BATISMO DO SENHOR
Primeira Leitura: Is 42,1-4.6-7
Assim fala o Senhor: 1“Eis o meu servo — eu o recebo; eis o meu eleito — nele se compraz minh’alma; pus meu espírito sobre ele, ele promoverá o julgamento das nações. 2Ele não clama nem levanta a voz, nem se faz ouvir pelas ruas. 3Não quebra uma cana rachada nem apaga um pavio que ainda fumega; mas promoverá o julgamento para obter a verdade. 4Não esmorecerá nem se deixará abater, enquanto não estabelecer a justiça na terra; os países distantes esperam seus ensinamentos. 6Eu, o Senhor, te chamei para a justiça e te tomei pela mão; eu te formei e te constituí como o centro de aliança do povo, luz das nações, 7para abrires os olhos dos cegos, tirar os cativos da prisão, livrar do cárcere os que vivem nas trevas”.
Evangelho: Mt 3,13-17
Naquele tempo, 13Jesus veio da Galileia para o rio Jordão, a fim
de se encontrar com João e ser batizado por ele. 14Mas João protestou, dizendo:
“Eu preciso ser batizado por ti, e tu vens a mim?” 15Jesus, porém,
respondeu-lhe: “Por enquanto deixa como está, porque nós devemos cumprir toda a
justiça!” E João concordou. 16Depois de ser batizado, Jesus saiu logo da água.
Então o céu se abriu e Jesus viu o Espírito de Deus, descendo como pomba e
vindo pousar sobre ele. 17E do céu veio uma voz que dizia: “Este é o meu Filho
amado, no qual eu pus o meu agrado”.
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A festa do Batismo do
Senhor encerra o Tempo do Natal e abre o Tempo Comum que será interrompido pela
Quaresma e Páscoa. E será reiniciado após a festa de Pentecostes. E os textos do
Evangelho para a leitura semanal do tempo comum serão ordenados da seguinte
maneira:
- Evangelho
de Marcos:
1ª -9ª Semana Comum.
- Evangelho
de Mateus:
10ª -21ª Semana Comum.
- Evangelho de Lucas : 22ª -34ª Semana Comum.
O batismo do Senhor é outra epifania de Jesus: manifestação de Jesus publicamente através da cena do Batismo.
Os relatos evangélicos do Batismo de Jesus têm um matiz claramente apologético. O Batismo de Jesus nos revela que havia resistência à incorporação deste fato da vida de Jesus na consciência cristológica das comunidades para as quais os evangelistas dirigiam seus evangelhos. Os evangelistas explicam de várias maneiras o paradoxo de que Jesus, não tendo pecado algum, se apresente para ser batizado por João Batista. Mateus, por exemplo, sublinha o caráter premeditado da decisão de Jesus que sai da Galiléia para ser batizado por João (v.13). E a voz celeste, que revela Jesus como “o Filho amado” (v.17), resolve o problema.
Por que Jesus foi batizado? Qual é o sentido de nosso Batismo?
Antes de iniciar sua atividade, Jesus, repleto do Espírito Santo e sob a guia do mesmo Espírito, escolhe seu próprio caminho como Messias de Israel, abandonando os modelos de prestígio e poder para assumir o de serviço e a fidelidade ao Pai. Por isso, no deserto, lugar clássico da verificação e da prova do povo de Deus, Jesus rejeita decididamente o caminho do prestígio fácil, do poder, do privilégio, e escolhe o caminho da fidelidade (Lc 4,1-13). É um caminho que se concluirá na suprema provação de Jerusalém: a morte de cruz.
Pergunta-se freqüentemente sobre a historicidade do batismo de Jesus. Por qual motivo Jesus foi batizado se o batismo de João é o de arrependimento para remissão dos pecados (cf. Mc 1,4; Mt 3,6; Lc 3,3)? Exatamente o significado “penitencial” do batismo de João, explicitamente notado pelos sinóticos, é que causa problema no caso de Jesus.
Primeiramente, recebendo o batismo nas águas, Jesus torna-se solidário com os pecados do povo e de todos os homens; e se solidariza com todos aqueles que lutam por um mundo melhor. Ele assume o pecado do mundo e abre, a todos os que queiram seguir o exemplo da sua vida, o caminho da salvação-libertação de todas as formas de escravidão. Jesus não vem de fora para nos dizer o que fazer, mas assume de dentro, faz seu, tudo o que é a vida do homem: o mal, o pecado, a dor, a limitação... E assumindo-o, torna-nos possível viver uma vida diferente, purificada e liberta. Faz-nos descobrir que os homens se edificam vivendo para os outros.
Jesus viveu, sofreu e morreu para que a nossa vida e a nossa morte se tornassem semelhantes à dele. Jesus não agiu como se fosse um pecador, pois elenão tinha pecado (Hb 4,15). Ele veio para viver uma vida humana para nos ensinar a amar no sofrimento, na luta contra a injustiça, na humilhação. Para nos ensinar a amar mesmo quando pensamos que já sabemos (por exemplo: pais para filhos). Para nos ensinar que saber amar é a verdadeira vida dos homens, pois o Deus em quem acreditamos é amor (1Jo 4,8.16). Jesus não andou com os “bons” do seu tempo nem esperou que os “maus” viessem até Ele; ele foi procurá-los, para estar com eles. O batismo de Jesus é a consciência do homem Jesus da missão que o Pai lhe confia.
Jesus consome toda a sua vida “fazendo o bem e curando os oprimidos” (At 10,38), único caminho para ser homem. E Ele o faz a partir de dentro, a partir da pobreza da condição humana, sem fazer uso de qualquer poder para além do amor e do esforço constantes: “Ele não clama nem levanta a voz, nem se faz ouvir pelas ruas. Não quebra uma cana rachada nem apaga um pavio que ainda fumega; mas promoverá o julgamento para obter a verdade. Não esmorecerá nem se deixará abater, enquanto não estabelecer a justiça na terra; os países distantes esperam seus ensinamentos” (Is 42,2-4).
E assumindo plenamente a nossa condição humana, Jesus nos mostrará o caminho de Deus, nos mostrará quem é Deus e para onde nos quer conduzir. O Espírito entrou nele para convertê-lo no Homem Novo, no Homem para os outros.
Somos (fomos) batizados para fazer o bem para todos, para salvar os outros do caminho do mal, a exemplo de Jesus. Nosso Batismo é sinal de nosso compromisso de querer viver segundo o caminho que nos marcou Jesus, caminho de justiça e de liberdade, de amor e de paz, de fraternidade e de familiaridade (viver como uma família, pois Deus é o Pai Nosso).
Em segundo lugar, nota-se claramente, também que, ao apresentar o batismo de Jesus, os sinóticos apenas acenam ao rito batismal para dar o máximo espaço à visão do Espírito que desce sobre Jesus e à voz do céu que O apresenta como Filho de Deus, amado e fiel. Por isso, o evangelista Mateus apresenta a objeção explícita de João Batista diante de Jesus que pede o batismo: ”Sou eu que devo ser batizado por ti e tu vens a mim?” (Mt 3,14). Em Lc João Batista coloca a superioridade de Jesus com esta expressão: “Eu vos batizo com água, mas virá aquele que é mais forte do que eu. Eu não sou digno de desamarrar a correia de suas sandálias. Ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo” (Lc 3,16). A tradição sinótica deixa o fato do batismo de Jesus em plano secundário para dar o máximo realce à descida do Espírito Santo sobre Jesus em conexão com o seu batismo no Jordão. A novidade evangélica está na acentuação do papel do Espírito que desce do céu e na solene investidura de Jesus como Filho amado de Deus e fiel executor da sua vontade. Jesus por meio do dom do Espírito, no momento do batismo, fica plenamente habilitado para a sua missão de Filho de Deus com a atitude do servo fiel. Este é o significado que a tradição primitiva deu ao batismo de Jesus e que os evangelistas fizeram seu, embora com acentuações diferentes.
Todos nós recebemos o batismo. O batismo não é um peso nem uma moda cristã e sim um dom, uma predileção de Deus, um chamamento a estar em comunhão com Deus, um chamamento à fé nele. Através do batismo, Deus não impõe as obrigações sobre nós, mas nos ama e nos oferece a sua graça e salvação em Jesus Cristo. Como resposta a este dom e a este amor é o amor e a entrega a Deus e aos irmãos na Igreja em que somos incorporados e a vivência desta filiação divina no mundo em que vivemos. Temos que assumir livre e conscientemente e satisfatoriamente a nossa condição de batizados. O nosso compromisso pessoal e comunitário de batizados é configurar com Cristo no seu estilo, na sua mentalidade e na sua doutrina. Crer em Cristo é comprometer-se com a pessoa e a causa de Jesus Cristo.
Somos filhos de Deus pela participação da filiação divina de Jesus Cristo. No Batismo nos doamos a Cristo e ele nos assume em si, para que depois não vivamos mais para nós mesmos, mas graças a Ele, com Ele e n´Ele. No Batismo abandonamos a nós mesmos e colocamos nossa vida nas mãos de Cristo para poder dizer com São Paulo: “Não sou eu quem vive, mas Cristo que vive em mim” (Gl 2,20).
Esta é a novidade do Batismo: nossa vida pertence a Cristo, não mais a nós mesmos. Eu sou de Cristo. Por isso, eu não estou sozinho na minha vida diária. Eu não sou do mundo. Eu pertenço a Cristo. A minha vida tem um dono: Jesus Cristo. Precisamente, por isso, não estamos mais sós nem mesmo na morte, mas estamos com Cristo que vive para sempre. Cristo é a vida de nossa vida.
Na cena do Batismo, o Espírito de Deus desce sobre Jesus porque ele está totalmente aberto à ação de Deus. O Espírito de Deus capacita o homem Jesus a levar até o fim a missão recebida do Pai para salvar os homens por amor.
Quando nos fecharmos ao Espírito Santo, nos tornaremos facilmente escravos de uma multidão de “pequenos espíritos”: espírito de rivalidade, de inveja, de prepotência, de complexo de superioridade, de querer a própria vantagem e assim por diante.
Abrir-se ao Espírito Santo é outra coisa. Trata-se de acolher humildemente a presença criadora de Deus em nós. É deixar-se purificar e modelar pelo Espírito de Deus, que animou a vida e a atividade de Jesus, para que possamos passar a vida fazendo o bem. Abrir-se ao Espírito Santo é viver da fé a experiência de um amor que nos envolve e nos faz invocar a Deus como Pai e nos aproximar dos outros como irmãos. Se nos abrirmos ao Espírito Santo, seremos conseqüentemente parceiros do bem. Ao abrirmos ao Espírito Santo produziremos muitos frutos tais como amor, alegria, paz, tolerância, agrado, generosidade, lealdade, simplicidade e domínio de si (cf. Gl 5,22-23; leia também 1Cor 12,6-11).
Para ser cristão de verdade, cada batizado tem necessidade de se abrir interiormente à força do Espírito Santo. Isto não se faz uma vez por todas. O rito de água somente se recebe uma vez na vida de cada batizado. Cada dia temos que nos submergir no batismo interior do Espírito de Deus através de um exercício constante da fé, da esperança e do amor.
Por isso, hoje é o
dia muito oportuno para recordar nosso batismo, mas não somente para recordá-lo
e sim para renovar a presença viva do Espírito Santo que nos foi dado através
do rito batismal.
P. Vitus Gustama,SVD
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