PRUDÊNCIA NA AÇÃO E AMOR
NO TRATAMENTO
Terça-feira da XII Semana
Comum
25 de Junho de 2013
Texto de leitura: Mt 7,6.12-14
Naquele tempo, disse Jesus aos seus
discípulos: 6 "Não lanceis aos cães as coisas santas, não atireis
aos porcos as vossas pérolas, para que não as calquem com os seus pés, e, voltando-se
contra vós, vos despedacem. 12 Tudo o que quereis que os homens vos
façam, fazei-o vós a eles. Esta é a lei e os profetas. 13 Entrai pela
porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduzem à
perdição e numerosos são os que por aí entram. 14 Estreita, porém, é a
porta e apertado o caminho da vida e raros são os que o encontram”.
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Estamos no fim do Sermão da
Montanha (Mt 5-7). A passagem do evangelho que serve para nossa meditação de
hoje é outra parte da conclusão do Sermão da Montanha (Mt 7). No texto de hoje
Jesus nos dá três lições importantes para nossa vida: viver na prudência; em
cada ato praticado o outro deve ser levado em consideração (regra de outro); e
o esforço na luta pela salvação (porta estreita).
No texto de hoje Jesus começa sua
lição com as seguintes palavras: “Não deis aos cães as coisas santas, nem
atireis vossas pérolas aos porcos; para que eles não as pisem e, voltando-se
contra vós, vos estraçalhem” (Mt 7,6). Esta sentença enigmática,
própria de Mateus, não tem nenhuma relação, ao parecer, com o que precede nem
com o que segue (alguns especialistas colocariam o v.6 dentro do conjunto de Mt
7,1-4). Mas o que mais importante para nós é a lição escondida nessa sentença.
Cães e porcos eram animais impuros
para os judeus. A quem, então, Jesus se refere quando fala de cães e de porcos?
Muitos interpretam que cães e porcos representam os pagãos. Na verdade, os cães
e os porcos não designam aqui categorias particulares de homens: pagãos,
fariseus, certas pessoas desviadas, hereges e assim por diante. Cães e porcos
ilustram bem, aqui, duas recusas características do Evangelho: primeiro,
a inconsciência dos que em nenhum momento pressentem (não percebem) o valor do
Evangelho, e segundo, a violência perigosa dos que, decepcionados
por não encontrar nele (no Evangelho) um alimento de seu gosto, se voltam
contra os que propõem a vida de acordo com o Evangelho. Ainda que os discípulos
não excluam ninguém de seu amor (Mt 5,38.43-48), mas eles têm que tomar cuidado
com aqueles que buscam somente seu próprio interesse e cometem a injustiça
contra o próximo. O conselho de Jesus no v.6 se encontra paralelamente no Livro
dos Provérbios (Antigo Testamento): “Quem censura um mofador, atrai sobre si
a zombaria; o que repreende o ímpio, arrisca-se a uma afronta. Não repreendas o
mofador, pois ele te odiará. Repreende o sábio e ele te amará” (Pr 9,7-8).
A expressão “as coisas santas” designa com freqüência no
Antigo Testamento as viandas (alimento) oferecidas em sacrifício e que somente
os fieis podiam consumir “... para a expiação quando de sua tomada de posse
e sua consagração. Estrangeiro algum comerá deles, porque são coisas santas”
(Ex 29,33-34; cf. Lv 2,3;22,10.16; Nm 18,8.19).
O paralelismo “coisas santas - pérolas” demonstra que a
primeira dessas expressões deve ser entendida como uma imagem que designa o que
é infinitamente precioso e pertence exclusivamente a Deus. “As pérolas” são
imagem daquilo que tem um grande valor ou precioso (cf. Mt 13,46).
“Não deis aos cães as coisas
santas, nem atireis vossas pérolas aos porcos; para que eles não as pisem e,
voltando-se contra vós, vos estraçalhem!”. Através deste conselho Jesus nos
ensina a vivermos na prudência. “A
prudência é o olho de todas as virtudes”, dizia Pitágoras. Ser prudente é a
primeira lição do evangelho de hoje.
A palavra “prudência” provém do latim “prudens-entis” que, na acepção própria,
significa precavido, competente. Prudência é virtude que faz prever, e procura
evitar as inconveniências e os perigos; cautela, precaução. A prudência é a
capacidade de ver, de compenetrar-se e de ajustar-se à realidade. A prudência
oferece a possibilidade de discernir o correto do incorreto, o bom do mau, o
verdadeiro do falso, o sensato do insensato a fim de guiar o bom rumo de nossas
ações. O prudente jamais se precipita no falar nem no agir sem conhecimento da
causa ou da realidade. Tendo conhecimento da causa ou da realidade ele fala com
cautela. A prudência é a faculdade que nos permite vermos e aprendermos a
realidade tal como é. A prudência é o modo de viver dos sábios, pois o homem
sábio é sempre guiado pela prudência. Por isso, o sábio dificilmente machuca os
outros.
A segunda lição que Jesus nos dá hoje é
esta: “Tudo quanto quereis que os outros vos façam, fazei também a eles.
Nisto consiste a Lei e os Profetas” (Mt 7,12). Trata-se de uma regra de
conduta e é considerada como a regra de ouro.
A regra de ouro já era conhecida na antiguidade. Em Heródoto lemos: “Não quero
fazer aquilo que censuro no próximo” (Heródoto, 3,142,3). Na sabedoria de
Confúcio (551 antes de Cristo) lemos: “Não faça aos outros o que você não
gostaria que fizessem a você”. Encontramos também esta regra nos ditos do
famoso rabi Hillel: “Não faças a ninguém aquilo que te é desagradável; isso é
toda a Torá, ao passo que o mais é explicação; vai e aprende!”.
Esta regra de ouro nos ensina que
em tudo que falarmos (comentarmos) ou fizermos a vida e a dignidade do outro
devem ser levadas em consideração. Às vezes acontece que machucamos muito os
outros porque ainda temos muitas feridas dentro de nós que ainda não são
curadas. E muitas vezes avaliamos o outro a partir de nossas feridas e não a
partir da própria realidade das coisas. Por trás de uma
pessoa brava e grosseira, há uma pessoa frustrada.
O verdadeiro cristão faz muito mais
além da regra de ouro. Ele é chamado e é enviado a fazer o bem ao próximo
independentemente da retribuição ou do reconhecimento. Ele sempre age com um
amor gratuito e de qualidade sem medir esforços, porque ele tem consciência
clara de que ele é amado por Deus deste modo. Ele é sempre solicito e serviçal.
Trata-se de a opção ou do estilo de vida com Deus traduzido na convivência
fraterna com os demais. Todo trato cordial e fraterno jamais se baseia na lei
de retribuição muito menos acontece por mera formalidade. O cristão existe para
fazer o bem, e se não o fizer deixará de existir em Jesus Cristo que “passou a
vida fazendo o bem” (At 10,38).
A terceira lição dada por Jesus no
evangelho deste dia é esta: “Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e
espaçoso é o caminho que leva à perdição, e muitos são os que entram por ele!
Como é estreita a porta e apertado o caminho que leva à vida! E são poucos os
que o encontram”! (Mt 7,13-14). Estas palavras de Jesus recordam aquilo que Moisés
falou, no Livro de Deuteronômio, para o povo eleito quando acabou de expor a
Lei: “Olha
que hoje ponho diante de ti a vida com o bem, e a morte com o mal. Mando-te
hoje que ames o Senhor, teu Deus, que andes em seus caminhos, observes seus
mandamentos, suas leis e seus preceitos, para que vivas e te multipliques, e
que o Senhor, teu Deus, te abençoe na terra em que vais entrar para
possuí-la. Se, porém, o teu coração se
afastar, se não obedeceres e se te deixares seduzir para te prostrares diante
de outros deuses e adorá-los, eu te declaro neste dia: perecereis seguramente e
não prolongareis os vossos dias na terra em que ides entrar para possuí-la, ao
passar o Jordão. Tomo hoje por
testemunhas o céu e a terra contra vós: ponho diante de ti a vida e a morte, a
bênção e a maldição. Escolhe, pois, a vida, para que vivas com a I tua posteridade,
amando o Senhor, teu Deus, obedecendo à sua voz e permanecendo unido a ele.
Porque é esta a tua vida e a longevidade dos teus dias na terra que o Senhor
jurou dar a Abraão, Isaac e Jacó, teus pais” (Dt 30,15-20).
Moisés falou de vida e de morte;
Jesus, que já olha mais para além da vida neste mundo, fala de “vida e
perdição”. Moisés mandou para “escolher o caminho”; Jesus manda “entrar pela
porta estreita”, tomar o caminho que leva à vida. Moisés fala desta vida; Jesus
fala da vida eterna da qual alcançarão os que seguem a senda estreita.
“Como é estreita a porta e apertado
o caminho que leva à vida!”. O verbo
grego para “apertado” usado em particípio se usa também para indicar aflição,
tribulação e perseguição. São os obstáculos
que tem que ser superados quando se recorre “a senda estreita”.
Não percamos a ideia de “caminho”.
A vida do cristão se concebe como um “caminho” (cf. At 9,2;13,10;18,25 etc.).
Não se improvisa, recorre-se pouco a pouco com uma tensão contínua até o Pai. O
amor nos faz encontrarmos Deus face a face um dia. Não precisaremos mais da fé
e da esperança no momento em que estivermos face a face com Deus na eternidade.
Como disse um pregador: “A fé e a esperança nos levam até a porta do céu. Mas o
que nos faz entrar nele é o amor, pois ‘Deus é amor’ (1Jo 4,8.16)”.
“Como é estreita a porta e apertado
o caminho que leva à vida!”. No Evangelho de
João Jesus se apresenta como porta: “Eu sou a porta; quem entrar por mim será
salvo” (Jo 10,9). O cristão se esforça por ser fiel a Deus e aos princípios
evangélicos como solidariedade, fraternidade, igualdade, justiça, amor,
bondade, solidariedade em vez de egoísmo, agressividade, violência. A santidade
é a forma normal de viver os ensinamentos de Cristo no cotidiano. Mas para tudo
isto se exige muito esforço. “Deus não condena quem não pode fazer o que
quer, mas quem não quer fazer o que pode”, dizia Santo Agostinho (Serm.
54,2).
P. Vitus Gustama,svd
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