Domingo, 01/11/2015
TODOS OS SANTOS
SOLENIDADE
Evangelho: Mt 5,1-12
Naquele tempo, 1 vendo Jesus as multidões,
subiu ao monte e sentou-se. Os discípulos aproximaram-se, 2 e Jesus começou a
ensiná-los:
3
“Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus.
4 Bem-aventurados os aflitos, porque serão
consolados.
5 Bem-aventurados os mansos, porque possuirão
a terra.
6 Bem-aventurados os que têm fome e sede de
justiça, porque serão saciados.
7 Bem-aventurados os misericordiosos, porque
alcançarão misericórdia.
8 Bem-aventurados os puros de coração, porque
verão a Deus.
9 Bem-aventurados os que promovem a paz,
porque serão chamados filhos de Deus.
10 Bem-aventurados os que são perseguidos por
causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus!
11 Bem-aventurados sois vós, quando vos
injuriarem e perseguirem, e, mentindo, disserem todo tipo de mal contra vós,
por causa de mim.
12 Alegrai-vos e exultai, porque será grande
a vossa recompensa nos céus”.
________________
Neste dia celebramos a festa de todos os
santos. O culto aos santos é a conseqüência de nosso Credo, conhecido como
Símbolo Apostólico, onde professamos: “Creio... na comunhão dos santos...”.
Esta pequena frase nos indica e afirma que a nossa relação com os santos é
contínua porque acreditamos na não–interrupção da comunhão eclesiástica pela
morte e ao mesmo tempo acreditamos no fortalecimento da mútua comunicação dos
bens espirituais (LG no 49; compare com Rm 8,38-39). A Igreja dos peregrinos
(todos nós mortais na história) sempre teve e continua tendo perfeito
conhecimento dessa comunhão reinante em todo Corpo Místico de Jesus Cristo que
é a Igreja (LG 50). A Igreja venera os santos como exemplos, pois eles são
reflexos da santidade de Deus. Eles contemplam tanto o Deus santo a ponto de
transformá-los em verdadeiros reflexos do Deus santo. Os santos nos ensinam a
trilharmos o caminho da santidade que termina na comunhão com Deus. O Culto aos
santos une-nos a Igreja celestial, pois acreditamos na vida sem fim, na vida
eterna.
Os santos no Céu não se tornam uns egoístas
que gozam a merecida felicidade. Como irmãos que nos precederam, eles ainda se
lembram de nós, seus irmãos, como Cristo sempre se lembra de nós. Os santos no
Céu e os cristãos na terra são uma família única. Assim como uma família, um
irmão ajuda o outro irmão. Por isso é que pedimos a ajuda dos santos. Se
acreditamos na vida sem fim, então não há separação entre nós e os santos. Como
irmãos nossos que nos precederam para a eternidade, sem dúvida nenhuma, eles
continuam nos ajudando como eles nos ajudavam quando estavam conosco neste
mundo.
Entendemos aqui por “santos” todos os que já
estão no céu e vêem o próprio Deus face a face porque viveram a vida de acordo
com os ensinamentos de Cristo que se resumem no amor a Deus e ao próximo. São
aqueles que estão na paz e na felicidade suprema (GS 93); aqueles que estão na
comunhão perpétua da incorruptível vida divina (GS 18). Esta vida perfeita
chama-se “o Céu”. O Céu é, certamente, o fim último e a realização das
aspirações mais profundas do homem, o estado supremo e definitivo de
felicidade. O céu é o estado em que todos alcançam a maturidade no amor, pois
“Deus é amor” (1Jo 4,8.16). O Céu é o desejo de todos nós que estamos peregrinando
ainda nesta terra. Participar da vida divina, a vida em sua plenitude, a vida
cheia de amor é o que queremos todos os dias, tanto para nós e nossos
familiares como para aqueles que nos precederam. Sobre o Céu, conforme as
palavras de São Paulo, citando Is 64,4, podemos dizer de outra maneira: “O
que os olhos não viram, os ouvidos não ouviram, e o coração do homem não
percebeu, isso Deus preparou para aqueles que O amam” (1Cor 2,9). O céu é
onde os cristãos e as pessoas de boa vontade se encontram com Cristo (cf. Jo
14,3; Mt 25,31-45). O céu é para as pessoas que vivem as atitudes básicas
assinaladas pelas bem-aventuranças (cf. Mt 5,1-12). A única coisa que interessa
a Deus é o nosso bem e o bem que praticamos em favos de nossos irmãos.
Como filhos de Deus, também estamos
conscientes de que Deus é o Único Santo e fonte de toda santidade. Por isso,
conseqüentemente, Ele é o Único que faz santos os participantes em sua vida por
fruírem de sua santidade, por cumprirem seus desígnios, por entrarem na esfera
vital de seu reinado, por viverem os ensinamentos de Jesus Cristo na vida
diária. A santidade é uma forma normal de viver conforme os ensinamentos de
Cristo. Quando o homem já participa em plenitude da vida de Deus no Reino dos céus,
então é santo por sua comunhão de vida com Deus, o Único Santo (cf. 1Jo 3,2).
Sabemos também que somente Deus pode receber
o verdadeiro culto de adoração. Dá-se,
porém, o culto de veneração aos servidores de Deus que já estão unidos a Ele plenamente
na glória e pela comunhão que mantém conosco, nos atraem para Deus e nos ajudam
a percorrermos o caminho que trilharam e que nos conduzem à meta na qual nos
precederam. Eles são prova evidente do amor de Deus e neles Deus nos fala. Eles
são reflexos da santidade de Deus. Quando veneramos os santos é porque
descobrimos neles mais vivamente a presença e o rosto de Deus; neles se
manifesta a imagem de Deus, o Único Santo.
Por isso, o culto aos santos não rebaixa nem
diminui a adoração a Deus, pelo contrário, enriquece-a intensamente porque nos
aproxima mais da única santidade de Deus que devemos imitar pessoalmente como o
fizeram homens como nós enquanto percorriam o mesmo caminho que estamos
percorrendo.
Do ponto de vista cristológico nós sabemos
também que Cristo é o Santo de Deus (Mc 1,24). Ele é a imagem do Deus invisível
(Cl 1,15). A santidade do homem consiste em sua perfeita união com Jesus (LG
50). A santidade cristã é uma forma normal de viver segundo os ensinamentos de
Cristo. Os santos são santos porque imitaram e viveram os ensinamentos de
Jesus, Senhor de todos os santos. Eles produziram em si mesmos, de forma
significativa, o mistério pascal de Jesus. Eles contemplam Cristo profundamente
e por isso, se tornam reflexos de Cristo para os outros. Por isso, a união com
os santos e seu culto unem-nos a Jesus, de quem dimana toda a graça
santificadora; eles são seus amigos e co-herdeiros. Enfatiza-se muito, por
isso, esse valor cristológico do culto aos santos na celebração eucarística.
É evidente que os santos, cuja festa
celebramos neste dia, não são somente aqueles que estão na lista oficial da
Igreja. O livro de Apocalipse (Ap 7,2-14) fala de um desfile de 144 mil servos
de Deus no céu. 144 é um número simbólico (12 x 12) significa a unidade e
totalidade do povo eleito. Entende-se, por isso, uma grande multidão de pessoas
de todos os povos e religiões, culturas, de antes e depois de Cristo. Por isso,
nunca podemos esquecer que há exemplos de santidade e heroísmo cristão em
outras Igrejas, religiões, povos e culturas. Reconhecer essa presença é uma
ajuda para superar os nossos seculares preconceitos e para acolher com alegria
esses parceiros na construção do Reino de Deus ou do mundo mais fraterno.
Quando nós veneramos os santos, portanto, não
somos idólatras. Se nós admirarmos e louvarmos um quadro de valor, por acaso o
pintor deste quadro se sentirá ofendido? Ao contrário, ele não ficará feliz? Os
santos são as obras artísticas de Deus, Aquele que esculpiu e pintou o seu
semblante na alma deles. Se admirarmos ou louvarmos os filhos, por acaso o pai
se ofenderá? O pai não ficará feliz pela admiração dada aos seus filhos por
outras pessoas? Os santos são os filhos prediletos do Senhor, aqueles que mais
se lhe assemelham.
Mas devemos reconhecer que há pessoas que
amam o santo ou a santa, mas não a sua santidade. São muitos cristãos que
recorrem aos santos somente para os interesses materiais ou só para alcançar
determinada graça e não para pedir a graça de seguir o exemplo desses santos
que viveram até o fim os ensinamentos de Jesus Cristo. Não podemos abusar dos
santos só para atender nossos desejos materiais, esquecendo-nos de que
precisamos seguir seus exemplos de santidade.
Devemos saber que não há devoção mais eficaz do que a imitação das
virtudes dos santos. Para que, seguindo o exemplo dos santos que viveram
segundo os ensinamentos de Cristo durante sua vida terrena, possamos também
alcançar a santidade para a qual todos nós somos chamados.
A vocação à santidade é universal. Todos são
chamados à santidade, segundo diz S. Paulo: “Pois esta é a vontade de Deus,
a vossa santificação” (cf. 1Ts 4,3;Ef 1,4). E o fundamento de nossa
santidade ou da nossa perfeição é Jesus Cristo, cumpridor fiel da vontade de
Deus. Como dizia Santa Teresa do Menino Jesus: “...Quem aspira à santidade deve fugir à tentação de querer
santificar-se ao seu modo, conforme a própria vontade, seu ponto de vista, seus
planos humanos, mas entregar-se inteiramente à vontade de Deus. Deus traça o
caminho e o homem deve segui-lo” (Fd.5-10). E na mesma perspectiva São João
da Cruz ensinou: “A santidade, ou seja,
a união autêntica com Deus consiste na total transformação de nossa vontade na
vontade de Deus, de tal modo que, em nós, nada contrarie a vontade do
Altíssimo, mas nossos atos dependem totalmente do beneplácito divino”
(Subida I-II,2).
Portanto, o culto verdadeiro de veneração que
prestamos aos santos não deve terminar neles. Ao contrário, deve acabar em
Cristo como fonte da missão, grandeza, dignidade e privilégios destes santos.
Os santos nos ajudam a termos fé firme em Jesus Cristo, mesmo que nos
encontremos numa situação sufocante.
Os santos são um grande exemplo de santidade
e de cumprimento da vontade de Deus para nós. Não pensemos que não podemos
resistir às tentações. Também os santos tiveram carne e sangue como nós;
experimentaram as tentações como as nossas tentações, contudo eles venceram.
Basta ler a história da vida dos santos, como Santo Agostinho, São Francisco de
Assis, São João da Cruz, Santa Teresa de Ávila e muitos outros santos,
saberemos as lutas sem tréguas deles contra as paixões desordenadas, contra as
tentações e outros problemas, no entanto venceram. Apesar de tantas dificuldades,
os santos viveram os ensinamentos de Cristo até o fim de sua vida. Se eles
venceram, será que nós não podemos vencer também?
Ser santo é viver com a pureza de coração sem
segundas intenções, oferecendo sinceridade e confiança. Ser santo é ter
confiança, esperança, alegria, porque Jesus está conosco. Ser santo é
solidarizar-se com aqueles que sofrem para aliviar sua dor. Santo na
perspectiva de Jesus é quem decide construir um mundo novo onde os homens se
amam, se querem e se ajudam, onde não se recusam uns aos outros por sua cor,
dinheiro, poder e assim por diante. Por isso, a santidade não é um modo
excepcional de viver e sim a forma normal de ser cristãos.
Por esta razão, a festa de Todos os Santos
deve ser para nós a ocasião para perceber melhor a natureza profunda da
santidade que recebemos no Batismo e que devemos fazer frutificar ao longo de
nossa vida para que um dia possamos, pela misericórdia de Deus, estar na
comunhão dos santos eternamente.
Alcançar a santidade é descobrir o espírito
da bem-aventurança e da paz que deve animar toda a existência. É buscar o bom
sempre o bom, o certo, o justo, o verdadeiro, o honesto. É defender a bênção no
meio das maldições. A santidade é a totalidade do espírito das bem-aventuranças
que se lêem no evangelho deste dia. A totalidade é pobreza do espírito para que
a graça de Deus possa ocupar o coração. A totalidade é mansidão, justiça,
pureza, paz e misericórdia. É abertura e doação que tem como símbolo a
confiança de uma criança.
Santidade é plural no sentido de que cada um
deve seguir a Cristo a partir de sua própria circunstância e dos talentos, a
partir de sua nação e língua, nos dias felizes e quando a tribulação arranca
lágrimas do coração, no silêncio de um convento ou na vertigem da cidade. “Esta
é a vontade de Deus: a vossa santificação” (1Ts 4,3a).
Portanto, os santos são os heróis de cada dia. Heróis
da fé e de amor. Com efeito, a santidade cristã não é uma perfeição levantada
sobre virtudes abstratas. O santo é a reprodução de Cristo. E todos nós somos
chamados a ser assim.
Pedimos a ajuda dos santos que viveram os
ensinamentos de Cristo até o fim, para que possamos também viver segundo os
ensinamentos de Cristo até o fim de nossa vida terrestre para que um dia, pela
misericórdia de Deus, mereçamos ser chamados de santos para estar na comunhão
de todos os santos de Deus.
P. Vitus Gustama,svd
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