O HOMEM É A IMAGEM DO DEUS ABSOLUTO
Terça-feira do IX Semana Comum
04 de Junho de 2013
Texto de Leitura: Mc 12,13-17
Naquele tempo, 13as
autoridades mandaram alguns fariseus e alguns partidários de Herodes, para
apanharem Jesus em alguma palavra. 14Quando chegaram, disseram a
Jesus: “Mestre, sabemos que tu és verdadeiro, e não dás preferência a ninguém.
Com efeito, tu não olhas para as aparências do homem, mas ensinas, com verdade,
o caminho de Deus. Dize-nos: É lícito ou não pagar o imposto a César? Devemos
pagar ou não?” 15Jesus percebeu a hipocrisia deles, e respondeu: “Por que me
tentais? Trazei-me uma moeda para que eu a veja”. 16Eles levaram a
moeda, e Jesus perguntou: “De quem é a figura e inscrição que estão nessa
moeda?” Eles responderam: “De César”. 17Então Jesus disse: “Dai,
pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. E eles ficaram
admirados com Jesus.
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Estamos no segundo episódio de choque
entre as autoridades e Jesus (veja o primeiro em Mc 11,27-33). Estes dois
choques têm a mesma idéia de fundo: indagar sobre a consciência que Jesus tem
de si mesmo e de sua missão. Na resposta precedente, dada em forma de parábola (Mc
12,1-12), aparece sua consciência messiânica e, portanto, sua missão de
libertador do povo. Mas como, de quem e de que Jesus liberta o povo?
No episodio do evangelho lido neste
dia entram em ação alguns fariseus e herodianos (do partido de Herodes)
enviados pelo Sinédrio que não pode pegar Jesus por causa do povo (medo do
povo. O povo apesar de não ter cargo e de ser pobre causa medo nas autoridades
por se tratar de uma maioria na sociedade). Esses dois grupos (fariseus e
herodianos) já decidiram há muito tempo em eliminar Jesus (Mc 3,6). Agora querem
apanhá-Lo “em alguma palavra”. A armadilha é essencialmente política, mas se
disfarça, hipocritamente, de religiosidade e de adulação. Eles chamam Jesus de “Mestre”,
algo insólito entre os fariseus e O definem como “verdadeiro” e que Jesus ensina
o caminho de Deus.
Os fariseus e os herodianos
apresentam a Jesus um problema ou um dilema aparentemente insolúvel. Jesus
relativiza o insolúvel problema introduzindo Deus no horizonte do problema. Quando
o ser humano conta com Deus, tudo tem sua solução. O surpreendente de Jesus é
que quando introduz Deus Ele não faz discursos sobre Deus. Jesus simplesmente
vive de Deus, fala com Ele, O presente e O sente. Para Jesus Deus é Alguém, e
não algo. É Alguém com quem conta em quaisquer momentos. É Alguém com quem
Jesus convive. “Eu e o Pai somos um” (Jo 10,30).
Jesus lhes pede a moeda para a
imagem incisa na moeda. Na moeda estava incisa a imagem de Tibério com a coroa
de laurel para indicar sua dignidade divina, e a inscrição: Tibério César,
filho do divino Augusto. Os fariseus e os herodianos tinham a moeda e a
levavam ao Templo. Isto significa que eles profanaram o Templo com uma imagem
de um pagão. Mas o que interessa ao evangelista Marcos é outra coisa: o ensinamento
de Jesus é o único que tem valor para a comunidade cristã. “Dai,
pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. Logicamente, o
ensinamento está na segunda parte: “Devolva a César o que é de César”. Podem ser
propriedade uma moeda e um território, mas cada homem é propriedade de Deus,
feito a imagem de Deus.
“Devolva a Cesar o que é do César”,
diz Jesus. Mas somente devolver o que é do César e não tudo o que o poder
pretende com todo seu aparato coercitivo. Por isso, Jesus acrescenta: “Devolva
a Deus o que é de Deus”. Isto significa que nem tudo é do César, ou seja,
que o poder do Estado não é absoluto. Na linguagem política os limites do poder
político radicam na soberania popular, no reconhecimento e na declaração dos
direitos humanos. Na linguagem espiritual ou religiosa o que se enfatiza é que
os poderes do Estado ou qualquer poder estão limitados pela soberania de Deus,
pois Deus criou o homem a sua imagem e semelhança. Assim expressa o profeta
Isaias do seguinte modo: “Eu sou Deus. Não há outro Deus fora de mim”
(cf. Is 45,20-25). A existência de Deus, o Absoluto, é a negação de qualquer
outro que se apresente como absoluto. Só há um Deus, o resto não é Deus.
Na verdade, aqui não há uma
verdadeira oposição, baseada no Evangelho, entre o que é do César e o que é
Deus. Dar ou devolver a Deus o que é lhe devido implica que seja dado a César o
que somente lhe pertence. O Reino de Deus não se situa fora dos reinos
terrestres que são assumidos por Deus em Jesus Cristo. Por isso, não se pode
ser cristão autentico à margem das realidades. O cristão é chamado e enviado
para ser o sal e a luz do mundo (cf. Mt 5,13-16) para que ninguém explore
ninguém, pois todos são filhos do mesmo Pai. O cristão na vida política deve
ser justo. A obediência cívica não pode estar em contradição com deveres com
Deus. Jesus respeita a autonomia do poder político, mas ao mesmo tempo afirma
implicitamente que as estruturas políticas, representadas neste caso pelo
imperador romano, não podem nunca ser divinizadas. Somente Deus é Deus.
Às vezes podemos cair na tentação de
pensar que o evangelho e a vida cristã se reduzem à mera vida espiritual. O
evangelho de hoje nos mostra que não é assim. A vida do evangelho toca todas as
áreas da vida, e entre elas a vida econômica e a da justiça. “Devolva a
César o que é do César e a Deus o que é de Deus” é o principio da justiça
equitativa, que, todavia, está longe da justiça cristã. Pagar o que se deve são
deveres elementares de justiça. A injustiça não cabe na vida do cristão.
Devolvamos a cada um o que lhe é próprio e nossa vida se encherá de paz e de
alegria. Podemos até ganhar na justiça humana. Mas precisamos estar conscientes
de que ainda resta a justiça divina, como diz São Paulo: “Todos nós teremos
de comparecer manifestamente perante o tribunal de Cristo, a fim de que cada um
receba a retribuição do que tiver feito durante sua vida no corpo, seja para o
bem, seja para o mal” (2Cor 5,10).
P. Vitus Gustama,svd
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