14 de Julho de 2014
Naquele tempo, disse Jesus aos seus
discípulos: 10,34 “Não penseis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer a
paz, mas sim a espada. 35 De fato, vim separar o filho de seu pai, a filha de
sua mãe, a nora de sua sogra. 36 E os inimigos do homem serão os seus próprios familiares.
37 Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim, não é digno de mim.
Quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim, não é digno de mim.
38 Quem não toma a sua cruz e não me segue, não é digno de mim. 39 Quem
procura conservar a sua vida vai perdê-la. E quem perde a sua vida por causa de
mim vai encontrá-la. 40 Quem vos recebe a mim recebe; e quem me recebe, recebe
aquele que me enviou. 41 Quem recebe um profeta, por ser profeta, receberá a
recompensa de profeta. E quem recebe um justo, por ser justo, receberá a
recompensa de justo. 42 Quem der, ainda que seja apenas um copo de água fresca,
a um desses pequeninos, por ser meu discípulo, em verdade vos digo: não perderá
a sua recompensa”. 11,1 Quando Jesus acabou de dar essas instruções aos doze
discípulos, partiu daí, a fim de ensinar e pregar nas cidades deles.
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Estamos nas ultimas instruções de Jesus no discurso
sobre a missão
(Mt
9,36-11,1).
Na passagem do Evangelho
de hoje Jesus nos
mostra quais
são as condições
para que sejamos Seus discípulos dignos. Radicalidade
e discipulado são inseparáveis.
1. Amar Com Amor Divino
Jesus começa a ultima parte do
discurso sobre a missão dizendo: “Não julgueis que vim trazer a paz à terra.
Vim trazer não a paz, mas a espada. Eu vim trazer a divisão entre o filho e o
pai, entre a filha e a mãe, entre a nora e a sogra...”
Quem acolhe Jesus e seus
ensinamentos se encontra, muitas vezes, numa escolha radical, inclusive nos
afetos mais íntimos, não para abandoná-los e sim para purificá-los e fazê-los mais
autênticos cristãos. O amor do pai e da mãe está inscrito na natureza e é um
mandamento de Deus (cf. Dt 20,12; 21,12. veja Mt 15,4; 19,19 e par.). Ao amar os
nossos pais reconhecemos neles o dom da vida recebida de Deus através deles. Ao
nos fazer nascer para este mundo, os pais são colaboradores do Deus Criador. No
entanto, quando os amamos no Senhor, os pais devem estar em comunhão com Deus
de Quem depende nossa vida e salvação. Os filhos não podem compactuar com a
maldade dos pais nem os pais podem colaborar com a injustiça e a desonestidade
dos filhos. neste sentido, ser verdadeiro cristão e seguir realmente a Jesus
podem provocar a oposição de nossos parentes. Amar a Jesus significa, então, amar
intensamente ao Pai do céu que nos entregou Seu Filho para nos salvar (cf. Jo
3,16) e amar com mais convicção àqueles que nos entregaram materialmente a
existência. E os pais, ao amar seus
filhos, vivem a paternidade e maternidade que tem sua origem em Deus. Ao amar a
Jesus sobre todas as coisas, os pais são capacitados a viver como maior
plenitude a doação total de si aos filhos.
O amor preferencial a Jesus, por
isso, não elimina o amor humano e sim o sublima, o faz autêntico, o faz ágape,
isto é, difusivo, nunca centralizador: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais do
que a mim, não é digno de mim. Quem ama seu filho ou sua filha mais do
que a mim, não é digno de mim. Quem não toma a sua cruz e não me segue, não
é digno de mim”. É amar os
outros no amor divino para tornar o amor sublime e divino. E o amor de Deus
purifica tudo, pois o amor divino é redentor.
Neste contexto, a paz que Jesus traz
é uma paz fundada na verdade, na justiça, na honestidade, no amor, na igualdade
e assim por diante, por isso cria conflito, divisão e oposição. Mas o cristão
tem que ser amigo da verdade em qualquer circunstância. O cristão tem que estar
do lado da verdade e do amor. A fé, quando é coerente, nos põe diante das
opções decisivas em nossa vida diariamente.
Ser cristão, seguidor de Jesus, não
é fácil, e supõe saber renunciar às tentações fáceis nos negócios. A renúncia
aos laços do egoísmo humano implica a dor das rupturas e do estranhamento
social, mas ao mesmo tempo, produz uma nova rede divina na qual estão
implicados o Pai do céu, Jesus e seus enviados e aquele que está disposto a
oferecer hospitalidade generosa aos que se comprometem com o projeto de Jesus.
Por isso, o cristão tem que ser,
antes de tudo, uma pessoa livre e responsável. Livre da mentalidade apegada ao
lucro em nome da desonestidade. Livre para enfrentar o conflito que suscita o
anúncio do Reino de Deus. Livre para se comportar e ser um verdadeiro filho de
Deus como Jesus o é. É a liberdade e responsabilidade para assumir a cruz que
implica o seguimento de Jesus. Quem foge é porque não está livre.
2. Ser Cristão é Viver No Paradoxo
Paradoxo é um pensamento que vai
contra a opinião ou contra o pensamento, porém nele tem verdade. “Quem
procura conservar a sua vida vai perdê-la. E quem perde a sua vida por causa de
mim vai encontrá-la” é uma afirmação paradoxal. ”Se o grão de
trigo que cai na terra não morre, ele continua só; mas se morre, então produz
muito fruto” (Jo 12,24), é outro exemplo da afirmação paradoxal.
Jesus continua seu discurso
dizendo: “Quem procurar conservar sua vida, vai perdê-la”. Esta
afirmação de Jesus é uma das leis fundamentais da existência: não há que tentar
possuir a vida só para si. Há que sair de si mesmo; há que aprender a
superar-se. Para viver em Deus temos que aprender a morrer. Para ganhar com
Deus, temos que aprender a perder. Para encontrar a liberdade em Deus, temos
que aprender a abandonar e a renunciar às nossas liberdades. No esquecimento de si está a verdadeira vida,
a verdadeira felicidade, o verdadeiro crescimento e a plenitude, segundo Jesus.
A preocupação pela própria vida e pelos próprios interesses pode levar o
cristão a trair a mensagem do evangelho. A busca de segurança e comodidade para
a própria existência conduz inevitavelmente para a própria ruína.
Uma existência fechada em si mesma,
centrada totalmente em si mesma, se vai esvaziando paulatinamente de sentido e
acaba se perdendo. Uma existência que aceita sair de si mesma e de seus
interesses, que se vai gastando e consumindo em beneficio dos demais, vai-se
enriquecendo e vai-se salvando. Quem não está disposto a dar a vida, está
predisposto a tirar a vida de sua fecundidade. Crer na vida eterna é entender
esta vida como um viver pelos demais. O sentido da vida não está em nós, em
nosso egoísmo, então, e sim no outro, nos outros, na solidariedade. O sentido
da vida está no Outro de todos nós que é Deus. Crer na ressurreição é viver já
para fazer possível a vida.
3. Dar é Uma Expressão da Riqueza Interior
No fim do texto Jesus nos diz: “Todo
aquele que der ainda que seja somente um copo de água fresca a um destes
pequeninos, porque é meu discípulo, em verdade eu vos digo: não perderá sua
recompensa”.
Dar significa privar-se de algo,
renunciar a algo. Estamos tão condicionados por nossa sociedade industrial e
tão inclinados a possuir, a acumular, a consumir apenas. E por isso, “dar” nos
parece algo improdutivo; um empobrecimento doloroso que não estamos dispostos a
fazer em qualquer momento. Em nossa sociedade, o homem que dá sem receber é um
homem pouco prático, sem futuro, sem sentido realista, incapaz de realizar uma
operação produtiva. No entanto, o gesto de dar é a expressão mais rica de
vitalidade, de força, riqueza e poder criador.
Quando damos algo de verdade, nos
experimentamos a nós mesmos cheios de vida com capacidade de enriquecer os
outros, ainda que seja em grau muito modesto. Dar significa estar vivo e ser
rico. Quem tem muito e não sabe dar, não é rico. É um homem pequeno, impotente,
empobrecido, por muito que possua. Precisamos aprender a dar nossa alegria,
nossa compreensão, esperança, amor e assim por diante para que nossa vida seja
cada vez mais rica em Deus.
“Todo aquele que der ainda que
seja somente um copo de água fresca a um destes pequeninos, porque é meu
discípulo, em verdade eu vos digo: não perderá sua recompensa”. Damos algo ou nos damos não para ganhar
recompensa, mas é a parte essencial do ser cristão a exemplo de Jesus que “passou a
vida fazendo o bem” (At 10,38). Dar é a expressão da minha riqueza interior e do
meu despojamento. Trata-se de um caminho de libertação das garras da ganância.
P. Vitus Gustama,svd
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