quarta-feira, 16 de abril de 2014

QUINTA-FEIRA SANTA
 
NOITE DO LAVA-PÉS, DA ENTREGA E DA EUCARISTIA
 
Leituras: Ex 12,1-8.11-14; 1Cor 11,23-26; Jo 13,1-15


Celebramos hoje a instituição da Eucaristia. E dentro desta celebração há o rito do lava-pés. Para a Eucaristia e o lava-pés o Senhor tem o mesmo mandato. Para a celebração permanente da Eucaristia ele dá o seguinte mandato: “Fazei isto em minha memória” (1Cor 11,24). E sobre o lava-pés o Senhor nos diz: “Se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” (Jo13,14-15). Façam a mesma coisa!


O LAVA-PÉS


O Senhor aceita e realiza o serviço do escravo, que é o lava-pés, leva a cabo o trabalho mais humilde, o mais baixo segundo o mundo, a fim de nos fazer dignos de nos sentarmos à mesa do Reino, de fazermos parte da família de Deus. Mas o verdadeiro significado do lava-pés é a expressão mais alta do amor-serviço.


Para João o lava-pés, não é um ato isolado, mas representa aquilo que constitui o sentido da vida inteira de Jesus: o levantar-se da mesa para servir, o despojar-se das vestiduras de glória, o inclinar-se até nós no mistério de perdão, o serviço da vida que ele leva até o fim, até a morte. Por isso, a vida e a morte de Jesus se fazem transparentes e revelam o único ato: o ato de amor que chega até o extremo, um amor infinito, o único lavatório capaz de preparar o homem para a comunhão plena com Deus. É o amor que faz o homem livre. É o amor que torna o homem inocente. O amor é que torna a fragilidade em força, o idoso em jovem, a confusão em direção, o pesado em leveza. É o amor que leva o homem para a eternidade. O amor é que faz o homem irmão do outro. O amor é que faz uma comunidade de irmãos. É o amor que nos leva ao céu.


Mas o homem é capaz de recusar o amor libertador de Deus, o amor que salva. O evangelho nos mostra dois tipos de recusa. A primeira recusa é a de Judas. Mais adiante no mesmo capítulo, o evangelista João faz o seguinte comentário: “Tomando, então, o pedaço de pão, Judas saiu imediatamente. Era noite” (Jo 13,30). O pedaço de pão umedecido no molho dado por Jesus a Judas é sinal de carinho especial, de amor e de amizade que Jesus tem para Judas até o fim. Mas Judas não quer ficar com o grupo que está com Jesus. O materialismo mata o amor. A arrogância sufoca a fraternidade. Judas é totalmente dominado pelas trevas. Por isso, o evangelista acrescenta intencionalmente esta frase: “Era noite”.


Judas representa o homem que não quer ser amado; representa quem despreza o carinho. Ele coloca o bloqueio para qualquer carinho, porque ele pensa apenas em possuir, em viver unicamente para as coisas materiais. Por esta razão, São Paulo diz que a avareza é idolatria (Cl 3,5).


A segunda recusa é a do homem religioso, do devoto cujo representante aqui é Pedro. O perigo consiste em que o “devoto”, o “religiosonão quer aceitar a realidade, isto é, não quer aceitar que também ele necessita de perdão; não aceita que seus pés estão sujos da lama de injustiça, de corrupção, de falta de respeito pela dignidade alheia, de desrespeito pela vida, de desrespeito pela verdade e assim por diante. O perigo que corre o devoto, o religioso consiste em pensar que não tem necessidade alguma da bondade de Deus, do perdão de Deus, em não aceitar a graça. Em resumo, não aceita que ele também é pecador.


Ser cristão, a partir desta perspectiva significa deixar-se lavar os pés sujos. Os pés são partes do corpo humano que tem o contato permanente com a terra, com a lama, com o . Mesmo que se usem as máscaras, como as sandálias, mas até as máscaras também ficam sujas. Santo Agostinho fez o seguinte comentário sobre o lava-pés: “Sem dúvida, o batismo nos limpou inteiramente, inclusive os pés. Estamos ‘limpos’; porém, enquanto vivermos aqui nesta terra, nossos pés pisam a terra deste mundo” (Tract. In Johan, LVI 4).


Por isso, precisamos levar a sério o que o Senhor nos diz neste dia: “Se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” (Jo13,14-15). Ninguém pode ser melhor sem a ajuda do outro. O crescimento é possível convivendo como os irmãos na interdependência, no perdão mutuo, no mutuo respeito. Quando não houver o mutuo respeito, não haverá também a mutua admiração.


Ser Cristão Servidor


 A toalha ou o avental que Jesus usa no lava-pés é o símbolo do serviço ao irmão. O serviço ao irmão é o distintivo que o cristão jamais pode depor, deve vesti-lo vinte quatro horas por dia, pois a todo momento pode haver um irmão que precisa dele e ele deve estar sempre pronto a prestar-lhe o seu serviço. Se não aceita gastar a vida no humilde serviço aos necessitados, nada tem em comum com Jesus que lava os pés de seus Apóstolos.


Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, pois eu o sou. Portanto, se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz”. Esta deve ser a atitude dos comensais da Ceia do Senhor, dos que comungam o Corpo e o Sangue do Senhor.


A Eucaristia deve construir uma comunidade de amor onde um se põe ao serviço dos demais. A Ceia eucarística é uma exigência de amor-serviçal. O sentido mais profundo da eucaristia é o de reunir os homens e as mulheres animados por este espírito: SERVIR. Trata-se de o serviço recíproco, humilde, concreto por amor. O contrário disso é o egoísmo que sufoca o amor, e arrogância que mata a fraternidade e a igualdade.


Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” (v.15). Continuar as ações de Cristo não é repetir ritos, mas atitudes: amor e serviço. O amor sincero e o serviço alegre, ao estilo de Jesus, há de ser o modo da presença de cada cristão neste mundo. Em outras palavras, o amor que se manifestou em Jesus, deve manifestar-se também nos cristãos através do amor mútuo e no serviço humilde por amor.


Vender ou Dar-Se


A Quinta-Feira Santa nos apresenta dois tipos de entrega, duas entregas com seus sinais bem distintivos e resultados opostos: uma é a entrega de Judas; outra é a entrega de Jesus.


A entrega de Judas (vender Jesus) tem seus componentes ou suas essências: a traição e o beijo hipócrita. Também tem seu móvel: umas moedas motivadas pela ganância. Judas prefere ter umas moedas no bolso a respeitar a vida humana. Ele prefere viver no egoísmo a viver na solidariedade. Mas seus resultados são fatais: auto-prisão, solidão e o suicídio. Nãooutro resultado!


A outra entrega é a de Jesus. Ele não vende ninguém; ele se dá a si mesmo para resgatar os outros. Ele não busca interesses, nem dinheiro nem ganância, e sim a vida para seus amigos (cf. Jo 15,13). Neste gesto de amor que se tece sobre o Pão e o Vinho (carne e sangue) Jesus se deixa a si mesmo para permanecer com os seus, para que nunca se encontrem sozinhos nem desamparados em meio do duro combate da vida. Diante daquele que vende em nome de algumas moedas (Judas), Jesus se dá, se oferece gratuitamente.


Vender ou dar-se; interesse ou oferecimento. Qual dos dois papeis queremos representar? Em lugar de quem nos pomos?


A EUCARISTIA


Nesta noite celebramos também a instituição do Sacramento da Eucaristia, o sacramento da fraternidade.


A qualidade da vida humana biologicamente ou fisicamente depende da qualidade daquilo que ele come e bebe. Jesus justamente nosaquilo que é de qualidade, até mais do que isto: Seu Corpo e seu Sangue: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem vida eterna, e eu o ressuscitarei no ultimo dia. Pois a minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue é verdadeiramente uma bebida” (Jo 6,54-55).


Comungar o Corpo do Senhor significa viver aquilo que Jesus viveu, fazer aquilo que ele fez. Ele viveu tudo por amor e fez tudo por amor. O amor transforma tudo em obra prima. Sem o amor tudo se transforma em exibicionismo e tudo se torna uma manifestação da vaidade. O vaidoso normalmente exagera tudo, até os problemas.


Ao comungar o Corpo do Senhor, o cristão está proclamando a todos o compromisso de viver a vida de Jesus: passar a vida inteira fazendo o bem; passar a vida formando a comunidade de irmãos onde deve reinar o amor mútuo e o mutuo respeito.


Será que estamos conscientes disto? Será que temos comungado com esta finalidade? Se Jesus nos deu aquilo que é de qualidade até mais do que isto, será que sabemos dar também o melhor para os outros e para a Igreja de Cristo? A resposta está no seu coração.

P. Vitus Gustama,svd

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