sexta-feira, 28 de novembro de 2014

I

ADVENTO: O SENHOR VEM ME VISITAR. O QUE PRECISO FAZER?

Sabemos que, civilmente, o ano novo começa no dia primeiro de janeiro. Mas, na liturgia, o ano novo (um novo ano litúrgico) começa no primeiro domingo do Advento e termina no XXXIV domingo do Tempo Comum, na festa do Cristo, Rei do Universo. Na liturgia, há três anos: o ano “A”, durante o qual refletimos sobre o evangelho de Mateus; o ano “B”, o evangelho de Marcos; e o ano “C”, o evangelho de Lucas. O evangelho de João é refletido durante as festas, como no Natal, no tempo da páscoa e em alguns domingos do Ano Marcos, pois o evangelho de Marcos é curto, tem 16 capítulos.


O termoAdvento” significa “vindaouchegada”. O “Advento” indicava, na linguagem pagã, a vinda periódica de Deus e sua presença teofânica no templo. Equivale a “retornoouaniversário”. Do ponto de vista cristão, Advento era a última vinda do Senhor no final dos tempos. Mas, ao se instaurarem as festas do Natal e da Epifania, o Advento significou também a vinda de Jesus na humildade da carne.


A partir desse sentido, o Advento é tempo de na esperança, que nos prepara para a dupla vinda do Senhor: a vinda histórica, na encarnação, por meio de Maria (Natal), e a vinda escatológica, ao final dos tempos (Parusia). Essas duas vindas são consideradas como uma , desdobrada em duas etapas. Essa dupla dimensão caracteriza todo o Advento. São Bernardo acrescentou uma vinda: a vinda do Senhor às almas pela graça. Essa é a vinda principal, sem a qual as outras duas nos resultariam inúteis ou perigosas. Sem a graça na alma, torna-se inútil a primeira vinda de Cristo para nos redimir, pois a graça é o fruto da redenção. E sem a graça na alma, será terrível a segunda vinda de Cristo para nos julgar, porque seria, então, como uma vinda para nos condenar.


Quando se fala da vinda, fala-se também da espera. Esperar é situar-se em estado de receptividade. Mas a nossa espera deve ser acompanhada com esperança. Esperar com esperança é estar convencido de que, pela fidelidade de Deus, vai nos chegar algo que supera nossas forças e que deve vir: o Reino de Deus em sua plenitude. O estado de receptividade exige outra atitude: vigilância. “Vigiar” equivale a velar solicitamente sobre algo ou sobre alguém durante um tempo, até alcançar o final desejado. A vigilância diante da chegada de Deus equivale a estar desperto, em disposição de serviço, com uma atitude atenta diante do futuro, sem evasão do presente, apesar da indiferença encontrada neste mundo. A vigilância consiste em discernir os sinais dos tempos para reconhecer a presença de Deus e do seu reino nos acontecimentos. Preciso descobrir o que Deus quer de mim e o que Ele quer me falar através de tudo isso. Mas, se converter um processo religioso da espera em algo comercial que logo pode converter-se em qualquer coisa, o cristão não espera mais em nada e a esperança cristã será uma palavra vazia e que, precisamente por isso, segue a lei do vazio de deixar-se preencher por outras esperanças caducas.


É preciso esperar a chegada do Senhor com humildade. Ser humilde significa aceitar a parte terrena que todos temos; significa descer, buscar e encontrar tudo o que somos, aceitando-nos tal como somos. Quando o coração se faz humilde, ele é capaz de amar em abundância. Ser humilde é deixar a luz de Deus entrar no nosso coração para fazer desaparecer os maus sentimentos que produzem nossas misérias. Nunca serei compassivo, se eu não admitir minha dureza interior. Nunca chegarei a ser criativo, se eu não for capaz de reconhecer toda a minha mesquinhez que se esconde no meu coração. “Humildade é a honesta confissão do ser pecador. É melhor um pecador humilde que um beato orgulhoso” (Santo Agostinho).


Portanto, aproveitemos o Advento para dar um bom passo ao nosso interior. Façamo-nos humildes e teremos a grande felicidade de viver plenamente o Natal. FELIZ ADVENTO!!!   SHALOM !!!

P. Vitus Gustama,svd


II


VIGILÂNCIA CRISTÃ É ESTAR PREPARADO PARA ACOLHER O SENHOR QUE VEM NOS SALVAR

I DOMINGO DO ADVENTO DO ANO “B”
30 de Novembro de 2014

Evangelho: Mc 13,33-37

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 33 Cuidado! Ficai atentos, porque não sabeis quando chegará o momento. 34 É como um homem que, ao partir para o estrangeiro, deixou sua casa sob a responsabilidade de seus empregados, distribuindo a cada um sua tarefa. E mandou o porteiro ficar vigiando. 35 Vigiai, portanto, porque não sabeis quando o dono da casa vem: à tarde, à meia-noite, de madrugada ou ao amanhecer. 36 Para que não suceda que, vindo de repente, ele vos encontre dormindo.
37O que vos digo, digo a todos: Vigiai!

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Mc 13,1-37, onde se encontra o texto evangélico deste domingo primeiro domingo do Advento do Ano litúrgico “B”, é conhecido como “Apocalipse de Marcos” ou “discurso escatológico”. É um discurso mais amplo de Jesus de todo o evangelho de Mc. Mc abre a seção com a admiração dos discípulos pelo esplendor do Templo(v.1), que  recebe a resposta de Jesus sobre o desaparecimento iminente de todo esse esplendor(v.2). Por isso, surge a pergunta dos discípulos sobre o tempo em que  tudo isso acontecerá e os sinais que anunciarão isso(vv. 3-4). Percebemos na seqüência da narrativa que a pergunta não se faz a respeito da destruição do templo, e sim a respeito dos últimos dias, pois o discurso vai falar dos acontecimentos dos últimos dias e dos sinais que precederão, e não da destruição de Jerusalém e do templo.
  

Neste capítulo 13, Mc une diversas matérias: algumas são propriamente apocalípticas que descrevem os acontecimentos dos últimos dias e a atitude requerida perante os mesmos(vv.7-8.14-20.24-27; e outro bloco: vv.5-6.21-23); outras têm o tom de consolação e conforto para os cristãos nos momentos de perseguição(vv.9-13). E no fim do discurso encontram-se outras matérias diversas: a parábola da figueira(vv.28-29); o momento da parusia(vv.30-32) e termina com a exortação para a vigilância(vv.33-37).
    

Apesar das matérias diversas, Mc consegue colocar todas elas dentro duma inclusão literária constituída pelos vv.5 e 37 que enfatiza a importância da vigilância. Na exortação inicial fala-se do perigo dos falsos messias que surgem sempre quando a sociedade passa por uma crise profunda o que leva a tomar uma atitude de vigilância(vv.5-6). E na última exortação fala-se da falsa segurança. Daí percebemos a intenção de Mc em alertar os cristãos para que estejam vigilantes constantemente, pois ninguém sabe quando chegará o “momento”(v.33). O que o mais importante, então, não é o momento em que isso acontecerá, e sim o que deve-se fazer para que ninguém  se pegue de surpresa.
   

O ensinamento que nos oferece esta unidade narrativa tem como destinatários a um grupo restringido de discípulos(cf. Mc 13,3). Esta unidade se situa imediatamente antes dos acontecimentos da paixão e da morte de Jesus que pode nos induzir a pensar que nos encontramos diante de um discurso de despedida. Em seus últimos dias em Jerusalém, Jesus revelaria aos mais íntimos os sofrimentos e perigos que lhes aguardavam, exortando-lhes a fidelidade e a perseverança na missão que lhes havia confiada.. Sem dúvida, neste discurso faltam as marcas características dos discursos de despedida(cf. Jo 13-17). Por isso, este discurso deve-se considerar muito mais como um discurso escatológico, do que um simples discurso de despedida, que com uma linguagem profético- apocalíptica, descreve a missão da comunidade cristã no período intermédio , isto é, no presente.
  

A missão confiada à comunidade cristã não é fácil. Ela tem que seguir fielmente os ensinamentos de Jesus Cristo a ponto de ser crucificada como ele. Da comunidade cristã exigem-se a fidelidade, a coragem e a vigilância no presente, sublinhando o futuro que lhe aguarda. A vitória que lhe aguarda faz a comunidade lutar sem medo apesar de dificuldades que ela encontra no caminho.


Mensagem do texto de Mc 13,33-37
  

Não é difícil descobrir o tema central do Evangelho deste Domingo: basta observar qual é a palavra que aparece mais vezes. É o verbo “vigiar” que em cinco versículos é repetido com uma insistência quase excessiva.

Por que temos que vigiar?
  

Jesus nos dá este motivo: “Prestai atenção, vigiai, pois não sabeis quando será o tempo/momento”(v.33). “Tempo” ou “momento” é uma tradução da palavra grega “kairós”. “Kairós” indica um tempo determinado e tem aqui uma conotação escatológica de tempo determinado por Deus para a vinda gloriosa do Cristo. Esse “tempo determinado” é desconhecido dos homens. Daí a necessidade de estar sempre vigilante à espera desse tempo determinado por Deus.
  

A exortação de Jesus à vigilância visa criar no nosso coração a atitude correta de quem deseja acolher o Senhor que vem ao nosso encontro. A exortação não fornece o temor e a angústia, pois, de fato, nós esperamos o que já temos garantido pela fé que é o fundamento de nossa esperança. E por sua vez, a esperança mantém e reaviva o nosso amor por Cristo que vem. Por isso, a espera cristã deve ser produtiva, alegre e serena.
  

Mas o que é vigiar?

Vigiar, no sentido próprio, significa renunciar ao sono da noite; pode-se fazê-lo para prolongar o trabalho(Sb 6,15) ou para evitar ser apanhado de surpresa por um inimigo(Sl 127,1s). Daí o sentido metafórico: vigiar é lutar contra o torpor e a negligência a fim de se chegar à meta visada(Pv 8,34). Para o crente/cristão a meta é estar pronto para receber o Senhor, quando chegar o seu Dia; é por isso que ele vigia e está vigilante, a fim de viver na noite sem ser da noite.
   

Nos evangelhos sinôticos, a exortação à vigilância é a principal recomendação de Jesus a seus discípulos como conclusão do seu discurso escatológico . A vigilância caracteriza, portanto, a atitude do cristão/discípulo que espera e aguarda a volta do Senhor: ela consiste antes de tudo em manter-se em estado de alerta, e com isso mesmo exige o desprendimento dos prazeres e dos bens da terra(Lc 21,34ss). A Igreja é a assembléia que sempre deve estar em estado de vigilância, lendo a vinda do Senhor nos acontecimentos, para permitir-lhe um encontro feliz com o Senhor glorioso.
   

Concretamente podemos dizer que vigiar significa pôr em prática as palavra de Jesus, especialmente o mandamento do amor. Significa enfrentar a tentação do egoísmo, que nos leva a convencer-nos da inutilidade de fazer o bem. Significa acreditar que vale a pena lutar para construir o Reino de Deus, a exemplo de Jesus, num mundo onde a injustiça e a maldade parecem falar mais alto. Significa estar sempre disposto a perdoar e a se reconciliar, revertendo a espiral da violência que assume proporções sempre maiores. Significa ser capaz de detectar tudo quanto possa desviar nossa atenção do convite de Deus para o encontro definitivo com Ele. Significa estar vigilante no que se deve falar e no que não se deve: ser vigilante nos comentários, nos julgamentos etc....Vigiar é aprender a falar o necessário.  É aprender a ficar em silêncio para avaliar as palavras soltas sem reflexão para não repeti-las novamente.
  

A vigilância é a atitude própria do amor que vela. O amor sempre mantém o coração alerta. A chegada de Cristo exclui todo temor, pois não há temor no amor. A vigilância nos ensina a ler a vinda do Senhor nos acontecimentos e nas pessoas.
  

Para manter este estado de vigilância é necessário lutar porque temos a tendência de vivermos de olhos cravados nas coisas da terra. O dono da casa, na parábola, é Jesus Cristo. Isto quer dizer que Ele é o sentido da nossa vida. É a razão de ser da Igreja. Trabalhemos para que na chegada do Senhor a justiça, a misericórdia, o perdão e obras de caridade estejam bem cultivados entre nós.
  

Mas a vigilância cristã é sempre perseverante e se alimenta da esperança. Por isso, a pessoa vigilante não se abate, ainda que a realidade seja desesperadora porque ele sabe em quem acredita: em Deus que transforma o impossível no possível. Um cristão vigilante sabe olhar para além da História do horizonte material e contemplá-la na perspectiva de Deus, segundo o ensinamento de Jesus. A vigilância permite o cristão descobrir nela uma lógica inacessível para quem não tem fé. Por isso, um cristão verdadeiro nunca será esmagado pelo peso da história e pela situação desesperadora.
     

Portanto, celebrar o Advento não significa celebrar só as coisas do passado, pois este Advento está sempre em andamento. É o Filho de Deus que continuamente visita e freqüenta o coração daqueles que sabem crer, amar e esperar. Cristo está em contínuo advento, sempre e incansavelmente a caminho de nossa casa. E o lugar que Ele mais ambiciona é um coração convertido, que tenha a coragem de se “reformar” e de se abrir ao amor, à fraternidade, à justiça e ao perdão. Por isso, não tenhamos medo de oferecer-lhe nosso ódio, amargura, desapontamento, mágoa, rancor, tristeza, desespero etc. porque o Senhor se revela como AMOR. Só criando espaço para Cristo num coração convertido é que conseguiremos chegar à meta e Cristo virá morar conosco.
   

Por isso, o Advento é o tempo de purificação, de revermos nossa vida: nossos gestos, nosso lar pois é Deus que se aproxima. Mais do que de flores, de lâmpadas coloridas ou de pinheiros verdes, vamos enfeitar o nosso coração  daquilo que não se encontra nas lojas: a paz  e a alegria no lar  e o amor no coração: o amor é uma “carta” aberta, um presente sem embalagem, pois o amor é a abertura para com os outros. Vamos fazer presépio vivo no nosso coração, um presépio construído com toda a sensibilidade, com a arte de amar, de perdoar, um presépio de carinho. E este presépio vivo dentro de nosso coração se expressa através de amor e de alegria nos cartões, nas cartas e nos telefonemas. Este presépio vivo dentro de nós deve ser eterno, não é preciso acabá-lo dentro de alguns dias durante o Natal. Temos uma vida para aperfeiçoá-la. Vamos fazer de nossa vida um eterno Natal de amor e de alegria.
 

Portanto, a palavra “vigiar” que aparece várias vezes no Evangelho deste primeiro Domingo do Advento é para a gente vigiar mesmo. Porque quando chega o Natal, as propagandas comerciais, a arrumação da casa e a preocupação dos cartões e dos presentes podem desviar nossa atenção do dono da festa: Jesus Cristo.
  

Que cada um de nós seja capaz de dizer e de viver esta frase: “Quero neste Natal ser rico por dentro. Não quero ter apenas embalagem, quero ter um coração como o de Cristo, cheio de amor e de justiça e de perdão.”

P. Vitus Gustama,svd

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