APRENDER A VIVER NA CULTURA DO ENCONTRO E
DO DIÁLOGO PARA ELIMINAR A VIOLÊNCIA
Segunda-Feira da
XI Semana Comum
16 de Junho de 2014
Evangelho: Mt
5,38-42
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 38
“Ouvistes o que foi dito: ‘Olho por olho e dente por dente!’ 39
Eu, porém, vos digo: Não enfrenteis quem é malvado! Pelo contrário, se
alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda! 40
Se alguém quiser abrir um processo para tomar a tua túnica, dá-lhe
também o manto! 41 Se alguém te forçar a andar um quilômetro,
caminha dois com ele! 42 Dá a quem te pedir e não vires as
costas a quem te pede emprestado”.
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O texto do evangelho lido neste dia
se encontra no Sermão da Montanha (Mt 5-7). Este texto é conhecido como a
quinta antítese nesse Sermão que nos fala sobre como devemos nos relacionar com
quem nos ofendeu. Para entender o significado desta antítese precisamos conectá-la
com as bem-aventuranças na abertura do Sermão da Montanha. Em algumas das
bem-aventuranças Jesus declara: “Bem-aventurados os mansos... Bem-aventurados os
misericordiosos... Bem-aventurados os que promovem a paz...”. É isto que Jesus nos ensina
agora e nos ensinará também com seu exemplo (cf. Mt 11,28-30; 12,18-21). Na Paixão,
Jesus pedirá o perdão ao Pai para os malvados (cf. Lc 23,34). São Pedro na sua primeira
Carta escreveu: “Quando injuriado, não revidava; ao sofrer, não ameaçava,
antes, punha a sua causa nas mãos daquele
que julga com justiça” (1Pd 2,23).
Nesta quinta antítese, Jesus faz
seu comentário sobre a lei de talião do Antigo Testamento. No Livro do
Êxodo lemos: “Vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão,
queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe” (Ex
21,23-25; cf. Lv 20,17-22). Aqui se acentua a vingança proporcional ou a
vingança na mesma medida.
A lei de talião era conhecida em todo
o Oriente Antigo. Ela é encontrada no Código Hammurábi, nas leis assírias, na
Torah bem como também entre os gregos e os romanos.
No famoso Código de Hammurabi
(século XVIII a.C) encontramos os seguintes artigos referentes à Lei de talião:
·
O artigo 196: “Se alguém arrancar um
olho de outro, também seu olho será arrancado”.
·
O artigo 197: “Se alguém quebrar um
membro de outro, também um de seus membros será quebrado”.
·
O artigo 200: “Se alguém quebrar um
dente de outro, um de seus dentes será quebrado”.
A finalidade primordial dessa lei
era colocar um limite a uma vontade desenfreada de vingança em uma sociedade em
que a vingança era quase que institucionalizada (cf. Gn 4,23-24). Portanto, a
intenção dessa lei era proteger os direitos das pessoas contra os excessos de
violência.
Na quinta antítese do Sermão da
Montanha Jesus faz uma reflexão sobre a lei de talião e oferece uma solução:
« Pelo contrário, se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a
esquerda. Se alguém quiser levar-te ao tribunal, para ficar com a tua túnica,
deixa-lhe também o manto. Se alguém te obrigar a acompanhá-lo durante um
quilômetro, caminha dois com ele. Dá a quem te pedir e não vires as costas a
quem te pede emprestado” (Mt 5,38-42).
Com esta antítese Jesus coloca como
alternativa à violência, não a lei de talião, mas a não-violência. Na verdade,
Jesus já colocou nas Bem-aventuranças a atitude certa contra a violência:
“Bem-aventurados os mansos, bem-aventurados os misericordiosos, bem-aventurados
os que promovem a paz”. Jesus nos ensina também com seu exemplo (cf. Mt
11,28-30; 12,18-21). E São Pedro na sua Carta escreveu que Cristo “Quando
injuriado, não revidava; ao sofrer não ameaçava, antes, punha a sua causa nas
mãos daquele que julga com justiça” (1Pd 2,23).
A reação paradoxal que Jesus sugere
aos cristãos, diante da violência, tem uma finalidade concreta: mostrar as
possibilidades extremas de aplicação do seu mandamento de amor. Quem é movido
por um amor incondicional ao próximo será capaz de fazer gestos radicais para
coibir a violência, sem responder com a mesma moeda. Tudo supõe que se tenha um
coração limpo (cf. Mt 5,8). A lei de talião é excluída pela limpeza de coração
e pela compaixão. O cristão é chamado a não entrar na engrenagem infernal de um
violento e não reagir com a violência à violência.
Segundo Jesus não basta “agüentar”
os maus; devemos fazer, por eles, algo de positivo. Jesus não quer bobos, mas
fortes, capazes de fazer algo para que o mundo mude ou melhore. Não é
suficiente sofrer, enquanto tivermos ainda uma possibilidade de fazer
positivamente o bem.
Não é possível viver odiando em
inimizade profunda e irreversível. O dano interior provocado por uma relação
esfarrapada corrói nossas melhores energias e o Templo de Deus em nós se deteriora
(cf. 1Cor 3,16-17) e sentimentos de vingança o deformam lentamente. O perdão é
o testamento escrito por Jesus na cruz.
Vamos olhar para nossa realidade,
tanto dentro da Igreja como fora dela, na sociedade, e vamos nos perguntar: a
Lei de Talião ainda continua sendo praticada? Será que abandonamos a cultura
que o Papa Francisco denomina a Cultura do encontro em que um se torna próximo
do outro e por isso, um tem que cuidar do outro? A cultura do encontro freia até
elimina a cultura de violência em que tudo se resolve com a briga e a vingança?
Não temos tentação em fazer vingança contra o outro que não está de acordo com
nosso pensamento e nossa maneira de viver? Viver uma vida de uma maneira só é
uma grande pobreza e mata toda a criatividade.
Deveríamos realizar um progressivo
desarme intelectual, moral e religioso. É não justificar o injustificável. É
crer na força do amor. É tirar da Eucaristia a certeza de curar nossas feridas
profundas. Toda vez que fazemos memória da morte e ressurreição de Cristo, o
mesmo Senhor nos introduz, pelo Espírito, na plenitude de sua existência
pascal.
Quando o amor for “excesso” o mal é
obrigado a não se produzir e sua existência se extingue. Não é uma petição aos
heróis e sim para todos os cristãos para que imitem o exemplo do seu Senhor
Jesus Cristo. Para isso, temos que pedir permanentemente ao Senhor sua graça e
força que vem de Seu Espírito para acontecer uma transformação profunda no
nosso modo de viver com os demais homens. Mas “Empregar o nome de
não-violência quando existe uma espada em vosso coração é, não somente
hipocrisia e desonesto, mas, ainda, covardia. Se permanecermos não-violentos, o
ódio ficará sem efeito. O primeiro princípio da ação não-violenta é o da
não-cooperação com tudo que é humilhante” (Mahatma Gandhi).
Reflitamos as seguintes palavras do
escritor e psicólogo argentino, René Juan Trossero:
“Não me importam as suas teorias
sobre a violência;
O que me interessa saber é como
você viveNo meio da violência que nos cerca por todas as partes.
Se você nunca foi vítima da
violência,
Fale sobre ela com prudênciaPor respeito aos que a sofrem na pele.
Provocar a violência em nome de
Deus
E do Evangelho é um sacrilégio.Pregar a resignação para os que sofrem a violência,
Invocando Deus e o Evangelho, é uma trapaça.
Não acabará a violência quando
houver menos armas,
E sim quando houver mais amor.
Destruir a violência com a
violência
É como apagar um incêndio com
gasolina.A única maneira de lutar contra a violência
É não provocá-la”. (René Juan Trossero)
São Pedro descreve Jesus da seguinte
maneira: “Quando injuriado, não revidava; ao sofrer, não ameaçava, antes,
punha a sua causa nas mãos daquele que
julga com justiça” (1Pd 2,23). Diante deste Jesus precisamos olhar para
nossa maneira de viver e de conviver, pois adotamos a maneira de viver de Jesus
como nossa e assumimos seus ensinamentos para nossa vida cotidiano, pois somos cristãos?
Será que podemos nos dizer como somos cristãos, ou estamos cristãos ainda?
P.Vitus Gustama,svd
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