terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

27 de Fevereiro de 2021

PARA AMAR A JESUS VERDADEIRAMENTE E AO PRÓXIMO TEMOS QUE APRENDER A PERDOAR, ATÉ OS INIMIGOS

Sábado da I Semana da Quaresma

Primeira Leitura: Dt 26,16-19

Moisés dirigiu a palavra ao povo de Israel e lhe disse: 16 “Hoje, o Senhor teu Deus te manda cumprir esses preceitos e decretos. Guarda-os e observa-os com todo o teu coração e com toda a tua alma. 17 Tu escolheste hoje o Senhor para ser o teu Deus, para seguires os seus caminhos, e guardares seus preceitos, mandamentos e decretos, e para obedecerdes à sua voz. 18 E o Senhor te escolheu, hoje, para que sejas para ele um povo particular, como te prometeu, a fim de observares todos os seus mandamentos. 19 Assim ele te fará ilustre entre todas as nações que criou, e te tornará superior em honra e glória, a fim de que sejas o povo santo do Senhor teu Deus, como ele disse”.

Evangelho: Mt 5,43-48

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 43 Vós ouvistes o que foi dito: 'Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo!' 44 Eu, porém, vos digo: Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem! 45 Assim, vos tornareis filhos do vosso Pai que está nos céus, porque ele faz nascer o sol sobre maus e bons, e faz cair a chuva sobre justos e injustos. 46 Porque, se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Os cobradores de impostos não fazem a mesma coisa? 47 E se saudais somente os vossos irmãos, o que fazeis de extraordinário? Os pagãos não fazem a mesma coisa? 48 Portanto, sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito.'

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O Senhor é Nosso Deus e Nós Somos Seu Povo

Tu escolheste hoje o Senhor para ser o teu Deus, para seguires os seus caminhos, e guardares seus preceitos, mandamentos e decretos, e para obedecerdes à sua voz. E o Senhor te escolheu, hoje, para que sejas para ele um povo particular, como te prometeu, a fim de observares todos os seus mandamentos”. 

O Deuteronômio, o último livro do Pentateuco, de onde foi tirada a Primeira Leitura de hoje, é, paradoxalmente, apesar da extensa parte legislativa que contém, um dos menos jurídicos. Sua finalidade é mais homilética do que legislativa e seu senso aguçado de história e das relações pessoais com Deus fazem dele, acima de tudo, um livro religioso. 

O texto de hoje recorda o conteúdo da Aliança e sublinha seu caráter espiritual. E a Aliança é uma realidade sempre atual. O Deuteronômio insistiu fortemente sobre este valor e por isso, se usa a palavra “hoje” (“hoje” nos vv. 16-18; cf. Dt 5,3; 6,10-13). Por isso, não se trata de viver de uma economia antiga; o passado não serve mais que para definir melhor o presente, pois tira-se apenas sua lição e consequentemente, as maravilhas passadas não cessam de renovar-se na atualidade. Sem a renovação e a inovação a humanidade não avança. A vida feliz e a glória (v.19) são a recompensa prometida por Deus para aqueles que observam a Aliança. Com efeito, a lei não é uma simples nomenclatura de preceitos impostos ao homem e sim que compromete muito mais uma atitude religiosa: “Eu serei teu Deus (v.17) e tu serás meu próprio povo” (vv.18-19).

Esta frase “Eu serei teu Deus e tu serás meu próprio povo” é para ser recordado por qualquer um de nós em todos os momentos de nossa vida, especialmente nos momentos de prova.

Viver Cristãmente É Caminhar Na Direção Do Bem e Da Salvação

Tu escolheste hoje o Senhor para ser o teu Deus, para seguires os seus caminhos, e guardares seus preceitos, mandamentos e decretos, e para obedecerdes à sua voz. E o Senhor te escolheu, hoje, para que sejas para ele um povo particular, como te prometeu, a fim de observares todos os seus mandamentos”.

O antigo semita é nômada. A estrutura do êxodo de Israel possui três momentos: saída, caminho no deserto e a chegada à Terra prometida (vida estabelecida). O êxodo de Israel constitui um processo de libertação feliz: libertado da escravidão do Egito à Terra prometida, uma “terra que mana leite e mel” (Ex 3,8). O caminho é seco e duro como o deserto, mas ao mesmo tempo não faltam as bênçãos de Deus durante essa caminhada. Neste contexto, o êxodo é entendido como marcha de um povo ou de um grupo de pessoas em busca de algum lugar melhor para se estabelecer, mas sempre com a ajuda divina. “Quem não contar com Deus não sabe contar” (Pascal). Caminho, via e sendas desempenham um papel essencial em sua existência. Como a coisa muito normal utiliza este mesmo vocabulário para falar da vida moral e religiosa e tal uso se manteve na língua hebraica. 

E o êxodo existencial de um ser humano possui três fases: iniciar, transitar e terminar. A vida terrena de um ser humano tem, então, seu início, faz-se no pleno desenvolvimento e aponta para seu término inevitável. O êxodo da vida humana é sempre um caminho de crescimento, uma saída da “própria terra”, de si mesmo. Neste caminho de crescimento suscitam inevitáveis interrogações sobre o próprio homem, sua condição e destino: “Quem sou eu? Que sentido tem a vida? Qual é o sentido da minha vida? O que estou procurando nesta vida? Para onde a vida vai me levar?”. Sem uma resposta a estas perguntas, o itinerário ou o êxodo que conduz para o crescimento ou à plena realização pode terminar em um beco sem saída. Quem tem um porquê para viver, encontrará frequentemente o como viver.

Caminho, em sentido figurado, tem na Bíblia várias acepções. Fala-se de dois caminhos: o caminho da vida e o da morte que Deus põe diante do homem (Jr 21,8); o caminho bom (1Sam 12,13) e o caminho mau (Jr 18,11); o caminho dos justos e o dos pecadores (Sl 1,6). Os caminhos de Deus são distintos dos caminhos dos homens (Is 55,8-9). Os caminhos de Deus conduzem à paz (Is 59,6; Lc 1,79) e à vida (Mt 7,14). Os caminhos dos homens, ao contrário, levam à morte (Pr 14,12) e à perdição (Mt 7,13). Os caminhos de Deus são Sua própria vontade, as normas de conduta sempre retas, verdadeiras e justas (Ap 15,3). A missão fundamental de Jesus Cristo foi ensinar para o homem estes caminhos (Mt 22,16). O próprio Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida (Jo 14,6). Nos Atos dos Apóstolos, o conjunto dos ensinamentos cristãos é chamado caminho, o caminho do Senhor (At 9,2; 18,25-26; 19,9.23; 22,4; 24,14-22). 

A ideia do caminho descreve muito bem nossa vida. Moisés falou sobre isso para seu povo. Na Quaresma nos é recordado ou lembrado de maneira mais explicita que nós cristãos temos um caminho próprio, um estilo de vida que nos traça a Palavra revelada por Deus. A Palavra de Deus nos direciona para a vida em plenitude. Basta ler e meditá-la diariamente, especialmente durante a Quaresma, para que possamos caminhar bem na vida. Temos que nos comportar como o povo da Aliança: continuar a seguir somente Deus e Sua Palavra, palavras que têm vida eterna (Jo 6,68). Deus, por sua parte, nos promete ser nosso Deus, ajudar-nos, fazer de nós o “o povo consagrado”, eleito que dá testemunho de sua salvação em meio do mundo. Deus e Sua Palavra são o único caminho que leva à salvação, à felicidade, à Páscoa definitiva. Deus nos é sempre fiel. Por nossa vez, devemos ser fiéis a Ele e cumprir Sua vontade “com todo o coração e com toda a alma”. 

Somos o povo em peregrinação para a eternidade, para a comunhão plena com Deus. Por isso, o apego, a ganância, o materialismo se tornam inúteis, pois nada se levará. Precisamos de pão, mas “não só de pão o homem vive” (Dt 8,3; Lc 4,4). É preciso viver muito além do pão, pois a nossa fome não é só de pão, mas de outros valores que nos dão o sentido da vida.

Para Estar No Caminho Do Senhor É Preciso a Aprender a Perdoar e Reconciliar-se

O Evangelho de hoje nos põe diante de um exemplo muito concreto deste estilo de vida que Deus quer de nós. Jesus nos apresenta seu programa como estilo de vida cristã: amar inclusive nossos inimigos. É o programa árduo. Mas a Páscoa a que nos preparamos é a celebração de um Cristo Jesus que se entregou totalmente pelos demais. Ele morreu perdoando todos os que O crucificaram. 

Ser seguidores do Senhor Jesus é assumir seu estilo de vida. O modelo deste estilo de vida é o próprio Jesus, Deus-Conosco e o próprio Pai do céu que “faz nascer o sol para os bons e maus e faz cair a chuva para os justos e injustos”, pois Deus é o Pai de todos.

O texto do evangelho lido neste dia faz parte do Sermão da Montanha (Mt 5-7). Estamos na seção chamada de antíteses (Mt 5,21-48) conhecidas pelo uso da seguinte expressão: “Ouvistes... Porém eu vos digo...”. 

Jesus continua analisando a lei antiga (“Ouvistes...”) e dá uma nova ênfase (“Porém eu vos digo...). Ele sabe que o único que pode salvar o ser humano é entender que se não se tem o perdão como ponto de partida, jamais se poderá alcançar uma convivência digna entre os seres humanos. Daqui sua grande preocupação pela busca desses valores que o Pai quer para a humanidade, valores que farão que o ser humano se aproxime da mesma perfeição de Deus (cf. Mt 5,48). Para aprender a amar verdadeiramente, o cristão tem que aprender a perdoar, pois o perdão é a expressão máxima do amor. Perdão é o último testamento de Jesus Cristo da cruz para todos os cristão, pois da cruz o Senhor rezou pelos seus inimigos (cf. Lc 23,34). 

A palavra “perdão” provém do latim “per”: intensificação e “donare”: doar, dar. Assim o perdão é um ato de doação, tanto para aquele que o recebe como para aquele que o brinda. Ambos se enriquecem com o benefício da paz; ambos se libertam do cárcere que os aprisiona. Por isso, o perdão é seguir avançando; é amparo e encontro. O perdão revela a graça. O ato de perdoar é um ato da misericórdia de Deus que apaga os pecados (Am 7; Ex 32,12.14; Jr 26,19; Ez 36,29.33). Perdoar é estar com Deus que perdoa sem medida. Perdoar é estar do lado de Deus.

Quando a comunidade cristã primitiva chegou a compreender que Jesus queria a criação de uma sociedade universal, unida através do amor fraterno, foi capaz de romper todos os distanciamentos que histórica e culturalmente separavam os seres humanos. Para os discípulos nãolugar para distinções (cf. At 10,34). Eles que sofrem as perseguições (Mt 5,10-12) não podem deixar-se dominar pelo ódio. Segundo Jesus no lugar do ódio, o desejo do bem (amor, oração) deve ocupar o coração do cristão. Para isso o cristão tem que estar bem unido a Cristo. Sua força para perdoar está em Jesus Cristo que perdoa até os que O crucificaram: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Aqui Jesus intercede pelos inimigos apesar da maldade que os inimigos lhe causaram. Jesus não nega a culpa cometida pelos inimigos, mas busca uma solução não violenta. “Jesus viveria e morreria em vão, se não conseguisse nos ensinar a ordenarmos a nossa vida pela eterna lei do amor” (Mahatma Gandhi: GANDHI E A NÃO VIOLÊNCIA, p.50 Vozes, 1967).

Amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos maltratam e perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai do céu, pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos”.  Como é difícil amar os que destruíram ou acabaram com nossa vida ou nossa família, e ainda rezar por eles!? No nosso inconsciente, como seres humanos, sempre resta algum sentimento vingativo. Trata-se de um sentimento com o intuito de acabar com a vida dos que nos fizeram algum mal, mas, infelizmente, resulta em acabar com a nossa própria vida por causa do mesmo sentimento: “O ódio que se opõe ao ódio consegue apenas aumentar a superfície e também a profundeza do ódio” (Mahatma Gandhi). Repito: O ódio é igual a beber o veneno e espera-se que o outro morra. Mas aquele que bebe o veneno é que morre. Daí lança-se a pergunta: vale a pena seguir o mesmo caminho (violência, vingança)? Não se trata de acariciar a cabeça de quem pratica a violência. Trata-se de procurar alguma alternativa. Nisto percebemos que ser cristão é o grande desafio diariamente. Todo dia devemos renovar o nosso ser de cristãos ao contemplar permanentemente Jesus Cristo, o amor misericordioso de Deus feito homem.

As sociedades humanas ao longo da história foram construídas a partir do princípio de interesses de grupos determinados que excluam todos aqueles que são vistos como ameaça à existência própria de ditos grupos. A comunidade cristã se encontra também a cada passo com pessoas que ameaçam sua existência. O inimigo está no horizonte de sua existência e frequentemente, esse inimigo pode ser qualificado de perseguidor. No entanto, para ela Jesus propõe uma nova lei que é a culminação de todas as contraposições mencionadas previamente. O “mandamento de amar” a todos deve converter-se em marca distintiva da comunidade de seguidores de Cristo, capaz de expressar sua originalidade na história humana, pois eles são filhos de Deus no Filho Jesus Cristo.  Ser filhos de Deus”, segundo Jesus, significa parecer-se a Ele ou com Ele no modo de fazer e de viver. 

Por isso, as palavras de Jesus hoje são, na verdade, reveladoras: fazei o bem e orai. A fraternidade universal é a consequência de outra realidade essencial: a paternidade universal de Deus. O amor sem fronteiras que Deus nos pede é o que Ele mesmo vive,pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos”. Deus ama a todos os homens. Ama até aos que não O amam. Ele derrama seus benefícios, seu sol formoso e sua chuva sobre todos. Assim Jesus nos diz que quando deixamos de amar alguém significa que recusamos alguém que Deus ama. Aquele que consideramos como nosso inimigo é amado por Deus. Nosso ou meu inimigo é um filho de Deus. Não se trata de um formoso ideal humanista. Deus é a única referência. Amar aqui significa querer o bem do outro independente daquilo que o outro faz contra mim. Para fazer isso é preciso ter muita maturidade cristã e espiritual. 

Amar as pessoas que nos amam, que se parecem a nós, é natural. Mas Deus nos pede mais. Deus nos pede que ampliemos nosso coração muito além do círculo de nossos amigos, de nossos parentes, de nosso âmbito. Isto será possível somente na medida em que todos os seres humanos chegarem a se amar e a se perdoar por ter consciência de que todos são os filhos e filhas do mesmo Pai celeste como rezamos diariamente o Pai Nosso (Mt 6,9-15). Se todos são filhos e filhas do Pai celeste, então, maltratar um ser humano é maltratar o Pai do céu, pois Deus também está no próximo (cf. Mt 25,40.45) e o próximo, como eu, é templo do Espírito Santo (cf. 1Cor 3,16-17).

"Sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito", assim Jesus concluiu. A perfeição é o horizonte de nossa existência. Como horizonte ela não é alcançável, mas serve como guia para nossa existência diária. “O fraco jamais perdoa: o perdão é uma das características do forte”. (Mahatma Gandhi).

Para pensar: As três coisas mais difíceis do mundo são: guardar um segredo, perdoar uma ofensa e aproveitar o tempo.” (Benjamin Franklin).

P. Vitus Gustama,svd

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