhamos essa
viagem ouvindo suas ultimas lições e refletindo sobre elas para rever nossa
maneira de viver como cristãos se nós estamos dentro dos ensinamentos do
Senhor.
Nessa viagem a multidão do povo
segue após Jesus. Jesus acalma o entusiasmo da multidão por meio da exigência
da renúncia total, porque viver como cristãos/ seguidores de Cristo não é fazer
passeata com o Senhor. Ele não precisa de admiradores ou espectadores, mas de
seguidores. Diante dos grandes números, das multidões incontáveis, Jesus fica
preocupado. Por isso, ele começa a explicar quais são os compromissos para quem
escolhe segui-lo como seu discípulo. Enquanto nós temos receio de perder alguns
simpatizantes, Jesus se preocupa com o contrário. E quando vemos as nossas
igrejas lotadas, sentimo-nos envaidecidos. Jesus, ao contrário, fica preocupado
diante da multidão que o seguia: ou eles não entenderam ou Jesus não se
expressou bem. Jesus jamais pretende enganar seus seguidores, induzindo-os a
assumirem um projeto de vida, sem conhecer-lhe o teor. Ele fala claro para
evitar frustrações.
No Evangelho de hoje, Jesus
apresenta três exigências muito claras e duras para quem quiser segui-Lo e
conclui as três com o mesmo áspero refrão: “...não pode ser meu discípulo”. A opção responsável e definitiva por
Cristo e pelo seu evangelho é o que especifica o cristão. Ser cristão significa
revestir-se de Cristo e ter os mesmos sentimentos, atitudes e ações na vida.
Ser cristão é aceitar pela fé e comportamento Jesus Cristo. Fazemos caminho ao
andar, mas só se caminharmos com Jesus e os irmãos é que nos tornamos cristãos,
pois não encontramos o Senhor senão no próximo (cf. Mt 25,40.45). No cristão
verdadeiro nota-se uma visão da vida, do homem, do mundo e dos problemas
humanos sob uma luz diferente: é a luz da fé pascal. Nota-se uma estabilidade
anímica que vence a mesquinhez e o desespero, uma paz que se sobrepõe às
dificuldades e ao desanimo, uma alegria que supera a tristeza e o mau humor,
pois ele sabe em quem acredita (2Tm 1,12).
1.
A primeira exigência: saber “odiar” (v.26)
Jesus emprega aqui uma expressão que
traduzida literalmente pode parecer excessivamente forte: “Se alguém vem a mim e não odeia
seu próprio pai e mãe, mulher,
filhos, irmãos, irmãs e até a própria vida não pode ser meu discípulo”(v.26).
Jesus, sem dúvida, não pretende
suprimir/eliminar o quarto mandamento (Lc 18,19-20). Segundo maneira oriental
de falar (semitismo), “odiar” significa pôr em segundo lugar algo porque tem
aparecido na vida de uma pessoa um valor maior (neste caso, Jesus e sua
mensagem) do que o anterior; significa colocar no segundo lugar. Trata-se,
então, de relativizar, à luz das exigências de seguir a Jesus, inclusive os
amores mais naturais e legítimos. Neste caso, “odiar” significa romper até os
laços mais íntimos quando estes constituem um impedimento para o amor e para a salvação.
Todos nós sentimos alguma vez a necessidade de nos afastarmos ou até de
contrariarmos certos projetos anti-evangélicos, mesmo quando encabeçados por
pessoas às quais estamos ligados por laços de amizade ou de parentesco. Estes
gestos corajosos, na verdade, são amor verdadeiro; são gestos evangélicos.
Renunciar aos pais, simbolicamente,
significa também a capacidade de desprender-se da tradição dos antigos para
abraçar o novo que nos salva; libertar-se das amarras da Lei para assumir a
misericórdia; libertar-se dos atos de cultos estéreis e equivocados para
assumir uma postura de uma fé madura, profética e libertadora. Assumir o
caminho do seguimento de Jesus significa relativizar todo o processo formativo
anterior para assumir outro.
Sobre saber “odiar”, podemos
traduzir na nossa linguagem assim: Quem é seguidor de Jesus não pode contrariar
os valores do Evangelho nem que seja para agradar a família. O próprio fato de
ser a família uma coisa boa, querida por Deus, mostra a força que Jesus queria
dar às exigências do Reino. Nem em nome de algo tão bom podemos ser desonestos,
mentirosos, corruptos, injustos. Temos que proteger nossa família dos valores
anti-evangélicos para que ela continue sendo uma Igreja doméstica.
2.
A segunda exigência: carregar a cruz diariamente (v.27)
“Quem
não carrega a sua cruz e me segue, não pode ser meu discípulo” (v.27). Esta
frase é interpretada, muitas vezes, como um apelo para suportar com paciência
as contrariedades, os grandes e pequenos sofrimentos da vida. Outras vezes é
entendida como uma exigência de mortificação, de sacrifício (mas, será
agradável a Deus a nossa dor? Será que Deus tem prazer de ver um ser humano
sofrer? Será que Deus como Pai tem alegria de ver seus filhos sofrer?). A dor é
um mal que deve ser afastado de nós mesmos e dos outros. O sofrimento,
tampouco, é um valor; pelo contrário, é algo para ser evitado e superado a todo
custo.
Propriamente falando, não existe uma
espiritualidade da cruz, mas apenas a espiritualidade do seguimento de Jesus:
durante este seguimento, é inevitável que encontremos perseguições,
incompreensões, resistência e o ódio. É a cruz inevitável do discipulado. Se você
é honesto, você se torna uma censura viva para quem vive na corrupção. Podemos
dizer que a cruz é conseqüência de uma “práxis”, de uma opção, de um valor. Não
é buscada em si mesma uma cruz, mas aceita como conseqüência de proclamar e
viver a Deus como Absoluto. Por isso, não se busca a cruz, busca-se o Reino de
Deus e a sua justiça, como Jesus e, buscando o Reino de Deus, onde e quando
impera o anti-reino, o anti-evangélico, encontra-se a cruz. As cruzes na vida
de Jesus, cujo ponto alto são a paixão e morte na cruz, foram o resultado
trágico e inevitável de ele ter levado a bom termo a missão que o Pai lhe
confiara. Jesus aceitou a cruz livremente, por amor ao Pai e por amor aos seres
humanos (salvar) razão pela qual Ele veio ao mundo. Foi por causa deste amor apaixonado
que a humanidade recobrou para sempre a amizade de Deus, tendo também acesso às
alegrias da vida eterna. Carregar a cruz, seguir o caminho de Jesus, é um
processo cotidiano de múltiplas decisões e fidelidades para chegar ao que digno
para o homem: a salvação.
O par de parábolas que segue, a do
construtor e do rei em guerra (vv.28-32), é um convite a refletir e ponderar
bem o risco daquele que quer se tornar discípulo. Trata-se de uma decisão
carregada de conseqüências. O texto nos convida a refletirmos sobre os custos,
as exigências da vida de fé. Se não pensarmos que a fé em Jesus não vai afetar
a nossa vida profundamente, mesmo na nossa vida cotidiana, não compreenderemos
o que o fato de seguir Jesus pede na realidade. Daí necessidade de calcular os
gastos, quer dizer, de medir o que o discípulo significa no Evangelho. Jesus
não quer decisões levianas, mal pensadas, de gente carregada só pelo entusiasmo
do momento. Não comece para depois não acabar; planeje; aprofunde as decisões
para poder assumir o que decidiu.
3.
A terceira exigência: a renúncia a si mesmo e a tudo (v.33 cf. Lc 9,23)
“... qualquer
de vós que não renunciar a tudo que possui, não pode ser meu discípulo” (v.33).
E em Lc 9,23: “Se alguém quer vir após
mim, renuncie a si mesmo...”.
Muitas vezes esse renunciar é
entendido como recusa deliberada de tudo que pode alegrar o coração, como se
Deus tivesse ciúme das nossas alegrias. Fabricam-se, então, tristes cristãos,
que confundiam santidade com amargura, sisudez, mau humor. O verdadeiro santo é
alegre e feliz, pois encontrou seu verdadeiro tesouro (Reino de Deus). É
possível ser sério com muito bom humor. Quem não sabe rir, ele não é uma pessoa
séria. Para que serviria um santo neurótico ou um santo que está sempre de cara
triste? É desejável viver os valores do Evangelho com alegria, com cara de
gente feliz, curtindo o que é bom na vida. Mas diante das exigências do Reino
de Deus, é absolutamente necessário renunciar ao que for atrapalhar. Renunciar
não é perder; é trocar um bem por outro, no qual, sincera e equilibradamente,
percebemos um valor maior.
Jesus nos manda renunciar a tudo que
tem. “Tudo que tem”, não só no sentido de bens materiai que se possuem, mas
pode significar também inchaço do orgulho, a sede de competição, a busca de
interesse, ser oportunista para cada falha, fraqueza ou descuido dos outros
para ganhar o máximo possível etc.
Além disso, Jesus exige o
“renunciar-se a si próprio”. A renúncia que ele pede de nós não é uma ação
negativa. Pede amor, doação de si mesmo. Negar-se é dar-se no amor. Fazer isso
é seguir a Jesus que fez o mesmo. O ascetismo, sacrifício ou renúncia de si
mesmo que não seja animado pelo amor, que não seja uma manifestação de amor,
uma expressão de doação de si mesmo, que não leve à comunhão com os outros é
apenas tortura auto-infligida A verdadeira renúncia de si mesmo é liberdade e
alegria porque é amor. Não é que vá ser livre de dor. Mas essa dor se
transformará em alegria, como a dor parto de uma mãe que é recompensada pelo
nascimento de um filho (de uma filha). Esse é o paradoxo da cruz de Jesus.
Reflitamos também nós um pouco e
perguntemo-nos: qual é o verdadeiro motivo que leva, em certas ocasiões, as multidões
às igrejas ou às praças? Os que participam com entusiasmo das nossas solenes
celebrações, das nossas romarias, estão realmente conscientes dos compromissos
que a fé cristã envolve? É muito mais fácil falar e aceitar o Deus que é
misericórdia e amor, enquanto o Deus que exige a responsabilidade acompanhada
pelas exigências duras é que muita gente começa a recuar. E Deus como é que
fica?
P. Vitus Gustama,svd
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