terça-feira, 11 de agosto de 2015

Domingo, 16/08/2015
ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA

 

I Leitura: Apocalipse 11,19;12,1.3-6.10


11 19 Abriu-se o templo de Deus no céu e apareceu, no seu templo, a arca do seu testamento. Houve relâmpagos, vozes, trovões, terremotos e forte saraiva.12 1 Apareceu em seguida um grande sinal no céu: uma Mulher revestida do sol, a lua debaixo dos seus pés e na cabeça uma coroa de doze estrelas. 3 Depois apareceu outro sinal no céu: um grande Dragão vermelho, com sete cabeças e dez chifres, e nas cabeças sete coroas. 4 Varria com sua cauda uma terça parte das  estrelas do céu, e as atirou à terra. Esse Dragão deteve-se diante da Mulher que estava para dar à luz, a fim de que, quando ela desse à luz, lhe devorasse o filho. 5 Ela deu à luz um Filho, um menino, aquele que deve reger todas as nações pagãs com cetro de ferro. Mas seu Filho foi arrebatado para junto de Deus e do seu trono. 6 A Mulher fugiu então para o deserto, onde Deus lhe tinha preparado um retiro para aí ser sustentada por mil duzentos e sessenta dias. 10 Eu ouvi no céu uma voz forte que dizia: Agora chegou a salvação, o poder e a realeza de nosso Deus, assim como a autoridade de seu Cristo, porque foi precipitado o acusador de nossos irmãos, que os acusava, dia e noite, diante do nosso Deus.


II Leitura: 1Coríntios 15,20-27


Irmãos, 15 20 Cristo ressuscitou dentre os mortos, como primícias dos que morreram! 21 Com efeito, se por um homem veio a morte, por um homem vem a ressurreição dos mortos. 22 Assim como em Adão todos morrem, assim em Cristo todos reviverão. 23 Cada qual, porém, em sua ordem: como primícias, Cristo; em seguida, os que forem de Cristo, na ocasião de sua vinda. 24 Depois, virá o fim, quando entregar o Reino a Deus, ao Pai, depois de haver destruído todo principado, toda potestade e toda dominação. 25 Porque é necessário que ele reine, até que ponha todos os inimigos debaixo de seus pés. 26 O último inimigo a derrotar será a morte, porque Deus sujeitou tudo debaixo dos seus pés. 27 Mas, quando ele disser que tudo lhe está sujeito, claro é que se excetua aquele que lhe sujeitou todas as coisas.


Evangelho: Lc 1,39-56


39 Naqueles dias, Maria se levantou e foi às pressas às montanhas, a uma cidade de Judá.  40 Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel. 41 Ora, apenas Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança estremeceu no seu seio; e Isabel ficou cheia do Espírito Santo. 42 E exclamou em alta voz: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre. 43 Donde me vem esta honra de vir a mim a mãe de meu Senhor? 44 Pois assim que a voz de tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança estremeceu de alegria no meu seio. 45 Bem-aventurada és tu que creste, pois se hão de cumprir as coisas que da parte do Senhor te foram ditas!” 46 E Maria disse: “Minha alma glorifica ao Senhor, 47 meu espírito exulta de alegria em Deus, meu Salvador, 48 porque olhou para sua pobre serva. Por isto, desde agora, me proclamarão bem-aventurada todas as gerações, 49 porque realizou em mim maravilhas aquele que é poderoso e cujo nome é Santo. 50 Sua misericórdia se estende, de geração em geração, sobre os que o temem. 51 Manifestou o poder do seu braço: desconcertou os corações dos soberbos. 52 Derrubou do trono os poderosos e exaltou os humildes. 53 Saciou de bens os indigentes e despediu de mãos vazias os ricos. 54 Acolheu a Israel, seu servo, lembrado da sua misericórdia, 55 conforme prometera a nossos pais, em favor de Abraão e sua posteridade, para sempre. 56 Maria ficou com Isabel cerca de três meses. Depois voltou para casa”.
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I.          Sobre O Culto A Maria


O culto é um ato de honra, reverência, estimação e louvor que se presta a uma pessoa ou à divindade. Literalmente a palavra “culto” vem do latim “colere” que significa encontro com o divino, geralmente no quadro de determinadas formas. É evidentemente vasto o significado da palavra “encontro”. Conforme o conteúdo do encontro mudam também as suas formas, variados são os lugares, os tempos, as intenções, os efeitos, os executores, o círculo dos participantes e a intensidade da participação. Temos o culto cívico, patriótico, religioso etc..
 

Em sentido estrito, o culto é só a Deus que se presta pela sua excelência infinita; podemos, no entanto, prestá-lo, indiretamente aos santos pela estreita união que têm com Deus. Por isso, o culto pode ser de latria (adoração) que se presta unicamente a Deus em reconhecimento da sua excelência e do seu domínio supremo sobre todo o universo. Pode ser o de dulia (veneração) que se tributa aos santos em reconhecimento da sua vida de entrega e união a Deus. Dulia é consequência do dogma da comunhão dos santos como professamos no Credo: “Creio...na comunhão dos santos...”. Os santos são reflexos de Deus. Podemos aprender deles como chegar à comunhão com Deus, quais são exemplos que podemos seguir e assim por diante.


Pode ser o culto de hiperdulia (veneração especial) que se presta a Maria Santíssima, reconhecendo a sua dignidade de Mãe de Deus (declaração do Concílio de Éfeso em 431; cf. LG no.53 do Concílio Vaticano II). Mas por ser criatura, não se pode prestar-lhe o culto de adoração (cf. LG no.62). Só assim, evita-se o perigo da “mariolatria” e os excessos na devoção mariana. Por “mariolatria” entendemos exatamente o atribuir em surdina à Virgem Maria o culto devido a Cristo. Se Maria não permanecer o ostensório, onde tudo brilha para o Cristo, estaremos depreciando a verdadeira glória de Maria. A glória de Maria reside no insondável mistério de sua concepção corporal e espiritual de Cristo, na aspiração de todo o seu ser pelo único mediador, Cristo Jesus, fruto da benevolência de Deus.  Cristo é que faz compreender Maria e não Maria que nos faz compreender Cristo. Maria não é um elo que une o homem a Deus, mas o seio que gera todos os irmãos de Cristo. O encontro com Cristo faz-se nela. Toda a vida mariana é essencialmente cristocêntrica. Mas por ser a mais excelsa de todas as criaturas, acima de todos os anjos e santos, presta-lhe culto de especial veneração. Na santa Igreja ela ocupa o lugar mais alto depois de Cristo e o mais perto de nós (LG no.54). Ao sabermos disso, a devoção mariana em nada afasta  de Cristo. Nem substitui nossa obrigação diante dele. A veneração de Maria no culto litúrgico não é acréscimo e excrescência, nem tampouco implica diminuição do culto a Cristo, porque a graça do Filho resplandece em sua Mãe mais que em qualquer outro membro do corpo do Senhor.  Maria foi a primeira discípula do Senhor por causa de seu fiat, seu faça-se (cf. Lc 1,38).   


Devemos estar conscientes de que a devoção mariana é um verdadeiro culto. Situa-se num plano mais elevado em razão do excepcional lugar de Maria na ordem da graça e da vida cristã. Por isso, temos dogmas marianos, mas não temos dogmas de tal ou qual santo. Isso dá ao culto mariano uma amplidão que outras devoções não têm, nem mesmo o culto aos santos em geral. Se nossas orações sobem ao Pai pelo Filho na medida em que elas são objetivamente no Fiat de Maria, elas ganharão em intensidade e eficácia se as engajamos pessoalmente na oração todo-poderosa de Maria.


II.            Sobre a Assunção de Maria

          
A proclamação do dogma da Assunção de Maria à glória dos céus, em alma e corpo, pertence ao século XX: foi declarado solenemente por Pio XII em 01 de Novembro de 1950 na bula Munificentissimus Deus. No entanto, a liturgia da Igreja universal, tanto no Oriente quanto no Ocidente, celebrou por muitos séculos esta convicção de fé.  No século V celebrava-se em Jerusalém no dia 15 de agosto uma festa importante que tinha por objeto a excelência da pessoa da Mãe de Deus, eleita por supremo conselho para desempenhar uma missão muito especial na história da salvação. Entre o V e VI século, a narração apócrifa sobre o Trânsito de Maria da vida terrena à glória eterna alcançou uma difusão extraordinária: a consequência foi o desejo natural dos peregrinos que ocorriam a Jerusalém de honrar o túmulo da Virgem. Durante o século VII, com o nome de Assunção foi acolhida na Igreja de Roma, juntamente com as festa da Apresentação, Anunciação e Natividade, para as quais o Papa Sérgio I(+ 701), instituiu uma procissão preparatória para a missa, celebrada na Santa Maria Maior. No fim do século VII encontra-se  uma antiga oração romana composta para a procissão que introduz a celebração mariana do dia 15 de agosto: “Venerável é para nós, Senhor, a festa deste dia em que a Santa Mãe de Deus sofreu a morte terrena, mas não permaneceu nas amarras da morte, ela que, do próprio ser, gerou, encarnado, o teu Filho, Senhor nosso” (Sacramentário Gregoriano Adrineu, no.661)
 

A bula da definição dogmática não fala de argumentos bíblicos, pois a Escritura não afirma a Assunção de Maria. Discute-se se Maria morreu ou não. Por isso, o texto dogmático, cautelosamente, diz “terminado o curso de sua vida terrestre”. Nós, por isso, afirmamos que Maria morreu, pois só assim se pode falar, verdadeiramente, da ressurreição, porque somente um morto pode ressuscitar. Maria morreu pelo fato natural da morte que pertence à estrutura da vida humana, independentemente do pecado. Na história, a vida tem seu início e tem também seu fim para todos. Maria, livre e isenta de todo o pecado, pôde integrar a morte como pertencente à vida criada por Deus. A morte não é vista como fatalidade e perda da vida, mas como chance e passagem para uma vida mais plena em Deus. A morte é, para quem vive de acordo com a vontade de Deus que se resume na vivência do amor fraterno, apenas um instrumento que o leva para a comunhão plena e eterna com Deus.


Além disso, Maria participa na  economia da redenção pelo fato de ser a Mãe do Senhor (Lc 1,43). Ela se associou totalmente ao destino de seu Filho. A redenção implica sempre a colaboração de quem a recebe. Maria colaborou admiravelmente na própria salvação. Já por este título ela é o modelo original de quantos recebem a salvação, o modelo de todos os redimidos. Como tal, ela já tem um significado universal de salvação. É o protótipo da vida redimida, a plena e perfeita realização, a imagem ideal de toda a vida cristã. Por sua vida e morte Jesus nos libertou. Por sua vida e morte Maria participou desta obra messiânica e universal. A co-redenção significa a associação de Maria tanto à cruz de Jesus como à sua ressurreição e exaltação gloriosa ou ascensão. Esta razão teológica tem o seu fundamento no triunfo de Cristo sobre a morte, de que faz participantes todos os cristãos por meio da fé, do batismo e da vivência dos ensinamentos de Cristo.


Maria foi assunta ao céu em corpo e alma. Aqui não se trata de dogmatizar um esquema antropológico (corpo e alma). Utiliza-se esta expressão, compreensível à cultura ocidental, para enfatizar o caráter totalizante e completo da glorificação de Maria. Maria vê-se envolvida na absoluta realização.  “Assunta ao céu”, ela se nos apresenta como as primícias da redenção, tendo já consumado em si o que ainda se realizará em nós e na Igreja. O corpo de Maria, enquanto ela perambulava por este mundo, foi somente veículo de graça, de amor, de compreensão e de bondade. Não foi instrumento de pecado, da vontade de autoafirmação humana e de desunião com os irmãos.  O corpo é forte e frágil, cheio de vida e contaminado pela doença e morte. Por isso, é exaltado por uns até a idolatria e odiado por outros até a trituração. Maria vive e goza, no corpo e na alma, quer dizer na totalidade de sua existência, desta inefável realização humana e divina. Na vida de Maria não há espaço para o pecado, pois ela está “cheia de graça” de Deus (cf. Lc 1,28).


Para Maria a assunção significa o definitivo encontro com seu Filho que a precedeu para a glória. Mãe e Filho vivem um amor e uma união inimaginável e inseparável. A vontade de Deus vivida no cotidiano une os dois no mesmo caminho de Deus. Maria agora vive, em corpo e alma, aquilo que nós também iremos viver quando atingirmos o céu. Enquanto peregrinamos, Maria atua como imagem que recorda e concretiza o nosso futuro. Em cada um que morre no Senhor se realiza aquilo que ocorreu com Maria: a ressurreição e a elevação ao céu. Andando por entre as tribulações do tempo presente, erguemos os olhos ao e rezamos: Salve Maria, vida, doçura e esperança, salve! Rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte. Doce mãe da esperança, em quem apareceu o futuro do mundo e nos foi antecipada e prometida a glória do tempo futuro, ajuda-nos a ser peregrinos na esperança a caminho da unidade futura do Reino, sem pararmos diante das resistências e das canseiras, antes nos empenhando, com fidelidade e paixão, em levar no presente os homens ao futuro da promessa de Deus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores, agora e na hora de nossa morte. Amém!
 

III.        Algumas Mensagens Da Leitura Do Evangelho Desta Festa


1. A fé que desperta


As palavras de saudação e agradecimento dirigidas por Isabel a Maria despertaram nela uma maravilhosa profissão de fé. Coisa semelhante acontece com cada um de nós. Lemos ou escutamos a Palavra de Deus ou lemos um bom livro espiritualmente. E quantas vezes tudo isso nos toca o coração e faz brotar dos lábios uma oração de louvor. Maria reconhece que o amor misericordioso do Senhor a tocou; e tocando-a, tocou a humanidade inteira. Por isso é que Isabel a proclama “bem-aventurada”. Por Maria e nela, todos os homens reconhecem o amor infinito e misterioso de Deus(Jo 3,16). Todos nós temos necessidade de que um outro nos revele a nós mesmos. É grande graça na vida de uma pessoa encontrar um mestre de espírito que lhe indique o seu nome, a sua vocação, a sua missão.


2.Viver a partilha


Na anunciação Maria tornou-se a primeira discípula, entre os primeiros cristãos, ouvindo a Palavra de Deus e aceitando-a . Na Visitação, ela se apressa em partilhar esta palavra do evangelho com os outros e, no Magnificat, temos sua interpretação dessa palavra que se assemelha à interpretação que seu Filho tinha dado em seu ministério. A primeira discípula cristã exemplifica a tarefa essencial de um discípulo. Depois de ouvir a Palavra de Deus e aceitá-la, devemos reparti-la com os outros, não simplesmente repetindo-a, mas interpretando-a, de modo que todos possam vê-la como uma Boa Nova.


3. Ser santo


Neste Magnificat Deus é proclamado como “Santo”. Santo significa aquele que está para além de tudo quanto pudermos pensar e imaginar; é totalmente outro que habita numa luz inacessível(v.49). Mas não vive numa soberana distância dos gritos dolorosos de seus filhos, pois este Deus santo é também misericordioso. Possui um coração sensível aos míseros (miseri-cor-dioso) e protesta contra a injustiça e a exploração e opressão. O texto chama-nos a atenção que os orgulhosos, os detentores do poder e os ricos fechados para si não possuem a última palavra como sempre pretendem, pois cada um tem que prestar contas diante de Deus. Escapa da justiça humana, sobra a justiça divina. Aí é que ninguém escapa.  Pela sua fé no poder ilimitado de Deus (v.37), Maria reconhece que a situação provocada pela prepotência, opressão e exploração não é desejada por Deus e, por isso, espera que não seja definitiva. Esta intervenção de Deus é vista como um ato de fidelidade para com o povo da aliança.


O Deus a quem o Magnificat proclama está orientado para os homens, em especial para os fracos, os pobres, os infelizes, os desgraçados, os oprimidos; privilegia o humilde, o humilhado, aqueles aos quais não se concede o direito à existência. Quem reconhece a Deus como seu Senhor, deve estimar todo homem como irmão.


Como Maria, estamos convencidos de que tudo é possível para quem crê (Lc 1,37;Mc 9,23) quando se trata de arrancar a raiz do sofrimento?


4. Sobre o encontro de duas mulheres abençoadas por Deus


Duas mulheres abençoadas por Deus, unidas por laços familiares se encontram na marca divisória dos dois Testamentos. O plano divino de salvação uniu seus destinos e o de seus respectivos filhos. Isabel simboliza o povo do Antigo Testamento, onde outras mulheres também sem esperança de sucessão/geração conseguiram como ela uma maternidade impossível, como puro dom de Deus. E o filho de Isabel será Precursor do Messias e o maior dos profetas.


Maria, ao contrário, abre o Novo Testamento e representa não só o Povo da Nova Aliança, mas toda a humanidade redimida. Ao aceitar o seu “faça-se/Fiat” a mensagem do Senhor, Maria se converteu na Mãe de Jesus, Nosso Senhor(LG 56). Por esta fé Maria é a primeira crente e discípula de Cristo, a primeira cristã da Igreja (Marialis Cultus de Paulo VI, nn.35-36). Jesus vai declarar mais tarde a bem-aventurança da fé, relativizando até certo ponto os vínculos de sangue com Maria, Sua Mãe, ao dizer: ”Felizes os que escutam a Palavra de Deus e a põe em prática”(Lc 11,28),porque esses são meu irmão e minha irmã e minha mãe”(Mc 3,35). Maria é feliz porque acreditou e cumpriu a Palavra e a vontade de Deus que aceita sem reservas com um sim incondicional. Nossa Igreja, por isso, reverencia a Mãe de Jesus como modelo de fé e de fidelidade a Deus.


A saudação de Maria dirigida para Isabel causa a alegria cuja característica é messiânica: os saltos de alegria de João no seio de sua mãe (vv.41.44); a irrupção do Espírito sobre Isabel(v.41b); a bênção messiânica de Isabel sobre Maria (v.42); a proclamação de Maria como “mãe do Senhor”(v.43); e a proclamação de que Maria é “bem-aventurada” por causa de sua fé(v.45). Todas estas reações são de caráter messiânico. O termo usado para expressar o júbilo de João pela irrupção dos tempos messiânicos é agallíasis, que é mais forte do que o termo normalmente usado para expressar a “alegria”(khará, usado 140 vezes em todo o NT). Agallíasis significa uma alegria causada pela vinda da salvação escatológica, alegria que é experimentada diante de Deus manifestada externamente.


Se acreditarmos que Jesus está dentro de nós, nos comportaremos como Maria: seremos portadores de alegria no Senhor para os outros. O nosso encontro com os outros fará brotar neles a alegria pela presença do Messias, a docilidade ao Espírito, o louvor a Deus.


Jesus declara feliz quem escuta e coloca em prática a palavra de Deus. Até neste ponto, será que somos felizes?


5.Sobre o Canto de Maria ou Magnificat.


Logo depois de receber do Anjo o anúncio da missão mais decisiva que se poderia imaginar, Maria sai apressada para servir Isabel. Ela não se julgou importante demais, não ficou deslumbrada com o papel que lhe fora dado. Ela foi ao encontro de alguém que precisava dela, foi partilhar trabalho e alegria com a prima que se via necessitada de ajuda. E mais tarde Jesus vai dizer que veio para servir. Antes mesmo de Jesus nascer, Maria já se comportava como discípula.


E no Magnificat Maria anuncia que os poderosos serão derrubados de seu tronos. Não se trata de punição nem vingança, pois o Deus de Jesus não é vingativo. Descer do trono é condição de salvação. É preciso descer do trono para aprender a ser irmão, a ser solidário, a servir, a criar relações horizontais. É preciso despojar-se de autossuficiência e reconhecer-se necessitado de salvação.


Estamos acostumados a reverenciar o poder, de várias maneiras. É só alguém “subir na vida” que logo começa a receber um tratamento mais respeitoso. É como se o posto que cada um ocupa mudasse a qualidade humana das pessoas. Não será por isso que alguns são chamados de “excelência” mesmo quando não têm atitudes tão excelentes assim para com os outros? Por esses e outros motivos o poder fascina e muita gente vive correndo atrás dele.


O peso do prestígio do poder invade até o campo religioso. Usamos para Deus frequentemente as mesmas imagens com que idealizamos o poder humano: Deus sentado no trono, Maria com coroa de rainha. Aliás, a Bíblia também faz isso, refletindo a cultura da época. O problema não está exatamente aí. O perigo está no jeito de utilizar essas imagens. Com essa noção de poder é possível até tentar dominar os outros, autoritariamente, em vez de dialogar e servir. Deus vê essa questão de outro jeito que nem sempre nós estamos preparados para entender.


Os “poderosos” não são os outros. Cada um de nós pode fabricar seus próprios “tronos” e olhar o próximo de cima, de forma opressora, indiferente ou superior.
 

Se somos realmente Igreja servidora, como Jesus sempre quis, temos que “descer” de muitos “tronos” que criamos e tratar o irmão, qualquer irmão, como um igual, digno de respeito e precioso como filho de Deus.


Maria também proclama que Deus está bem atento e quer saciar os famintos: “Encheu de bens os famintos, e despediu os ricos de mãos vazias”. “De mãos vazias” porque começam a aprender a compartilhar. Repartir significa prolongar a generosidade de Deus criador. Quando se libera do egoísmo humano, sobra para cobrir a necessidade de todos. Ninguém é pobre quando sabe amar. Quando não for capaz de amar, embora uma pessoa seja rica, na verdade ela é muito pobre.


Temos famintos de todo tipo: gente com fome de pão, de saúde, de respeito, de afeto, de cidadania, de perdão e d Deus. Jesus e Maria nos chamam a ser Igreja que vai ao encontro de todas as fomes e carências humanas, sendo sinal da presença desse Deus que Maria anunciou em seu canto, Magnificat. O Deus a quem o Magnificat proclama está orientado para os homens, em especial para os fracos, os pobres, os infelizes, os desgraçados, os oprimidos; privilegia o humilde, o humilhado, aqueles aos quais não se concede o direito à existência. Quem reconhece a Deus como seu Senhor, deve estimar todo homem como irmão.


No Magnificat, Maria é a porta voz da expectativa dos pobres, figura da primeira discípula cristã, cumprimento e superação do Israel da esperança. Ela é o sinal da esperança. O Magnificat é um resumo de todas as esperanças de Israel.


Cada vez que cantamos o Magnificat, somos convidados a acolher Jesus e a salvação e a misericórdia que ele nos traz como o acolheu Maria. O projeto da misericórdia de Deus só pode ser realizado na história através de homens e mulheres que buscam a Deus, esperam em Deus, se abrem a Deus e acolhem o amor de Deus, o amor que leva a prática da justiça e da misericórdia.


Temos certeza de que há ainda muitas mensagens deste texto que cada um pode descobrir. Vamos terminar esta reflexão com um texto bem conhecido de S. Grignion de Monfort com o intuito de nos ajudar a nos mergulhar no mistério de Maria e de Deus:


“Nunca podeis pensar em Maria, sem que ela, em nossa vez, pense em Deus. Nunca podeis louvar e honrar Maria, sem que ela louve e honre conosco a Deus. Em Maria tudo está relacionado com Deus; ela é a orientação personificada para Deus, o eco de Deus que não sabe dizer, nem repetir senão o Santo Nome de Deus. Se dizemos “Maria”, ela diz “Deus”. Santa Isabel louvou Maria, chamou-lhe Bem-aventurada, porque acreditou Maria, eco fiel de Deus; entoou o hino “A minha alma glorifica o Senhor”. O que ela fez nesta ocasião, fá-lo todos os dias. Quando a louvamos, a amamos, a honramos ou nos damos a ela, é Deus que é louvado, amado, honrado, e é a Deus que nos damos por Maria e em Maria”.        
    

Que Maria, Doce Mãe da esperança nos ajuda a ser peregrinos na esperança sem pararmos diante das resistências e das canseiras a caminho da comunhão plena com o nosso Criador, o Deus Conosco.

 
P. Vitus Gustama,svd

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