16/03/2015
CRER E VIVER
CONFORME A PALAVRA DE DEUS É UM GRANDE MILAGRE
Segunda-Feira da IV
Semana da Quaresma
Textos: Is 65,17-21; Jo 4,43-54
Naquele tempo, 43 Jesus partiu da
Samaria para a Galileia. 44 O próprio Jesus tinha declarado, que um profeta não
é honrado na sua própria terra. 45 Quando então chegou à Galileia, os galileus
receberam-no bem, porque tinham visto tudo o que Jesus tinha feito em
Jerusalém, durante a festa. Pois também eles tinham ido à festa. 46 Assim,
Jesus voltou para Caná da Galileia, onde havia transformado água em vinho.
Havia em Cafarnaum um funcionário do rei que tinha um filho doente. 47 Ouviu
dizer que Jesus tinha vindo da Judeia para a Galileia. Ele saiu ao seu encontro
e pediu-lhe que fosse a Cafarnaum curar seu filho, que estava morrendo. 48 Jesus
disse-lhe: “Se não virdes sinais e prodígios, não acreditais”. 49 O funcionário
do rei disse: “Senhor, desce, antes que meu filho morra!” 50 Jesus lhe disse:
“Podes ir, teu filho está vivo”. O homem acreditou na palavra de Jesus e foi
embora. 51 Enquanto descia para Cafarnaum, seus empregados foram ao seu
encontro, dizendo que o seu filho estava vivo. 52 O funcionário perguntou a que
horas o menino tinha melhorado. Eles responderam: “A febre desapareceu, ontem,
pela uma da tarde”. 53 O pai verificou que tinha sido exatamente na mesma hora
em que Jesus lhe havia dito: “Teu filho está vivo”. Então, ele abraçou a fé,
juntamente com toda a sua família. 54 Esse foi o segundo sinal de Jesus.
Realizou-o quando voltou da Judeia para a Galileia.
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Hoje o evangelho nos relata que
Jesus se encontra novamente em Caná da Galiléia onde ele realizou o primeiro
sinal: a transformação de água em vinho (Jo 2,1-11). No evangelho de hoje Ele
operou outro sinal: a cura do filho de um funcionário real. Ainda que o
primeiro sinal seja um espetacular, mas este segundo é mais valioso porque não
é algo material o que se soluciona e sim a vida de uma pessoa que está quase
para terminar.
O evangelista João escolhe, como
protagonista para o segundo sinal operado por Jesus, um homem que exerce
autoridade, um funcionário real (de um rei). E por isso, pode ser figura de
qualquer tipo de poder.
Esse funcionário apenas ouviu falar
de Jesus. Movido pela necessidade ele foi procurar Jesus para que este pudesse
curar seu filho de uma doença mortal. Esse funcionário abandona seu orgulho de
ocupar o cargo de poder em nome do filho que está para morrer. Pai ou mãe fará
qualquer coisa para salvar um filho que está em perigo de morte. O funcionário
pede uma intervenção direta de Jesus a favor de seu filho que está para morrer.
Ele não quer saber dos comentários do povo em geral desde que seu filho seja
recuperado são e salvo: “Senhor, desce, antes que meu filho morra!” 50 Jesus
lhe disse: “Podes ir, teu filho está vivo”. Com estas palavras, o
funcionário acredita que Jesus dispõe de uma força salvadora, capaz de dar a
vida para seu filho moribundo.
Jesus contestou: “Se não virdes
sinais e prodígios, não acreditais”. Esta frase nos mostra que os homens, em
geral, são assim mesmo: precisam de milagre para crer. Mas ao contrário, o
homem precisa crer para reconhecer e enxergar os milagres de Deus na sua vida
cotidiana. “O
milagre é o filho predileto da fé” (Johann Goethe). Com esta resposta
Jesus quer mostrar a mentalidade comum desse tipo de grupo de pessoas: “Não
acreditais”. Com este plural Jesus assinala a categoria dos instalados no
poder. Jesus, através desse funcionário, quer se dirigir aos poderosos e em
geral, para aqueles que esperam a salvação na demonstração do poder. Para eles,
a fé somente pode ter como fundamento o desdobramento de força, o espetáculo
maravilhoso.
O funcionário não se intimidou, mas
insiste: “Senhor, desce antes que meu filho morra!”. Com este pedido renovado
esse funcionário confessa a impotência do poder diante da debilidade e da
morte. O poder deste mundo é impotente para salvar o homem.
Por causa de sua fé, Jesus disse ao
funcionário: “Podes ir, teu filho está vivo!”. Com sua resposta Jesus indica
que a salvação que ele trouxe não requer a colaboração do poderoso. Jesus atua
na simplicidade sem ostentação. Jesus não precisa descer até Cafarnaum. Sua
ação não necessita de sua presença física. Será sua mensagem que comunica vida.
Basta acreditar nela. Jesus comunica vida com sua Palavra que é Palavra
criadora e chega a todo lugar.
Desse funcionário real aprendemos
que se quisermos a ajuda de Jesus temos que aprender a ser humildes, abandonar
nossa arrogância de nos acharmos poderosos e a não prestar muita atenção para
aqueles nos criticam por causa de nossa fé. Temos que ter certeza que as palavras
do Senhor são poderosas para nos libertar de todas as prisões de nossa vida.
Com sua Palavra e seu convite para
que o funcionário real vá, pois o filho está vivo, Jesus quer colocar o
funcionário à prova para sua fé e para ver se ele renuncia a seu desejo de
sinais espetaculares (“Se não virdes sinais e prodígios, não acreditais”). O
funcionário aceita o desafio posto por Jesus e acredita no poder de Sua
Palavra.
Como resultado, o funcionário viu
seu filho vivo certamente no momento em que Jesus pronunciou sua Palavra:
“Podes ir, teu filho está vivo”. Ele que pedia a Jesus como poderoso, agora crê
como “homem”; antes se definia por sua função, agora por sua condição humana,
pressuposta para toda relação pessoal. Ele confia na Palavra de Jesus e por isso
se põe em caminho. Ele renunciou a sua mentalidade de poder e aos sinais
portentosos.
Estamos na Quaresma, mas caminhamos
para a Páscoa, isto é, para a ressurreição, como professamos no Credo: “Creio
na ressurreição da carne”. Toda nossa vida aqui na terra é uma “quaresma”, isto
é, uma preparação para a Páscoa definitiva, para o encontro derradeiro com Deus
na felicidade sem fim. Para isso, é necessário crer na Palavra de Deus.
A Igreja primitiva confessa, como
testemunham os escritos do Novo Testamento, que com a morte e ressurreição de
Jesus começou já a nova criação, os “novos céus e nova terra” (cf. 2Pd 3,13; Ap
21,1). Esse começo é imperceptível para os olhos nus. A história humana
continua dominada, em grande parte, pelo pecado, pela corrupção e pela morte
(seja natural seja forçada ou abortada), porém algo vai mudar. A convivência do
lobo e do cordeiro continua, porém o ódio e a hostilidade devem dar lugar para
o amor, isto é, o amor vencerá, pois “Deus é amor” (1Jo 4,8.16). Quem segue os
passos de Jesus que se resumem nos passos de amor se torna nova criatura e o
amor não morrerá, pois é o nome do próprio Deus: “Se alguém está em Cristo,
é nova criatura. Passaram-se as coisas antigas; eis que se fez uma realidade
nova” (2Cor 5,17). Cristo é autor desta nova criação, pois nele Deus se faz
presente para o mundo. A fé na nova criação significa o principio da liberdade
humana.
O que chama a atenção deste segundo
sinal é que Jesus atua à distância. Ele não precisa ir até Cafarnaum para curar
diretamente o enfermo. Sem se mover de Caná Jesus faz o possível o
restabelecimento. Diante do pedido do funcionário real: “Senhor, desce, antes
que meu filho morra!”, Jesus responde: “Podes ir, teu filho está vivo”.
Isto nos recorda que podemos fazer
tantas coisas boas à distância, isto é, sem ter que estar presentes no lugar
onde nos solicita nossa generosidade. Assim, por exemplo, colaborar
economicamente com nossos missionários ou com entidades católicas e semelhantes
que ali estão trabalhando, com as instituições de caridade. Inclusive, podemos
dar uma alegria a muita gente que está muito distante de nós com uma chamada de
telefone, uma carta ou um correio eletrônico. A distância não é nenhum problema
para ser generoso porque a generosidade sai do coração e ultrapassa todas as
fronteiras. Como dizia Santo Agostinho: “Quem tem caridade em seu coração,
sempre encontra alguma coisa para dar”.
Em segundo lugar, S. João, ao narrar
a cura, à distância, do filho do funcionário real, quer nos apresentar Jesus
como Palavra de vida. Mas a Palavra que exige a fé. A Palavra de Jesus é o
sinal extraordinário e o prodígio que nos oferece. Quem acolhe a Palavra e
acredita nela, experimenta milagres e muitas transformações na vida. O
funcionário real acolheu a Palavra de Jesus e recebeu como prêmio a cura do
próprio filho. Jesus comunica vida com sua Palavra, que é palavra criadora e
chega a todo lugar. “Crer” sem necessidade de sinais nem de prodígios é fonte
de vida e de cura e de outras tantas transformações na vida. A pesar de ser
um excluído da religião oficial, por ser um estrangeiro e por isso, impuro, no
entanto Jesus descobre no funcionário real um homem de fé que crê na promessa
de cura apesar com palavra apenas e à distância. O perigo de toda religião é
chegar a crer no legalismo. Quando a lei se entroniza no interior da mesma, a
surpresa e a gratuidade do encontro com Deus, que é o que realmente define o
milagre, se tornam impossíveis. O legalismo, por fazer que as coisas boas
sucedam como recompensa para a observância da lei, destrói a possibilidade da
graça e do verdadeiro milagre. A possibilidade de encontrar-se com as pessoas
do tipo do funcionário real, necessitadas do amor mais que da lei, faz renascer
em Jesus a imensa alegria da misericórdia. A partir daqui todo milagre é
possível.
Portanto, acreditar e obedecer,
acolher a Palavra de Deus e pô-la em prática é uma questão de vida ou de morte.
Se soubermos caminhar na fé acreditando na Palavra de Deus, mesmo na noite
escura do sofrimento e da provação, a Palavra será como uma lâmpada para os
nossos passos.
Aprendemos da cena do evangelho
deste dia que a verdadeira fé em Deus e na Sua Palavra significa crer sem
necessidade de sinais nem prodígios, crer sem milagres, crer sem ver (cf. Hb
11,1). O evangelista João sublinha que o funcionário real acreditou na Palavra
de Deus sem verificação. Ele simplesmente foi embora com a Palavra de Deus em
seu coração. Não tinha nenhuma prova no momento, tinha somente “a Palavra” de
Jesus. O funcionário está totalmente na fé, no salto da fé, na confiança
ilimitada da fé. “A quem nós iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida
eterna” (Jo 6,68). “Que o teu orgulho e objetivo consistam em pôr no teu
trabalho algo que se assemelhe a um milagre” (Leonardo da Vinci). ”Só há duas maneiras de viver a vida:
a primeira é vivê-la como se os milagres não existissem. A segunda é vivê-la
como se tudo fosse milagre” (Albert Einstein).
P. Vitus Gustama,svd
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