sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

09 de Fevereiro de 2021

VIVER DE ACORDO COM O CORAÇÃO RETO E INDIVISÍVEL PARA PODER AGRADAR A DEUS

Terça-feira Da V Semana Comum

Primeira Leitura: Gn 1,20–2,4a

20 Deus disse: “Fervilhem as águas de seres animados de vida e voem pássaros sobre a terra, debaixo do firmamento do céu”. 21 Deus criou os grandes monstros marinhos e todos os seres vivos que nadam, em multidão, nas águas, segundo as suas espécies, e todas as aves, segundo as suas espécies. E Deus viu que era bom. 22 E Deus os abençoou, dizendo: “Sede fecundos e multiplicai-vos e enchei as águas do mar, e que as aves se multipliquem sobre a terra”. 23 Houve uma tarde e uma manhã: quinto dia. 24 Deus disse: “Produza a terra seres vivos segundo as suas espécies, animais domésticos, répteis e animais selvagens, segundo as suas espécies”. E assim se fez. 25 Deus fez os animais selvagens, segundo as suas espécies, os animais domésticos segundo as suas espécies, e todos os répteis do solo segundo as suas espécies. E Deus viu que era bom. 26 Deus disse: “Façamos o homem à nossa imagem e segundo a nossa semelhança para que domine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, e sobre todos os répteis que rastejam sobre a terra”. 27 E Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou: homem e mulher os criou. 28 E Deus os abençoou e lhes disse: “Sede fecundos e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a! Dominai sobre os peixes do mar, sobre os pássaros do céu e sobre todos os animais que se movem sobre a terra”. 29 E Deus disse: “Eis que vos entrego todas as plantas que dão semente sobre a terra, e todas as árvores que produzem fruto com sua semente, para vos servirem de alimento. 30 E a todos os animais da terra, e a todas as aves do céu, e a tudo o que rasteja sobre a terra e que é animado de vida, eu dou todos os vegetais para alimento”. E assim se fez. 31 E Deus viu tudo quanto havia feito, e eis que tudo era muito bom. Houve uma tarde e uma manhã: sexto dia. 2,1 E assim foram concluídos o céu e a terra com todo o seu exército. 2No sétimo dia, Deus considerou acabada toda a obra que tinha feito; e no sétimo dia descansou de toda a obra que fizera. 3Deus abençoou o sétimo dia e o santificou, porque nesse dia descansou de toda a obra da criação. 4aEsta é a história do céu e da terra, quando foram criados.

Evangelho: Mc 7,1-13

Naquele tempo, 1os fariseus e alguns mestres da Lei vieram de Jerusalém e se reuniram em torno de Jesus. 2Eles viam que alguns dos seus discípulos comiam o pão com as mãos impuras, isto é, sem as terem lavado. 3Com efeito, os fariseus e todos os judeus comem depois de lavar bem as mãos, seguindo a tradição recebida dos antigos. 4Ao voltar da praça, eles não comem sem tomar banho. E seguem muitos outros costumes que receberam por tradição: a maneira certa de lavar copos, jarras e vasilhas de cobre. 5Os fariseus e os mestres da Lei perguntaram então a Jesus: “Por que os teus discípulos não seguem a tradição dos antigos, mas comem o pão sem lavar as mãos?” 6Jesus respondeu: “Bem profetizou Isaías a vosso respeito, hipócritas, como está escrito: ‘Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim. 7De nada adianta o culto que me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos’. 8Vós abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens”. 9E dizia-lhes: “Vós sabeis muito bem como anular o mandamento de Deus, a fim de guardar as vossas tradições. 10Com efeito, Moisés ordenou: ‘Honra teu pai e tua mãe’. E ainda: ‘Quem amaldiçoa o pai ou a mãe deve morrer’. 11Mas vós ensinais que é lícito alguém dizer a seu pai e à sua mãe: ‘O sustento que vós poderíeis receber de mim é Corban, isto é, Consagrado a Deus’. 12E essa pessoa fica dispensada de ajudar seu pai ou sua mãe. 13Assim vós esvaziais a Palavra de Deus com a tradição que vós transmitis. E vós fazeis muitas outras coisas como estas”.

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Deus Criou Tudo Por Amor

Continuamos a acompanhar o relato da criação do universo por Deus. A ideia bíblica de “criação” se expressa com o verbo hebraico “bara”, que denota não só a ação de dar princípio à realidade, mas também a ação restauradora (re-criadora) e consumadora dessa mesma realidade. Em outras palavras, Deus CRIA quando, primeiro, Ele chama à existência os seres que não existem ou não existiam. Segundo, Deus sustenta as criaturas na sua existência (providência divina), escolhe um grupo humano para que se converta em seu povo (Povo eleito) e refaz a criação degradada pelo pecado (fruto da ganância ou da avareza humana). Terceiro, Deus conduz essa mesma criação redimida à plenitude do ser e de sentido que é a salvação. A história da humanidade foi, desde as origens, orientada para a luz eterna, e toda a humanidade foi convidada a penetrar no descanso de Deus.

Em cada uma dessas acepções da ideia da criação, um atributo divino se destaca: o amor. Deus cria por amor. Deus se encarnou por amor. Deus redime por amor. Deus ama tanto para criar como para salvar. A ação criadora, mais do que a onipotência é a expressão da bondade irrestrita, a generosidade ilimitada e o amor gratuito de um Deus que atua movido exclusivamente por sua vontade de comunicar-se. O que se pretende é revelar aos crentes o porquê e o para quê da realidade criada. O porquê é o amor divino enquanto comunicador de ser; o para quê é esse mesmo amor enquanto salvador e doador de plenitude a todo o criado. Ler a Bíblia é aprender a conhecer o coração de Deus mediante Suas palavras” (Gregório Magno). E coração de Deus é um coração cheio de amor misericordioso. Certamente, da primeira até a última página da Bíblia conta-se a história do amor de Deus pela humanidade. Santo Agostinho dizia: “Qual o valor desta virtude (amor/caridade)? É a alma das Sagradas Letras, a força da profecia, a vida dos sacramentos, o fundamento da ciência, o fruto da fé, a riqueza do pobre, a vida dos moribundos”. Unicamente na direção do amor é que poderemos caminhar em direção ao centro da vida: o resto equivale a se perder.           

A suprema felicidade da vida é a certeza de que somos capazes de amar e somos amados por Deus e por aqueles que nos querem bem. “Somente o amor não fica molestado pela felicidade alheia, pois não é invejoso. Somente ele não se deixa enfatuar na felicidade própria, pois não se incha de orgulho” (Sto. Agostinho). Por isso, à medida que a vida avança, o critério da maturidade real é a capacidade de amar. 

Portanto, a Primeira Leitura nos lembra que toda a realidade humana, o mundo inteiro como habitação humana, é uma boa obra de Deus por amor. O cristianismo não condena o que é humano, nem olha com desconfiança para a realidade do mundo. Porque é obra de Deus e Deus viu que "tudo era muito bom". Especialmente o homem foi criado à sua imagem.

Ao nos criar amorosamente, de alguma forma, Deus se colocou em nossas mãos. Um místico alemão disse: "Deus tem tanta necessidade de mim como eu preciso dele". Aquele que ama precisa do amado. Os humanistas ateus dizem: se admitirmos a existência de Deus, o homem não seria livre. Isso é falso. A afirmação oposta é verdadeira: se o homem existe, Deus não é mais livre para deixar de amar o homem. O homem pode abandonar Deus, mas Deus não abandona o homem. Deus não cria para ser dono de alguém, mas apenas para dar, compartilhar e esperar. Deus nos espera. Ele nos ama de tal maneira que ele se deixou morrer por nós. "Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu único Filho, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas alcance a vida eterna" (Jo 3,16).

A fé na criação de Deus implica uma ética ecológica, um modelo de relação homem-natureza que permita contemplar essa mesma natureza como casa e pátria do ser do homem, e ao mesmo tempo, sacramento pela real presença nela do Criador e pela encarnação nele do Mediador da criação.

O destino do homem não é viver por viver; trabalhar, amar, reproduzir-se ou dominar a criação e sim conviver, compartilhar a vida com Deus e caminhar juntos movido tudo por amor. 

Honrar a Deus Com Coração

Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim. De nada adianta o culto que me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos”.

Lendo o texto do evangelho de hoje logo percebemos qual foi a situação por trás do texto. O evangelista Marcos sente a necessidade de explicar quais eram os costumes dos fariseus e quase de todos os judeus (Mc 7,3-4). Isto nos mostra que Marcos escreveu seu evangelho para cristãos que não eram da origem judaica. Marcos está falando para uma comunidade cristã a fim de comunicar um ensinamento muito importante de Jesus.

O ensinamento parte da pergunta dos escribas e dos fariseus vindos de Jerusalém: “Por que os teus discípulos não seguem a tradição dos antigos, mas comem o pão sem lavar as mãos?”. 

Jesus, colocando-se na linha dos antigos profetas, cita o profeta Isaias e depois, Moisés para rebater seus adversários: “Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim. De nada adianta o culto que me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos”. Na expressão de Jesus há antíteses: “lábios- coração”, “render culto- preceitos humanos”. Na primeira antítese se descreve a exterioridade, a aparência. Trata-se de uma vida não vivida na intimidade ou na profundidade do coração. Este tipo de vida é chamada de vida hipócrita, pois o externo não corresponde com o que há no coração e nas aspirações humanas. Na segunda antítese se descreve um culto hipócrita porque está regido pelos preceitos humanos que abandonam (Mc 7,8), anulam (Mc 7,9) e esvaziam (Mc 8,13) os mandamentos de Deus.

Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim”. Com esta afirmação Jesus quer colocar em destaque a moral do coração e não somente a moral das ações. Somente de um homem devidamente ordenado, de um homem de coração limpo é que podem proceder ações morais e éticas. Uma pessoa íntegra, de coração indivisível sabe se governar e se controlar, sabe ser justo e honesto.  Aquele que não é capaz de governar a si mesmo não será capaz de governar os outros (Mahatma Gandhi). É uma chamada para a retidão de intenção ou a retidão do coração. Quando o coração está em desordem, então a conduta se torna cega. Nisto consiste um esforço contínuo de purificação. Para Jesus o primeiro dever do homem é ter a consciência limpa ou o coração puro. “Faz de teu coração um tribunal e senta-te nele como juiz de ti mesmo. Tua memória seja o promotor, tua consciência a testemunha, e o temor de Deus, o juiz” (Santo Agostinho: Serm. 351, 4,7). Portanto, não se trata somente de fazer as coisas de coração e sim de fazer coisas que procede do coração reto e limpo. Para Jesus o coração tem que estar limpo para que possa estar em disposição para captar a vontade de Deus, uma vontade que não é simplesmente letra escrita. Não basta superar a hipocrisia e o formalismo; a interiorização pede algo mais que sentimento de sinceridade.

O coração reto do qual fala Jesus não é feito somente de coragem, de fidelidade e de boa memória sobre todos os ensinamentos. O coração é feito de disponibilidade, entendendo com isso a liberdade e a intuição. Trata-se de criar uma situação interior capaz de conhecer a Deus, ao verdadeiro Deus, capaz de ler de novo a vontade de Deus. O coração é o lugar onde Deus se revela, não simplesmente o lugar onde se percebe a obrigatoriedade de um esquema existente e onde se encontra a coragem de repeti-lo.

Assim no texto do evangelho de hoje Jesus reprova o espírito farisaico: a confusão entre o rigorismo minucioso na observância da moral e da fidelidade a Deus. A minuciosidade nem sempre é sinal da fidelidade. Jesus também reprova artimanhas casuísticas na interpretação dos deveres morais, um defeito que leva a um duplo desequilíbrio: complicar a observância da lei especialmente para a gente simples e tranquilizar a consciência dos astutos que intentam salvar o esquema da lei descuidando de sua substância. Jesus também critica a confiança nas próprias obras acima do amor de Deus que nos chega gratuitamente. Aquele que se gloria pelas próprias obras, e não pelo amor gratuito de Deus e pela sua misericórdia, tem pretensão inútil de ser Deus para si próprio. 

Para tudo isto, o evangelho assume uma dupla tarefa: pôr em evidência qual é o centro da lei: é a caridade. “Atente para que a sua prática religiosa não seja mais importante do que seu Deus e seu próximo” (René Juan Trossero). O egoísmo devora o que o outro tem; o amor oferece ao outro o que lhe falta. Segundo, considerar a obediência do homem à lei como resposta ao gesto salvífico e gratuito de Deus e não a lei por lei. A lei ou as normas devem me ajudar a me aproximar de Deus.  Em outras palavra, não são as normas que produzem a graça de Deus e sim a graça de Deus é que produz disciplina e normas para o homem. A graça de Deus ordena minha vida e me coloca em uma disciplina. Atrás de tudo isto há uma advertência fundamental de Jesus que serve de fio condutor para todo o capitulo 7 de Marcos: todas as formas de legalismo são sempre uma forma de recusar a Deus. O legalismo farisaico nasce de uma incompreensão de Deus e oferece uma razão para recusá-Lo; de fato foi um motivo para recusar a Jesus. 

Os homens verdadeiros e autênticos podem ser aplaudidos ou condenados, amados ou odiados, mas sempre despertam nossa admiração. Quem vive na retidão tem como critério a verdade e a caridade. A verdade dita com caridade convence até os ateus em tudo. A verdade dita com caridade humaniza nossa maneira de falar e de tratar dos assuntos mais complicados. “O amor e a verdade estão tão unidos entre si que é praticamente impossível separá-los. São como duas faces da mesma medalha” (Mahatma Gandhi). É preciso ter um coração indivisível e íntegro para ter uma ação ética. 

Vós abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens, disse Jesus citando o profeta Isaías. Através desta afirmação Jesus quer nos dizer que o mandamento de Deus e as tradições dos homens têm que ser considerados como duas coisas distintas. Os dois não estão no mesmo plano e por isso, não podem ser colocados no mesmo patamar, pois o mandamento de Deus é perene e as tradições dos homens são provisionais.

Para ser lembrado: Somente de um homem devidamente ordenado e de coração puro é que podem proceder ações morais e éticas. É uma chamada para a retidão de intenção e de ação.

P. Vitus Gustama,svd

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