APRENDER A ESCUTAR E A COMUNICAR-SE
Primeira Leitura: Gn 3,1-8
1 A serpente era o mais astuto de todos os animais dos campos que o Senhor Deus tinha feito. Ela disse à mulher: “É verdade que Deus vos disse: ‘Não comereis de nenhuma das árvores do jardim?’” 2 E a mulher respondeu à serpente: “Do fruto das árvores do jardim, nós podemos comer. 3 Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, Deus nos disse: ‘Não comais dele nem sequer o toqueis, do contrário, morrereis’”. 4 A serpente disse à mulher: “Não, vós não morrereis. 5 Mas Deus sabe que, no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão e sereis como Deus, conhecendo o bem e o mal”. 6 A mulher viu que seria bom comer da árvore, pois era atraente para os olhos e desejável para obter conhecimento. E colheu um fruto, comeu e deu também ao marido, que estava com ela, e ele comeu. 7 Então, os olhos dos dois se abriram; e, vendo que estavam nus, teceram tangas para si com folhas de figueira. 8 Quando ouviram a voz do Senhor Deus, que passeava pelo jardim à brisa da tarde, Adão e sua mulher esconderam-se do Senhor Deus no meio das árvores do jardim.
Naquele
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Na Desobediência à Palavra De Deus o Homem Cria a Desarmonia Com Tudo e Com Todos
O texto da Primeira Leitura faz parte do relato da tradição Yahvista em torno da criação (Gn 2,4b-3,26). Como já se sabe que a linguagem Yahvista é viva, simples, ingênua. Tem o dramatismo da ação de personagens nominados. O esquema do relato da criação do homem é assim: o homem é criado em uma terra deserta e depois ele é traslado para o jardim de Éden. Ali Deus lhe impõe um mandato. Se ele cumprir o mandato, ele viverá feliz no jardim. Mas o homem rompe o pacto, e é expulso do Éden. Ainda que não se diga explicitamente, este esquema é um relato de Aliança. Tudo isto ocorreu na história do povo.
Ser fiel à Palavra de Deus significa permanecer na harmonia homem-natureza, homem-mulher e Homem-Deus. Não obedecer à Palavra de Deus, cair na tentação, é romper o desígnio harmônico (comunhão) de Deus Pai; é isolar-se de tudo e de todos, principalmente da salvação, pois fica-se sem Deus; é a volta do caos ou voltar para o caos.
Os personagens da ação na cena no texto de hoje não são históricos, mas representam a humanidade inteira para ser observado diretamente e ao vivo, isto é, tem sua atualidade para todos os tempos e lugares. Os personagens levam sobre si a realidade do homem de todos os tempos. Deus é descrito com pai que proibiu a seus filhos de chegar a ter um conhecimento, pois seria para eles fonte de sofrimento e sepultura de sua simplicidade e inocência. Mas por outro lado, o homem é muito curioso em ter conhecimento como Deus, mesmo que corra os maiores perigos. Com esta curiosidade, o homem quer ser senhor de seu destino e quer agir com independência. O homem não quer permanecer subordinado para sempre e por isso, desconfia e desobedece.
A tradição javista escolheu um novo personagem para entrar em cena: a serpente que tenta perturbar a paz idílica e as boas relações existentes entre Deus e o homem e a mulher. A tradição Yahvista escolheu a serpente como símbolo do inimigo por ser símbolo de vida e de morte nos mitos. Esta serpente é qualificada com “astuta” (hebraico: ´arum = astuta (sábia) que se relaciona com ´arumim = nus do versículo anterior e com ´arur = maldita (
No diálogo, a serpente se mostra interessada em ajudar a humanidade em sua ânsia por um progresso desordenado, contrariando a vontade de Deus. A serpente semeia a desconfiança na mulher, visto que conseguiu despertar o interesse da mulher: "No dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão e sereis como Deus, conhecendo o bem e o mal”. Neste diálogo, o homem (Adam) permanece mudo.
A árvore é o centro de atenção; a mulher, confusa, não percebe o perigo. A serpente colocou o ser humano diante da grande decisão. Três expressões qualificam o fruto da árvore: era bom para comer; de agradável aspecto; e muito apropriado para abrir a inteligência: “A mulher viu que seria bom comer da árvore, pois era atraente para os olhos e desejável para obter conhecimento” (Gn 3,6). O ser humano espera encontrar o que precisa: a autonomia e a imunidade em face da morte: “sereis como Deus”: os deuses não envelhecem nem morrem.
Na desconfiança e na confusão, a palavra do sedutor pode mais no ser humano do que a Palavra do Senhor. O proibido aumenta o desejo no ser humano. Sugerida, a mulher come e faz seu marido comer. Cumprido seu papel, o tentador desaparece e emudece.
As consequências são imediatas. Em vez de adquirir a maravilhosa ciência, os seres humanos se encontram nus, frágeis, envergonhados e indefesos. Envergonham-se, pois não viraram deuses. A vergonha é, segundo o autor, a reação elementar de um sentimento de culpa nas áreas mais íntimas do ser humano e quer ocultá-las cobrindo-se instintivamente com folhas de figueira. Desaparece a harmonia interna e evidencia-se a presença da consciência má, a ruptura interior, o efeito primeiro do pecado. Estão nus e envergonhados!
Para o autor, a origem de toda tentação e pecado está na falta de confiança, atitude fundamental para com Deus e alicerce da obediência. O pecado é como dizer: “Não quero ter nada com Deus!”, quando na realidade não somos nada sem Deus. Pecar é querer ser deus diante de Deus. O pecado é não querer viver da comunhão, da gratuidade da comunhão com Deus. E ao romper a comunhão com Deus, fundamento e valor de tudo, rompe-se inevitavelmente a comunhão com todos os demais homens e com a natureza. Neste sentido pode-se dizer que o pecado é a recusa da comunhão com Deus manifestada na recusa da comunhão com a natureza e com os demais homens que são o dom de Deus para nós. Mas todo aquele que aceitar com gozo a vontade de Deus em sua vida, voltará a fazer presente o Paraíso em seu coração e em seu mundo.
Muitas serpentes astutas e sereias sedutoras se mostram interessadas, hoje, em ajudar a humanidade em sua ânsia de progresso desordenado: guerra das galáxias, armas atômicas equipadas de GPS para poder atingir alvo de maneira precisa, e armas bacteriológicas e químicas, e assim por diante. “Seus olhos se abrirão e vocês serão os mais poderosos do mundo, quase como deuses!”. Caídos na tentação, nós vamos nos alimentar dessa propaganda destruidora e mortal e vamos fazer os outros comerem o mesmo alimento cheio de fatalidade.
Apesar de tudo isso, a mensagem bíblica nunca é terrífica e sim otimista e cheia de esperança. Apesar do fracasso, Deus continua cuidando do homem (Gn 3,21) respeitando sua liberdade. No interior humano sempre se dará uma dura batalha que pode gerar até a violência: morte do irmão, aniquilamento da sociedade (cf. Gn 4,8; 9,20ss; 11,1-9), mas poderá nos levar a um maior progresso cultural, técnico e religioso (Gn 4,2-4). Segundo a mensagem do Gênesis, o bem triunfará sobre o mal.
Escutar Deus e Sua Palavra São Fonte De Nossa Salvação
Na
No
Um cristão ou qualquer pessoa de boa vontade precisa aprender a escutar, a falar e a calar a seu tempo, levando a sério a verdade e a caridade fraterna. Quando buscarmos a verdade e levarmos em consideração a caridade fraterna, falaremos e escutaremos com responsabilidade, isto é, saber escutar quando há que escutar; saber calar quando há que calar e saber falar quando, como e o que há que falar. Para isso, precisamos manter nossos ouvidos e coração abertos à Palavra de Deus, pois a Palavra de Deus tem o único objetivo: salvar a humanidade. Muitas tragédias na Bíblia eram frutos da falta da escuta da Palavra de Deus.
Pode ser que não sejamos surdos fisicamente. Mas hoje em dia ficamos cada vez mais duros de ouvido porque todos nós temos que filtrar o que ouvimos a fim de não sentirmos oprimidos, irritados, desorientados pela superabundância de informações, de barulhos e de conversas que entram em nossa vida com uma velocidade impressionante. E os nossos ouvidos continuam a ficar abertos em tempo integral. Cada dia uma quantidade enorme de notícias entra na nossa vida, mas sem a qual não poderíamos nos posicionar bem nesta vida. Podemos ficar tristes ou alegres, animados ou desanimados por aquilo que ouvimos e pelo modo como ouvimos e pela maneira que interpretamos sobre o que ouvimos e os acontecimentos. O que precisamos manter é a capacidade de sintetizar todas as informações para construir nossa própria vida e nossa convivência. Tudo o que ouvimos, para poder compreendê-lo temos que organizá-lo em um determinado horizonte, o qual é distinto de pessoa a pessoa. Tal horizonte se produz a partir de decisões vitais para nossa vida: o que preciso ouvir e o que eu preciso evitar de ouvir. Aquilo que eu ouço é capaz de me dar um bom descanso ou de tirar meu bom sono. É preciso termos uma audição seletiva para todas as informações para não formarmos nossa personalidade erradamente. Sem a audição seletiva um dia as coisas, que não deveriam entrar, acabarão dando comando para nossa vida. Conseqüentemente, as portas que deveriam ficar fechadas, estarão abertas e as que deveriam abertas, ficarão fechadas. Em outras palavras, perderemos totalmente o controle sobre nossa vida por falta desta audição seletiva. Um veículo sem bom controle de seu piloto tem grandes possibilidades ou probabilidades de ter acidente.
O personagem central da cena do evangelho de hoje é um surdo-mudo. O homem foi criado para se comunicar. Por isso, mudez e surdez são dois empecilhos para a comunicação fluente. Esta era a situação do homem que foi apresentado para Jesus.
Boca e ouvido têm um rico simbolismo na Bíblia. O ser humano precisa da boca para cantar os louvores de Deus e proclamar Suas maravilhas e narrar às gerações futuras a misericórdia de Deus. Através dos ouvidos o homem é instruído nos caminhos de sabedoria. Mas a língua pode levar o homem a perder-se. Daí o provérbio: “Falar com sabedoria é prata, ouvir com amor é ouro”.
Para o evangelista Marcos esse homem representa aqueles que vivem fechados no seu mundo sem partilha, sem diálogo. O surdo-mudo representa aqueles que não se preocupam em comunicar, em partilhar a vida, em dialogar, em deixar-se interpelar pelos outros. O surdo-mudo representa aqueles que vivem instalados, no seu egoísmo, nas suas certezas e nos seus preconceitos, convencidos de que é dono absoluto da verdade. Uma pessoa que está cheia de si paradoxalmente é uma pessoa vazia.
“Abre-te”, diz Jesus ao surdo-mudo. E ele saiu de seu isolamento e de seu silêncio mortal. Este “abre-te” é também dirigido a cada um de nós. A ordem “abre-te” existe porque há dentro de nós algo fechado. O que é que está muito fechado em você que o impede de se comunicar com os demais e com o mundo? Abra seu coração a quem lhe oferece a amizade. Abra-se aos que necessitam de seu carinho. Abra seus ouvidos e mova sua língua para aqueles que necessitam de suas palavras de consolo e de conforto. Quem tem ouvidos novos e os lábios libertados do mal tem também os olhos abertos para os demais, a mão estendida para os necessitados e o coração limpo para testemunhar o verdadeiro amor. Quem faz o bem não faz barulho. Como dizia o Papa Pio XI: “O bem não faz barulho e o barulho não faz bem”.
“Abre-te!”, diz Jesus a cada um de nós. Cada um precisa se perguntar: “O que é que está fechado em mim que necessita do toque de Jesus para eu poder ser libertado?”.
Para Ser Lembrado
“Jesus colocou os dedos nos seus ouvidos,
cuspiu e com a saliva tocou a língua dele. Olhando para o céu, suspirou e disse:
‘Efatá!’ que quer dizer: ‘Abre-te!’ Imediatamente
seus ouvidos se abriram, sua língua se soltou e ele começou a falar sem
dificuldade”.
A comunidade cristã entendeu o valor
sacramental do ensinamento de Jesus e realiza sobre os candidatos para o
batismo, sobre os catecúmenos, o gesto de Jesus. Quem preside toca os ouvidos
do candidato para que possa acolher a Palavra de Deus e a boca para professar a
fé: “O Senhor Jesus, que fez os surdos ouvir e os mudos falar, te conceda que
possas logo ouvir sua Palavra e professar a fé para louvor e glória de Deus”.
P. Vitus
Gustama,svd
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