03/02/2015
BASTA TER FÉ EM
JESUS
Evangelho: Mc 5,21-42
Naquele
tempo, 21Jesus atravessou de novo, numa barca, para a outra margem.
Uma numerosa multidão se reuniu junto dele, e Jesus ficou na praia. 22Aproximou-se,
então, um dos chefes da sinagoga, chamado Jairo. Quando viu Jesus, caiu a seus
pés, 23e pediu com insistência: “Minha filhinha está nas últimas.
Vem e põe as mãos sobre ela, para que ela sare e viva!” 24Jesus então o acompanhou. Numerosa multidão o seguia e comprimia. 25Ora,
achava-se ali uma mulher que, há doze anos, estava com hemorragia; 26tinha
sofrido nas mãos de muitos médicos, gastou tudo o que possuía, e, em vez de
melhorar, piorava cada vez mais. 27Tendo ouvido falar de Jesus, aproximou-se dele por detrás, no meio
da multidão, e tocou na sua roupa. 28Ela pensava: “Se eu ao menos
tocar na roupa dele, ficarei curada”. 29A hemorragia parou
imediatamente, e a mulher sentiu dentro de si que estava curada da doença. 30Jesus
logo percebeu que uma força tinha saído dele. E, voltando-se no meio da
multidão, perguntou: “Quem tocou na minha roupa?” 31Os discípulos
disseram: “Estás vendo a multidão que te comprime e ainda perguntas: ‘Quem me
tocou’?” 32Ele, porém, olhava ao redor para ver quem havia feito aquilo. 33A
mulher, cheia de medo e tremendo, percebendo o que lhe havia acontecido, veio e
caiu aos pés de Jesus, e contou-lhe toda a verdade. 34Ele lhe disse:
“Filha, a tua fé te salvou. Vai em paz e fica curada dessa doença”. 35Ele
estava ainda falando, quando chegaram alguns da casa do chefe da sinagoga, e
disseram a Jairo: “Tua filha morreu. Por que ainda incomodar o mestre?” 36Jesus
ouviu a notícia e disse ao chefe da sinagoga: “Não tenhas medo. Basta ter fé!” 37E
não deixou que ninguém o acompanhasse, a não ser Pedro, Tiago e seu irmão João.
38Quando chegaram à casa do chefe da sinagoga, Jesus viu a confusão
e como estavam chorando e gritando. 39Então, ele entrou e disse: “Por que essa confusão e esse choro? A
criança não morreu, mas está dormindo”. 40Começaram então a caçoar
dele. Mas, ele mandou que todos saíssem, menos o pai e a mãe da menina, e os
três discípulos que o acompanhavam. Depois entraram no quarto onde estava a
criança. 41Jesus pegou na mão da menina e disse: “Talitá cum” — que
quer dizer: “Menina, levanta-te!” 42Ela levantou-se imediatamente e
começou a andar, pois tinha doze anos. E todos ficaram admirados. 43Ele
recomendou com insistência que ninguém ficasse sabendo daquilo. E mandou dar de
comer à menina.
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Estamos
nos últimos dois milagres de uma serie de milagres no início do evangelho de
Marcos (Mc 4,35-5,43). No texto do Evangelho de hoje Jesus é apresentado como
aquele que tem poder de curar as doenças por graves que elas sejam e de
devolver a vida para quem se encontra morto. Mas para que seu poder possa
acontecer na vida do homem, há uma condição indispensável: fé. “Não tenhas medo. Basta ter fé!”, disse nos Jesus.
“A fé é a garantia dos bens que se esperam, a prova das realidades que não
se vêem” (Hb 11,1). A mulher que estava doente de hemorragia durante 12
anos viveu a fé e ficou curada como premio de sua fé. "Fé é o pássaro que sente a luz e canta quando a
madrugada é ainda escura."
(Rabindranath Tagore)
1. O Reino de
Deus é a Vida Para Todos (cf. Jo 10,10b).
Jesus percorre o país para anunciar o Reino de Deus e para
estabelecê-lo. Ele fala e age com autoridade. A sua fama se espalha, porque uma
força brota d’Ele, é a força da ressurreição, a força do Espírito de vida, suas
palavras estão cheias de autoridade, pois fazem todos crescerem na fraternidade
e na igualdade.
“Fica curada!”. O imperativo
de Jesus tem algo de afetuoso para com a
mulher sofrida de hemorragia durante 12 anos, e é restaurada na sua dignidade,
restabelecida na sociedade que excluía o seu mal. Este imperativo “fica curada”
aparece também como uma constatação: é a fé dessa mulher que a salvou, e Jesus
se alegrou por isso. A cura é conseqüência da fé, que é sempre fonte de vida e
de felicidade. “Filha, a tua fé te salvou. Vai em paz e fica curada dessa
doença”.
“Levanta-te!”. Este segundo imperativo do Evangelho deste
dia é dinâmico e traduz perfeitamente a paixão de Deus em ver o homem vivo, o
seu amor incondicional pela vida, pois Ele é a própria fonte de vida (cf. Jo
11,25; 14,6; 10,10). “Adormecida”, no “sono da morte”… um estado do qual Deus
nos quer fazer sair, um estado do qual Ele nos salva, Jesus, o Deus-Conosco,
chamou a jovem mulher a voltar à vida. “Eu te ordeno: levanta-te”. A palavra
evoca a ressurreição, o novo surgir da vida, o amor divino que nos coloca de
pé. É um imperativo que quer nos mostrar que
a vida jamais acaba, pois sua origem está em Deus (cf Jo 1,4; 11,25;
14,6). É preciso mantermos nossa fé no Deus da vida, origem e destino da vida.
Ter fé no Deus da vida significa não parar de existir. É viver para sempre.
Jesus pede ao pai da jovem apenas uma coisa: fé. “Não tenhas medo. Basta ter
fé!”. E quanto a nós, cremos
verdadeiramente em Jesus Cristo, Filho de Deus vivo?
“Retirai-vos porque a menina não morreu e sim está
dormindo”, disse Jesus à multidão. Jesus
quer dizer que para ele e para o poder de Deus a morte não significa mais que
um sono ligeiro. Da mesma maneira Jesus também falou de Lázaro morto: “Nosso
amigo Lázaro está dormindo e vou despertá-lo” (Jo 11,11). A morte para Deus não
é um poder insuperável. Para quem ainda não está no caminho da fé tem
dificuldade para entender tudo isso. As coisas têm um aspecto muito distinto
diante do olhar de Deus e diante da experiência do homem. Mas se aprendermos a
olhar tudo a partir de Deus, então a morte perderá seu caráter arrepiante e
teremos alegria de tratar nossa vida com carinho e respeito, pois a vida é de
Deus e Deus está nela.
As duas beneficiadas das ações de Jesus neste Evangelho têm
algo em comum: a primeira estava doente durante 12 anos, e a jovem filha morreu
aos 12 anos, a idade em que se devia tornar mulher. No povo de Israel, o percurso
destas duas mulheres era sinal de um fracasso. Uma estava atingida, como Sara,
a mulher de Abraão, na sua fecundidade, pois essa mulher de hemorragia perdia o
seu sangue, princípio de vida na mentalidade semítica. A outra perdia a vida,
precisamente na idade em que se preparava para transmiti-la (era tradição
casar-se muito cedo). Cristo cura as duas mulheres e permite-lhes assim assumir
a sua vocação maternal. “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em
abundância”, disse-nos Jesus (Jo 10,10b). Estar com Jesus significa estar com a
vida em abundância. Longe dele perdemos a capacidade de produzir frutos para
uma vida em abundância (cf. Jo 15,5).
2.
Transformação Pela Fé.
Um chefe de sinagoga cai de joelhos, reconhecendo a
divindade de Jesus, e suplica a Jesus para salvar a sua filha. Uma mulher
atingida por hemorragias não diz nada, mas contenta-se em tocar as vestes de
Jesus, porque se considera impura ritualmente (por isso ela fez tudo
silenciosamente). Isto basta para Aquele que veio para levantar, curar, salvar
a humanidade ferida. Só a fé solicita um sinal de Jesus, a fé de Jairo, a fé da
mulher, a fé de Pedro, Tiago e João… E esta fé faz Jesus agir e transforma os
beneficiados: a mulher é curada, a jovem volta a viver (levantar-se.
A fé nos diz que não há nada que seja perdido. A fé amplia
nosso horizonte e alarga nossa perspectiva para mais longe. A fé nos levanta
para um topo mais alto para ver até os vales da vida na sua profundidade. A fé
nos coloca no mapa de nossa vida para que saibamos para onde vamos e por onde
vamos. A fé é um tipo de “GPS” que nos leva até o endereço certo de nossa vida. Por causa da fé eu preparo o espaço necessário
para que Deus possa atuar em mim. A fé é sempre e continua sendo a condição e o
fundamento da ação salvadora de Deus em mim.
“Não tenhas medo.
Basta ter fé!”. É o convite de Jesus para cada um de nós. Jesus não nos
pede outra coisa a não ser fé. E isso Ele pede até quando nos encontrarmos numa
situação impossível de superar. A exemplo da mulher com a hemorragia durante 12
anos que toca na veste de Jesus, precisamos tocar o próprio mistério para que
possamos sair de nossa situação sem saída. Além disso, precisamos deixar nossa
mão segurada pelo Senhor para que possamos nos levantar novamente de uma situação
de morte, como a menina de 12 anos que se encontrou morta e voltou a viver,
pois o Senhor segurou sua mão e a ajudou a se levantar.
“Não temas; basta que tenhas fé!”. Este é o segredo. Ter fé
é uma maneira mais eficaz para ficar perto de Deus. Mas a fé não se adquire nem
nos livros, nem nas revistas nem nas receitas e sim está no encontro pessoal
com Jesus. Para esse Jesus podemos pedir: “Toque-me, Senhor para que eu possa
ficar curado e viva novamente!”.
A fé move montanhas. Nossas montanhas de medo, de
covardias, de falta de compromisso com a vida. Aquela mulher, com fluxo de
sangue, considerada impura que não podia ser tocada por ninguém nem tocar
alguém, tomou coragem de tocar o manto de Jesus, pois tem fé no poder de Jesus
de que ficaria curada. Para ela não há lei que a detenha. E ficou curada.
Diante da morte de sua filha, Jairo
escuta a voz do Senhor que lhe diz: “Não
temas; basta que tenhas fé!”. Quem tem fé não há nada nem ninguém possa o
deter.
“Não tenhas medo. Basta ter fé!”, disse-nos
Jesus hoje.
·
“A fé nasce no encontro com o Deus
vivo, que nos chama e revela o seu amor: um amor que nos precede e sobre o qual
podemos apoiar-nos para construir solidamente a vida. Transformados por este
amor, recebemos olhos novos e experimentamos que há nele uma grande promessa de
plenitude e se nos abre a visão do futuro. A fé, que recebemos de Deus como dom
sobrenatural, aparece-nos como luz para a estrada orientando os nossos passos
no tempo.”(Papa
Francisco: Carta Encíclica Lumen Fidei no.4)
·
“A
fé está ligada à escuta. ... A fé é a resposta a uma Palavra que interpela
pessoalmente, a um Tu que nos chama por nome. A fé desvenda-nos o caminho e acompanha os nossos
passos na história.” (Idem no.8)
- Acreditar significa confiar-se a um amor misericordioso que sempre acolhe e perdoa, que sustenta e guia a existência, que se mostra poderoso na sua capacidade de endireitar os desvios da nossa história. A fé consiste na disponibilidade a deixar-se incessantemente transformar pela chamada de Deus. Paradoxalmente, neste voltar-se continuamente para o Senhor, o homem encontra uma estrada segura que o liberta do movimento dispersivo a que o sujeitam os ídolos. (Idem no. 13)
·
“A
fé não só olha para Jesus, mas olha também a partir da perspectiva de Jesus e
com os seus olhos: é uma participação no seu modo de ver.” (Idem no.18)
·
“Aquele que acredita, ao aceitar o dom
da fé, é transformado numa nova criatura, recebe um novo ser, um ser filial,
torna-se filho no Filho: « Abbá, Pai » é a palavra mais característica da experiência
de Jesus, que se torna centro da experiência cristã [cf. Rm 8, 15].” (Idem no.19)
- “Em família, a fé acompanha todas as idades da vida, a começar pela infância: as crianças aprendem a confiar no amor de seus pais. Por isso, é importante que os pais cultivem práticas de fé comuns na família, que acompanhem o amadurecimento da fé dos filhos. Sobretudo os jovens, que atravessam uma idade da vida tão complexa, rica e importante para a fé, devem sentir a proximidade e a atenção da família e da comunidade eclesial no seu caminho de crescimento da fé. Todos vimos como, nas Jornadas Mundiais da Juventude, os jovens mostram a alegria da fé, o compromisso de viver uma fé cada vez mais sólida e generosa. Os jovens têm o desejo de uma vida grande; o encontro com Cristo, o deixar-se conquistar e guiar pelo seu amor alarga o horizonte da existência, dá-lhe uma esperança firme que não desilude. A fé não é um refúgio para gente sem coragem, mas a dilatação da vida: faz descobrir uma grande chamada — a vocação ao amor — e assegura que este amor é fiável, que vale a pena entregar-se a ele, porque o seu fundamento se encontra na fidelidade de Deus, que é mais forte do que toda a nossa fragilidade.” (Idem no.53)
A ausência da fé suscita a angústia e o pavor. Quando confiamos
apenas nas nossas forças, quando contamos apenas com as nossas capacidades e
nossas técnicas, com aquilo que possuímos ou somente com as relações que
mantemos com as pessoas com as quais estamos ligados, mais cedo ou tarde
ficaremos desiludidos. A confiança total em Deus nascida da nossa fé na Sua
Palavra é a única resposta adequada ao Seu insondável amor por nós.
3. A Vida Que
Nos Aproxima e A Força Curadora Que Nos Atrai e Levanta
Jesus se encontra no meio da multidão. Evidentemente há
muita conversa, gritaria e barulho. A multidão esmaga Jesus. No meio dessa
multidão eis que uma mulher se aproxima de Jesus, a todo o custo, somente para
tocar ao menos as vestes do Senhor. Para ela chegou seu momento e Jesus passou
providencialmente pela sua vida. Ela não quer perder esse precioso momento para
se aproximar d’Aquele que é fonte da verdadeira vida. Ela conseguiu tocar as
vestes do Senhor com muita fé. Destas vestes saiu uma força curadora para essa
mulher.
Há momentos preciosos na nossa vida em que nos esforçamos,
isto é, usar toda nossa força em função daquele momento. E nenhum de nós quer
perder aquela oportunidade. Por isso, costuma-se dizer: “Ou agora ou nunca
mais!”.
“Se eu ao menos tocar na roupa dele, ficarei
curada”. A mulher de hemorragia se esforça para tocar no corpo de Jesus
em função de sua cura de uma doença de longos anos (12 anos). É claro que Jesus
não crê que Seu corpo seja um tipo de talismã que emita umas forças
misteriosas, pois Jesus atua sempre sabendo daquilo que faz, e cura os enfermos
que crêem nele. Por isso, seus milagres não acontecem por debaixo de
consciência. A fé é um ato consciente. É uma entrega total para Deus, aconteça
o que acontecer, pois Deus é soberano nos seus atos e misericordioso em suas
sábias decisões, pois tudo em função da salvação do homem. Tudo que Deus faz
por nós é sempre para nos salvar. Basta correspondermos à ação de Deus para que
aconteça a salvação.
Na Eucaristia celebramos o memorial do amor de Jesus por
nós. Ele veio como vem não somente para curar nossas enfermidades corporais,
mas principalmente para nos libertar da enfermidade do pecado que nos separa do
amor de Deus e do próximo. Deus não nos quer são em nosso corpo, mas
principalmente que sejamos renovados no Seu amor para que possamos ver o outro
como nosso irmão. Apesar de nossas rebeldias, Deus jamais nos abandona e jamais
Ele deixa de nos amar. Essa fidelidade do Senhor é que celebramos em cada
Eucaristia. Aceitamos o amor de Deus que tem por nós e nos deixamos conduzir
por seu amor.
P. Vitus Gustama,svd
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