sábado, 19 de outubro de 2013

 
POSSUIR OS BENS TEMPORARIAMENTE


Segunda-feira da XXIX Semana Comum
21 de Outubro de 2013

Texto de Leitura: Lc 12,13-21

Naquele tempo, 13 alguém, do meio da multidão, disse a Jesus: “Mestre, dize ao meu irmão que reparta a herança comigo”. 14 Jesus respondeu: “Homem, quem me encarregou de julgar ou de dividir vossos bens?” 15 E disse-lhes: “Atenção! Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de bens”. 16 E contou-lhes uma parábola: “A terra de um homem rico deu uma grande colheita. 17 Ele pensava consigo mesmo: ‘Que vou fazer? Não tenho onde guardar minha colheita’. 18 Então resolveu: ‘Já sei o que vou fazer! Vou derrubar meus celeiros e construir maiores; neles vou guardar todo o meu trigo, junto com os meus bens. 19 Então poderei dizer a mim mesmo: Meu caro, tu tens uma boa reserva para muitos anos. Descansa, come, bebe, aproveita!’ 20 Mas Deus lhe disse: ‘Louco! Ainda nesta noite, pedirão de volta a tua vida. E para quem ficará o que tu acumulaste?’ 21 Assim acontece com quem ajunta tesouros para si mesmo, mas não é rico diante de Deus”.

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Ainda estamos na seção chamada Lições do Caminho (Lc 9,51-19,28). Jesus passa para nós suas últimas e mais importantes lições no seu caminho (êxodo) para Jerusalém. Esse caminho nos mostra que a vida é uma peregrinação para a vida glorificada. Desse caminho a presença de cruz ou cruzes é inevitável. Mas ao olhar para a vida glorificada mostrada por Jesus teremos condições e forças para superar as barreiras e ultrapassar os obstáculos. A vida glorificada nos renova nossas forças permanentemente.


Na passagem do evangelho de hoje Jesus nos dá lição sobre como devemos nos comportar diante dos bens. Essa lição nos mostra que nossa relação com as coisas não é de propriedade e sim de uso. Usaremos os bens materiais enquanto tivermos o direito de usufruí-los. Mas esse direito cessará assim que terminar nossa missão ou nossa existência neste mundo. Estejamos conscientes de que somos valorizados não pelos bens que possuímos ou pelo cargo que temos e sim pelos valores que vivemos.


Atenção! Guardai-vos de todo tipo de ganância, pois mesmo que se tenha muitas coisas, a vida não consiste na abundância de bens”, alerta-nos Jesus no evangelho deste dia (Lc 12,15).


O homem é sempre tentado a buscar sua salvação nos bens, a pôr nas riquezas sua segurança. O cristão deve estar vigilante contra essa tentação insidiosa /cheia de ciladas. Os bens não asseguram nem a mesma vida, menos ainda a salvação. Num leito de morte toda riqueza e todo poder mundano caíram no chão.


O homem da parábola dialoga consigo mesmo. Este diálogo falha na ordem de salvação. Faltam-lhe interlocutores. Não intervém Deus. Não intervêm os demais homens, pois esse homem fala consigo próprio (fala sozinho). O homem foi feito para a comunicação, foi feito para a comunhão. E o seu desenvolvimento depende da existência dos outros. Ninguém foi feito para o isolamento. A comunhão sugere calor, compreensão e abraço para que o homem possa se desenvolver. Quando ficamos isolados, estamos propensos a ser prejudicados. Sentir-se integrado mantém a pessoa em equilíbrio. Os antigos e eternos valores da vida humana: verdade, unidade, solidariedade, bondade, justiça, honestidade, amor e assim por diante, são afirmações da verdadeira comunhão ou integração. Podemos possuir tudo que o mundo tem a oferecer em termos de status, poder, realização, e bens, no entanto, sem nos sentirmos integrados, sem a convivência com os outros, tudo isso parece vazio e inútil.


Bloquear a vida! Este é o grande pecado do homem rico na parábola. Ele acreditava que podia comprar a vida, encerrá-la, dominá-la. Pensava “agarrar” a vida. Mas a vida se escapa dele: “Louco! Ainda nesta noite, pedirão de volta a tua vida. E para quem ficará o que tu acumulaste?”, diz-lhe Deus (Lc 12,20).


A riqueza não é algo diabólica (diabólico é aquilo que divide o homem por dentro ou entre si. O contrário do diabólico é simbólico, isto é, duas coisas que se encaixam bem); o faz diabólico o uso que o homem faz dele. Tampouco é um poder que escraviza por si. A riqueza nenhuma tem poder de escravizar. O homem é que se faz escravo dos seus bens ou quem a utiliza para escravizar seus irmãos. O dinheiro é satânico quando o homem, ao servir-se dele, não tem outro horizonte. Mas o dinheiro é um bem quando o homem o utiliza para a felicidade dos demais. Mesmo sendo rico, quando o homem partir deste mundo, ele não terá mais poder sobre suas riquezas. São os vivos que determinarão o uso da riqueza deixada.


A cobiça pode ser de dinheiro, mas também de fama, de poder, de prazer, de ideologias e assim por diante. Mas sempre é idolatria, porque pomos nossa confiança em algo frágil e caduco e não nos valores duradouros, e isso nos bloqueia outras coisas mais importantes. Tudo isto não nos deixa sermos livres, nem sermos solidários com os demais, nem estarmos abertos diante de Deus.


Ser rico diante de Deus significa dar importância àquelas coisas que levaremos conosco na morte: as boas obras, a caridade praticada na verdade, a justiça e a honestidade que vivemos e assim por diante. É saber compartilhar com os outros nossos bens que é uma riqueza que vale a pena diante de Deus.


No fundo, Jesus quer nos dizer que nem o trabalho nem o capital (dinheiro) será a última palavra sobre o homem; tanto o um como o outro se fica sem resposta diante da morte, e a morte é a maior questão que persegue o homem. É preciso buscarmos as coisas do alto para superar esta questão, pois Deus rico em misericórdia, que vivificou Jesus, nos vivificará também.


Quase em toda a Bíblia se encontram termos que aludem à tensão em que vive o ser humano: graça e pecado, amor e desamor/ ódio, verdade e mentira, autenticidade e falsidade, coerência e incoerência, generosidade e egoísmo, reconciliação e vingança, cautela e despreocupação e assim por diante. Em todo ser humano entram em luta permanente duas forças ou inclinações contrárias: o bem-virtude, e o mal-vício. O primeiro salva, e o segundo condena. Essas duas coisas sempre nos acompanham diariamente. Cabe a cada um escolher, e aceitar as conseqüências dessa escolha.

P. Vitus Gustama,svd

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