FALAR E VIVER COM AUTORIDADE
Terça-feira da XXII Semana Comum
03 de Setembro de 2013
Texto de Leitura: Lc 4,31-37
Naquele tempo, 31 Jesus desceu a
Cafarnaum, cidade da Galileia, e aí os ensinava aos sábados. 32 As pessoas ficavam
admiradas com o seu ensinamento, porque Jesus falava com autoridade. 33 Na sinagoga, havia um
homem possuído pelo espírito de um demônio impuro, que gritou em alta voz: 34 “Que queres de nós,
Jesus Nazareno? Vieste para nos destruir? Eu sei quem tu és: tu és o Santo de
Deus!” 35 Jesus o ameaçou, dizendo: “Cala-te, e sai dele!” Então o
demônio lançou o homem no chão, saiu dele, e não lhe fez mal nenhum. 36 O espanto se apossou de
todos e eles comentavam entre si: “Que palavra é essa? Ele manda nos espíritos
impuros, com autoridade e poder, e eles saem”. 37 E a fama de Jesus se
espalhava em todos os lugares da redondeza.
___________________
Estamos
nos primeiros dias da pregação publica de Jesus segundo o evangelho de Lucas. Recusado pelo seu povo
em Nazaré, Jesus vai a Cafarnaum cuja população era uma mistura de várias
nacionalidades. Em Cafarnaum Ele fala com autoridade para as pessoas e desperta
a admiração de todos, pois Ele prega e liberta.
Todos os
evangelhos sinóticos (Mt, Mc, Lc) colocaram em destaque a autoridade
extraordinária, o prestigio que emanava da pessoa e da palavra de Jesus (Mt
7,29; Mc 1,22; Lc 4,32). Naquela época tinha bastante “escolas”, grupos de
escribas ou de letrados que faziam comentários sobre a Sagrada Escritura. Agora
Jesus faz seus próprios comentários que totalmente são novos (sem nenhuma
influência de alguma escola). Do fundo de si mesmo surgem pensamentos
magistrais revestidos de autoridade que causa a admiração no povo. O
evangelista Marcos registrou a admiração do povo diante do ensinamento de Jesus
com as seguintes palavras: “Estavam espantados com o
seu ensinamento, pois ele os ensinava como quem tem autoridade e não como
escribas” (Mc 1,22). No seu ensinamento, Jesus não se
apóia nas tradições de escolas rabínicas, pois Ele é enviado de Deus, o Filho
de Deus em quem repousa o Espírito de Deus (Mc 1,9-11). Jesus apela diretamente
para a consciência de seus interlocutores.
A autoridade de Jesus não está a
serviço de uma instituição, mas está a serviço do ser humano para que este
reconheça sua própria dignidade, seu valor e sua vocação à vida comunitária de
irmãos. A nova forma de Jesus ensinar “com autoridade” apela para valores e
atitudes fundamentais do ser humano: apela à capacidade de convivência como
irmãos do mesmo Pai do céu, apela ao reconhecimento respeitoso e tolerante do
outro, apela ao desenvolvimento da auto-estima como condições para uma
autêntica libertação da situação de marginalização em que vive a grande
maioria. Onde não houver um mútuo respeito, não haverá espaço para a mútua
admiração. O Pai que está no céu nos faz irmãos aqui na terra. Ao aceitar o Espírito de
Deus o homem se liberta de suas escravidões e se torna irmão do outro.
Por esta razão, Lucas nos relatou
também um homem endemoninhado que se encontrou dentro do templo. Um
endemoninhado é um homem possuído por uma ideologia que aliena completamente a
liberdade e o faz falar como instrumento de outro. Este personagem representa
uma parte do público (ele fala em plural: “Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste
para nos destruir?”), que se alarma diante do messianismo que Jesus pretende
expor. Esta parte do público tem medo de que o patriotismo nacionalista perca
terreno. Se Jesus continuar falando assim (com autoridade), a libertação de
Israel vai fracassar. Assim pensa esse grupo.
Jesus não se deixa instrumentalizar.
Ele liberta com conjuração o homem possuído por aquela ideologia de morte e lhe
devolve sua condição de um homem livre, que pensa por si próprio. Com a Palavra
ungida com o Espírito criador de Deus Jesus humaniza o homem no meio de tantos
oportunistas que se arrogam o poder de Deus em beneficio de seus interesses
mesquinhos. “Todo aquele que, ocupando uma
posição de autoridade, aproveita para divertir-se, para aumentar seu patrimônio,
ou para conseguir lucros pessoais, não é um servidor dos demais, mas um escravo
de si mesmo”, dizia Santo Agostinho (Serm. 46,2). Jesus não quer que o cérebro
desse homem vire um arquivo para pensamentos alheios. Jesus quer que ele tenha
coragem de criar os seus próprios pensamentos e não apenas memorizar os
pensamentos alheios.
Por isso, o episódio do homem
possuído por um espírito impuro, mais do que demonstrar autoridade de Jesus
sobre as forças do mal, quer mostrar como Jesus integra ao seio da comunidade
aquele que era excluído e recusado como muitos outros em nome de um poder que
desumaniza ou em nome de uma instituição desumanizante.
Se você quer saber quanta
autoridade tem, não se pergunte a quantos você submete, mas a quantos você
ajudou a crescer. O medo que os outros têm de você não mede sua autoridade, mas
seu poder autoritário. A autoridade põe respeito, o autoritarismo põe medo nas
pessoas. Quando alguém acredita que a força de sua autoridade está em seu poder
e não em seu amor, ele desautoriza a si mesmo como pessoa. Se ou quando alguém
precisa apelar para a força e para o poder para ser autoritário é porque como
pessoa já não tem mais autoridade. Os títulos e os cargos podem até
confirmar a autoridade que cada um tem, mas não lhe dão a que não tem.
Jesus fala como quem tem autoridade,
assim o evangelista Marcos registrou. O que significa para nós falar com
autoridade? Há palavras ou ações que nos aproximam de Jesus. Quais são estas
palavras?
Sempre que pronunciarmos uma
palavra viva, aquela que não é fingida, aquela que sabe detectar em cada
momento aquilo do qual o outro está necessitando, aquela palavra que faz o
outro melhorar e crescer, aquela que não semeia a discórdia, a palavra que
humaniza, estaremos falando com autoridade. Sempre que pronunciarmos uma
palavra compassiva, aquela que consola nos momentos de dificuldade, a palavra
que anima quem está desesperado, a palavra sincera de querer ajudar, estaremos
falando com autoridade. Sempre que pronunciarmos uma palavra solidária, aquela
que coloca as coisas no seu devido lugar, aquela que sai do coração para
aliviar a dor do outro, aquela que serena, estaremos falando com autoridade.
Sempre que pronunciarmos uma palavra de esperança que diz que nem tudo está
perdido, que o melhor está para vir porque Deus está conosco (Mt 28,20) e que
“para Deus nada é impossível” (Lc 1,37), estaremos falando com autoridade.
É bom cada um de nós fazer um exame
de consciência para saber se fala com autoridade como Jesus ou não? É bom cada
um se perguntar se está próximo de Jesus no modo de viver e de tratar os demais
ou não? Hoje em dia precisamos muito mais das pessoas com autoridade e carisma
do que das pessoas com o poder.
P.
Vitus Gustama,svd
Nenhum comentário:
Postar um comentário