sábado, 29 de agosto de 2015

02/09/2015
JESUS NOS LIBERTA PARA SERVIRMOS O PRÓXIMO

Quarta-Feira da XXII Semana Comum

 

Evangelho: Lc 4,38-44


Naquele tempo, 38 Jesus saiu da sinagoga e entrou na casa de Simão. A sogra de Simão estava sofrendo com febre alta, e pediram a Jesus em favor dela. 39 Inclinando-se sobre ela, Jesus ameaçou a febre, e a febre a deixou. Imediatamente, ela se levantou e começou a servi-los. 40 Ao pôr do sol, todos os que tinham doentes atingidos por diversos males, os levaram a Jesus. Jesus punha as mãos em cada um deles e os curava. 41 De muitas pessoas também saíam demônios, gritando: “Tu és o Filho de Deus”. Jesus os ameaçava, e não os deixava falar, porque sabiam que ele era o Messias. 42 Ao raiar do dia, Jesus saiu e foi para um lugar deserto. As multidões o procuravam e, indo até ele, tentavam impedi-lo de as deixar. 43 Mas Jesus disse: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado”. 44 E pregava nas sinagogas da Judéia.
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O que Jesus anunciou na sinagoga de Nazaré, no seu discurso programático (Lc 4,14-30), ele vai o cumprindo. Aplicando para si a profecia de Isaias, Jesus diz que vem anunciar a salvação aos pobres e curar os cegos e dar a liberdade aos oprimidos.


Hoje lemos o programa de uma jornada de Jesus “ao sair da sinagoga”: curar a febre da sogra de Pedro, impor as mãos e curar os enfermos que as pessoas trouxeram para Jesus, libertar os possuídos pelo demônio e não se cansar de ir ao encontro do povo para anunciar o Reino de Deus. Mas, no meio de suas atividades missionárias, Jesus nunca deixa de buscar momentos de paz para rezar pessoalmente num lugar solitário.


Depois de sair da Sinagoga, em Nazaré, Jesus e alguns discípulos foram para a casa de Simão Pedro. Jesus saiu de um lugar oficial (sinagoga é lugar de oração, de ensino e de catequese para os judeus) para um ambiente familiar: casa. Em casa todos tem seu espaço e cada um é chamado pelo nome e não pelo título (se é um doutor, deputado, presidente e assim por diante). Cada um é gente em casa. Em casa um se preocupa com o outro. Basta um membro sofrer, todos sofrerão. Basta um membro ter sucesso, todos experimentarão a felicidade. Ninguém fica feliz sozinho como também ninguém sofre sozinho, pois não somente vivemos, mas convivemos. Nossa vida é cercada por outras vidas. Oxalá possamos viver a espiritualidade familiar também fora de nossa família, como Jesus nos diz hoje: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado” (Lc 4,43). O cristão existe para os outros. Nisto consiste o sentido de sua vida de cristão.


Pedro encontra sua sogra com febre em sua casa. No pensamento daquela época, a febre era causada pelo demônio. Com um gesto familiar, Jesus se aproximou da mulher, tocou-a e a ajudou a se levantar, e a febre desapareceu. A sogra de Pedro começou a servir a todos imediatamente.


A febre representa tudo que nos impede de servirmos aos outros. Cada um pode descobrir que tipo de “febre” que o impede de servir aos outros, “febre” que faz a vida perder seu sentido (ficar deitado todo tempo). O que é que me faz viver uma “vida deitada”, isto é, sem ação, sem ânimo, sem perspectivas. Eu preciso convidar Jesus para entrar na minha casa onde estou “deitado” para que ele se aproxime de mim, me toque e me ajude a me levantar. A palavra “levantar-se” no Novo Testamento, em outros contextos, também significa ressuscitar. Eu preciso me levantar de uma vida estéril (deitar) para uma vida fecunda (servir). Eu preciso me levantar de uma situação que torna “morto” para uma vida cheio de ânimo. Para isso, eu preciso abrir a “casa” de minha vida, deixar a mão de Jesus segurar a minha mão, mão de Jesus que me potencia, mão que me levanta, mão que me cura e liberta, mão que me torna uma mão que ajuda os outros.


No texto do evangelho de hoje o evangelista Lucas revele a identidade de Jesus na boca dos demônios. Jesus é revelado como o Filho de Deus que no entendimento de Lucas significa o Messias de Israel (Lc 4,41). Os homens são incapazes de reconhecer a identidade de Jesus, mas os demônios a captam cuja existência é ameaçada pelo poder messiânico de Jesus. Jesus não deixava os demônios falarem, mas logo os expulsou (Lc 4,41). Nesta marca comum nos antigos exorcismos se descobre que é preciso lutar contra o mal sem deter-se em discutir suas pretensões.


Todos nós sabemos que o mal pode vestir-se de uma aparência boa, enganando os que procuram escutar suas “orações” ou “pedidos”. Jesus não ficou parado nisto. Jesus sabe que tudo que destrói o homem é perverso e Jesus tem o poder para vencê-lo, devolvendo assim a dignidade para as pessoas sofridas.


Outro detalhe que chama bastante nossa atenção é que diante da obra de Jesus surge uma reação bastante egoísta entre as pessoas: querem monopolizar o aspecto mais extenso da atividade de Jesus e utilizá-lo como um simples curandeiro: “As multidões o procuravam e, indo até ele, tentavam impedi-lo de as deixar”. O povo quer reter de Jesus somente a sua força milagrosa. O povo quer se aproveitar de Jesus e de seu poder para i próprio interesse. Mas Jesus foge disso, pois sua missão é fundamentalmente itinerante e Jesus vai ao encontros dos outros sofredores para ajudá-los.


Podemos ter a tentação ou a tendência para este tipo de relacionamento com Jesus no sentido de que nós aceitamos Jesus simplesmente na medida em que ele nos ajuda a resolver nossos problemas para garantir tranqüilidade psicológica ou uma ordem na família, ou uma garantia na vida financeira. Santo Agostinho nos relembra que a razão de nossa existência neste mundo é a vida eterna. Temos que viver e conviver dentro desta dimensão. Conseqüentemente eu sou uma ocasião de salvação para o próximo e o próximo é uma ocasião de salvação para mim. Jesus nos salva na medida em que cada um se torna uma ocasião de salvação para o outro (cf. Mt 25,40.45; veja também Lc 22,31-32). Estando conscientes disso entenderemos que Jesus é muito maior do que um fazedor de milagres. Ele é a nossa Salvação (cf. Jo 6,68-69). Que Jesus Cristo é nosso Salvador é uma das afirmações mais sólidas e repetidas do Novo Testamento. É a primeira noticia do céu à terra através do anjo falando a uns pastores: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador que é o Cristo Senhor” (Lc 2,11). A salvação alcança o que foi criado, pessoas humanas em umas condições concretas. Anunciar a salvação é anunciar a vida em todas as suas dimensões, inclusive em algo tão relativo como a saúde (a palavra “salus” [salvar/salvação] exige previamente uma cura. Para um cego, depois da recuperação de vista, Jesus disse: “Tua fé te salvou” [Mc 10,52]). Cada cristão existe para ajudar, proteger e salvar o outro. Se um cristão é egoísta é porque ele deixa de ser cristão. Se um cristão é desonesto, injusto, incoerente, etc., ele não pode mais ser chamado de cristão, como dizia Santo Agostinho: “O nome de cristão traz em si a conotação de justiça, bondade, integridade, paciência, castidade, prudência, amabilidade, inocência e piedade. Como podes explicar a apropriação de tal nome se tua conduta mostra tão poucas dessas muitas virtudes?” (De vit. christ. 6).


A resposta de Jesus, para a tentação de monopólio, é clara: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado” (Lc 4,43). Sua exigência se traduz em um dom que fica aberto para todos os que O esperam. Certamente o Evangelho é um presente que enriquece a existência, porém um presente que não se pode encerrar e sim um presente que nos abre sem cessar para os outros.


Podemos revisar alguns traços significativos do texto do evangelho lido neste dia. Em primeiro lugar, o texto diz que Jesus foi para casa de Pedro ao sair da sinagoga. Trata-se de um bom programa para qualquer cristão. “Ao sair da sinagoga...”. Ou seja, na nossa linguagem “ao sair de nossa missa ou de nossa oração”, nos espera uma jornada de trabalho, de pregação e evangelização, de serviço curativo para os demais traduzindo nossas orações em ações. É colocar a oração na vida e a vida na oração. Em segundo lugar, Jesus, em meio de uma jornada com um horário intensivo de trabalho e dedicação missionária, encontra momentos para rezar sozinho. Um evangelizador sem oração não poder ser um bom evangelizador. “O ORADOR SE PROCURA A SI. O PREGADOR PROCURA DEUS”, dizia são João Crisóstomo. Em terceiro lugar, Jesus não quer “se instalar” num lugar onde ele é bem acolhido: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado”. É preciso que nós evitemos dois perigos: o ativismo exagerado, descuidando da oração (espiritualidade) e a tentação de ficarmos no ambiente em que somos bem recebidos, descuidando da universalidade de nossa missão. É preciso que olhemos para Cristo para saber o que precisamos fazer: Jesus é evangelizador itinerante, libertador, orante.


Uma das atitudes fundamentais de Jesus, que Lucas nos descreveu no seu evangelho, é a sua grande misericórdia. A misericórdia leva Jesus a ser disponível para os demais. Por causa da misericórdia, para Jesus não há momento determinado para ajudar, para curar e para atender aos que O procuram e necessitam dele. Todo tempo de Jesus é para os necessitados, para os quais ele foi enviado (cf. Lc 4,18-19). E todos encontram nele alívio, consolo e força para continuar a seguir adiante na vida. Servir é amar. E amar é viver para sempre, pois “Deus é amor” (1Jo 4,8.16).


Que “motor” que nos move a trabalharmos como cristãos tanto na Igreja como na sociedade em geral? Como está nossa disponibilidade como cristãos? Existe algum momento dedicado para os outros no nosso dia-a-dia para ajudar, consolar, aconselhar ou simplesmente para escutar o outro?

P. Vitus Gustama,svd

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