sábado, 18 de janeiro de 2020

Domingo,26/01/2020
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JESUS CHAMA A TODOS À SALVAÇÃO E ENVIADOS PARA SALVAR OS OUTROS
III DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO “A”


Primeira Leitura: Is 8,23b-9,3
8,23b No tempo passado o Senhor humilhou a terra de Zabulon e a terra de Neftali; mas recentemente cobriu de glória o caminho do mar, do além-Jordão e da Galileia das nações. 9,1 O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam nas sombras da morte, uma luz resplandeceu. 2 Fizeste crescer a alegria, e aumentaste a felicidade; todos se regozijam em tua presença como alegres ceifeiros na colheita, ou como exaltados guerreiros ao dividirem os despojos. 3 Pois o jugo que oprimia o povo, — a carga sobre os ombros, o orgulho dos fiscais — tu os abateste como na jornada de Madiã.


Segunda Leitura: 1Cor 1,10-13.17
10 Irmãos, eu vos exorto, pelo nome do Senhor nosso, Jesus Cristo, a que sejais todos concordes uns com os outros e não admitais divisões entre vós. Pelo contrário, sede bem unidos e concordes no pensar e no falar. 11 Com efeito, pessoas da família de Cloé informaram-me a vosso respeito, meus irmãos, que está havendo contendas entre vós. 12 Digo isso, porque cada um de vós afirma: “Eu sou de Paulo”; ou: “Eu sou de Apolo”; ou: “Eu sou de Cefas”; ou: “Eu sou de Cristo!” 13 Será que Cristo está dividido? Acaso Paulo é que foi crucificado por amor de vós? Ou é no nome de Paulo que fostes batizados? 17 De fato, Cristo não me enviou para batizar, mas para pregar a boa nova da salvação, sem me valer dos recursos da oratória, para não privar a cruz de Cristo da sua força própria.


Evangelho: Mt 4,12-23
12 Ao saber que João tinha sido preso, Jesus voltou para a Galileia. 13 Deixou Nazaré e foi morar em Cafarnaum, que fica às margens do mar da Galileia, 14 no território de Zabulon e Neftali, para se cumprir o que foi dito pelo profeta Isaías: 15 ”Terra de Zabulon, terra de Neftali, caminho do mar, região do outro lado do rio Jordão, Galileia dos pagãos! 16 O povo que vivia nas trevas viu uma grande luz, e para os que viviam na região escura da morte brilhou uma luz”. 17 Daí em diante Jesus começou a pregar dizendo: “Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo”. 18 Quando Jesus andava à beira do mar da Galileia, viu dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e seu irmão André. Estavam lançando a rede ao mar, pois eram pescadores. 19 Jesus disse a eles: “Segui-me, e eu farei de vós pescadores de homens”. 20 Eles imediatamente deixaram as redes e o seguiram. 21 Caminhando um pouco mais, Jesus viu outros dois irmãos: Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João. Estavam na barca com seu pai Zebedeu consertando as redes. Jesus os chamou. 22 Eles imediatamente deixaram a barca e o pai, e o seguiram. 23 Jesus andava por toda a Galileia, ensinando em suas sinagogas, pregando o Evangelho do Reino e curando todo tipo de doença e enfermidade do povo.
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Domingo Dedicado à Palavra de Deus

Através de seu Motu Próprio, APERUIT ILLIS (30/09/2019), o Papa Francisco estabelece o Terceiro Domingo do Tempo Comum como Domingo dedicado à Palavra de Deus. Quero destacar alguns pontos:
  • Estabeleço que o III Domingo do Tempo Comum seja dedicado à celebração, reflexão e divulgação da Palavra de Deus. Este Domingo da Palavra de Deus colocar-se-á, assim, num momento propício daquele período do ano em que somos convidados a reforçar os laços com os judeus e a rezar pela unidade dos cristãos. Não se trata de mera coincidência temporal: a celebração do Domingo da Palavra de Deus expressa uma valência ecuménica, porque a Sagrada Escritura indica, a quantos se colocam à sua escuta, o caminho a seguir para se chegar a uma unidade autêntica e sólida.
    As comunidades encontrarão a forma de viver este Domingo como um dia solene. Entretanto será importante que, na celebração eucarística, se possa entronizar o texto sagrado, de modo a tornar evidente aos olhos da assembleia o valor normativo que possui a Palavra de Deus. Neste Domingo, em particular, será útil colocar em evidência a sua proclamação e adaptar a homilia para se pôr em destaque o serviço que se presta à Palavra do Senhor. Neste Domingo, os Bispos poderão celebrar o rito do Leitorado ou confiar um ministério semelhante, a fim de chamar a atenção para a importância da proclamação da Palavra de Deus na liturgia. De fato, é fundamental que se faça todo o esforço possível no sentido de preparar alguns fiéis para serem verdadeiros anunciadores da Palavra com uma preparação adequada, tal como já acontece habitualmente com os acólitos ou os ministros extraordinários da comunhão. Da mesma maneira, os párocos poderão encontrar formas de entregar a Bíblia, ou um dos seus livros, a toda a assembleia, de modo a fazer emergir a importância de continuar na vida diária a leitura, o aprofundamento e a oração com a Sagrada Escritura, com particular referência à lectio divina” (Aperuit Illis n.3).
  • A Bíblia não pode ser património só de alguns e, menos ainda, uma coletânea de livros para poucos privilegiados. Pertence, antes de mais nada, ao povo convocado para a escutar e se reconhecer nesta Palavra. ... A Bíblia é o livro do povo do Senhor que, escutando-a, passa da dispersão e divisão à unidade. A Palavra de Deus une os crentes e faz deles um só povo  (n.4).
  • Nesta unidade gerada pela escuta, primariamente os Pastores têm a grande responsabilidade de explicar e fazer compreender a todos a Sagrada Escritura. Uma vez que é o livro do povo, todos os que têm a vocação de ser ministros da Palavra devem sentir fortemente a exigência de a tornar acessível à sua comunidade (n.5).
  • É preciso dedicar tempo conveniente à preparação da homilia. Não se pode improvisar o comentário às leituras sagradas. Sobretudo a nós, pregadores, pede-se o esforço de não nos alongarmos desmesuradamente com homilias enfatuadas ou sobre assuntos não atinentes. Se nos detivermos a meditar e rezar sobre o texto sagrado, então seremos capazes de falar com o coração para chegar ao coração das pessoas que escutam, de modo a expressar o essencial que é recebido e produz fruto. Nunca nos cansemos de dedicar tempo e oração à Sagrada Escritura, para que seja acolhida, «não como palavra de homens, mas como ela é realmente, palavra de Deus» [1Ts 2, 13] (n.5).
  • O dia dedicado à Bíblia pretende ser, não «uma vez no ano», mas uma vez por todo o ano, porque temos urgente necessidade de nos tornar familiares e íntimos da Sagrada Escritura e do Ressuscitado, que não cessa de partir a Palavra e o Pão na comunidade dos crentes. Para tal, precisamos de entrar em confidência assídua com a Sagrada Escritura; caso contrário, o coração fica frio e os olhos permanecem fechados, atingidos, como somos, por inumeráveis formas de cegueira (n.8).
  • Na II Carta a Timóteo, que de certa forma constitui o testamento espiritual de Paulo, este recomenda ao seu fiel colaborador que frequente assiduamente a Sagrada Escritura. O Apóstolo está convencido de que «toda a Escritura é inspirada por Deus e adequada para ensinar, refutar, corrigir e educar na justiça» (3, 16). Esta recomendação de Paulo a Timóteo constitui uma base sobre a qual a constituição conciliar Dei Verbum aborda o grande tema da inspiração da Sagrada Escritura, base essa donde emergem particularmente a finalidade salvífica, a dimensão espiritual e o princípio da encarnação para a Sagrada Escritura (n.9).
  • A Bíblia não é uma coletânea de livros de história nem de crónicas, mas está orientada completamente para a salvação integral da pessoa. A inegável radicação histórica dos livros contidos no texto sagrado não deve fazer esquecer esta finalidade primordial: a nossa salvação. Tudo está orientado para esta finalidade inscrita na própria natureza da Bíblia, composta como história de salvação na qual Deus fala e age para ir ao encontro de todos os homens e salvá-los do mal e da morte (n.9b).
  • A doçura da Palavra de Deus impele-nos a comunicá-la a quantos encontramos na nossa vida, expressando a certeza da esperança que ela contém (cf. 1 Pd 3, 15-16). Entretanto a amargura apresenta-se, muitas vezes, no facto de verificar como se torna difícil para nós termos de a viver com coerência, ou de constatar sensivelmente que é rejeitada, porque não se considera válida para dar sentido à vida. Por isso, é necessário que nunca nos abeiremos da Palavra de Deus por mero hábito, mas nos alimentemos dela para descobrir e viver em profundidade a nossa relação com Deus e com os irmãos (n.12c).
  • Outra provocação que nos vem da Sagrada Escritura tem a ver com a caridade. A Palavra de Deus apela constantemente para o amor misericordioso do Pai, que pede a seus filhos para viverem na caridade. A vida de Jesus é a expressão plena e perfeita deste amor divino, que nada guarda para si, mas a todos se oferece sem reservas. Na parábola do pobre Lázaro, encontramos uma indicação preciosa. Depois da morte de Lázaro e do rico, este vê o pobre no seio de Abraão e pede para Lázaro ser enviado a casa dos seus irmãos a fim de os advertir sobre a vivência do amor do próximo para evitar que venham sofrer os mesmos tormentos dele. A resposta de Abraão é incisiva: «Têm Moisés e os Profetas; que os ouçam! » (Lc 16, 29). Escutar as sagradas Escrituras para praticar a misericórdia: este é um grande desafio lançado à nossa vida. A Palavra de Deus é capaz de abrir os nossos olhos, permitindo-nos sair do individualismo que leva à asfixia e à esterilidade enquanto abre a estrada da partilha e da solidariedade (n.13).
  • Possa o domingo dedicado à Palavra fazer crescer no povo de Deus uma religiosa e assídua familiaridade com as sagradas Escrituras, tal como ensinava o autor sagrado já nos tempos antigos: esta palavra «está muito perto de ti, na tua boca e no teu coração, para a praticares» [Dt 30, 14] (n.15).
Neste documento, o Papa Francisco enfatiza a ligação entre a Sagrada Escritura e a fé; a Sagrada Escritura e a Eucaristia; a Sagrada Escritura e os Sacramentos:
  • “É profundo o vínculo entre a Sagrada Escritura e a fé dos crentes. Sabendo que a fé vem da escuta, e a escuta centra-se na Palavra de Cristo (cf. Rm 10, 17), daí se vê a urgência e a importância que os crentes devem dar à escuta da Palavra do Senhor, tanto na ação litúrgica, como na oração e reflexão pessoais” (n.7)
  • A partir da cena dos discípulos Emaús “compreendemos como seja indivisível a relação entre a Sagrada Escritura e a Eucaristia. O Concílio Vaticano II ensina: ‘A Igreja venerou sempre as divinas Escrituras como venera o próprio Corpo do Senhor, não deixando jamais, sobretudo na sagrada Liturgia, de tomar e distribuir aos fiéis o pão da vida, quer da mesa da palavra de Deus quer da do Corpo de Cristo’ [Dei Verbum, 21]” (n.8).
  • Sagrada Escritura e Sacramentos são inseparáveis entre si. Quando os Sacramentos são introduzidos e iluminados pela Palavra, manifestam-se mais claramente como a meta dum caminho onde o próprio Cristo abre a mente e o coração ao reconhecimento da sua ação salvífica. Neste contexto, é preciso não esquecer um ensinamento que vem do livro do Apocalipse; lá se ensina que o Senhor está à porta e bate. Se uma pessoa ouvir a sua voz e Lhe abrir a porta, Ele entra para cear junto com ela (cf. 3, 20). Cristo Jesus bate à nossa porta através da Sagrada Escritura; se ouvirmos e abrirmos a porta da mente e do coração, então Ele entra na nossa vida e permanece conosco (n.8).
Algumas Mensagens Do Evangelho Deste Dia


1. Jesus Veio Como Luz Para Todos


 Ao saber que João tinha sido preso, Jesus voltou para a Galileia... O povo que vivia nas trevas viu uma grande luz, e para os que viviam na região escura da morte brilhou uma luz”. 


O texto do Evangelho de hoje começa com o relato da prisão de João Batista. Os motivos dessa prisão só serão explicados em Mt 14,3-12. A prisão de João Batista antecipa o ministério ou a missão de Jesus. João Batista exerceu sua função de “preparar o caminho do Senhor” (Mt 3,3). Agora Jesus chegou para começar sua missão. Alguns especialistas consideram João Batista não apenas como Precursor na pregação em relação a Jesus, mas também como pessoa que precede na morte. A morte violenta de João Batista (decapitado) precede ou antecipa a morte violenta de Jesus Cristo na cruz.


Ao ouvir a notícia da prisão de João Batista “Jesus retirou-se para a Galiléia” (v.12; veja 14,13). No v.15 lê-se “Galiléia dos pagãos”. Galiléia era uma região habitada por muitos incircuncisos (pagãos). Isto se deveu a um fato histórico. Quando os assírios conquistaram o Reino de Israel, deportaram a população, substituindo-a com povos estrangeiros que não tinham nenhuma vinculação com a fé mosaica. Por isso, os judeus desprezavam os habitantes da Galileia.


Galiléia dos pagãos” é uma citação do profeta Isaías (cf. Is 8,23-9,1). É interessante notar que Jesus não foi para a cidade santa de Jerusalém. Mas Deus se aproxima antes dos pequenos, dos marginalizados, dos excluídos e dos que vivem no anonimato para a sociedade. Para Deus todos têm seu nome e são chamados pelo nome, pois todos são Seus filhos e filhas. Qualquer pai ou mãe sabe do nome de cada um de seus filhos.


Ao dizer “Galiléia dos pagãos” Mt quer nos mostrar que Jesus é enviado não apenas para o povo de Israel, mas para todos, o que sugere os pagãos também. O estigma do passado e todos os preconceitos contra os galileus definitivamente estão superados pela chegada de Jesus Cristo. Ele é o Salvador do mundo. Ninguém está excluído do amor salvador de Deus. Todos os homens que vivem na sombra da morte e se aceitarem Jesus, encontrarão em Jesus seu libertador, pois Jesus é a “Luz para iluminar as nações” (Lc 2,32; cf. Jo 8,12).


O povo que vivia nas trevas viu uma grande luz, e para os que viviam na região escura da morte brilhou uma luz”.  Luz significa vida e salvação. Jesus como a Luz por excelência vem para desfazer as trevas de nossa vida. Jesus como a Vida por excelência (cf. Jo 11,25; 14,6) vem para vivificar a morte e conduzir para a vida eterna. A pessoa de Jesus é vida e salvação. Por isso, também a pregação de Jesus é vida e salvação.


Se Cristo Jesus é o Salvador do mundo, Luz para as nações, nós cristãos temos que superar a tentação de cair no particularismo, no exclusivismo, no isolamento, ou no grupismo. Somos chamados a criar a fraternidade universal independentemente da crença que cada um tem. Somos batizados para a humanidade. O cristão é uma pessoa que se preocupa com a salvação de todos. O cristão é o verdadeiramente católico, isto é, ele existe para todos e com todos, ele busca a salvação, busca a luz para iluminar sua existência, e essa luz se encontra no próprio Jesus, Luz do mundo (cf. Jo 8,12).


Em função do papel de Jesus como Luz nas trevas lê-se, como Salmo responsorial, o Sl 26. O salmista dos Sl 26,1 afirma com fé: O Senhor é a minha luz e a minha salvação, a quem temerei?”. É a confissão de uma fé profunda em que se encontra uma segurança total no Senhor que sempre ilumina a vida. Se a humanidade não encontrar Jesus, ela continuará a caminhar nas trevas. Jazer na escuridão ou morte é viver no meio de ações e estruturas contrárias à vontade de Deus. Luz é uma imagem da vida e poder salvífico de Deus. A fé em Jesus Cristo, “Luz do mundo” (Jo 8,12) faz com que a inteligência seja iluminada e a vida vivida sob a Luz divina.


Por nossa vez, somos chamados para ser enviados por Jesus Cristo como luz do mundo (Mt 5,14). Para que sejamos luz para os outros devemos ser iluminados primeiro por Cristo através do encontro pessoal com Jesus. É contemplar Jesus, Luz do mundo, para sermos reflexos dele no mundo. Se não for assim, seremos pedra de tropeço no caminho dos outros e viveremos apagando o brilho dos outros e, consequentemente, seremos instrumentos ineficazes neste mundo. Somos como os olhos. Eles só funcionam, quando há luz, pois os olhos não funcionam na escuridão mesmo que eles sejam saudáveis. Seremos luz para os outros, se estivermos imersos na grande Luz que é Cristo.


2. Urgência Da Conversão Pela Proximidade Do Reino De Deus                     


Jesus que veio como Luz do mundo conclama todos à conversão: “Convertei-vos porque o Reino dos céus está próximo”.


O Reino de Deus vem ao encontro do homem do futuro como nova possibilidade criada por Deus. Por isso, “o Reino dos céus está próximo” é uma palavra que provoca júbilo e sentimentos de felicidade exuberante, pois expressa a vontade de Deus de salvar os homens. O Reino de Deus é um acontecimento que acontece na história humana, que para a humanidade significa bênção, vida, felicidade e salvação. A chegada do Reino de Deus, primordialmente, é uma oferta de salvação, é uma esperança para a humanidade.


Mas O reino de Deus se torna uma ameaça quem não aceitá-lo. Não se pode esperar a vinda de Deus sem renovação da vida. Por isso, a resposta adequada para este convite, ou para a proximidade do Reino de Deus é a conversão. Conversão significa esvaziar-se de tudo para dar lugar à riqueza do poder da graça de Deus. Devemos crucificar o nosso “eu” prepotente e auto-suficiente, se quisermos que o grandioso “Ele” (Deus e sua graça) viva manifestamente em nós. O ego é a barreira que se interpõe entre Deus e os planos dele para nossa vida. A arrogância suga a vitalidade do nosso caráter e afasta a salvação de nossa vida. O cristão deve ser definido como pessoa que tem sede de agradar a Deus. Quem se entrega a Deus pela fé, se converte, como conseqüência. Fé sem conversão de nosso coração para Deus é apenas uma fé superficial. Fé e conversão estão sempre unidas.


3. A Vocação Dos Primeiros Discípulos E Nossa Vocação


Em primeiro lugar, é digno de sublinhar o fato de Jesus buscar as pessoas para acompanhá-lo ou para trabalhar com ele. Ele não vai à busca dos teólogos, dos cientistas, dos sábios, dos ricos, dos professores, mas de simples pescadores, pois o que importa para Jesus não é preparo científico e títulos acadêmicos dos seus seguidores, mas que eles tenham fé e amor no coração e disponíveis para o bem ou a salvação de todos. Aquele que prega ou profetiza por ordem de Cristo, não precisa demonstrar nada: só testemunhar a verdade do amor de Deus e a certeza da ressurreição do Senhor.


Talvez Henri J. Nouwen, um dos grandes escritores da espiritualidade, tivesse razão quando escreveu: “Em toda parte, líderes cristãos, homens e mulheres, ficaram cada vez mais cientes da necessidade de treinamento e formação mais específicos. Essa necessidade é real, e o desejo por maior profissionalismo no ministério é compreensível. Mas o perigo é, em vez de se tornar livre para permitir o desenvolvimento do espírito, o futuro ministro embaraçar-se nas complicações da própria e presumida competência e usar sua especialização como uma desculpa para evitar a tarefa muito mais difícil de ser compassivo... o perigo é seu perito olhar diagnóstico tornar-se um olhar distante e analítico, e não o olhar de um parceiro compassivo. E se padres e ministros de amanhã pensam que mais treinamento especializado é a solução para o problema da liderança cristã para a futura geração, podem terminar mais frustrados e desapontados que os líderes de hoje. Mais treinamento e estrutura são necessários quanto mais pão para o faminto. Mas, do mesmo modo como o pão ofertado sem amor pode provocar guerra, em vez de paz, o profissionalismo sem compaixão transformará o perdão em uma roleta e o outro mundo em algo ofuscado” (Veja: O Sofrimento que Cura, Paulinas,2001).


Em segundo lugar, a vocação dos primeiros discípulos acontece “junto ao mar da Galiléia” (vv.18.21).  “O mar da Galiléia” é o lugar no qual vive o povo da Galiléia e ali trabalha. Isto quer nos dizer que o chamado não é feito num ambiente religioso particular, mas aí onde as pessoas verdadeiramente vivem, na sua vida cotidiana. Jesus procura e encontra o povo em sua própria situação concreta. Jesus apresenta a cada um o convite de segui-lo ali onde se encontra, numa situação comum, honesta e honrada como aquela dos primeiros discípulos(dos pescadores) ou então, numa situação desonrada e moralmente difícil como aquela do cobrador de impostos(Mt 9,9). Jesus vai de um ao outro e os chama.


Neste chamamento sublinha-se o aspecto pessoal. Jesus se aproxima de cada um, fala e o chama. Da mesma maneira Jesus se aproxima de todo homem, e ali onde ele está, faz-lhe ouvir aquela palavra de esperança e de confiança que é o chamado a segui-lo. Trata-se da chamada do Salvador.


Em terceiro lugar, Jesus os chama para “segui-lo” (v.19).  Jesus não segue o método usado pelos mestres de sua época, onde normalmente o discípulo procurava/escolhia o mestre e estudava com ele até conseguir o “diploma”. Ao contrário, é Jesus quem vai atrás dos discípulos e os chama para segui-lo. Das 90 vezes que se emprega o vocábulo “seguir” no NT, unicamente 11 aparecem fora dos evangelhos (Em Atos 4 vezes, em Ap 6 vezes; e uma vez em 1Cor 10,4). “Seguir” significa ir detrás de alguém, pisando nas suas pecadas, percorrer o seu caminho e, portanto, pede, sobretudo, uma imensa confiança nele. Seguir a Jesus significa fazer os mesmos passos de Jesus, viver a mesma vida de Jesus, adotar o mesmo estilo de Jesus para se aproximar das pessoas, querer a mesma vontade do Pai do céu. Neste seguir incluem-se também a paixão e a cruz. Seguir a Jesus não é só aceitar sua doutrina, mas entregar-se incondicionalmente à sua pessoa, colaborar na sua missão, partilhar do seu destino que inclui a morte e glorificação. Seguir Jesus, por isso, supõe o abandono confiante nele, isto é, uma confiança total, doação completa à pessoa de Jesus e não a uma causa. O seguimento de Jesus exige, portanto, urgência, desacomodação diante da situação existente e opção por uma nova forma de ver as coisas e uma prática transformadora. Tudo isto é necessário para percorrer o caminho em direção ao conhecimento do mistério de Jesus.


Em quarto lugar, eles são chamados para ser “pescadores de homens” (v.19). A tradicional expressão “pescadores de homens”, que indica a atividade missionária dos discípulos de Jesus, significa não apenas atrair pessoas para a causa do Reino de Deus, mas possui também um matiz de julgamento profético, como o mostra Jeremias em 16,16. A imagem da pesca na tradição bíblica servia para indicar o juízo último de Deus (Jr 16,16;Hab 1,15-17). Nesta linha devemos entender também a parábola da pesca onde se lança a rede na água (Mt 13,45-50). Em outras palavras, a tarefa dos discípulos é a de preparar a humanidade para o acontecimento final que já se inicia no mundo. Dentro desta linha de pensamento percebe-se o conteúdo da pregação de Jesus: o anúncio do Reino e com o apelo à conversão (Mt 4,17).


Em quinto lugar, Os discípulos “imediatamente deixaram as redes e foram com ele” (vv.20.22). O atrativo da chamada de Jesus é irresistível e os faz capazes de renunciar à sua família e ao seu trabalho para seguir Jesus. Esta ruptura com a própria família tinha umas implicações muito distintas às que têm hoje o abandono do lar familiar. Não era somente nem principalmente uma ruptura afetiva, e sim uma ruptura com todas as seguranças. A casa e a família eram, até então, o grupo de apoio mais sólido desde o ponto de vista social (os que careciam de uma família careciam de honra e prestígio) e econômico (a família era a principal unidade de produção e o grupo em que se exercia a mútua solidariedade). Ao deixar sua família e sua casa, aqueles discípulos fizeram uma opção muito radical: deixaram verdadeiramente tudo para seguir a Jesus (cf. Mt 19,27-29). Através da pronta resposta dos discípulos ao convite de Jesus, Mateus propõe um exemplo da conversão radical que a chegada do Reino exige (Mt 4,17) e apresenta aos principais destinatários dos ensinamentos e sinais de Jesus.


A estes discípulos, que escutaram as palavras de Jesus (Mt 5-7) e contemplaram seus sinais (Mt 8-9), Jesus os enviará depois a difundir sua mensagem e a realizar os mesmos sinais que ele realizava (Mt 10). Esta missão se antecipa já no momento de sua vocação com uma imagem tomada do ofício que desempenhavam antes de ser chamados por Jesus: serão pescadores de homens.


Olhando para a vocação dos quatro primeiros discípulos, vamos nos perguntar: Em primeiro lugar, o que significa para você “eles imediatamente deixaram as redes, a barca e o pai e seguiram Jesus”? O que representa para você “a barca” e “rede” na sua vida? Você prefere   remar sua própria barca ou quer entrar na barca de Jesus? Jesus não permite os adiamentos, pois com ele tudo tem que ser “imediatamente” (veja Mt 8,21s). Em segundo lugar, “Nem todos os caminhos são para todos os caminhantes” (Goethe). Nossa primeira vocação é o nosso chamado para sermos seres humanos, pessoas humanas; o resto são formas e caminhos. Enquanto você não tiver planejado sua vida como um benefício para os outros, não terá sentido que você se pergunte por sua vocação. Na sua opção vocacional, não procure quem o exima de sua liberdade e de sua responsabilidade. Ninguém deve nem pode escolher e decidir por você. Não acreditamos que Deus se antecipe escolhendo por você; mas acreditamos que se compromete e escolhe com você quando você faz isso séria e livremente.
P. Vitus Gustama,svd

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