SER VERDADEIRO CRISTÃO É SER PROFETA QUE ANUNCIA E DENUNCIA
Quinta-Feira da XXVIII
Semana Comum
16 de Outubro de 2014
Evangelho: Lc 11,47-54
Naquele tempo, disse o Senhor: 47 “Ai de
vós, porque construís os túmulos dos profetas; no entanto, foram vossos
pais que os mataram. 48 Com isso, vós sois testemunhas e aprovais as
obras de vossos pais, pois eles mataram os profetas e vós construís os túmulos.
49 É por isso que a sabedoria de Deus afirmou: Eu lhes enviarei profetas
e apóstolos, e eles matarão e perseguirão alguns deles, 50 a fim de que
se peçam contas a esta geração do sangue de todos os profetas, derramado desde
a criação do mundo, 51 desde o sangue de Abel até o sangue de Zacarias,
que foi morto entre o altar e o santuário. Sim, eu vos digo: serão pedidas
contas disso a esta geração. 52 Ai de vós, mestres da Lei, porque
tomastes a chave da ciência. Vós mesmos não entrastes, e ainda impedistes os
que queriam entrar”. 53 Quando Jesus saiu daí, os mestres da Lei e os
fariseus começaram a tratá-lo mal, e a provocá-lo sobre muitos pontos. 54
Armavam ciladas, para pegá-lo de surpresa, por qualquer palavra que saísse de
sua boca.
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Continuamos a acompanhar as Lições
do Caminho dadas por Jesus durante sua última viagem para Jerusalém (Lc
9,51-19,28), pois nessa cidade Ele será crucificado, morto e glorificado.
E a passagem do evangelho de hoje
nos apresenta a ultima parte do conjunto de acusações de Jesus (Lc 11,37-54)
contra os dirigentes oficiais judeus, os fariseus e os escribas porque eles
invertem o valor das coisas. Eles vivem uma vida dupla. São denunciados pela
incoerência de sua vida. As palavras de Jesus têm um tom de denúncia e por
isso, trata-se de a voz de um profeta.
Nesta ultima parte encontramos os
mais terríveis acusações, pois a religião dos fariseus não só camufla a morte
espiritual, mas também mostra uma oposição radical aos verdadeiros porta-vozes
de Deus, pois esses profetas foram assassinados. Não se pode considerar verdadeira
uma religião, uma crença que usa de violência contra aos demais seres humanos. Cada
verdadeira religião, cada verdadeira Igreja, cada crença verdadeira deve transformar
seus adeptos em irmãos e irmãs da humanidade. Cada verdadeira religião, cada
verdadeira Igreja deve manter sua função profética contra qualquer injustiça
social, contra qualquer desigualdade, contra qualquer violência e assim por
diante. A denúncia de Jesus, apesar de conter toda verdade, provoca o ódio
feroz nos seus adversários e o próprio Jesus será vítima da própria denúncia. “Os
que discutem mais que defendem a verdade, utilizam mais as desculpas que os
argumentos, não se preocupam com a verdade, mas com seu próprio triunfo”,
dizia Santo Agostinho (Epist. 238,2).
Mas a verdade vencerá, e o tempo vai
mostrar toda a verdade. Dia virá, indeterminado, porém seguro, em que Deus
pedirá contas da consciência que destruímos, da pobreza que geramos e das vidas
que prejudicamos, do sangue de todos os profetas que derramamos, de todos os
inocentes, sacrificados aos interesses humanos em virtude da inteligência mal
empregada e da defesa de uma lei supostamente sagrada. O sagrado é o próprio
ser humano, pois ele é o templo de Deus (cf. 1Cor 3,16-17; cf. Mt 25,40.45).
“Ai de vós, porque construís os
túmulos dos profetas; no entanto, foram vossos pais que os mataram. Com isso,
vós sois testemunhas e aprovais as obras de vossos pais, pois eles mataram os
profetas e vós construís os túmulos. (...) Sim, eu vos digo: serão pedidas
contas disso a esta geração” (Lc 11, 47-48. 51b).
Os escribas crêem honrar os profetas
assassinados fazendo-lhes esplêndidos sepulcros. Ou seja, os fariseus estão
dispostos a honrar os profetas mortos, mas não fazem caso para os profetas
vivos. Eles tratam os profetas de seu tempo igual ao tratamento que os seus
antepassados faziam contra os verdadeiros profetas. Em outras palavras, na
realidade, eles seguem o mesmo caminho (eles vão matar Jesus). Eles matarão
Jesus em nome de sua interpretação sobre a lei. Possuidores da chave da ciência
eles fecham o caminho da salvação aos que confiam neles e os seguem como guias.
Eles preferem seus próprios caminhos ao caminho de Deus.
Ao denunciar a perseguição e a morte
dos profetas antigos, Jesus denuncia antecipadamente a injustiça praticada
contra Ele, no futuro próximo, exatamente, por aqueles que buscam agradar a
Deus e cultivam uma suposta santidade. Isto nos mostra que a recitação de um
credo e a prática do culto sem o compromisso de uma conduta coerente eticamente
é um ópio que adormece a própria consciência. É um grande alerta a todos que se
dizem religiosos ou fieis para que a prática religiosa não seja mais importante
do que o próprio Deus e o próximo.
Que falta que os profetas nos fazem!
E o Evangelho insiste: os profetas foram perseguidos, acusados e derramaram seu
sangue, foram assassinados (Lc 11,49). O mundo precisa verdadeiramente dos
homens e das mulheres que profetizam, isto é, que anunciam o bem e denunciam o
mal e tudo que é desumano. Em um lugar e em um tempo em que carece o
transcendente, o divino; em um tempo onde tantos filhos de Deus, os inocentes
estão maltratados e crucificados pela fome, pela exploração, pela injustiça,
pela desesperança, em um lugar onde a verdade é silenciada e distorcida,
somente as vozes proféticas podem dizer algo transparente, crível capaz de
chegar até o coração de cada pessoa para transformá-lo em um coração sincero,
em um coração de irmão. Se nos faltarem os profetas, o testemunho cristão será
opaco, sua voz será inexpressiva, suas atividades serão infecundas e
frustrantes. São Paulo nos adverte: “Não extingais o Espírito; não desprezeis
as profecias. Discerni tudo e ficai com o que é bom. Guardai-vos de toda
espécie de mal” (1Ts 5,19-22). Necessitamos de profetas dentro da própria
Igreja e fora dela da mesma forma.
“Ai de vós, mestres da Lei,
porque tomastes a chave da ciência. Vós mesmos não entrastes, e ainda
impedistes os que queriam entrar”.
Os escribas dominam as Sagradas
Escrituras. Possuidores da chave da ciência, os escribas fecharam a salvação
aos que põem neles sua confiança e os seguem como guias. Eles preferem os
próprios caminhos ao caminho de Deus. Mas não basta compreender a Palavra de
Deus. É preciso abrir toda essa riqueza para que seja desfrutada por todos.
Deus nos confiou a riqueza de Seu amor, de Sua vida, de Seu perdão, de Sua
salvação não para que escondamos e sim para que todos conheçam toda essa
riqueza a fim de que sua vida tenham sentido apesar de tudo, como a
perseguição. Não basta construir templos. É necessário viver o Evangelho. É
necessário que a salvação seja parte de nossa própria vida de cada dia. A fé
nos move para que mudemos nossos critérios de acordo com a Palavra de Deus a
fim de que sejamos sinais do amor de Deus para os demais.
Nós nos reunimos em torno de Cristo
na celebração de Seu mistério pascal para assumirmos nossa própria
responsabilidade. Quem somente participa (= assistir) da missa sem nenhuma
capacidade de produzir fruto, se faz responsável, não somente, da morte de
Jesus, mas também do mal que continua dominando muitos ambientes de nosso
mundo.
Não basta construir templos, casas
de assistência social, fundar clubes ou associações de ajuda solidária. É
necessário viver o Evangelho. É necessário confessar Jesus Cristo. Na sua
primeira homilia, logo depois de sua eleição, o Papa Francisco disse: “Podemos
caminhar o que quisermos, podemos edificar um monte de coisas, mas se não
confessarmos Jesus Cristo, está errado. Tornar-nos-emos uma ONG
sócio-caritativa, mas não a Igreja, Esposa do Senhor... Quando não se confessa
Jesus Cristo, faz-me pensar nesta frase de Léon Bloy: ‘Quem não reza ao Senhor,
reza ao diabo’. Quando não confessa Jesus Cristo, confessa o mundanismo do
diabo, o mundanismo do demônio”. A Igreja de Cristo não pode ficar na somente
promoção social como uma filantropia. Mas é necessário fazer que a salvação
faça parte de nossa própria vida para que possamos levá-la também aos demais.
P. Vitus Gustama,svd
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