III DOMINGO DA QUARESMA DO ANO
“C”
Domingo, 04 de Março de 2013
Texto: Lc 13,1-9
1Naquele
tempo, vieram algumas pessoas trazendo notícias a Jesus a respeito dos galileus
que Pilatos tinha matado, misturando seu sangue com o dos sacrifícios que
ofereciam. 2Jesus lhes respondeu: “Vós pensais que esses galileus eram mais
pecadores do que todos os outros galileus, por terem sofrido tal coisa? 3Eu vos
digo que não. Mas se vós não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo modo.
4E aqueles dezoito que morreram, quando a torre de Siloé caiu sobre eles?
Pensais que eram mais culpados do que todos os outros moradores de Jerusalém?
5Eu vos digo que não. Mas, se não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo
modo”. 6E Jesus contou esta parábola: “Certo homem tinha uma figueira plantada
na sua vinha. Foi até ela procurar figos e não encontrou. 7Então disse ao
vinhateiro: ‘Já faz três anos que venho procurando figos nesta figueira e nada
encontro. Corta-a! Por que está ela inutilizando a terra?’ 8Ele, porém,
respondeu: ‘Senhor, deixa a figueira ainda este ano. Vou cavar em volta dela e
colocar adubo. 9Pode ser que venha a dar fruto. Se não der, então tu a
cortarás’”.
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Os dois
acidentes relatados no evangelho lido neste dia são exclusivos do evangelho de
Lucas. O episódio do massacre relatado neste evangelho comandado por Pilatos é
ignorado pelas fontes profanas durante a administração de Pilatos (de 26-36 d.
C). José Flávio, o grande historiador judeu, relata somente um massacre
comandado por Pilatos em 35 d. C. por ocasião de uma romaria de samaritanos ao
monte Garizim, por suspeita de um complô contra o domínio romano; gesto que
para Pilatos valeu a destituição do cargo e o exílio para as Gálias. Enquanto os
sacrifícios devem ser feitos somente em Jerusalém. Também o segundo episódio
não é confirmado pelos documentos profanos.
Os que relatam
os dois acontecimentos a Jesus querem provocar o juízo e uma
tomada de posição de Jesus. Jesus dá uma resposta que aparentemente ignora
estes problemas. Jesus contesta o sistema farisaico e o conseqüente preconceito
religioso popular que estabeleceu uma perfeita equação entre o pecado e o
castigo, e que no caso presente chegava a esta conclusão: nós somos justos
porque não merecemos esse fim horrível.
“Vós pensais que esses galileus eram mais
pecadores do que todos os outros galileus, por terem sofrido tal coisa? 3Eu vos
digo que não. Mas se vós não vos converterdes, ireis morrer todos do mesmo
modo”. Esta é a resposta de Jesus para os que relataram os dois
acontecimentos. Com essa afirmação Jesus
vai contra uma idéia muito presente no seu tempo, segundo a qual doença,
infortúnio, pobreza são conseqüências das faltas cometidas por quem sofre essas
situações. Em outras palavras, ele é contra o dogma de retribuição dos fariseus
que diz que o destino de um homem está intimamente relacionado com a sua culpa
diante de Deus. O homem não pode encaixar a ação de Deus nos esquemas
preestabelecidos para seu próprio privilégio e prestígio e se transformar em
contador de Deus.
“Se não vos converterdes, perecereis todos do
mesmo modo”. A conversão é polivalente. Em sentido geral indica mudança de
vida; deixar o comportamento habitual de antes para empreender outro novo;
prescindir da busca egoísta de si mesmo para colocar-se a serviço do Senhor.
Conversão é toda decisão ou inovação que de alguma forma nos aproxima da vida
divina, nos torna mais conformes a ela e nos tornamos mais irmãos com os demais.
Na Bíblia, a
noção básica da conversão é a mudança. Envolve voltar-se do pecado, da morte e
das trevas para a graça, a nova vida e luz. A ação dual de voltar-se sempre
leva a pessoa a um novo nível de existência humana. É uma mudança total do
próprio modo de pensar e de agir, uma renovação total e integral do eu. É um
abandono total em Deus. Somente abandonando-se a Deus a ponto de se deixar
transformar inteiramente por Ele e permanecer amistosamente abraçado com Ele, é
possível esperar ser salvo.
O móvel da
conversão não é tanto a ameaça de castigo ou de perder a salvação, quanto a
fascinação de penetrar na vida do amor trinitário divino. A conversão conduz as
pessoas juntas à maturidade espiritual, que se reflete em sua aversão ao mal e
sua atração pelo bem. Um aspecto da conversão específico do NT é estar
intimamente ligado à pessoa de Jesus Cristo, em quem o Reino se realiza. A
conversão é realidade cristológica. É a união com o corpo de Cristo e íntimo
conhecimento pessoal de Jesus Cristo como Senhor ressuscitado e Salvador. Esta
conversão total não pode ser obra do homem; é tarefa que supõe dom e graça com
a resposta positiva da parte do homem. Só pode realizar-se como participação do
mistério pascal de Cristo. A conversão somente se realiza na fé; propõe-se como
resposta ao chamado de Deus, como correspondência à graça redentora.
Embora a
conversão seja experiência individual, o entendimento bíblico é que é sempre
relacional. Esta relação é bidirecional, sendo vertical e horizontal. A
conversão nos leva a um novo relacionamento com Deus e com outros seres
humanos. No AT, o relacionamento da aliança com Deus é essencial e, no NT, o
relacionamento com Jesus Cristo é primordial. Mas ambos levam a novos
inter-relacionamentos humanos com responsabilidades e privilégios na
comunidade. Por isso, o chamado bíblico à conversão é apropriadamente dirigido
a comunidades e não simplesmente a indivíduos.
A conversão
também envolve mudanças internas (de atitude) e externas (comportamentais) na
vida. A autêntica conversão cristã nunca está separada de ações concretas que
espelham a realidade interior mudada. Assim, a conversão sempre leva a algum
aspecto de responsabilidade e justiça sociais.
Além disso, o
efeito proeminente da conversão é o impulso de dar testemunho aos outros e,
conseqüentemente, evangelizar. Como a conversão é, tantas vezes, uma profunda
mudança existencial na vida, é natural que as pessoas tenham o impulso de
difundir a “Boa Nova”. De certa forma, podemos dizer que a evangelização é
definitivamente o resultado da conversão, mas precisa ser vista na perspectiva
apropriada da mensagem total da constante conversão para todos. A conversão não
é uma “carreira” acabada e sim inacabada. Trata-se de um trabalho silencioso de
cada dia. Ninguém é convertido definitivamente enquanto estiver ainda na
história.
A conversão é
crescimento contínuo; não é um acontecimento instantâneo, pontual e de uma vez
por todas; não é uma carreira acabada, mas que constitui um crescimento sem
interrupção e ascendente. Por mais decidida que seja a entrega de um cristão ao
Reino, ela tenderá sempre a ser precária. De um coração convertido aos valores
do Reino e do Evangelho se seguirão naturalmente os frutos visíveis de uma
conversão que atinge a realidade da vida.
Existem, hoje,
vários níveis de interligação de sofrimento com culpa. Muita gente hoje em dia
ainda se parece com os fariseus que mantém o sistema ou o dogma de retribuição.
Alguém como que temendo por causa de culpa impessoal, coletiva e inconsciente,
refugia-se sob a suposta proteção de um rito. Diante da ameaça de um raio, por
exemplo, benze-se com o sinal da cruz. Para essas pessoas será útil saber que
nenhum rito nos protege perante Deus se o coração continua habitado pelo
pecado. Evidentemente, quem vive em disposição constante perante Deus, pode em
momento de perigo significar por um sinal da cruz o seu constante abandono na
misericórdia de Deus. Sem esta atitude, o rito é vazio e desonra a Deus.
Jesus quer nos
libertar dessa concepção que por um lado, impede-nos de enfrentar as
verdadeiras causas dos males que ocorrem conosco ou na sociedade, remetendo-os
a demônio para desviar alguém da própria responsabilidade ou a uma espécie de
fatalidade que nos leva a nos afundarmos na passividade. Por outro lado, Jesus
quer nos apresentar a imagem do Deus de amor e de vida e não de um Deus de
castigo. Pecar é não dar fruto, não
produz nada pelo bem da humanidade ou dos outros. Esta é a mensagem da parábola
da figueira estéril. Esse Deus que Jesus nos apresenta espera com paciência,
até o último minuto de nossa vida, os bons frutos que produzimos.
Para os ouvintes
de Jesus era familiar a imagem da figueira infértil, para indicar o comportamento
infiel do povo de Deus (cf. Jr 8,13; Mq 7,1). Mas esta imagem é atual ainda. A
parábola da figueira estéril revela-nos um Deus paciente e bondoso conosco. Mas
ele é paciente para esperar que produzamos bons frutos para o Seu Reino.
Que tipos de frutos
estamos/estou produzindo? Esta figueira que Jesus fala é cada um de nós, nossa
família, a Igreja e a sociedade. Que frutos de fraternidade nós produzimos? A
figueira estéril que Jesus fala não está longe de nós. Quem sabe se não está
dentro de nós, na nossa família, na nossa comunidade?
P. Vitus Gustama,svd
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