XVI DOMINGO DO TEMPO COMUM DO ANO B
O Evangelho do Domingo anterior falou do envio dos Doze como “apóstolos ”(enviados ) em pares (dois a dois ) à missão com autoridade recebida de Jesus para dominar os espíritos impuros (Mc 6,7). O Evangelho deste Domingo relata a sua volta dessa missão . Eles se reúnem ao redor de Jesus, contam-lhe o que fizeram e ensinaram.
1. É preciso ter tempo para estarmos a sós com Deus
Há sempre dois perigos no ritmo da vida de cada cristão . O primeiro perigo é o perigo de atividade constante /sem parar . Ninguém pode trabalhar sem descansar . E ninguém pode viver a vida cristã, se ele não tiver tempo para estar com Deus . O grande perigo de nossa vida é que não damos a Deus nenhuma oportunidade para ele falar para nós porque não sabemos como ficar em silêncio e como aprender a parar nenhum minuto . Nós não damos a Deus tempo para ele nos reabastecer com sua força porque não temos tempo para esperá-lo e falar com ele . Temos que nos abrir ao que há de eterno nas coisas . Se alguém não for despojado, pobre no espírito , terá, inconscientemente , tendência a executar a obra que tem a fazer para a sua própria satisfação e não para a glória de Deus . Será virtuoso não porque ama a vontade de Deus , mas porque deseja admirar suas próprias virtudes ou obras . Ele esquece da fonte dessas virtudes que é Deus , como alguém que bebe a água e esquece de cuidar da fonte , por isso , acaba não tendo mais a água para sobreviver . Quanta carga pesada desta vida que temos que carregar , quando não tivermos contato com Deus que é o Senhor de tudo de bom nesta vida . Santo Agostinho dizia: “Em qualquer lugar para onde o homem se dirija, se não se apoiar em Deus , sempre encontrará dor ”.
O grande desafio à nossa felicidade é o desafio do demais : há coisas demais para fazer , distrações demais , barulho de mais . Achamos que precisamos fazer mais , ir a mais lugares , querer e realizar mais coisas . Enquanto o dia continua tendo vinte e quatro horas , e o ano com os seus doze meses.
O segundo perigo é o de afastarmo-nos de mais da realidade só para rezar . Devoção que não se coloca em ação /na prática não é devoção verdadeira. Oração que não se traduz na prática não é oração verdadeira. Nunca podemos procurar a amizade com Deus só para evitar a amizade com os homens , mas ao contrário , procuramos a amizade com Deus para melhorar nossa amizade com os homens . A vida cristã é o encontro recíproco com Deus no lugar deserto e servindo homens no lugar público .
O senhor sempre nos convida para irmos com ele a um lugar à parte . Mas se vamos para lugar à parte para estar com Cristo apenas para nos livrarmos da companhia de pessoas que não nos agradam, não encontraremos nem a paz , estaremos num mero isolamento . Ir para lugar à parte não a fim de fugir dos homens , mas para encontrá-los em Deus . O simples fato de viver em soledade (solidão ) não isola o homem , como simples fato de viver com outros nem sempre leva os homens à comunhão com os outros . Não vamos para o lugar à parte (estar com Jesus) com o intuito de fugir das pessoas e sim para aprender como encontrá-las. Não nos separamos delas, mas para encontrar o melhor modo de fazer-lhes bem . O silêncio é solidão em comunhão , e é assim que nos torna solidários com todos . Uma vida espiritual verdadeira nos faz alertas e conscientes em relação ao mundo à nossa volta , de forma que tudo o que é e acontece torna-se parte de nossa contemplação e meditação e convida-nos a uma resposta livre e sem medo .
O desejo de Jesus de estar sozinho com os discípulos não se concretizou, porque a multidão chegou antes deles, no lugar para onde se dirigiam. Embora irrealizado, o desejo de Jesus não pode ser descartado, sem mais . O ativismo é um perigo que deve ser evitado. O ativismo , com o passar do tempo , poderá se mostrar prejudicial . O excesso de atividades levaria qualquer um de nós a se desviar do verdadeiro sentido de nossa missão neste mundo como cristãos . Um cristão que se envolve em muitas atividades , desempenha uma variedade muito grande de tarefas , às vezes /muitas vezes , faz tudo isso seguindo os próprios impulsos , as próprias idéias e se esquece de entrar em sintonia com a Palavra de Deus . Deste modo acaba por responder às necessidades e exigências segundo exclusivamente o que é sugerido pela lógica humana .
2. Jesus se compadece pela multidão
“Assim que Jesus desembarcou, viu uma grande multidão e ficou tomado de compaixão por eles , pois estavam como ovelhas sem pastor . E começou a ensinar-lhes muitas coisas ”(v.34). No início do Evangelho de Mc relatou-se também que Jesus teve o mesmo sentimento de compaixão em relação ao leproso (cf. Mc 1,41). O verbo “Compadecer-se” ou “Comover-se” se usava no judaísmo somente ao falar de Deus ; e no NT, somente de Jesus. Compaixão é o amor entranhado de Deus pelos homens manifestado em Jesus. A compaixão é a característica divina . A compaixão não conhece marginalização alguma, pois o reinado de Deus não exclui ninguém da salvação. Compaixão é sentir com outrem , achegar-se ao seu lugar , assumir-lhe a experiência e a dor . A compaixão atinge o próprio centro da pessoa , nas próprias vísceras . Assim se comporta Deus , segundo AT(cf. Is 63,15;Jr 31,20). A compaixão é comover-se até as entranhas , solidarizar-se profundamente , sentir a partir de outrem , é sofrer- com . A compaixão requer que eu esteja com as pessoas que sofrem, e disposto a partilhar meu tempo e meu coração com eles . Quando eu compartilhar meu coração com uma pessoa que sofre, uma parte dela não será tocada pelo sofrimento. O meu coração partilhado alivia a dor do outro . Assim é que vivia Jesus e é assim também que os seus seguidores devem viver .
A resposta de Jesus aos ignorantes , aos famintos , aos cegos , aos leproso , às viúvas e a todos os que chegavam até ele com o seu sofrimento brotou da compaixão divina que levou Deus a tornar-se um de nós . Por causa da sua compaixão pela humanidade é que Deus escolheu ser um Deus-Conosco. O nosso Deus é chamado de Emanuel(cf. Mt 1,23;18,20;28,20; cf. também Jo 1,14), porque ele se comprometeu a viver em solidariedade conosco , a compartilhar conosco as alegrias e as dores , a nos defender e nos proteger , e a sofrer conosco tudo em nossa vida .
A compaixão que Jesus propõe nos desafia a abandonarmos o nosso apego e a entrarmos com ele na vida corajosa do próprio Deus . Jesus nos convida a sermos tão próximos uns dos outros como Deus é em relação a nós mesmos . Jesus nos pede que desmascaremos a ilusão da nossa própria competitividade, que deixemos de nos apegar às nossas distinções imaginárias como fontes de identidade . Este novo eu , o eu de Jesus Cristo , nos torna possível sermos compassivos como nosso Pai é compassivo . Esta nova identidade , livre de da ganância e do desejo de poder , nos permite entrarmos tão plena e incondicionalmente nos sofrimentos dos outros e curarmos os doentes .
Neste texto , Jesus se compadece porque o povo está “como ovelhas sem pastor ”. A referência ao AT é evidente . Josué foi escolhido por Deus para ser sucessor de Moisés “para que a comunidade do Senhor não seja como um rebanho sem pastor (Nm 27,17). Ezequiel denuncia os líderes do povo que se preocupam mais com a própria vida do que com a do rebanho (Ez 34,3-4). Zacarias lamenta sobre o povo que “não tem pastor ” por causa da falsa liderança (Zc 10,2)etc.. No AT o “pastor ” significa autoridade ou liderança política , enquanto que as “ovelhas ” representam o povo . Ao dizer que eles (povo ) “... estavam como ovelhas sem pastor ”, o texto quer dizer que os pastores , em vez de defender as ovelhas , as oprimem e exploram. A ganância dos “lobos ” é tanta que as “ovelhas ” não têm o que comer (cf. Mc 6,36). Os “lobos ” devoram as “ovelhas ”.
Jesus assume o papel de pastor de Israel, e seu objetivo é dar alimento às ovelhas (cf. Mc 6,35-44 fala da multiplicação dos pães para alimentar o povo abandonado pelos líderes falsos em contraposição com o banquete dado por Herodes para os “grandes ”. cf. Mc 6,21-29).
Será que cada um de nós , como seguidor de Jesus reflete a liderança de Jesus Cristo , o Bom Pastor ?
P. Vitus Gustama,svd
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