VIGÍLIA PASCAL "B"
1 Quando
passou o sábado , Maria Madalena e Maria,
a mãe de Tiago, e Salomé, compraram perfumes para ungir o corpo de
Jesus. 2 E bem cedo ,
no primeiro dia
da semana , ao nascer
do sol , elas
foram ao túmulo . 3 E diziam entre si : “Quem rolará para nós a pedra da entrada do túmulo ?”
4 Era uma pedra
muito grande .
Mas , quando
olharam, viram que a pedra já tinha sido retirada . 5 Entraram,
então , no túmulo
e viram um jovem ,
sentado ao lado direito ,
vestido de branco .
6 Mas o jovem
lhes disse: “Não
vos assusteis! Vós
procurais Jesus de Nazaré, que foi
crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui .
7 Vede o lugar onde
o puseram. Ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que
ele irá à vossa
frente , na Galileia. Lá vós o
vereis, como ele
mesmo tinha
dito ”.
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Os exegetas
discutem bastante sobre
Mc 16,1-8. Eles perguntam se o evangelho de Mc termina com
Mc 16,8 ou se há outro
final perdido no qual
Mc falaria mais da ressurreição
longamente do que
neste que nos
é conhecido . A maior
parte dos exegetas
julga que o evangelista
terminou o seu Evangelho
no v.8; ou seja, que
Mc deu uma brevíssima instrução sobre a ressurreição .
O relato sobre a ressurreição de
Jesus neste texto, como foi dito, é bem breve, mas está cheio de riqueza de
traços inesperados e densidade teológica. Tentemos descobrir o sentido do
relato passo a passo.
1.
Jesus é o princípio da nova e definitiva criação
As mulheres
vão ao túmulo
“no primeiro dia
da semana , ao nascer
do sol ”(v.2). “O primeiro
dia da semana ”,
isto é, no terceiro
dia depois
de sua morte ,
o tempo que
o próprio Jesus anunciou (cf. Mc 8,31;9,31;10,34) alude ao primeiro dia da criação (cf.
Gn 1,5). Mc sublinha assim o começo da nova criação . Para enfatizar mais este sentido ,
Mc fala também
sobre “ao nascer
do sol ”. “Ao nascer
do sol ” não
indica apenas uma nova
situação em
contraste com
as três horas
de total escuridão
que precederam a morte
de Jesus (cf. Mc 15,33), mas
simbolicamente indica que também Jesus ressuscitou (Mc 16,2). Isto quer dizer que a ressurreição de Jesus é o princípio
da nova e definitiva
criação . Ele
é o princípio do qual
fluem em nossa
vida toda ,
a força de Deus
que restaura em
nós a semelhança
divina . A partir
de Jesus ressuscitado tudo ganha seu justo valor . Nada fica sem sentido visto a
partir da ressurreição
de Jesus. Jesus como o princípio da nova
e definitiva criação
serve como o ponto
de partida para
tudo . Sem
este ponto de
partida que
é o princípio , o ser
humano perderá seu
rumo . Tudo
tem que começar
nele para terminar nele, pois Jesus é aquele que se define “Eu sou o Alfa e o Ômega , o Começo
e o Fim ”(Ap 21,6). Com ele tudo se renova: “Eis que faço novas
todas as coisas ”(Ap 21,5). Por isso ,
deixemos a luz nova
do Cristo ressuscitado iluminar
o nosso coração ,
o nosso ser inteiro para que sejamos novas
criaturas e estejamos cheios de toda
a plenitude de Deus (cf.
Ef 3,18-19).
2.
As surpresas das mulheres e seu emudecimento diante da ressurreição
As mulheres
que vão
ao túmulo de Jesus para
ungir o corpo
de Jesus (v.1) são realmente
mulheres repletas de amor e devoção
a Jesus. Elas vão
ao túmulo para
reverenciar o corpo
de Jesus. Elas pensam apenas na morte de Jesus e não na sua ressurreição que
ele anunciou antes
de sua morte .
As mulheres ficam aquém
do verdadeiro sentido
da cruz de Jesus. Por
isso , no caminho
rumo ao túmulo
elas dizem entre
si : “Quem rolará a pedra da entrada do túmulo
para nós ?”(v.3).
Foi fácil fechar
o túmulo , porque
é fácil pensar
que a morte
vence a vida . Mas
para as mulheres
é impossível abri-lo e admitir
que a vida
vença a morte . Elas
se fixam e param na hora da morte de Jesus.
Os leitores
deste relato esperam a reação de alegria dessas mulheres
ao receberem a notícia da ressurreição de Jesus Cristo .
Mas em
vez disto, elas
emudecem. Elas ficam como que
paralisadas e em seguida
fala do seu
temor , do seu
estupor , do seu
medo e do seu
emudecimento: “Nada contaram a ninguém ”
(Mc 16,8b). Com isso ,
o evangelista quer
nos dizer que o Evangelho
continua aberto para o futuro . Somos convidados
para este novo futuro onde encontraremos Jesus ressuscitado e encontraremos também o sentido
de nossa vida .
Para isso ,
temos que levar
adiante o projeto
de Jesus ressuscitado. Além disto, este Evangelho
é um convite
a abrir os olhos
para ver o Senhor
na nossa experiência
diária .
3. A
missão confiada às mulheres sobre o novo encontro com Jesus
Apesar do seu emudecimento, essas
mulheres são testemunhas privilegiadas dessa revelação divina e são chamadas e
enviadas para anunciar aos discípulos e a Pedro sobre a ressurreição de
Jesus e sobre o novo encontro com ele na
Galiléia: “Não tenhais medo. Vós estais
procurando Jesus de Nazaré, o crucificado: ressuscitou, não está aqui... Mas
ide dizer aos seus discípulos e a Pedro que ele vos precede na Galiléia: lá o
vereis como vos disse”(v.7).
“Ele não está aqui. Ele ressuscitou! E ele os
precedeu na Galiléia”. O lugar do encontro não é num passado, mas num futuro
novo. O lugar do encontro não é na contemplação de um morto, mas no seguimento
de quem está vivo. Jesus ressuscitado deve ser seguido, vivendo o seu projeto.
Jesus não é uma figura num livro, mas uma presença viva e vivificante. Não é
suficiente estudar a história de Jesus como qualquer grande figura histórica.
Nós podemos começar desta maneira, mas devemos terminá-la com o encontro com
ele, pois Jesus não é uma memória, mas uma presença. Ele continua vivo entre
nós. Se realmente acreditarmos nesta Presença, encontraremos sempre forças mais
que suficientes para encarar qualquer tipo de dificuldade, pois o próprio Jesus
venceu a morte.
“Ele não está aqui. Ele
ressuscitou!”, é a mensagem para todos que queiram mudar de vida para a melhor.
Jesus faz uma páscoa, uma passagem da morte para a vida, para Deus. Precisamos
fazer essa passagem. “Se não passamos para Deus que permanece”, dizia Santo
Agostinho, “passaremos com o mundo que passa. Páscoa é passar para aquilo que
não passa. Quão melhor é passar do ‘mundo’, antes que passe ‘junto com o
mundo’; passar para o Pai, antes que passe para o inimigo”. Cada vez que
acolhemos a inspiração da Palavra de Deus, estamos fazendo uma passagem para
Deus. Cada vez que dizemos “não” a uma vontade da carne, estamos fazendo uma
passagem para Deus. Não há momento ou ação da vida de um cristão que não possa
se transformar em uma passagem, em uma páscoa. A páscoa deve acontecer em todos
os momentos da vida de um cristão. Além disto, todo cristão vivo deve ser uma
manifestação extraordinária da ressurreição do Senhor.
O evangelista Mc certamente quer
transmitir, através deste relato, uma mensagem para todos os leitores e
cristãos em particular que a ressurreição de Jesus manifesta uma dupla
fidelidade: a fidelidade do Pai que não abandona Jesus, mas o ressuscitou,
sinal da aprovação; e a fidelidade do Filho que não abandona os discípulos, que
fugiram na Paixão, mas os procura e quer reencontrá-los. A primeira preocupação
de Jesus Ressuscitado é a de reencontrar os seus discípulos, para retomar,
novamente juntos, o seu caminho. A esperança de cada cristão repousa
inteiramente nesta dupla fidelidade.
4.
Jesus nos precede para onde formos
“Ele vós precederá na Galiléia”.
Este anúncio é cheio de significado. Os exegetas discutem sobre o significado
da Galiléia. A Galiléia para o evangelho de Mc é importante onde se desenvolve
a maior parte. Foi na Galiléia que Jesus começou a proclamar a Boa Nova,
anunciando a chegada do Reino de Deus(Mc 1,14-15). Foi neste lugar que Jesus chamou seus primeiros discípulos
para ser “pescadores de homens”(Mc 1,16-20). Foi na Galiléia inteira que Jesus
pregou o Evangelho, curando e expulsando os espíritos maus(Mc 3,13-19;6,7-13).
Foi na Galiléia que Jesus começou a revelar aos discípulos “o mistério” do
Reino de Deus(Mc 4,11). Foi da Galiléia que a Boa Nova se espalhou para todas
as regiões ao redor(Mc 3,7-12). Na e da Galiléia os discípulos podem continuar
sua missão de pregar o Evangelho e curar todos os povos no mundo inteiro(Mc
13,10;14,9). E foi na Galiléia que Jesus ressuscitado precedeu os discípulos(Mc
16,7). A Galiléia é, por isso, o lugar onde com os mesmos gestos, com a sua
bondade e disponibilidade, os discípulos reconhecerão a presença viva daquele
Senhor que conheceram. A Galiléia é o lugar em que o Senhor Ressuscitado se
lhes manifestará visivelmente e onde Jesus começará a reconstrução da
comunidade, aquela reconstrução que era anunciada na Paixão em que Jesus disse:
“Todos vós vos escandalizareis, porque
está escrito: Ferirei o pastor e as ovelhas se dispersarão. Mas depois que eu
ressurgir, eu vos precederei na Galiléia”(Mc 14,27-28). E Jesus é fiel às
suas promessas. A Galiléia é o lugar onde a comunidade dos Doze será
reconstruída. Todo o Evangelho de Mc deve ser meditado na aceitação de que
Jesus vive e fala hoje aos seus e os chama, como ele os chamou junto ao lago(Mc
1,14-20), ou junto ao monte(Mc 3,13-19) e continua a estar na Igreja, em cada
cristão.
“Ele vos precederá na Galiléia”. A
palavra “preceder” é usada também em Mc 10,32 quando Jesus está a caminho rumo
a Jerusalém. Jesus precedeu os discípulos na Morte e na Nova Vida que o Pai lhe
deu. Ele precederá os discípulos na Galiléia. “Jesus vos precederá” é uma
promessa para todos nós. Para onde formos, como verdadeiros cristãos, devemos
estar conscientes de que Jesus sempre nos precede. Ele sempre chega primeiro
que nós. E ele nos guia para onde ele se encontra. Que saibamos reconhecer essa
precedência e esta presença. Quando temos esta consciência, nenhuma dificuldade
vai nos bloquear, pois Jesus nos precede e com isto, abre o caminho para nós.
Mas com uma condição: que sejamos fiéis à Sua Palavra, pois a Sua Palavra nos
orienta sobre o que devemos fazer.
5.
Algumas das implicações da fé na ressurreição
a). A Páscoa cristã é a
festa das festas, e o cristão é aquele que afirma: o Senhor ressuscitou
verdadeiramente. O cristianismo nasce e progride desta proclamação fundamental:
Jesus Cristo que foi crucificado, ressuscitou verdadeiramente. Da ressurreição
de Cristo deriva todo o resto da mensagem cristã. Sem a vitória de Cristo sobre
a morte, toda a pregação seria inútil e a nossa fé seria vazia de conteúdo(cf.
1Cor 15,14-17). A ressurreição do Senhor é uma realidade central da fé cristã.
A importância deste milagre é tão grande que os Apóstolos são, antes de mais
nada, testemunhas da ressurreição de Jesus(cf. At 1,22;2,32;3,15). O núcleo de
toda a pregação é este: Cristo vive e vive no meio de nós(cf. Jo 1,14;Mt
28,20). A páscoa da ressurreição é a grande festa cristã. Este mistério é tão
importante e central é que o celebramos ao longo de todos os domingos e festas
do ano litúrgico e inclusivamente na Eucaristia diária. Certamente cada
eucaristia que se celebra, celebra-se e proclama-se ao mesmo tempo a ressurreição
do Senhor e a nossa também. A eucaristia dominical é a páscoa semanal. A
eucaristia diária é a páscoa diária.
Sem dúvida nenhuma, a Páscoa é, por
isso, o próprio conteúdo da fé cristã, é o coração da vida da Igreja porque ela
nos revela quem é Deus, quem é Jesus Cristo e quem somos nós. A ressurreição
nos mostra que o Deus revelado por Cristo é Aquele que ama e quer a vida. A
Páscoa nos revela que Jesus, morto e ressuscitado, é Aquele que converge toda a
história da humanidade. E ao mesmo tempo revela que a fidelidade é o caminho
certo para chegar à Páscoa eterna com Deus. A Páscoa também nos revela que
somos chamados a ressuscitar com Jesus, a superar com ele o drama da morte para
podermos permanecer com ele na vida que não tem fim.
b). Pela ressurreição do
Senhor sabemos que Deus ama a vida. A Páscoa é a gloriosa manifestação de um
Deus que ama a vida, que quer a vida e não a morte, de um Deus que, além disso,
faz com que da morte surja a vida.
Crer na ressurreição implica, por
isso, defender a vida, especialmente a dos mais indefesos; implica respeitar a
vida alheia como a própria; implica lutar pelo que é certo e justo, pois estes
predicados como outros semelhantes é que garantem a vida sem fim; implica estender
a mão para levantar quem se encontra sob o peso dos problemas desta vida.
Procurar o Senhor ressuscitado implica comprometer-se com aqueles que vêem o
seu direito à vida permanentemente violentado e violado. Acreditar na
ressurreição significa afirmar a vida contra a morte.
c). A ressurreição
é o grito festivo
da fé . Com
a ressurreição , o grito
de Jesus na Sexta-Feira Santa “Deus meu , Deus meu , por que me
abandonaste?” (Mc 15,34), grito que
sintetiza todas as situações de aflição da humanidade
se transforma, na noite de Sábado Santo , em grito festivo de fé e
de esperança : Cristo
ressuscitou. É um grito
de fé porque
anuncia algo que
aconteceu em Cristo
e permanece para sempre .
É o grito de esperança
porque a partir
de Jesus Cristo ressuscitado a vida humana tem
um futuro
e que ninguém
pode tirá-lo de nós , e que seremos ressuscitados também .
A certeza deste grito
de alegria e de esperança
nos proclama
que a bondade
soterra a maldade , que
a morte já
tem o seu contrapeso
de vida , que
toda crise
pode ser suplantada, que
com Cristo
toda tristeza
conhecerá a alegria .
Infelizmente temos que confessar
que a nossa existência humana é muitas vezes dominada por uma tendência de
diminuir as esperanças, reduzindo-as cada dia mais por causa das ilusões, e a
nossa tristeza nos leva, com freqüência, a recusarmos palavras de conforto,
porque nós não temos idéia exata da libertação que nos foi concedida por Jesus
ressuscitado. Precisamos estar conscientes de que a Páscoa é uma recriação, é
uma nova criação da humanidade, pois Jesus, pela sua ressurreição, inaugurou um
mundo novo no meio de nós.
d). A ressurreição de
Cristo é uma resposta às esperanças de um destino humano aberto para o futuro
novo. Quando este futuro novo for negado, a pessoa se fecha a si mesma, fica
insatisfeita e chega às margens do desespero. A ressurreição nos leva a certeza
de que a vida jamais acabará e de que o triunfo da vida não é mais ameaçado
pela morte. O Ressuscitado está conosco, e continua vivo dentro da história e
junto com ele nós estamos em condições de vencer o mal com o bem, de tirar do
mal o maior dos bens. Esta é força e a novidade da Páscoa. Quem crê na
ressurreição não é permitido viver triste. Somos destinados e chamados a viver
plenamente com Deus, alegres na esperança com os irmãos da mesma peregrinação.
e). Da ressurreição de Jesus nasce, antes
de mais nada ,
uma esperança . Cristo
é nossa esperança
(1Tm 1,1). Nessa esperança nós , cristãos ,
aprendemos a acreditar em
Deus e a desentranhar
o sentido último
do homem . Mas
a esperança de que
se trata não
é virtude de um
instante ou
reação de um
momento . É uma atitude
permanente , um
estilo de vida .
É a forma de enfrentar
a vida própria
do cristão . Se perder
essa esperança , perde tudo . Deixa de ser cristão . Aquele que vive
animado pela
esperança cristã põe seu olhar no futuro . Ele não fica apenas
com o presente ,
nem vive preso
ao passado , mas
olha sempre
para frente .
A esperança sempre
gera uma perspectiva de futuro . E esta esperança
dá origem a uma nova
maneira de se posicionar
na vida apesar
das dificuldades , como
diz São Paulo: “Somos atribulados por todos os lados ,
mas não
esmagados; postos em
extrema dificuldade ,
mas não
vencidos pelos impasses ;
perseguidos, mas não
abandonados; prostrados por terra , mas não aniquilados” (2Cor
4,8-9). A esperança vive da confiança em Deus , como o profeta Isaías diz: “É ele (Deus )
que dá forças
ao cansado , que
prodigaliza vigor ao enfraquecido. Mesmo os jovens
se cansam e se fatigam; até os moços vivem a tropeçar , mas os que põem
a sua esperança
em Yahweh(Deus )
renovam as suas forças ,
abrem asas como
as águias , correm e não
se fatigam, caminhar e não
se cansam”(Is 40,29-31). Que cada
um de nós
seja um pequeno
sinal , uma pequena
prova desse Deus
da esperança ! FELIZ
PÁSCOA PARA VOCÊ E SUA FAMÍLIA !
P. Vitus Gustama,svd
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