SEXTA-FEIRA SANTA
A CRUZ E O CRISTÃO
(REFLEXÃO PARA A SEXTA-FEIRA SANTA
)
Celebrar a Sexta-feira Santa nos leva a pensarmos na cruz
e a cruz nos
leva a pensarmos na dor
e no sofrimento. E falar da dor
é falar das pessoas
concretas, pessoas que
sofrem.
A pergunta
que o próprio
sofrimento faz a todos nós é esta: Se existe um
Deus justo,
por que
existem o mal e o sofrimento? E se existem
o mal e o sofrimento, como poderá existir um Deus justo? E se Deus é justo e
misericordioso, por que
um inocente
ou uma criança
recém-nascida sofre? Por que Deus parece
ficar calado diante de uma oração
para pedir a solução para um
problema ou
para um sofrimento
insuportável? Por que as coisas ruins acontecem a pessoas
boas? Como posso acreditar
num Deus que
ame a dor, num Deus
que acende a luz
vermelha às alegrias
humanas?
Estas perguntas
servem apenas como
exemplo de uma ladainha
de perguntas sobre
o mesmo tema. As desgraças
que atingem as pessoas
boas não são
um problema
apenas para
as próprias vítimas e para
suas famílias,
mas também
são problemas
para todos os
que desejam acreditar
em Deus,
e num mundo mais
justo, fraterno,
razoável e suportável.
A dor
é realidade e mistério, noite e dia, névoa e luz, fraqueza e força,
morte e vida,
desespero e esperança.
Nós sofremos simplesmente
porque essa é a condição
do ser humano.
A vida humana
terrena é por
si mesma
pequena, fraca
e frágil. A morte
e a dor são
companheiras naturais de nossa própria estrutura. O sofrimento chega
a todos nós.
Não lhe
podemos escapar. Mas
embora a dor
em si
seja inevitável, durante
esta vida, muitas dores
e muitas mortes podem ser
evitadas.
Jesus Cristo crucificado que
ressuscitou é a resposta de Deus para nós
Popularmente, a cruz, com freqüência, tem sido tomado apenas
como símbolo
da dor humana.
Às vezes se tem usado para
induzir os homens
a não se rebelarem, mas
sim a negociar
com a dor;
tem sido motivo para
justificar o sofrimento e ainda
como pretexto
para certas formas de repressão.
Com esta concepção,
a cruz foi afastada grosseiramente
de sua referência
a Jesus, Salvador.
Sem dúvida nenhuma, Deus não aceita
a sociedade na qual
uns homens desprezam, injustiçam,
exploram, roubam, maltratam, atropelam e matam os outros.
As cruzes que
os homens levantam para
seus irmãos
são abomináveis
aos olhos de Deus.
É preciso lutar
contra elas,
pois Deus as
detesta.
Jesus Cristo
também sente na própria
carne todas as dimensões
do sofrimento humano. A dor nos faz mais próximos
de Jesus Cristo. Mas
a dor de Jesus não
se encerrou jamais sobre
si mesmo,
ao contrário, estava totalmente aberta
ao próximo. Por
isso, o profeta
Isaías resumiu: Jesus “tomou as nossas enfermidades
e carregou as nossas doenças” (Mt
8,17). Tão profundamente
sentiu a dor humana,
que dedicou sua
vida para servir a todos, para aliviar suas
penas e para
ensinar-lhes o caminho da superação e da irmandade
(Lc 4,18-19). Sua existência
esteve totalmente orientada no sentido de aliviar a dor alheia. Não fechava seu
coração para ninguém. Ele
fazia o máximo possível
para que cada um pudesse
ver o amor de
Deus que
Deus lhe
tinha e seu
próprio valor
humano.
Portanto, Jesus não veio
para glorificar a dor, mas sim para dar
um fim
a seu reinado.
A cruz de Jesus é um
instrumento de exaltação
porque ela
é o fruto de amor.
A cruz é o último
ato de uma vida
vivida no amor,
na doação e na entrega.
A cruz é a expressão
suprema do amor
de Deus por
nós. Por
isso, para os
cristãos a contemplação
da cruz é fonte
de alegria serena
porque vemos na cruz
a manifestação mais
clara do amor
de Deus por
nós todos
e por cada
um em
particular. Deus
fez a alma humana
de tal forma que apenas uma vida de bondade,
de amor e de honestidade
nos faz sentir
espiritualmente saudáveis,
humanos e fraternos.
Por isso, nunca podemos olhar para a cruz de Jesus sem nos
lembrarmos da ressurreição. Sexta-Feira Santa
não tem qualquer
significado sem
o Domingo da Páscoa.
No Calvário a vida
ganhou, porque o amor
era mais
forte que
a morte. Somente a partir dessa perspectiva
se pensa, se corrige e se assume o símbolo da cruz.
A redenção é antes
de tudo uma vitória.
Cristo é o vencedor da morte.
Cristo é o Salvador
do mundo, Salvador
de cada um
de nós.
Todos nós
carregamos alguma cruz na nossa vida. Há cruzes de todos
os tipos. Há cruzes
em todos
os caminhos. Há cruzes
com Cristo,
mas há também
cruzes sem
Cristo. Cada
cruz, então,
tem uma história e cada
história tem uma cruz.
A cruz sem
Cristo é a cruz-condenação. É a cruz de quem deseja ser um deus. É a cruz que não tem finalidade
em si
mesmo. É a cruz
sem fé,
sem amor,
sem sentido
da vida, sem
renúncia por
amor. É a cruz
de quem deseja
viver numa liberdade
sem responsabilidade.
Jesus Cristo, que
foi crucificado, transformou a cruz de castigo em bênção.
Por isso, somos convidados
a olhar para o alto, para a cruz de Jesus. Somente
olhando para o alto,
para Deus, o homem encontra
o sentido da sua
existência e tudo
que se passa
aqui nesta terra.
Só do alto
vem a luz que
dá sentido à alegria
e à dor, às vitórias
e às derrotas, à solidão
e à morte. Olhar para Jesus na cruz
significa aceitar com
fé a mensagem
que ele
dirige para todos
nós, cristãos.
Aqui crer
significa identificar a própria
vida com
a de Cristo. Este
é o caminho para
alcançar a vida
do alto, a salvação. Por isso, Madre Teresa de Calcutá dizia: “Se olhamos para a Cruz de Jesus
sabemos muito bem
do quanto Deus
nos amou. Mas
quando participamos da Eucaristia, da missa,
sabemos muito bem
do quanto Deus
nos ama”,
porque Jesus continua nos amando, dando-nos Seu
Corpo e Sangue
para nos fortalecer na nossa caminhada para alcançar a vida eterna.
Devemos contemplar hoje a Cruz de Cristo com olhos de fé. Desde que Cristo padeceu e morreu nela, a Cruz
deixou de ser ignomínia
para converter-se em
sinal de vitória
e salvação. A tradição genuína da Igreja
não considera nunca
a Cruz sob
o aspecto doloroso,
e sim dentro
de uma perspectiva de triunfo e exaltação.
Por isso,
os fiéis sempre usam e fazem o sinal da cruz como um gesto especificamente cristão,
que os distingue e os honra. Mas também, por
esta mesma razão
constituiria uma grave inconsciência convertê-la em
um instrumento
ornamental. A aceitação
da Cruz em
nossa vida
é algo terrivelmente sério e comprometido.
Nós
também estávamos lá
O
perigo que
temos ao ler o relato da Paixão
de Jesus é ficarmos como espectadores da cena
cujo papel de
cada personagem
da Paixão não
tem nada a ver
com a nossa
vida. Mas
se refletirmos seriamente sobre este relato, na verdade,
estávamos também lá
desempenhando nosso papel
para causar o
sofrimento de Jesus. E ao olharmos para o nosso modo de viver atualmente
confessamos que continuamos a fazer Jesus sofrer, pois “Em verdade
vos digo: cada
vez que
o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos,
a mim o fizestes. E todas as vezes que o
deixastes de fazer a um
desses pequeninos, foi a mim que o
deixastes de fazer” (Mt 25,39.45).
Hoje Cristo continua sofrendo a Paixão
quando não
soubermos acompanhar nossos
irmãos que
sofrem, que sentem angústia
e se sentem sós, como
fizeram os discípulos prediletos no Jardim
de Getsêmani. Hoje Cristo
continua sofrendo a Paixão quando vendermos nossa
dignidade por
algumas moedas como
Judas que
vendeu Jesus por trinta moedas de prata;
quando nossa
ganância nos
levar a fazermos negócios
sujos e quando
não prestarmos a ajuda
aos irmãos necessitados. Hoje Cristo
continua sofrendo a Paixão quando buscarmos na violência
a solução de nossos
problemas como
aqueles que
prenderam Jesus com paus
e espadas; quando
não estivermos convencidos
de que “quem
usa espada,
com/ de a espada
morrerá”. Hoje Cristo
continua sofrendo a Paixão quando acusarmos injustamente
os irmãos como
fizeram os líderes religiosos
de Jerusalém e as falsas testemunhas; quando não
respeitarmos os homens e os acusamos sem verdade. Hoje Cristo
continua sofrendo a Paixão quando negarmos ou
mentirmos por vergonha
e covardia, como
fez Pedro; quando não
confessarmos com valentia e sinceridade nossa
fé; quando
não defendermos a causa
da justiça por
medo dos problemas
e dificuldades que
isto possa nos
trazer. Hoje Cristo continua sofrendo a Paixão
quando lavarmos as mãos
como Pilato; quando
não vivermos comprometidos com a causa dos que sofrem; quando
encolhermos os ombros e não defendermos a verdade e
a justiça por
medo das conseqüências.
Hoje Cristo
continua sofrendo a Paixão quando condenarmos os outros
sem ponderar
o que há de verdade
nessas condenações, como
fez a multidão em
Jerusalém. Hoje Cristo
continua sofrendo a Paixão quando zombarmos os que
sofrem, os marginalizados da sociedade, os pobres, os idosos,
os embriagados, os aleijados, os débeis
e assim por
diante. Somos nós
responsáveis deste mundo.
Sou eu responsável
deste mundo!
Nosso caminho de conversão
se une hoje ao caminho
de Jesus para aprender
dele que o mais
importante da vida
é colocá-la ao serviço de uma causa digna. Se nos esforçamos por
mudar atitudes
e afinar nossos
sentimentos durante
o tempo da Quaresma
é simplesmente para
nos identificar
melhor com
este Jesus que
hoje entra triunfante
em Jerusalém, e compreender
que a alegria
e a felicidade formam parte de nosso ser cristão, para celebrar e viver
mais autenticamente unidos a Cristo Ressuscitado a nova
vida que
ele nos
oferece no domingo da Páscoa. Nosso caminhar ao lado de
Jesus ao longo da Semana
Santa é a melhor
escola que
podemos freqüentar para nossa vida de cada dia. Com a segurança de que nosso caminho já não o fazemos sozinhos,
e sim com
este Jesus da Semana
Santa e com
tantos irmãos
na fé que
têm a mesma esperança.
Hoje Jesus nos
ensina mais
do que nunca
a caminharmos juntos: Jesus, os irmãos e eu mesmo. Manifestamos isto
simbolicamente na procissão que
fazemos juntos com
os ramos na mão,
símbolo de nossa
vitória antecipada.
UMA CRUZ
NO BOLSO.
“Eu
carrego uma cruz no meu
bolso, uma simples
lembrança para
mim do fato
de ser cristão.
Esta pequena cruz
não é mágica
nem muito
bonita também,
e não significa que
ela me
proteja de qualquer problema
físico. Ela
não é para identificação, para todo mundo ver. Ela é simplesmente um
entendimento entre
mim e meu
Senhor. Quando
eu coloco a minha
mão no bolso
para pegar uma moeda ou uma chave, a cruz
está lá para me lembrar o preço que Ele pagou por mim. Ela me lembra também
de ser agradecido pelas graças
recebidas diariamente e de me empenhar em servi-Lo cada vez melhor em tudo aquilo que eu faço e
digo. Ela também
é uma lembrança diária
da paz e do conforto
que eu
compartilho com todos
aqueles que
conhecem meu Mestre
e se entregam para uma presença.
Então, eu
carrego uma cruz no bolso
lembrando a mim e a mais
ninguém que
Jesus Cristo é o Senhor
da minha vida
se assim eu
quiser”. (Robert Kennedy)
P. Vitus Gustama,svd
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