quinta-feira, 12 de março de 2015

14/03/2015
 
HUMILDADE NO REZAR E NO AGIR

Sábado da III Semana da Quaresma


Textos: Os 6,1-6; Lc 18, 9-14

Naquele tempo, 9Jesus contou esta parábola para alguns que confiavam na sua própria justiça e desprezavam os outros: 10Dois homens subiram ao Templo para rezar: um era fariseu, o outro cobrador de impostos. 11O fariseu, de , rezava assim em seu íntimo: ‘Ó Deus, eu te agradeço porque eu não sou como os outros homens, ladrões, desonestos, adúlteros, nem como este cobrador de impostos. 12Eu jejuo duas vezes por semana, e eu dou o dízimo de toda a minha renda’. 13O cobrador de impostos, porém, ficou à distância, e nem se atrevia a levantar os olhos para o céu; mas batia no peito, dizendo: ‘Meu Deus, tem piedade de mim que sou pecador!’ 14Eu vos digo: este último voltou para casa justificado, o outro não. Pois quem se eleva será humilhado, e quem se humilha será elevado(Lc 18,9-14).
 

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Oração é um dos temas preferidos do evangelista Lucas. Lucas é o evangelista da oração. Ele é o único evangelista que inicia (Lc 1,8-10) e termina (Lc 24,53) seu evangelho com o tema da oração. É ele quem mais nos apresenta Jesus orando, principalmente nos momentos decisivos de sua vida: no Batismo (Lc 3,21), na escolha dos discípulos (Lc 6,12), na profissão de fé de Pedro (Lc 9,8), na transfiguração (Lc 9,28s), no Getsêmani (Lc 22,39-46) e na cruz (Lc 23,34.46). Jesus também ensina os discípulos a orar (Lc 11,1ss). No evangelho de Lucas podemos encontrar as orações mais conhecidas e citadas pela Igreja: o Magnificat (Lc 1,46-56); o Benedictus (Lc 1,67-79); o Glória (Lc 2,14); o Nunc Dimittis (Lc 2,29-32). Além disso, Lucas ainda conta três parábolas sobre a oração (Lc 11,5-13;18,1-8;18,9-13). E na sua segunda obra (nos Atos) Lucas nos fala novamente deste tema. Ele nos apresenta a Comunidade Primitiva como uma comunidade orante (At 1,14;2,42). A oração está presente nos momentos mais importantes da Igreja Primitiva (At 1,24;8,15;11,4;12,5;13,2;14,23).


O texto do evangelho de hoje fala da oração de um publicano humilde e de um fariseu arrogante. Sobre a oração o Novo Catecismo da Igreja Católica diz: “A oração é um dom da graça, mas pressupõe sempre uma resposta decidida da nossa parte, porque o que reza combate contra si mesmo, contra o ambiente e, sobretudo, contra o Tentador, que faz tudo para retirá-lo da oração. O combate da oração é inseparável do progresso da vida espiritual. Reza-se como se vive, porque se vive como se reza” (Compêndio do Novo Catecismo, 572; Novo Catecismo, no. 2725).


Não nos esqueçamos: o Tentador quer nos tirar da oração, pois rezar é conversar com Deus. E o Tentador não quer que conversemos com Deus. quem não reza (conversar com Deus), pode acabar conversando com o adversário (satanás) ou com o diabo (aquele que cria a desunião e divisão). Além disso, quem não conversa com Deus, gosta de falar de si próprio (egolatria). Quem conversa com Deus permanentemente, torna-se mais humano ou se humaniza. Quem se humaniza, torna-se irmão do outro. A oração nos serena, pois confiamos totalmente n’Aquele que torna tudo existir e possibilita o que é impossível (cf. Lc 1,37). Quanto mais crescermos na espiritualidade, mais rezaremos, pois “O combate da oração é inseparável do progresso da vida espiritual”. A verdadeira oração nos torna mais humildes ou mais nós mesmos. A oração potencia nossa humanidade.


Estamos na parte do evangelho de Lucas na qual se fala do caminho de Jesus para Jerusalém onde será morto e ressuscitado (Lc 9,58-19,28). Jesus está na etapa final de seu caminho (Lc 17,11-19,28). Durante esse caminho Jesus dá muitas lições importantes para seus discípulos.


Na passagem do evangelho deste dia Jesus continua a enfatizar sobre a importância da oração perseverante e humilde (Lc 18,1-14) que se iniciou na passagem anterior deste texto. Para falar da oração humilde Jesus conta uma parábola na qual ele coloca em confronto dois tipos de atitude diante de Deus representados por um fariseu e um publicano, como protagonistas da parábola: o fariseu que se elogia desprezando o outro e o publicano que simplesmente pede a misericórdia de Deus sem desprezar ninguém, porque ele tem consciência de seus pecados.
 

Na “oração” do fariseu, Deus ficou esquecido e somente o EU predomina: Eu não sou como os demais, eu jejuo, eu pago o dízimo. A arrogante consciência de ter feito alguma coisa, o faz acreditar que Deus se tornou seu Devedor, mas é inútil. Ele abusava da oração para demonstrar sua própria grandeza a fim de se colocar em destaque diante dos demais. É um verdadeiro exibicionista. O exibicionismo é a linguagem que demonstra a ausência de um valor. Quando um valor cresce na experiência espiritual de uma pessoa, ela ama discrição, que é a linguagem do tesouro escondido, e se comunica pelo caminho da simplicidade e da discrição. Toda a arrogância é contra ao amor fraterno que é essencial para uma convivência mais humana.


É curioso comprovar que os santos, os que estão de verdade mais perto de Deus, se consideram sempre uns grandes pecadores, pois eles compreendem verdadeiramente o que o pecado significa. Somente à luz de Deus é possível reconhecer a própria miséria. O aproximar-se de Deus consiste em perder ou em abandonar nosso egoísmo e auto-suficiência para encontrar a felicidade de Deus.


Na parábola o publicano se sente pequeno, não se atreve a levantar os olhos ao céu, e por isso, sai do templo engrandecido. Reconhece-se pobre e por isso, sai enriquecido. Reconhece-se pecador e por isso, sai justificado. Com razão o Livro de Eclesiástico afirma: “Quem serve a Deus como Ele o quer, será bem acolhido e suas súplicas subirão até as nuvens. A prece do humilde atravessa as nuvens” (Eclo 35,20-21).        


Somos fariseus quando vamos à igreja não para escutar Deus e suas exigências, mas para convidá-Lo a nos admirar pelo bom que somos. Somos fariseus quando esquecemos a grandeza de Deus e nosso nada, e cremos que as virtudes próprias exigem o desprezo dos demais. Somos fariseus quando nos separamos dos demais e nos cremos mais justos, menos egoístas e mais puros/limpos que os outros. Somos fariseus quando entendemos que nossas relações com Deus têm de ser quantitativas e medimos somente nossa religiosidade pelas missas das quais participamos e não pelo amor que vivenciamos com os demais. A vaidade nos faz perder tempo em coisas fúteis e sem valor.


O evangelho deste dia nos chama a nos vestirmos da humildade. E para que nos mantenhamos humildes jamais podemos nos esquecer que quem presencia nossa vida e nossas obras é o próprio Senhor a Quem temos que procurar agradar em cada momento. Se não estivermos vigilantes nisso, a soberba vai nos dominar. E a soberba tem manifestações em todos os aspectos de nossa vida: faz-nos susceptíveis, injustos em nossos juízes e em nossas palavras e ações, faz-nos crer melhores do que os demais e negar as boas qualidades dos outros e a soberba nos convence ter virtudes que não possuímos.


O Senhor se comove e esbanja suas graças diante de um coração humilde. A soberba é o maior obstáculo que o homem põe diante da graça de Deus. A soberba é o vício capital mais perigoso: se insinua e tende até infiltrar-se até nas boas obras. Por causa da soberba as boas obras perdem até seu mérito sobrenatural, pois as boas obras praticadas são uma participação na bondade de Deus.


Nossa oração deve ser como a do publicano: humilde, atenta, confiada, procurando que não seja monólogo em que damos voltas a nos mesmos, às virtudes que cremos possuir. A humildade é o fundamento de toda nossa relação com Deus e com os demais. Por isso, a humildade atrai a bênção de Deus e a simpatia dos homens.


Sabendo que todos nós somos pecadores não podemos desprezar aqueles que vivem dominados pela maldade, pelo vício e assim por diante. Deus ama os pecadores e odeia o pecado. Por isso, o Senhor tomou nossa natureza humana para nos salvar e nos levar junto de Si como Seus amados. Por isso, fica a pergunta: temos rezado por as pessoas que vivem dominadas por algum vício e alguma maldade? Sejamos compassivos nas nossas orações por essas pessoas, pois quem é compassivo e justo brilhará com a mesma Luz de Deus para os demais. Sejamos um sinal de Cristo, Luz do mundo, dando-lhes nosso afeto, carinho e a caridade cristã. Rezemos/oremos uns pelos outros, principalmente nesta Quaresma, para que o amor de Deus e sua salvação cheguem a todos. Há pensamentos que são orações. Há momentos nos quais, seja qual for a posição do corpo, a alma está de joelhos” (Victor Hugo)


Sempre que nós rezamos de verdade, a nossa oração é eficaz não porque modificamos Deus, mas porque nos modificamos, assim saímos diferentes do que entramos do templo.
  

Reflita o que São Paulo escreveu: “Verdade é que a minha consciência de nada me acusa, mas nem por isto estou justificado; meu juiz é o Senhor” (1Cor 4,4). “As melhores e as mais lindas coisas do mundo não se pode ver nem tocar. Elas devem ser sentidas com o coração” (Charles Chaplin).

P. Vitus Gustama,svd

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