terça-feira, 29 de junho de 2021

Terça-feira Da XIV Semana Comum, 06/07/2021

É PRECISO APOIAR-SE NO DEUS FORTE VIVENDO CONFORME SUA PALAVRA

Terça-Feira da XIV Semana Comum

Primeira Leitura: Gn 32,23-33

Naqueles dias, 23 Jacó levantou-se ainda de noite, tomou suas duas mulheres, as duas escravas e os onze filhos e passou o vau do Jaboc. 24 Depois de tê-los ajudado a passar a lutar com ele até o raiar da aurora. 26 Vendo que não podia vencê-lo, este tocou-lhe o nervo da coxa e logo o tendão da coxa de Jacó se deslocou, enquanto lutava com ele. 27 O homem disse a Jacó: “Larga-me, pois já surge a aurora”. Mas Jacó respondeu: “Não te largarei, se não me abençoares”. 28 O homem perguntou-lhe: “Qual é o teu nome?” Respondeu: “Jacó”. 29 Ele lhe disse: “De modo algum te chamarás Jacó, mas Israel; porque lutaste com Deus e com os homens, e venceste”. 30 Perguntou-lhe Jacó: “Dize-me, por favor, o teu nome”. Ele respondeu: “Por que perguntas-me o meu nome?” E ali mesmo o abençoou. 31 Jacó deu a esse lugar o nome de Fanuel, dizendo: “Vi Deus face a face e tive poupada a minha vida”. 32 Surgiu o sol quando ele atravessava Fanuel; e ia mancando por causa da coxa. 33 Por isso os filhos de Israel não comem até hoje o nervo da articulação da coxa, pois Jacó foi ferido nesse nervo.

Evangelho: Mt 9,32-38

Naquele tempo, 32 apresentaram a Jesus um homem mudo, que estava possuído pelo demônio. 33 Quando o demônio foi expulso, o mudo começou a falar. As multidões ficaram admiradas e diziam: “Nunca se viu coisa igual em Israel”. 34 Os fariseus, porém, diziam: “É pelo chefe dos demônios que ele expulsa os demônios”. 35 Jesus percorria todas as cidades e povoados, ensinando em suas sinagogas, pregando o Evangelho do Reino, e curando todo o tipo de doença e enfermidade. 36 Vendo Jesus as multidões, compadeceu-se delas, porque estavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor. Então disse a seus discípulos: 37 “A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. 38 Pedi pois ao dono da messe que envie trabalhadores para a sua colheita!”

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É Preciso Apoiar-se Em Deus Nas Nossas Lutas Diárias, Pois Ele é o Deus Forte

De modo algum te chamarás Jacó, mas Israel; porque lutaste com Deus e com os homens, e venceste”.

No dia anterior lemos um episódio misterioso na vida de Jacó em que Jacó, no sonho, via os anjos descende e subindo (cf. Gn 28,10-22). É um episódio que aconteceu durante a fuga de Jacó por medo de seu irmão, Esaú, de quem roubou a bênção da primogenitura. Hoje a Primeira Leitura nos apresenta mais um episódio desta natureza em que Jacó luta contra uma pessoa que parece homem, mas que não se sabe, pelo relato, se é um espirito, um anjo ou o próprio Deus. Desta vez o episódio acontece na sua viagem de volta para Canaã onde mora seu irmão, Esaú de quem ele tem muito medo.

O episódio de Fanuel interrompe o relato do encontro imediato de Jacó com Esaú, seu irmão, e também é de grande importância no conjunto das narrativas sobre Jacó. O Javista (redator do texto) aplicou ao patriarca uma velha tradição local que falava de um ataque noturno da divindade. Nos tempos primitivos, havia lendas frequentes de deuses ou seres de outro mundo que lutavam com alguns homens, especialmente à noite. O resultado foi muitas vezes que esses homens de alguma forma se apoderaram de uma parte da força desses seres ou desses deuses. Em nosso caso, esta luta se apresenta como um perigo muito mais temível do que a presença de Esaú, e ameaça a própria vida do depositário das promessas (Jacó). Se Jacó consegue vencer, de acordo com o relato, deve-se somente à bondade divina. Talvez este evento noturno suponha uma purificação interior do patriarca Jacó. Em todo caso, tem um caráter típico, já que nesta luta se reflete a história de Israel com Deus, especialmente dada a equiparação  de Jacó e Israel (um nome honorífico  concedido por Deus, que, no entanto, não quer manifestar seu próprio nome, porém dá a bênção ao patriarca Jacó). Jacó é constituído, deste modo, como o homem da bênção, ou seja, um homem protegido por Deus. Consequentemente, Jacó não deve ter medo. 

A cena de Jacó lutando a noite toda com o enviado de Deus é rica em simbolismo. Interessa-nos particularmente sobre o tema da fraternidade traída e restabelecida como fio condutor para uma leitura do Gênesis. O encontro com Deus passa pela reconciliação com o irmão. No contexto desta história de lutas e reconciliações é interessante notar, especialmente, o drama produzido por três tensões dialéticas entrelaçadas: a tensão entre os irmãos, a tensão do homem consigo mesmo no interior de seu coração, e a tensão entre o homem com Deus. Este último está simbolicamente encarnado na rica passagem da luta de Jacó com o anjo: aceitação da graça e resistência a ela, abençoar e ser abençoado, ferida/mágoa e consolação, e assim por diante, são vários aspectos dessa tensão. Olhemos  para esta cena e tomemos esta passagem como um símbolo de nossa fuga e de nossa exposição à graça.

Jacó passou bastante anos, mais ou menos uns vinte anos, em Mesopotâmia, onde se refugia. Agora volta para sua terra de origem, Canaã, com suas duas mulheres (Lia e Raquel) e seus onze filhos, com muito medo de Esaú, seu irmão. 

Nesta circunstância é que sucede a misteriosa luta com o desconhecido, que aconteceu durante a noite. Segundo a crença popular, os espíritos tinham seu campo de atuação durante a noite e ao amanhecer eles despareciam. Nessa luta Jacó saiu vitorioso apesar de ficar coxo, para dizer que Jacó não fugirá mais. Jacó reconhece no homem que lhe feriu durante a luta como um ser sobrenatural e lhe pede sua bênção. Jacó sabe que ele já tem a bênção dada pelo seu pai, Isaac, mas que não a merece.

Esta bênção lhe será outorgada, mas antes, seu nome será mudado de “Jacó” (suplantador, trambiqueiro) para “Israel” porque “luta com Deus e com os homens e vence” (Gn 32,29). O nome “Israel” vai ser símbolo das vitórias futuras de Jacó, mas sem artimanhas. Até agora a vida de Jacó foi uma luta contra todos: contra os homens e contra Deus.  Mas daqui em diante Jacó jamais poderá suplantar ninguém (Jacó), jamais passará à frente de ninguém (significado de ficar coxo), pois ele vai contar sempre com seu Deus. A partir de agora tudo muda: a escuridão (lutar à noite) é luz (vitória), a noite é dia, o medo é confiança, a covardia é decisão. Jacó transformou-se em Israel. Novo nome e nova maneira de viver. O autor sagrado joga com o sentido do verbo “sarah” (ser forte, prevalecer ou também lutar). Neste suposto, “Israel” teria que traduzi-lo por “Deus (Elohim) é forte, vence ou luta”. Mas o autor sagrado joga com a interpretação popular: “Ser forte com Elohim (Deus), luta com Ele”. No contexto, a ideia de nome novo está relacionada à ideia de vitória no futuro das quais as lutas anteriores (com Deus e com os homens, com Labão e Esaú) são uma garantia.

A Primeira Leitura quer nos dizer que nossos encontros com Deus são misteriosos. Jamais podemos saber que tipo de encontros que vamos ter com Deus nos momentos seguintes de nossa vida. Às vezes nossos encontros com Deus são pacíficos, como o encontro de Jacó com os anjos de Deus que descem e sobem. Outros encontros são mais turbulentos, como a luta noturna de Jacó com o desconhecido, mas que sempre terminam com a bênção, pois com Deus vencemos, pois Ele é forte; Ele é Israel. Neste Deus forte é que temos que nos apoiar e em Quem devemos confiar apesar das noites escuras de nossa vida, pois o amanhecer de Deus pronto para aparecer. É apenas questão de tempo. Haja paciência de nossa parte para esperar o amanhecer de Deus ou o sol de Deus com que ilumina nossas noites de vida.

Além disso, a luta de Jacó com o anjo/Deus nas margens do Jaboc foi um encontro com a graça. E como sempre acontece quando nos deixamos tocar pela graça, o patriarca Jacó saiu daquele encontro vulnerado e abençoado, ao mesmo tempo.

Nós também saímos ao mesmo tempo feridos e consolados, abalados/sacudidos e encorajados/animados após cada encontro com a graça. É por isso que existe uma ambivalência em nossos sentimentos de desejar e de temer aqueles encontros que ansiamos e dos quais fugimos.

Jacó decidiu voltar para sua terra natal apesar de seu medo do irmão, Esaú pronto para querer matá-lo. Muitas vezes sofremos, cedo ou tarde, como consequências de nossas falhas e armadilhas que usamos contra os outros. Mas temos que lutar contra tudo isso. Temos que adotar para nós mesmos “nome novo” para mudar nossa maneira de viver e de conviver com os outros, como Jacó que se transformou em Israel. Seguir a Jesus supõe renúncias e valentia ou luta. O próprio Jesus nos disse: “O Reino dos céus é arrebatado à força e são os violentos (lutadores) que o conquistam” (Mt 11,12). O próprio Jesus teve luta e venceu no grande combate da redenção da humanidade. Agora, como seguidores do Senhor Jesus, somos partícipes dessa vitória, dando-nos forças na nossas lutas de cada dia. As provas da vida nos transformam em pessoas maduras que nos fazem passar de “suplantadores” (Jacó) para pessoas “fortes com a força de Deus” (Israel).

Mas "não é contra homens de carne e sangue que temos de lutar, mas contra os principados e potestades, contra os príncipes deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal (espalhadas) nos ares" (Ef 6,12). Na Eucaristia temos o melhor alimento e a força mais eficaz para nossas lutas de cada dia.

Viver De Acordo Com A Palavra de Deus

1. Palavra Na Nossa Vida Cotidiana 

A primeira parte do evangelho de hoje fala da cura de um mudo que logo em seguida ele começou a falar. 

Deus criou o homem dotado de fala. A palavra é um dos grandes meios de comunicar-se com os irmãos. A palavra é um dos meios que nos vincula aos outros. A palavra pontua nossa vida cotidiana. A palavra é também algo que nos liga a nós mesmos. Quantas vezes, ao acordar de manhã ou em determinadas situações na nossa vida cotidiana, nós falamos a nós mesmos, pelo menos mentalmente. A palavra nos acompanha quase o tempo todo, até mesmo, paradoxalmente, o silêncio, que se tornou tão raro no mundo moderno, tem significado por causa dela. Há profissões que usam menos palavra. Mas há também profissões que trabalham com palavra e dependem da palavra para transmitir sua mensagem ou seu ponto de vista sobre algo na vida ou na sociedade. A palavra está no âmago de nossa vida pessoal, familiar, social e profissional. Já imaginou se você pudesse contar quantas palavras ditas diariamente por você? Creio que você mesmo ficaria assustado ou admirado por tantas palavras ditas em vão, ao mesmo tempo por tantas palavras que saíram de sua boca que ajudaram tantas pessoas por terem sido boas! Milhares e milhares de pessoas mudaram de qualidade de vida por causa da palavra ouvida de outras pessoas ou lida em um bom livro. Cada palavra representa uma realidade ou um mundo contido nela. Você já pensou quantos mundos contidos numa frase que pronunciamos ou escrevemos? Mas será que cada frase pronunciada ou escrita representa mesmo a realidade ou inventamos frases e frases para enganar os outros? Será que em cada frase contém a verdade? Será que levamos em conta a caridade e a fraternidade ao soltar/pronunciar ou ao escrever alguma frase? 

2. Cada Batizado Deve Ser Prolongamento da Palavra de Deus Encarnada

Deus quer que o homem se comunique. Se alguém não se comunicar, se está sempre quieto ou mudo, é sinal de que alguma coisa está errada nele fisicamente, ou psiquicamente ou espiritualmente. A fala é dom de Deus, tanto que São João, no Prólogo de seu evangelho dá um título muito significativo a Jesus: Palavra ou Verbo (Jo 1,1-14). Jesus é a Palavra de Deus para nós; é a comunicação de Deus para nós. Através de Jesus é que Deus fala conosco: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14).  O próprio Pedro, no seu discurso no livro dos Atos dos Apóstolos, nos disse: “Deus enviou a sua palavra aos filhos de Israel, anunciando-lhes a boa nova da paz, por meio de Jesus Cristo. Este é o Senhor de todos” (At 10,36). Como é que opera a Palavra de Deus na vida do homem? O autor da Carta aos Hebreus responde: “A palavra de Deus é viva, eficaz, mais penetrante do que uma espada de dois gumes e atinge até a divisão da alma e do corpo, das juntas e medulas, e discerne os pensamentos e intenções do coração. Nenhuma criatura lhe é invisível. Tudo é nu e descoberto aos olhos daquele a quem havemos de prestar contas” (Hb 4,12-13).  Mas nem a boca santa de Jesus que emite a Palavra de Deus terá qualquer efeito na nossa vida, se nós estivermos surdos a ela. 

É bom notar que seremos também julgados pelas palavras que dizemos ou pronunciamos sobre os outros, além dos atos que praticamos. O livro de Provérbio nos alerta: “Nas muitas palavras não falta ofensas; quem retém os lábios é prudente” (Pr 10,19). “A boca dos justos é fonte de vida, mas a boca dos ímpios encobre violência” (Pr 10,11). Da mesma forma são Tiago nos diz: “Aquele que não peca no falar é realmente um homem perfeito, capaz de frear todo o seu corpo” (Tg 3,2b). Que nossas palavras não ultrapassem nossos atos para não sermos chamados de mentirosos ou falsos. Por isso, São Tiago nos alerta: “Tornai-vos praticantes da Palavra (de Deus) e não simples ouvintes, enganando-vos a vós mesmos” (Tg 1,22). 

A cura do mudo no texto do evangelho de hoje se refere àquele que não quer escutar a voz de Deus, que não quer seguir Seu projeto porque há outras coisas que o ensurdecem. Biblicamente o surdo-mudo (o termo grego “kôphos” significa surdo, mudo e surdo-mudo) é aquele que perde o contato com sua própria realidade de filho de Deus. Ele vive paralisado porque está privado da comunicação com o único que o faz livre: Deus (através de Sua Palavra).

A Igreja, isto é, todo batizado, é responsável pelo Evangelho de Jesus no mundo (cf. Mt 28,18-20). O anúncio da Palavra de Deus define sua missão no mundo. Todos os batizados hão de realizar sua vida na fidelidade à Palavra de Deus. Todos os batizados devem construir a casa de sua vida sobre a Palavra de Deus para que ela seja firme como construir uma casa sobre a rocha (cf. Mt 7,24-25). Cada batizado deve ser pessoa da palavra de Deus, isto é, sua palavra deve ser palavra que edifica e leva os outros para Deus. Cada batizado deve ser encarnação da Palavra de Deus. 

3. Até Para Fazer o Bem Encontramos Dificuldades 

Jesus veio ao mundo unicamente para fazer o bem, como pregou o Apóstolo Pedro: “Vós sabeis como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com o poder, como ele andou fazendo o bem e curando todos os oprimidos do demônio, porque Deus estava com ele” (At 10,38). Mas sabemos muito bem que até para fazer o bem encontramos dificuldades e críticas como aconteceu com Jesus no texto do evangelho de hoje. Jesus libertou um surdo de sua mudez e começou a falar. Jesus foi criticado por causa disso: “Os fariseus, porém, diziam: É pelo príncipe dos demônios que ele expulsa os demônios” (Mt 9,34). Mas “a acusação teológica (dos fariseus) não é mais que um pretexto que apenas dissimula sua sede de autoridade sobre o povo”, comentou P. Bonnard. Atrás de uma acusação ou crítica há interesse. Mas a questão é esta: que tipo de interesse?

4. Ser Compassivo Como Cristo

A segunda parte do texto do evangelho de hoje (Mt 9,35-38), na verdade, é uma introdução para o discurso de Jesus sobre a missão (Mt 9,35-10,16). 

Esta segunda parte fala da compaixão de Jesus pela multidão: “Vendo Jesus as multidões, compadeceu-se delas...”. Jesus sempre se compadece pelos que sofrem como o mudo no evangelho de hoje. A compaixão é uma das características de Deus.

Uma verdadeira compaixão não olha o necessitado de cima para baixo (sentimento de superioridade), mas é capaz de padecer-com, sentir-com para daí atuar. Cada compaixão sempre tem a ver com o deixar aproximar-se, prestar atenção, sentar-se à mesma mesa, chamar pelo nome, perceber a necessidade, oferecer a ajuda. A compaixão é comover-se até as entranhas, solidarizar-se profundamente, sentir-se a partir de outrem; é sofrer com (Latim: pati + cum, compaixão = sofrer com). A compaixão requer que estejamos com as pessoas que sofrem e dispostos a partilhar nosso tempo com elas. É estar no lugar do outro para sentirmos o que ele sente e ajudar no que puder dentro do limite da capacidade. Por isso, pode-se dizer que a verdadeira compaixão é muito humana e divina simultaneamente. Quando compartilhamos nosso coração e tempo com uma pessoa que sofre, uma parte do sofrimento dela será aliviada. Vamos deixar o resto com Deus desde que façamos nossa parte até o limite de nossa capacidade. Somos seguidores do Deus da Compaixão que se tornou carne em Jesus Cristo. A compaixão deve se tornar carne também em nós.

P. Vitus Gustama,svd

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