quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

08 de Fevereiro de 2021

TOCAR E DEIXAR-SE TOCAR POR JESUS

Segunda-Feira Da V Comum

Primeira Leitura: Gn 1,1-19

1 No princípio, Deus criou o céu e a terra. 2 A terra estava deserta e vazia, as trevas cobriam a face do abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. 3 Deus disse: “Faça-se a luz!” E a luz se fez. 4 Deus viu que a luz era boa e separou a luz das trevas. 5 E à luz Deus chamou “dia” e às trevas, “noite”. Houve uma tarde e uma manhã: primeiro dia. 6 Deus disse: “Faça-se um firmamento entre as águas, separando umas das outras”. 7 E Deus fez o firmamento, e separou as águas que estavam embaixo das que estavam em cima do firmamento. E assim se fez. 8 Ao firmamento Deus chamou “céu”. Houve uma tarde e uma manhã: segundo dia. 9 Deus disse: “Juntem-se as águas que estão debaixo do céu num só lugar e apareça o solo enxuto!” E assim se fez. 10 Ao solo enxuto Deus chamou “terra” e ao ajuntamento das águas, “mar”. E Deus viu que era bom. 11 Deus disse: “A terra faça brotar vegetação e plantas que deem semente, e árvores frutíferas que deem fruto segundo a sua espécie, que tenham nele sua semente sobre a terra”. E assim se fez. 12 E a terra produziu vegetação e plantas que trazem semente segundo a sua espécie, e árvores que dão fruto tendo nele a semente da sua espécie. E Deus viu que era bom. 13 Houve uma tarde e uma manhã: terceiro dia. 14 Deus disse: “Façam-se luzeiros no firmamento do céu, para separar o dia da noite. Que sirvam de sinais para marcar as épocas, os dias e os anos, 15 e que resplandeçam no firmamento do céu e iluminem a terra”. E assim se fez. 16 Deus fez os dois grandes luzeiros: o luzeiro maior para presidir ao dia, e o luzeiro menor para presidir à noite, e as estrelas. 17 Deus colocou-os no firmamento do céu para alumiar a terra, 18 para presidir ao dia e à noite e separar a luz das trevas. E Deus viu que era bom. 19 E houve uma tarde e uma manhã: quarto dia.

Evangelho: Mc 6, 53-56

Naquele tempo, 53tendo Jesus e seus discípulos acabado de atravessar o mar da Galileia, chegaram a Genesaré e amarraram a barca. 54Logo que desceram da barca, as pessoas imediatamente reconheceram Jesus. 55Percorrendo toda aquela região, levavam os doentes deitados em suas camas para o lugar onde ouviam falar que Jesus estava. 56E, nos povoados, cidades e campos onde chegavam, colocavam os doentes nas praças e pediam-lhe para tocar, ao menos, a barra de sua veste. E todos quantos o tocavam ficavam salvos.

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Tudo O Que É Bom Tem Sua Origem Em Deus 

Durante duas semanas leremos o livro de Gênesis = origens: do mundo, do homem e do povo de Israel, com que começa a Bíblia. É um livro muito bem elaborado. Sua redação foi bastante tardia: depois do Exílio da Babilônia. 

Através do relato da criação, o autor não busca nos dar uns dados científicos. O Gênesis não é um livro científico. Ou seja, não nos conta a história exata da evolução do cosmos até chegar a sua situação atual. O Gênesis é um livro que intenta responder às grandes interrogações que Israel fez em vários períodos de sua história: qual é a origem do mundo, da vida, do homem. E interpreta a história a partir do prisma religioso que é a base de toda a Bíblia: Deus é transcendente, o Criador do que existe, sobretudo, da vida e da humanidade, fez tudo bem e tem um plano de salvação que começa na criação, atinge sua plenitude ao enviar-nos seu Filho como Salvador universal e tem como meta o novo céu e a nova terra no final dos tempos. 

O Gênesis nos conta tudo isso usando gêneros literários populares e poéticos, que expressam o pano de fundo histórico por meio de contos, relatos, mitos e lendas, para os quais o autor extrai um valor religioso para nos ajudar em nosso caminho. Por exemplo, nos diz que a criação foi feita "em sete dias" e que, no final, "Deus descansou". É uma maneira popular e antropomórfica de descrever um processo cujos detalhes científicos não interessam ao autor e justificam de passagem a instituição da semana e do descanso sabático. 

A Bíblia não quer nos ensinar tecnicamente como surgiram as diversas espécies de animais, ou o homem e a mulher: Adão de barro e Eva da costela. São, evidentemente, gêneros literários sem pretensões de exatidão biológica. O mesmo acontece com a origem das estrelas. A Bíblia não quer nos dizer como o céu foi feito, e sim como se vai para o céu, em uma frase atribuída a Galileu. Ele não nos dá lições de cosmologia, mas nos convida a cantar um hino de louvor pelas grandezas de Deus, o Criador.

O autor sagrado, um redator Sacerdotal somente nos diz que na origem de tudo está Deus, Sua vontade criadora, comunicadora, cheia de sabedoria e amor. Na oração Eucarística IV o sacerdote louva a Deus com as seguintes palavras: “Nós proclamamos a vossa grandeza, Pai santo, a sabedoria e o amor com que fizestes todas as coisas”. Tanto o macrocosmos como o microcosmos, desde os astros até os menores animais e flores estão cheios de beleza e detalhes surpreendentes. 

Os estudiosos notam nos livros do Pentateuco (os "cinco livros" atribuídos a Moisés: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio) a mistura de várias "versões" ou tradições, cada uma com suas fontes e suas tendências: especialmente a tradição Yahvista e a Sacerdotal. A primeira, a tradição Yahvista, foi escrita no século X a.C, no tempo do rei Salomão. O segundo, a tradição Sacerdotal, é mais recente, do século VI a.C, em tempos de Exílio. O atual livro do Gênesis é uma mistura de ambas as tradições. 

Hoje lemos o princípio de tudo. No relato lemos como Deus põe ordem no caos inicial, pensando no homem e no seu bem. O primeiro dia, separa a luz das trevas. O segundo dia, as águas superiores e as inferiores. O terceiro dia, a terra dos mares. O quarto dia, o dia e a noite. Sempre de pois da “jornada” em que sucede se afirma que “Deus viu que era bom”. 

No princípio, Deus criou o céu e a terra”, assim começa o livro. Estas palavras sugeriram, pelo menos, a ideia de que o “tempo” começou com a criação material. A pergunta: “O que havia antes?”, não tem sentido, pois Deus não está no tempo e sim na eternidade na qual não há nem antes nem depois: “Só Vós sois o Deus vivo e verdadeiro que existis antes de todo o tempo e permaneceis para sempre, habitando em luz inacessível” (Oração Eucarística IV). Com a expressão “No princípio”, o autor não quer remontar ao início do tempo; simplesmente indica “em primeiro lugar”. Para Deus, a criação é HOJE. É bom e conveniente pensarmos que Deus não cessa de criar. Estou nas mãos criadoras de Deus neste exato momento, nas mãos amorosas. A expressão “O céu e a terra” indica a totalidade da criação, o universo. Propõe o processo criador coo uma oposição entre o caos e o cosmos. Onde onde Deus opera, ali há ordem (cosmos). A voz divina manda e é obedecida: a palavra e eficaz. Deus chama à existência e a criatura obedece

Temos que refrescar nossa capacidade de admiração pelas coisas que Deus nos deu de presente neste mundo em que vivemos. Tudo é para nós, mas nada é nosso, pois tudo é de Deus. Temos apenas o direito de usufruto, pois nada levamos daqui ao terminar nossa jornada aqui neste mundo. 

Além disso, todos nós devemos ser, de alguma forma, ecologistas, admiradores, conservadores e protetores dessa natureza para o bem de todos. O Salmo Responsorial de hoje (Sl 103) nos ajuda com a seguinte oração contemplativa: “Ó meu Deus e meu Senhor, como sois grande! De majestade e esplendor vos revestis e de luz vos envolveis como num manto. A terra vós firmastes em suas bases, ficará firme pelos séculos sem fim; os mares a cobriam como um manto, e as águas envolviam as montanhas. Quão numerosas, ó Senhor, são vossas obras, e que sabedoria em todas elas! Encheu-se a terra com as vossas criaturas!”.

Tocar e Deixar-se Tocar Por Jesus, Nosso Salvador 

O texto do evangelho de hoje pode ser qualificado na categoria de “sumárioou síntese que o evangelista Marcos faz, de vez em quando, para resumir um período de atividade de Jesus e para unir as distintas partes de seu relato. Nesse sumário Jesus não toma nenhuma iniciativa nem se põe, como tantas outras vezes, a ensinar (cf. Mc 6,34). As pessoas se aproximam de Jesus para ser curadas por Ele.

Marcos nos relatou que Jesus visitou a região de Genesaré. “Genesaré” é figura da periferia do judaísmo, à margem da instituição judaica. Jesus entra em qualquer núcleo da população por pequeno que seja, pois Jesus é “Deus que visitou seu povo” (Lc 1,68; 7,16). Na região de Genesaré não se encontram os endemoninhados, isto é, fanatismos destruidores. Encontra-se mal (Mc 1,32;2,17): os enfermos que vivem excluídos pela sociedade legalista que espiritualmente mata todos os que padecem algum tipo de mal físico.

Anteriormente Jesus fez o milagre da multiplicação dos pães.  E esse milagre despertou o entusiasmo popular. Jesus e seus discípulos querem sair desse entusiasmo e vão para algum lugar para descansar. Mas Jesus e seus discípulos não têm como escapar das multidões. Jesus acaba as atendendo e deixa o descanso para mais tarde. Isto se chama a disponibilidade baseada na misericórdia. A misericórdia é sinônima de partilha íntima da dor dos que sofrem, dos desprezados, dos marginalizados ou excluídos. É sentir com o outro na sua dor. Por isso, a misericórdia cura e liberta. A verdadeira misericórdia obriga à ação. O preço da misericórdia divina é infinito: a encarnação de Deus em Jesus Cristo e sua morte salvadora na cruz.

“... levavam os doentes deitados em suas camas para o lugar onde ouviam falar que Jesus estava”, assim relatou o evangelista Marcos.

A enfermidade e os sofrimentos acompanham a vida do homem permanentemente e o situa numa terrível insegurança. Tudo isso simboliza a fragilidade da condição humana submetida aos riscos inesperados e imprevisíveis. A enfermidade contradiz o desejo de absoluto e de solidez que todos nós temos. Por isso é que a enfermidade guarda sempre uma significação religiosa mesmo para o homem moderno.

Em nossos dias a cura das enfermidades corresponde à ciência médica. Mas os antigos, em todas as civilizações do mundo, deram à enfermidade e à cura um significado religioso. As pessoas enfermas recorreram a Deus para ser curadas. Hoje em dia a primeira reação de quem se encontra enfermo é procurar ou chamar médico. Mas se refletirmos profundamente nós perceberemos que o homem com a inteligência que Deus lhe deu, e que combate o mal através de ajuda, de remédios capazes de curar etc. continua sendo um dom de Deus. A vocação de ser médico e enfermeiro é maravilhosa ao serviço da humanidade. Deus quer cuidar dos enfermos através de seus filhos médicos e enfermeiros. 

Todos quantos tocavam Jesus, ficavam salvos”.  Esta frase tem um peso teológico. “Salvar” é ato próprio de Deus em relação ao homem. Por isso, esta frase vai muito além de uma simples cura. Toda proximidade de Jesus possibilita a passagem do homem para a nova condição de vida. Trata-se de uma total restauração do homem que se aproxima de Jesus com . A é simples: as pessoas querem tocar Jesus para ficar curadas de seus males. As pessoas dos contornos levavam os enfermos para Jesus para que pudessem tocar, ao menos, a barra de sua veste.  As pessoas, na sua simplicidade, acreditavam que somente o contato direto com Jesus é que se sentiam afetadas pelo poder de Jesus. Dessa maneira ficavam curadas.

Com estas curas o evangelista Marcos quer nos mostrar o efeito mais notável do anúncio do Reino de Deus: a Graça. A graça de Deus nos devolve a alegria de viver, pois em Deus encontramos o sentido de nossa vida, inclusive de nossas dores e enfermidade e nosesperança de estar em comunhão plena com Deus um dia. No seu ato de libertação Jesus nos apresenta o plano maravilhoso de seu Pai: o amor gratuito de Deus Pai para com o ser humano. Este amor gratuito não pode ser comprado nem exigido nem é resposta aos méritos que alguém crê ter acumulado. Diante da graça anunciada e vivenciada por Jesus, o sistema religioso de seu tempo, que se baseava na acumulação de méritos, entra em crise. Os pobres, os marginalizados e excluídos, por outro lado, são os maiores beneficiados pela proposta revolucionária de Jesus, pois são mais disponíveis e abertos diante da graça de Deus.

O amor gratuito, que Deus nos tem, desperta nossa consciência de que vivemos num mundo de gratuidade que nos faz vivermos agradecidos e gratos permanentemente ou nos faz vivermos uma vida eucarística. E essa consciência nos leva a ajudarmos gratuitamente os que se encontram “enfermos” nesta vida. Da experiência cotidiana percebemos que os que ajudam mais os outros, sem esperar nada de troca, são mais felizes do que os demais. “Quando perguntamos pela bondade de um homem, não perguntamos por suas crenças ou esperanças, mas por seus amores” (Santo Agostinho: De fide, spe et char. 31).

Todos quantos tocavam Jesus, ficavam salvos”. Nós, cristãos, temos que aprender a “tocar” Jesus, a não perder nenhuma maneira o contato direto com Jesus, porque Ele é a fonte do que somos e daquilo quesentido à nossa vida. Somente tocando Jesus, encontraremos a força para seguir adiante nesta vida e para segui-Lo pelos caminhos da vida. 

As pessoas dos contornos levaram os enfermos para que, pelo menos, pudessem tocar a barra do manto de Jesus. Dessa forma, eles foram curados. Em sua simplicidade, essas pessoas sentiram algo muito importante: que apenas o contato direto com uma pessoa nos permite conhecermos ou nos sentirmos afetados por ela. Os cristãos teriam que aprender a "tocar" Jesus, a não perder de forma alguma o contato direto com ele, porque ele é a fonte do que somos e o que dá sentido às nossas vidas. Não é impossível tocá-lo hoje fisicamente. 

Há, pelo menos, dois caminhos para nos encontrarmos com Jesus e tocá-Lo. Um é através da Eucaristia e da leitura e da escuta da Palavra de Deus. Em cada Palavra proclamada e meditada há sempre alguma palavra para minha vida se eu estiver aberto diante dela. Há sempre uma palavra que toca minha vida ou minha maneira de viver. Na Eucaristia a Palavra de Deus se faz alimento para minha peregrinação nesta terra rumo à casa do Pai, nosso lar definitivo.  Outra maneira é nos aproximarmos dos nossos irmãos e irmãs, especialmente dos mais pobres e desamparados, dos que sofrem. Eles são, hoje, sacramentos viventes da presença de Jesus no meio de nós (Mt 25,40.45). O contato físico, real, diário, com eles nos fará experimentar, sem dúvida nenhuma, a humanidade viva e real de Jesus que nos cura de nossas enfermidades.

O Senhor nos recebe em sua Casa e nos alimenta com sua Palavra e Seu Pão eucarístico. Mas ele nos envia para que demos testemunho de nossa , alimentando os demais com nosso amor gratuito para que eles possam voltar a viver com mais vigor como filhos e filhas amados do Pai.

P. Vitus Gustama,svd

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