quarta-feira, 16 de julho de 2014

 
TRABALHAR EM FUNÇÃO DA DIGNIDADE DO SER HUMANO E SUA SALVAÇÃO

Sexta-Feira da XV Semana Comum
18 de Julho de 2014
 

Evangelho: Mt 12,1-8

1 Naquele tempo, Jesus passou no meio de uma plantação num dia de sábado. Seus discípulos tinham fome e começaram a apanhar espigas para comer. 2 Vendo isso, os fariseus disseram-lhe: “Olha, os teus discípulos estão fazendo o que não é permitido fazer em dia de sábado!” 3 Jesus respondeu-lhes: “Nunca lestes o que fez Davi, quando ele e seus companheiros sentiram fome? 4 Como entrou na casa de Deus e todos comeram os pães da oferenda que nem a ele nem aos seus companheiros era permitido comer, mas unicamente aos sacerdotes? 5 Ou nunca lestes na Lei, que em dia de sábado, no Templo, os sacerdotes violam o sábado sem contrair culpa alguma? 6 Ora, eu vos digo: aqui está quem é maior do que o Templo. 7 Se tivésseis compreendido o que significa: ‘Quero a misericórdia e não o sacrifício’, não teríeis condenado os inocentes. 8 De fato, o Filho do Homem é senhor do sábado”.
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Com este capitulo (Mt 12) começam as controvérsias entre Jesus e os fariseus. Desta vez a controvérsia gira em torno da observância do Sábado.


A observância do Sábado era entre os principais mandamentos. Era tão importante como todos os mandamentos juntos. Todo trabalho era proibido (cf. Dt 5,14). Tinha uma lista de 39 trabalhos proibidos no Sábado. E cada um desses 39 trabalhos proibidos se desdobrava em mais seis, ao todo 234 atividades proibidas. Transgredir o Sábado podia levar o acusado à condenação. A punição prevista chegava à pena de morte (cf. Ex 31,12-17; 35,1-3). Durante o exílio na Babilônia observar o Sábado era um sinal da identidade israelita entre os gentios.


Na verdade inicialmente observar o Sábado tinha como finalidade o descanso humano, para celebrar a libertação humana (interpretação da tradição deuteronomista. Cf. Dt 5,12-15). Mais tarde na tradição sacerdotal (cf. Ex 20,8-11), o descanso sabático tinha como finalidade imitar o repouso de Deus ao findar-se a obra da Criação. Com essa interpretação o Sábado passou a ser considerado como dia a ser “santificado”, dedicado a Deus e ao culto.


Na verdade, ao comentar Ex 31,13-14 os rabinos permitiam realizar trabalho em Sábado, se fosse em função de socorrer alguém em extremo perigo de vida. Eles diziam: “O homem não foi feito para o mundo, mas o mundo para o homem”. Ou: “O Sábado foi entregue a vós, não vós ao Sábado” (Simeão ben Menaxa, em 180 a.C, na época dos Macabeus). Na mesma linha está o Segundo Livro dos Macabeus: “Não foi por causa do Lugar que o Senhor escolheu o povo e sim por causa do povo, o Lugar” (2Mc 5,19).


Na interpretação dos fariseus sobre a observância do Sábado o que conta é a Lei. Os fariseus julgam o atuar humano a partir da lei e o julgam sob o aspecto que afeta a um preceito determinado, não a lei em seu conjunto. Os fariseus sabem que no Sábado pode-se comer, mas não se pode “colher”. Para eles cortar as espigas é colher. Logo este ato é considerado como trabalho e por isso, é proibido. Daí a pergunta deles: “Olha, os teus discípulos estão fazendo o que não é permitido fazer em dia de sábado!”. Ama menos quem se preocupa apenas com a lei e não com a dignidade do ser humano.


Jesus, na sua interpretação sobre a observância do Sábado, destaca a importância máxima do ser humano. Toda a atividade de Jesus tem como centro o ser humano e sua salvação. Para Jesus o que conta é o homem. Em nome da importância máxima do homem Jesus cita o profeta Oseías: “Quero a misericórdia e não o sacrifício” (Os 6,6). Com esta citação Jesus destaca a dignidade do homem diante de Deus. Em nome de um ser humano necessitado de libertação e de salvação Jesus é capaz de “transgredir” uma lei por mais sagrada que ela pareça ser, como o Sábado. Em nome do ser humano por amor Deus Pai enviou Seu Filho unigênito a fim de salvar a humanidade (cf. Jo 3,16). Em nome do ser humano e sua salvação, Jesus aceita ser perseguido, crucificado e morto. O preço de nossa salvação é o sangue de Jesus derramado na Cruz. Ao olhar para a Cruz de Jesus sabemos logo o quanto Jesus nos amou. E o mesmo Jesus continua se oferecendo como alimento para todos os seus seguidores, pois Ele continua nos amando. Por isso, ao participar da Eucaristia sabemos o quanto Jesus nos ama, pois Ele nos alimenta com seu próprio Corpo para podermos fazer nossa caminhada rumo à comunhão plena com nosso Deus e para que sejamos vida para os outros. A Eucaristia é nosso “Viático”, isto é, nosso alimento para nossa viagem nesse mundo rumo ao encontro derradeiro com Deus.


Por causa da grandeza do homem e de sua dignidade entre outras criaturas o Salmista fez a seguinte oração: “Quando contemplo o firmamento, obra de vossos dedos, a lua e as estrelas que lá fixastes: Que é o homem, digo-me então, para pensardes nele? Que são os filhos de Adão, para que vos ocupeis com eles? Entretanto, vós o fizestes quase igual aos anjos, de glória e honra o coroastes. Destes-lhe poder sobre as obras de vossas mãos, vós lhe submetestes todo o universo” (Sl 8,4-7).


“Que é o homem de quem cuidas Tu, Senhor? Um ponto de poeira num cosmos de luz. (...) Sorrio em reconhecimento quando vejo que fizeste de mim o rei da tua criação, inferior, tão-somente, a Ti mesmo. Conheço a minha pequenez e a minha grandeza, a minha dignidade e a minha insignificância... Grande é o Teu Nome, ó Senhor, por toda a terra” (Carlos G. Valles. Busco Tua Face, Senhor: Salmos para contemplação. Ed.Loyola).


Sao Boaventura colocou na boca de Deus as seguintes palavras sobre o ser humano: "Quando te criei, pus sobre tua fronte a imagem da minha divindade, adaptei-me à imagem da tua humanidade quando te quis redimir; tu, pois, que cancelaste a imagem da minha divindade, impressa na tua fronte quando foste criado, retém ao menos na mente a imagem da tua humanidade, impressa em mim quando quis redimir-te; se não soubeste ficar qual tal te criei, sabe ao menos reter-me como eu fiz quando de novo te criei".


 “Quero a misericórdia e não o sacrifício”, diz-nos Jesus hoje. O culto e a vida, a oração e a convivência fraterna devem andar de mãos dadas. Trazemos nossa vida para nossa oração e levamos para a vida nossa oração na convivência fraterna.


Toda a atividade na Igreja do Senhor está em torno das pessoas e não em torno do trabalho. Na Igreja do Senhor, jamais pode ser colocada a pessoa de lado em função do trabalho. Trabalhamos na Igreja em função das pessoas e sua salvação e não em função do próprio trabalho. As pastorais e os movimentos existem para alcançar esse objetivo. Por isso, a seguinte pergunta permanece como um alerta: Se Jesus coloca o ser humano como o centro de sua atividade, qual é o lugar do homem, das pessoas nas nossas atividades pastorais e profissionais? “Quero a misericórdia e não o sacrifício”.
 
P.Vitus Gustama, SVD

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