segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

 
MANTER O CORAÇÃO PURO E IMACULADO

Quarta-Feira da V Semana Do Tempo Comum
12 de Fevereiro de 2014
 
 
Primeira Leitura: 1Rs 10,1-10

1Naqueles dias, a rainha de Sabá, tendo ouvido falar – para a glória do Senhor – da fama de Salomão, veio prová-lo com enigmas. 2Chegou a Jerusalém com numerosa comitiva, com camelos carregados de aromas, e enorme quantidade de ouro e pedras preciosas. Apresentou-se ao rei Salomão e expôs-lhe tudo o que tinha em seu pensamento. 3Salomão soube responder a todas as suas perguntas: para ele nada houve tão obscuro que não pudesse esclarecer. 4Quando a rainha de Sabá viu toda a sabedoria de Salomão, a casa que tinha construído, 5os manjares da sua mesa, os cortesãos sentados em ordem à mesa, as diversas classes dos que o serviam e suas vestes, os copeiros, os holocaustos que ele oferecia no templo do Senhor, ficou pasmada e disse ao rei: 6“Realmente era verdade o que eu ouvi no meu país a respeito de tuas palavras e de tua sabedoria! 7Eu não queria acreditar no que diziam, até que vim e vi com os meus próprios olhos, e reconheci que não me tinham dito nem a metade. Tua sabedoria e tua riqueza são muito maiores do que a fama que chegara aos meus ouvidos. 8Feliz a tua gente, felizes os teus servos que gozam sempre da tua presença e que ouvem a tua sabedoria! 9Bendito seja o Senhor, teu Deus, a quem agradaste, que te colocou sobre o trono de Israel, p orque o Senhor amou Israel para sempre, e te constituiu rei para governares com justiça e equidade”. 10Depois, ela deu ao rei cento e vinte talentos de ouro e grande quantidade de aromas e pedras preciosas. Nunca mais foi trazida tanta quantidade de aromas como a que a rainha de Sabá deu ao rei Salomão.
 

Evangelho: Mc 7, 14-23

Naquele tempo, 14Jesus chamou a multidão para perto de si e disse: “Escutai todos e compreendei: 15o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior. 16Quem tem ouvidos para ouvir ouça”. 17Quando Jesus entrou em casa, longe da multidão, os discípulos lhe perguntaram sobre essa parábola. 18Jesus lhes disse: “Será que nem vós compreendeis? Não entendeis que nada do que vem de fora e entra numa pessoa pode torná-la impura, 19porque não entra em seu coração, mas em seu estômago e vai para a fossa?” Assim Jesus declarava que todos os alimentos eram puros. 20Ele disse: “O que sai do homem, isso é que o torna impuro. 21Pois é de dentro do coração humano que saem as más intenções, imoralidades, roubos, assassínios, 22adultérios, ambições desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo. 23Todas estas coisas más saem de dentro e são elas que tornam impuro o homem”.

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Em Mc 7,1-23 há três cenas: Jesus, de um lado e os escribas e os fariseus de outro lado numa controvérsia (Mc 7,1-13); Jesus- multidão (Mc 7,14-15) e Jesus- discípulos (Mc 7,17-23). Mas o ensinamento de Jesus tem como objetivo educar seus discípulos para que tenham um senso crítica sobre as tradições de seu povo a fim de colocar em destaque a lei de Deus.


O texto do evangelho de hoje começa com a seguinte frase: “Jesus chamou a multidão para perto de si e disse: Escutai todos e compreendei...”. A frase “chamou a multidão” é um verdadeiro ato de convocação. Jesus faz isso de maneira concisa e incisiva e convida a multidão para pensar sobre aquilo que ele vai dizer a fim de entendê-lo. Não era fácil mudar a mentalidade daqueles que estavam ali, escutando Jesus.


Depois que atacou a hipocrisia dos fariseus que honram Deus apenas com os lábios enquanto que seu coração está longe d’Ele, agora Jesus expõe para todos o princípio sobre o santo e o profano: o que separa o homem de Deus não é o que procede de fora dele: “O que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior”.  E Marcos acrescentou: “Assim Jesus declarava que todos os alimentos eram puros”.


O livro de Levítico (AT) enumera uma serie de animais que são tabu para o Povo eleito. Comê-los significava tornar-se impuro e impedia a pessoa de participar no culto de Deus (cf. Lv 11). Semelhante proibição está em contradição coma palavra de Deus a Noé: “Tudo o que se move e vive vos servirá de alimento...” (Gn 9,3). No entanto, era necessário o povo eleito aceitar a proibição para se defender dos cultos pagãos que usavam amplamente determinados animais. Por isso, não comê-los se convertia num sinal de que o povo eleito queria viver separado dos cultos pagãos e disponível ao culto a Deus.


Jesus não discute essa boa vontade e sim a forma de conceber o “puro” e o “impuro”. Por isso, Jesus declara: “O que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior”.  A lei de Deus não é algo exterior e sim algo presente em nosso interior, em nosso coração que nos faz tomarmos atitudes e darmos respostas adequadas para o viver de cada dia. O puro e o impuro não devem ser procurados fora do homem, mas no seu coração. Dessa maneira, Jesus está em perfeita sintonia com os profetas; não se opõe à Lei e sim a aprofunda, a espiritualiza e vai à raiz do mal. Há uma impureza muito maior e a única que realmente se afasta de Deus: quando o homem se decide, livremente, pelo mal. Esta é a impureza que deve ser eliminada da vida ou do coração do homem.


Quando se fala do “coração”, deve ser entendido no sentido de toda a interioridade da pessoa, o centro da vida, das decisões e do encontro pessoal com Deus. Se o coração for bom, os gestos de relacionamento humano obedecem aos imperativos de humanizar, de fraternizar e de santificar a convivência. A pureza do agir depende da pureza do coração. Mas se o coração for mau, a vida é envenenada pela insatisfação, pela inveja, pelo ciúme, pela disputa, pela discriminação, pelo sensualismo, pelas más intenções e assim por adiante. Para Jesus, o teste decisivo para saber se o coração está perto de Deus é o comportamento fraterno para com o próximo. O coração é o lugar onde o homem se revela e onde Deus se revela. Em outras palavras pode-se dizer que a vida cristã se resume em uma palavra: AMOR. Mas o conceito do amor tem sido tão manipulado e profanado que requer uma clarificação para dissipar possíveis confusões. O amor, núcleo da vida cristã é uma atitude. Consiste em uma entrega total e desinteressada de nossa pessoa a Deus e ao próximo. A antítese do amor cristão é o ritualismo que utiliza Deus e os demais para o proveito próprio, ou um ritualismo que se desliga dos compromissos com a vida e com os problemas humanos. A relação com Deus não depende da observância de normas ou de gestos religiosos, mas da atitude fraterna para com os demais seres humanos.


Muitas vezes, somos fiscais do comportamento alheio como os fariseus, gente sempre pronta a julgar, a criticar, a condenar o próximo a partir de detalhes, muitas vezes, mínimos. Às vezes são até pessoas aparentemente boas, que acabam estragando a convivência porque adoram exibir o seu estrito cumprimento de todas as regras, sociais e religiosas, com o intuito de diminuir os demais. “Seja humilde para evitar o orgulho, mas voe alto para alcançar a sabedoria”, dizia Santo Agostinho (In ps. 130,12). Muitas vezes também nós andamos a toda hora medindo a piedade alheia pelos padrões das nossas próprias normas, sem perceber que, ao fazermos isso, estamos bloqueando o acolhimento, o testemunho de comunhão e de fraternidade que são alguns dos valores importantes na Igreja e na vida cotidiana. Precisamos estar conscientes de que a dignidade da pessoa humana não consiste em parecer bom, mas em ser bom. “É mais fácil simular virtudes do que possuí-las. Por isso, o mundo está cheio de farsantes”, dizia Santo Agostinho (De mor. Eccl. Cath. 1,12). Tudo é puro quando sai de um coração limpo. Mas tudo pode ser inútil, se for contaminado pela vaidade, pelo exibicionismo ou pela hipocrisia. Por isso, a conversão do coração e as vitórias interiores sempre são necessárias, pois elas acabam melhorando a conduta de qualquer um de nós e a qualidade de nossa convivência.
 

Honrar a Deus de verdade, para Jesus, não é apenas estar em dia com os regulamentos nem seguir devoções particulares. Honrar a Deus é fazer prevalecer a caridade fraterna, estar ao lado dos que sofrem que nos exigem gestos concretos de bondade e de amor para com eles. A vida no Espírito é antes uma realidade interior. A partir daí, o exterior é manifestação de uma verdade mais profunda. A comunidade não se cria por decreto, mas nasce quando as pessoas têm um coração que sabe amar e respeitar aos outros e quando fazem circular um espírito novo, de união e de preocupação mútua pelo crescimento dos outros.


Se quisermos cumprir a lei de Deus, devemos ter em vista sempre, em primeiríssimo lugar, os objetivos do projeto de Deus. Ele quer mais vida, mais amor, mais compaixão e misericórdia, mais partilha, mais igualdade e mais justiça. Esse é o critério mais evangélico para avaliar a legitimidade de nossa vida cristã e do nosso modo de seguir a lei. Somos Igreja para nos ajudarmos uns aos outros a crescer, não para virarmos fiscais das virtudes e da vida alheias. Somos chamados a construir um mundo mais humano e fraterno, pois Deus é o Pai de todos. “É preciso amar os homens não pela simpatia que nos inspiram nem pelas qualidades que apreciamos, mas porque Deus os ama” (Martin Luther King).
 
P. Vitus Gustama,svd

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