SER REFLEXO DA PACIÊNCIA
DIVINA
Sábado
da XVI Semana Comum
27 de Julho de 2013
Texto de Leitura: Mt
13,24-30
Naquele tempo, 24 Jesus contou
outra parábola à multidão: “O Reino dos Céus é como um homem que semeou boa
semente no seu campo. 25 Enquanto todos dormiam, veio seu inimigo, semeou joio
no meio do trigo, e foi embora. 26 Quando o trigo cresceu e as espigas
começaram a se formar, apareceu também o joio. 27 Os empregados foram procurar
o dono e lhe disseram: ‘Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde
veio então o joio?’ 28 O dono respondeu: ‘Foi algum inimigo que fez isso’. Os
empregados lhe perguntaram: ‘Queres que vamos arrancar o joio?’ 29 O dono
respondeu: ‘Não! pode acontecer que, arrancando o joio, arranqueis também o
trigo. 30 Deixai crescer um e outro até a colheita! E, no tempo da colheita, direi
aos que cortam o trigo: arrancai primeiro o joio e o amarrai em feixes para ser
queimado! Recolhei, porém, o trigo no meu celeiro’”.
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Estamos no discurso de Jesus sobre
o Reino de Deus em parábolas. Desta vez Jesus nos conta a parábola sobre o joio
no meio de trigo. O joio é uma planta da família das gramíneas (lolium temulentum) que cresce no meio do
trigo que dificilmente se distingue do bom trigo durante o seu crescimento; só
se vê a diferença nas espigas. As espigas do trigo alimentam o homem (animal),
enquanto que o joio produz uma espiga de grãos escuros de efeito altamente
tóxico. Mas, na verdade, não há necessidade saber da espécie de erva parasita
que Jesus fala nessa parábola; basta saber que se trata de uma planta nociva.
Esta parábola conta uma cena da
vida cotidiana: o dono do campo que semeia a boa semente, o inimigo que
prejudica o campo de trigo ao semear o joio, as relações entre o patrão e os
empregados. Tudo parece normal, exceto a surpreendente reação do dono do campo:
deixar que ambos (joio e trigo) cresçam juntos. A atitude do dono,
evidentemente, chama a atenção dos ouvintes, porque a atitude normal é arrancar
logo o joio para que o trigo possa crescer saudavelmente a fim de produzir boas
espigas. O dono sabe que o joio pode impedir ou dificultar o crescimento do
trigo, mas os dois parecem muito ao princípio e é possível que ao arrancar o
joio, arranquem também o trigo. O dono quer que se espere o tempo da colheita
para separar o trigo do joio.
Evidentemente a parábola do joio
orienta-se para o fim dos tempos, pois ela trata do juízo final, que introduz o
Reino de Deus. Nesta parábola rejeita-se expressamente a idéia duma separação
antes do tempo ou uma precipitação e exorta-se à paciência até chegar o tempo
da colheita. Os homens não estão absolutamente em condição de fazer esta
separação (v.29), pois ao fazer separação que é a competência de Deus, os
homens cairiam em erros de julgamento e os dois (joio e trigo) acabam morrendo
juntos, pois quem julga o outro, cai também no julgamento (Mt 7,1).
Infelizmente a tendência espontânea
dos homens é a de repartir a humanidade em duas categorias: os bons e os maus.
E os maus sempre são os outros e os bons sempre somos nós. Por isso, somos
intolerantes para as faltas alheias, mas muito amigos de nos auto-justificarmos
e muito ligeiros a desculpar-nos. Que as bênçãos de Deus caiam sobre nós e
nossa família, e as maldições sobre os maus, sobre os inimigos. Com isso, somos
maus do mesmo jeito. Com esta atitude os homens, no fundo até inconsciente, tem
uma tendência espontaneamente sectária e intolerante. O outro o amedronta
enquanto não se tornou seu “semelhante”. O mal e o bem não estão só fora de
nós, mas dentro do nosso coração. Ao esquecermos isto, nos constituímos juízes
dos outros. Ninguém pode ter a presunção de ser trigo limpo, porque ninguém é
tão bom que não tenha algum joio. Somente Deus é bom plenamente (Mc 10,18).
Através desta parábola Jesus quer
revelar também a paciência de um Deus que adia o julgamento (vv.28-30) a fim de
deixar ao pecador o tempo para se converter. Apesar de ter na sua mão todo o
poder, Deus se mostra tolerante e paciente para com a sua criatura, o homem,
que é débil, limitado e pecador. Ele não exclui ninguém do Reino: todos são
convocados até o último minuto, todos podem entrar nele. A cólera não é a
última palavra da manifestação divina. O perdão sempre prevalece. A paciência
divina está aberta para todos aqueles que se convertem.
Por sua atitude durante toda a sua
vida, Jesus encarna a paciência de Deus em relação aos pecadores. Não existe
pecado que não possa ser perdoado por Deus, se o pecador se converter; nenhum
pecado arranca o homem do poder misericordioso de Deus.
O segredo desta paciência de Jesus
é o amor. Jesus ama o Pai com o mesmo amor com que é amado, pois é o Filho.
Jesus ama os homens com o mesmo amor com que o Pai os ama. Talvez a expressão
joanina seja melhor para descrever o amor de Jesus: “...amou-os até o fim” (Jo 13,1). Jesus ama os homens até em seu
pecado. Foi o pecado dos homens que conduziu Jesus à cruz. No momento supremo
em que o desígnio divino parece comprometido pela atitude dos homens, o amor se
faz totalmente misericordioso: ”Pai,
perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Jesus, realmente,
amou os homens até o fim.
Por ser membro do Corpo de Cristo,
todos nós temos a missão de encarnar a paciência de Jesus. É na paciência que
se conquista a vida (Lc 21,19). A paciência não é passividade. Por isso, ela é
uma virtude dos fortes e prudentes.
Nossa tarefa neste mundo não é a de
repartir os homens entre os bons e os maus, mas a de revelar o amor
misericordioso de Deus. Ninguém por si tem o direito de se constituir critério
para o seu irmão. Não o irmão justo é o nosso critério, mas o Deus santo e
misericordioso. Aqui na terra, o trigo está sempre misturado com o joio, e a
linha de demarcação entre um e outro passa em todo homem. O cristão e a cristã
são chamados a exercer sua função como pedra insubstituível na construção do
Corpo de Cristo (Igreja) e a cooperar de modo original na realização da
história da salvação. Quando o cristão não se tornar mais o sinal do amor de
Deus, a missão automaticamente degrada-se em propaganda ou em tentativa de
autopromoção. Para isso, temos que nos renovar sem cessar por dentro através do
alimento da Palavra de Deus e da Palavra que se faz carne na Eucaristia.
Além disso, essa parábola serve de
exortação para todos os cristãos. Deus deixa conviver os bons com os maus, sem
pressa de fazer juízo. E nessas circunstâncias não sabemos se fazemos parte do
grupo dos bons ou do dos maus; se somos do trigo ou do joio. Mas como Deus tem
paciência, sempre é tempo de tentarmos produzir alguma coisa positiva, e
rendermos para a vida presente para vivermos na vida eterna.
Portanto, precisamos estar
conscientes de que o bem e o mal são duas realidades que aparecem juntos em
nossa vida porque brotam da mesma fonte: o coração. Da abundância do coração
fala a boca, o que sai de dentro é o que faz boa ou má à pessoa. Isto nos faz
viver verdadeiramente em constante contradição interna como reconhece Paulo: “Realmente não consigo entender o que faço;
pois não pratico o que quero, mas faço o que detesto” (Rm 7,15). Não há
ninguém tão bom que não tenha algo de mau, e não há ninguém tão mau que não
tenha algo de bom. Quem opta por fazer o bem sabe que tem que enfrentar o mal
em todas suas formas.
P. Vitus Gustama,svd
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