SER IGREJA EM SAÍDA
Sábado da I Semana da Páscoa
26 de Abril de 2014
Evangelho: Mc 16,9-15
9Depois de ressuscitar, na
madrugada do primeiro dia após o sábado, Jesus apareceu primeiro a Maria
Madalena, da qual havia expulsado sete demônios. 10Ela foi anunciar
isso aos seguidores de Jesus, que estavam de luto e chorando. 11Quando
ouviram que ele estava vivo e fora visto por ela, não quiseram acreditar. 12Em seguida, Jesus apareceu a dois deles, com outra aparência,
enquanto estavam indo para o campo. 13Eles também voltaram e
anunciaram isso aos outros. Também a estes não deram crédito. 14Por
fim, Jesus apareceu aos onze discípulos enquanto estavam comendo, repreendeu-os
por causa da falta de fé e pela dureza de coração, porque não tinham acreditado
naqueles que o tinham visto ressuscitado. 15E disse-lhes: “Ide pelo
mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura!”
-------------------------
Todos os especialistas concordam
que o texto lido neste dia foi acrescentado ao evangelho de Marcos
posteriormente para preencher a ausência das aparições de Jesus após a
ressurreição, as quais relataram os outros evangelhos e outros textos do Novo
Testamento. A exegese moderna reconhece a canonicidade deste texto, mas nega
sua autenticidade como o de Marcos. O próprio evangelho de Marcos termina em Mc
16,8. Esse acréscimo aconteceu ainda na época apostólico.
O texto nos relatou que a aparição
de Jesus aos Onze discípulos aconteceu durante a refeição. A refeição é o
momento fraterno, momento de partilha durante o qual se estreitam os laços de
amizade, de família e de fraternidade mesmo que a qualidade daquilo que se come
e se bebe esteja longe de seu valor nutritivo. O momento da refeição é o
momento sagrado. É o momento de dar graças a Deus pela terra, criada por Deus,
que produz o alimento e pela colaboração do homem em cultivar a terra para
produzir alimentos para todos. Por isso, a ausência de um membro da família é
bastante sentida nesses momentos, especialmente nos dias comemorativos. Um dos
sacramentos instituídos por Jesus é, precisamente, o sacramento da “refeição
fraterna” chamado de Eucaristia. É preciso que a nossa participação na
Eucaristia reflita nossas refeições familiares e fraternas em nossa família. E
que a Eucaristia da qual participamos reflita também nas nossas refeições
familiares e na convivência mais fraterna com os demais.
Durante a refeição é que o Senhor
deu aos Onze discípulos o mandato de anunciar a Boa Nova para o mundo inteiro
(toda criatura): “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda
criatura!”. O mandato de ir pelo
mundo inteiro para evangelizar dado durante a refeição nos quer enfatizar que
toda a atividade de evangelização deve ser feita no espírito de fraternidade e
familiaridade, pois todos nós somos filhos e filhas do mesmo Pai celeste pela
participação na filiação divina de Jesus Cristo que nos deu o mandato de
proclamar a Boa Nova aprofundando nosso laço de fraternidade entre todos.
Graças aos Apóstolos chegou até nós a Boa Nova.
Os apóstolos são testemunhas da
grande mensagem da ressurreição e sua pregação está em torno da ressurreição do
Senhor. E os apóstolos se defenderam com valentia diante do tribunal como lemos
nos Atos dos Apóstolos. A fé e o contato cotidiano com a Palavra de Deus são
capazes de transformar os mais humildes em homens valentes e seguros de si
mesmos. É a valentia que nasce da liberdade da fé. Os apóstolos (acusados) eram
gente simples e sem cultura, mas os homens seguros e valentes, intérpretes da
Escritura e pregadores que passaram de acusados para acusadores. Não havia
ordens nem ameaças capazes de os fazerem calar porque a força irresistível de
Deus estava com eles. Os seus adversários se encontraram em nítida dificuldade
ou em beco sem saída, e pretendiam ocultar fatos. Mas os fatos, como a cura do
coxo (cf. At 4,13-21), falam ou se argumentam por si mesmos. Negar os fatos tão
evidentes é considerar-se como mentiroso, cego ou manipulador, fruto de um
autoritarismo e arrogância que por trás de tudo isso se esconde algum interesse
pessoal ou coletivo, ou sente-se ameaçado nos seus negócios interesseiros. Mas
quem vive no bem e do bem reconhece facilmente a presença da verdade onde
estiver. Viver de acordo com a verdade é viver na liberdade e na leveza: “Se
permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos e conhecereis
a verdade, e a verdade vos libertará” (Jo 8,32). Quem vive de acordo com a
Palavra de Deus vive na verdade e conforme a verdade. Mas a verdade é para ser
dita com caridade a fim de ganharmos os outros para Deus e para o bem maior.
“Ide pelo mundo inteiro e
anunciai o Evangelho a toda criatura!”. Os Onze discípulos que saem para
proclamar o evangelho pelo mundo são uns indivíduos duplamente culpáveis. São
culpáveis de ter abandonado o Mestre durante a Paixão. São culpáveis também
pela sua incredulidade depois da ressurreição, como relatou o evangelho de hoje:
“Jesus
apareceu aos onze discípulos enquanto estavam comendo, repreendeu-os por causa
da falta de fé e pela dureza de coração, porque não tinham acreditado naqueles
que o tinham visto ressuscitado”. Precisamente para estes discípulos é que Jesus dê
este mandato: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda
criatura!”. É levar a mensagem que
não pertence aos discípulos, mas pertence a Jesus Cristo. Isto significa que
eles devem se apoiar totalmente em Jesus Cristo permanentemente para ser fieis
à mensagem do Senhor. Se não se apoiar em Jesus Ressuscitado acontecerão
novamente a traição e a incredulidade. Quem prega não é porque seja melhor e
mais inteligente do que os demais e sim por reconhecer-se pecador que recebeu o
perdão de Deus e por ser incrédulo que foi libertado da incredulidade.
“Ide pelo mundo inteiro e anunciai o
Evangelho a toda criatura”. Pregar é o dever da Igreja. Isto quer dizer que
é o dever de cada cristão. Cada cristão tem dever de transmitir a história da
Boa Nova de Jesus para todos os que nunca a ouviram ou ouviram muito pouco. O
dever do cristão é ser o mensageiro de Jesus. Cada cristão é, então, o
mensageiro de Cristo neste mundo. E cada cristão tem que usar todos os meios ao
seu alcance para propagar a Palavra de Deus: homilia, catequese, meios de
comunicação, literatura, arte, festas e convivência. Mas é o anúncio
respeitoso, sem impor, mas convidando; sem ameaçar, mas ofertando a salvação
que liberta.
São Francisco nos aconselhou com as
seguintes palavras: “Pregai sempre o Evangelho e, se for necessário, também
com as palavras”. A atitude, o testemunho de vida, as obras precedem as
palavras no anúncio do Evangelho. No anúncio, nossas palavras não podem
ultrapassar nossas ações ou nosso testemunho de vida. Um provérbio latino diz:
“Verba movent, exempla trahunt” = “As palavras movem, os exemplos
arrastam”. “A missão não se limita a um programa ou projeto,
mas é compartilhar a experiência do acontecimento do encontro com Cristo,
testemunhá-lo e anunciá-lo de pessoa a pessoa, de comunidade a comunidade e da
Igreja a todos os confins do mundo (cf. At 1,8)”. (Documento Aparecida no.145).
Para todos os evangelizadores o
Papa Francisco na sua exortação escreveu: “E que o mundo do nosso tempo, que
procura ora na angústia ora com esperança, possa receber a Boa Nova dos lábios,
não de evangelizadores tristes e descoroçoados, impacientes ou ansiosos, mas
sim de ministros do Evangelho cuja vida irradie fervor, pois foram quem recebeu
primeiro em si a alegria de Cristo... Espero que todas as comunidades se
esforcem por atuar os meios necessários para avançar no caminho duma conversão
pastoral e missionária, que não pode deixar as coisas como estão. Neste momento,
não nos serve uma ‘simples administração’. Constituamo-nos em ‘estado
permanente de missão’, em todas as regiões da terra... O Evangelho convida,
antes de tudo, a responder a Deus que nos ama e salva, reconhecendo-O nos
outros e saindo de nós mesmos para procurar o bem de todos... A Igreja ‘em
saída’ é uma Igreja com as portas abertas. Sair em direção aos outros para
chegar às periferias humanas não significa correr pelo mundo sem direção nem
sentido... Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo!
Repito aqui, para toda a Igreja, aquilo que muitas vezes disse aos sacerdotes e
aos leigos de Buenos Aires: prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada
por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a
comodidade de se agarrar às próprias seguranças.” (Evangelii Gaudium
no.10.25.46.49).
P. Vitus Gustama,svd
Nenhum comentário:
Postar um comentário