sábado, 19 de abril de 2014

 
O SENHOR NÃO NOS ABANDONA

Quarta-Feira da I Semana da Páscoa
23 de Abril de 2014
 

Evangelho: Lc 24,13-35


13Naquele mesmo dia, o primeiro da semana, dois dos discípulos de Jesus iam para um povoado chamado Emaús, distante onze quilômetros de Jerusalém. 14Conversavam sobre todas as coisas que tinham acontecido.15Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles. 16Os discípulos, porém, estavam como cegos, e não o reconheceram. 17Então Jesus perguntou: “Que ides conversando pelo caminho?” Eles pararam, com o rosto triste, 18e um deles chamado Cléofas, lhe disse: “Tu és o único peregrino em Jerusalém que não sabe o que lá aconteceu nestes últimos dias?19Ele perguntou: “Que foi?” Os discípulos responderam: “O que aconteceu com Jesus, o Nazareno, que foi um profeta poderoso em obras e palavras, diante de Deus e diante de todo o povo. 20Nossos sumos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte e o crucificaram. 21Nós esperávamos que ele fosse libertar Israel, mas, apesar de tudo isso, já faz três dias que todas essas coisas aconteceram! 22É verdade que algumas mulheres do nosso grupo nos deram um susto. Elas foram de madrugada ao túmulo 23e não encontraram o corpo dele. Então voltaram, dizendo que tinham visto anjos e que estes afirmaram que Jesus está vivo. 24Alguns dos nossos foram ao túmulo e encontraram as coisas como as mulheres tinham dito. A ele, porém, ninguém o viu”. 25Então Jesus lhes disse: “Como sois sem inteligência e lentos para crer em tudo o que os profetas falaram! 26Será que o Cristo não devia sofrer tudo isso para entrar na sua glória?” 27E, começando por Moisés e passando pelos Profetas, explicava aos discípulos todas as passagens da Escritura que falavam a respeito dele. 28Quando chegaram perto do povoado para onde iam, Jesus fez de conta que ia mais adiante. 29Eles, porém, insistiram com Jesus, dizendo: “Fica conosco, pois já é tarde e a noite vem chegando!” Jesus entrou para ficar com eles. 30Quando se sentou à mesa com eles, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e lhes distribuía. 31Nisso os olhos dos discípulos se abriram e eles reconheceram Jesus. Jesus, porém, desapareceu da frente deles. 32Então um disse ao outro: “Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?” 33Naquela mesma hora, eles se levantaram e voltaram para Jerusalém onde encontraram os Onze reunidos com os outros. 34E estes confirmaram: “Realmente, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão!”  35Então os dois contaram o que tinha acontecido no caminho, e como tinham reconhecido Jesus ao partir o pão.

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Nós esperávamos…!”, disseram os dois discípulos de Emaús diante da morte de Jesus.  Estas palavras estão cheias de uma esperança perdida. É fácil entendermos a decepção desses homens. Em toda vida humana alguma vez ou várias vezes aconteceu e acontecerá uma grande esperança perdida, uma morte cruel, um fracasso humilhante, uma preocupação, uma questão não solucionada ou não solucionável, um pecado que faz sofrer, uma imprudência que causa uma fatalidade, e assim por diante.


Os dois discípulos de Emaús se sentem muito frustrados diante da situação. Frustração é um sentimento de fracasso e decepção que aparece diante de um desejo não realizado ou diante de uma necessidade não satisfeita. Quanto maior for o desejo que quisermos realizar (se não for realizado), maior será o grau de frustração que teremos. Quando uma pessoa não conseguir realizar seu desejo aparecerão duas emoções opostas nela: a raiva e tristeza. Uma pessoa frustrada, muitas vezes, se torna violenta, brava, estúpida, grosseira e assim por diante. Por trás de uma pessoa brava e grosseira, há uma pessoa frustrada.


Os dois discípulos se afastaram de Jerusalém indo para Emaús. A viagem ida para Emaús é triste, em silencio, com sentimentos de derrota e desilusão: “Nós esperávamos...!”


Nisto “O próprio Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles”, comentou o evangelista Lucas. Por seu caminho Jesus vem encontrá-los. E se interessa por suas preocupações. Jesus jamais nos abandona nas nossas tristezas e sofrimentos. Mas o nome dele deve ser sempre nosso assunto de conversa e de oração para que ele inspire nossas conversas e orações. Jesus conhece nossos sofrimentos e nossas decepções. Por isso precisamos nos deixar olhar e interrogar por Jesus: “O que vocês vivem conversando no seu caminho da vida?”. Qual conteúdo da conversa? Precisamos contar tudo para Jesus como expressão de nossa fé nele embora ele saiba de tudo sobre nossa vida.


Os dois não reconheceram o Caminhante que se junta a eles: “seus olhos estavam cegos, não podiam reconhecê-lo”. Sempre é difícil reconhecer o Ressuscitado, como no caso de Maria Madalena, sobretudo, quando os olhos estão tristes e fechados. A fé dos dois se desmoronou. Não crêem na ressurreição apesar da informação de algumas mulheres que o túmulo estava vazio. Há um ponto comum nos relatos das aparições do Ressuscitado: os discípulos estão pouco dispostos a crer; duvidam, não esperam a ressurreição, estão desconcertados.


Somente no pão partilhado é que os dois reconheceram que aquele homem que andava com eles era Jesus ressuscitado. A viagem de volta para Jerusalém se torna exatamente contrária: os dois discípulos correm pressurosos, cheios de alegria, os olhos enxergam melhor e a inteligência fica aberta para entender as Sagradas Escrituras e impacientes para contar a experiência para sua comunidade em Jerusalém.


O ressuscitado está presente nos três grandes momentos em que os discípulos de Emaús o encontraram: na Fração do Pão, na Proclamação de Sua Palavra e na Comunidade. São precisamente os três momentos primordiais de nossa celebração: a Comunidade reunida, a Palavra proclamada e escutada e a Eucaristia recebida como alimento. Os três “sacramentos” do Senhor ressuscitado.


Em outras palavras, o relato do evangelho de Lucas foi elaborado totalmente para nos ensinar como podemos reconhecer Jesus, como podemos avançar lentamente da dúvida, do desespero para a fé.


O primeiro método, para reconhecer Jesus é preciso tomar contato, profundamente, cordialmente, com as Escrituras, com a Palavra de Deus. “Jesus, começando por Moisés e passando pelos profetas, explicava aos discípulos todas as passagens da Escritura que falavam a respeito dele”. O AT esclarece o NT. O projeto de Deus prossegue sem ruptura. O que se realiza em Jesus Cristo é o que Deus previa desde a eternidade. Por isso, precisamos ler e reler a Palavra de Deus com a oração e com o coração, sem os quais jamais conseguiríamos a inspiração divina para entender o que está escrito nas Escrituras.


A segunda experiência para reconhecer Jesus é a Eucaristia, a fração do pão. “Quando se sentou à mesa com eles, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e lhes distribuía. Nisso os olhos dos discípulos se abriram e eles reconheceram Jesus”. A Eucaristia é o sacramento, o sinal eficaz da presença de Cristo ressuscitado. É o grande mistério da fé, embora aparentemente seja um sinal muito pobre, um sinal muito modesto materialmente: pão e vinho. Pobre, materialmente, mas são essenciais para a vida humana. Através destes dois elementos (pão e vinho), estamos diante do Sagrado que quer nos tocar para nos alimentar e salvar. É o sacramento da fraternidade onde todos se alimentam do mesmo Pão eucarístico e do mesmo Cálice. É o momento de humanização, pois todos são comensais. É a vida de Jesus sacrificada para a nossa salvação. É o nosso verdadeiro alimento na caminhada rumo ao céu, à comunhão plena no banquete eterno com Deus. A eucaristia é o céu aqui na terra. Ir à missa é ir ao céu. A Eucaristia é o banquete celeste antecipado já aqui na terra. Não vamos à missa para cumprir preceitos e sim vamos ao céu ao participarmos da Eucaristia que é o banquete celeste.


Na celebração eucarística há duas Mesas inseparáveis: a Mesa da Palavra (Liturgia da Palavra) e a Mesa da Eucaristia (Liturgia da Eucaristia). “No princípio era Palavra e a Palavra se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,1.14). As duas são da mesma importância. Na Mesa da Palavra Deus tem sua Palavra para nos alimentar. Deus sempre tem uma palavra para cada participante da celebração eucarística. E na Mesa da Eucaristia, o Senhor nos alimenta com seu Corpo e seu Sangue. Já que as duas Mesas são da mesma importância, então devemos dar-lhes a atenção de maneira igual e com a mesma reverência. Essas duas mesas se encontram no texto do evangelho de hoje. Jesus nutre, primeiro, os dois discípulos com Sua Palavra (Sagrada Escritura) para depois alimentá-los com o Pão da vida, Pão partilhado na mesa comum.


Depois desses dois sinais isto é, a Palavra e a Fração do Pão, no mesmo instante, os dois discípulos voltaram para Jerusalém para contar essa experiência para os demais discípulos. Isto nos mostra que Jesus se encontra na comunidade reunida em Seu nome e que fala de Seu nome (cf. Mt 18,20).


Além disso, a volta dos dois discípulos com tanta pressa para comunidade também tem outro nome: missão. Cada encontro pessoal com o Senhor Jesus move a pessoa a ir ao encontro dos outros para contar esse encontro, para partilhar a riqueza desse encontro. Ninguém pode somente ficar quieto em seu lugar contemplando Cristo ressuscitado. Há que pôr-se em caminho e marchar até os outros irmãos para que juntos formemos uma comunidade de irmãos baseada no amor e no respeito mútuo e anunciemos a esperança de que a vida humana tem futuro em Deus ao vivermos no presente como irmãos e irmãs, alimentados pelo Pão da Palavra e pelo Pão Eucarístico.


A experiência dos dois discípulos de Emaús nos mostra que a Páscoa não é uma recordação. É salvação, é vida hoje e aqui para você, para mim, para todos nós. Temos, sim, nossas decepções em relação à comunidade. Mas se escutarmos atentamente e profundamente a Palavra de Deus e nos alimentarmos de Seu Corpo e Sangue, não tem como não formar uma comunidade de irmãos. Os dois discípulos de Emaús há muita coisa a nos ensinar sobre como devemos ser a Igreja.

P. Vitus Gustama,svd

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