SER PERMANENTE VIGILANTE
Sexta-Feira da XXXII
Semana Comum
14 de Novembro de 2014
Evangelho: Lc 17,26-37
Naquele tempo, disse Jesus aos seus
discípulos: 26 Como aconteceu nos dias de Noé, assim também acontecerá nos dias
do Filho do Homem. 27 Eles comiam, bebiam, casavam-se e se davam em casamento,
até ao dia em que Noé entrou na arca. Então chegou o dilúvio e fez morrer todos
eles. 28 Acontecerá como nos dias de Ló: comiam e bebiam, compravam e vendiam,
plantavam e construíam. 29 Mas no dia em que Ló saiu de Sodoma, Deus fez chover
fogo e enxofre do céu e fez morrer todos. 30 O mesmo acontecerá no dia em que o
Filho do Homem for revelado. 31 Nesse dia, quem estiver no terraço, não desça
para apanhar os bens que estão em sua casa. E quem estiver nos campos não volte
para trás. 32 Lembrai-vos da mulher de Ló. 33 Quem procura ganhar a sua vida,
vai perdê-la; e quem a perde, vai conservá-la. 34 Eu vos digo: nessa noite,
dois estarão numa cama; um será tomado e o outro será deixado. 35 Duas mulheres
estarão moendo juntas; uma será tomada e a outra será deixada. 36 Dois homens
estarão no campo; um será levado e o outro será deixado.' 37 Os discípulos
perguntaram: 'Senhor, onde acontecerá isso?' Jesus respondeu: 'Onde estiver o
cadáver, aí se reunirão os abutres.'
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Continuamos a escutar as últimas e
importantes lições de Jesus no seu caminho para Jerusalém onde Ele será crucificado,
morto e glorificado (Lc 9,58-19,28).
No texto do evangelho do dia
anterior, Jesus nos anunciava sobre a imprevisibilidade da chegada do Reino de
Deus (cf. Lc 17,20-25). No texto do
evangelho de hoje Jesus reforça sua afirmação comparando sua vinda à do dilúvio
no tempo de Noé e ao castigo sobre Sodoma no tempo de Ló (Lot). E por isso,
Jesus quer que estejamos permanentemente vigilantes. Trata-se, então, da lição sobre
a vigilância.
Para falar sobre a vigilância no
texto do evangelho de hoje Jesus usa uma linguagem apocalíptica, aludindo, uma
parte, aos dias cruciais de Noé e do dilúvio, e outra parte, aos dias cruciais
do encontro derradeiro dos homens com Deus, seu Criador. Em ambos os tempos se
encontram Deus, amor, Criador, juiz misericordioso e nós, homens, pecadores,
objetos do amor misericordioso de Deus (cf. Jo 3,16; Jo 13,1).
O juízo de Deus se revela em forma
de surpresa (Lc 17,26-32), como aconteceu na época de Ló (Lot) onde os homens
continuavam ocupados em grandes afazeres da vida: fortuna, diversão, comida,
negócios, vida familiar, vida de prazer e assim por diante, e foram
surpreendidos por uma fatalidade.
Às vezes, o centro da vida de uma
pessoa é o trabalho. Muitas pessoas estão submersas nas realidades temporais
que absorvem totalmente sua atenção: subsistência, vida família, vida
profissional (carreira), dinheiro e os demais bens materiais, prazer e assim
por diante. Mas a vida está acima e além da história e do tempo. Deus é quem dá
sentido à vida dos homens. Deus é quem responde os anseios mais profundos. A vida
sem sentido se torna vazia. O sentido da vida está n’Aquele que criou a vida. Por
isso, “O homem, para onde se dirija, sem se apoiar em Deus, só encontrará
dor. E ninguém está tão só do que aquele que vive sem Deus” (Santo
Agostinho). Para algumas pessoas há uma dependência exagerada do trabalho.
Quando há dependência, não há liberdade. Há pessoas que se entreguem a tudo
desde que não fiquem no vazio. Mas cedo ou tarde chegará esse vazio quando a
pessoa perder suas forças para trabalhar. O trabalho absorve tanto a vida de um
ser humano a ponto de ele esquecer a dimensão profunda de sua vida. “Saberás da dor de estar só e da pena de estar com muitos... Saberás
das escuras que são as noites e os longos que podem ser os dias... Saberás da
fome da carne e da angústia do espírito...”, escreveu o Papa João XXIII
(São João XXIII). Não se pode ignorar que tudo quanto se alcança
(materialmente, socialmente) se perde. Só o que se é, permanece. A vida nunca é
o que se tem. A vida é o que se é. “Saberás que o amor ajuda. Que a compreensão alenta. Que a
esperança sustenta. Que a fé engrandece. E que tu estás com o Senhor”
(João XXIII).
Em silêncio de cada dia Deus
continua nos chamando para uma autêntica verdade de nossa vida. Para poder
ouvir esse Deus é necessário criar o silêncio dentro de nós. Noé escutava esse
Deus e se salvou do dilúvio (cf. Gn 7,1-8,22). Ló (Lot) escutava a voz de Deus
e se escapou do fogo devorador (cf. Gn 19,1-29). O silêncio possibilita a
presença da eternidade. No silêncio posso me encontrar com a própria verdade.
No silêncio posso encontrar meu eixo e minha salvação. Ao contrário, no meio de
muito barulho e de muita agitação nada se escuta claramente e nada se vê
nitidamente. A agitação não deixaria de ser uma fuga do encontro consigo
próprio e com a verdade. O silêncio é um verdadeiro encontro. Qualquer encontro
dá-se e realiza-se a partir do esvaziamento para possibilitar o próprio
encontro e a partilha. Somente podemos apertar a mão do outro se as duas mãos
(a minha e a do outro) estiverem vazias.
Diante desta chamada silenciosa de
Deus há dois tipos de reações: os que estão demasiadamente ocupados em seus
negócios preferem não escutar, pois para eles isso tiraria seu momento de
prazer como os habitantes de Sodoma. E os que, escutando em princípio a
chamada, sentindo a nostalgia do mundo que abandonaram, voltam ao mundo antigo,
como aconteceu com a mulher de Ló (Lot) e se tornou vítima fatal dessa volta
para o mundo antigo (cf. Gn 19,26). São Pedro nos alerta com as seguintes
palavras: “Com efeito, se, depois de fugir às imundícies do mundo pelo conhecimento
de nosso Senhor Jesus Cristo, de novo são seduzidos e se deixam vencer por
elas, o seu ultimo estado se torna pior do que o primeiro” (2Pd 2,20; leia
2Pd 2,4-22). Foi isso que aconteceu com a mulher de Ló (Lot). Não podemos
seguir a Jesus que é a novidade de nossa vida e viver como antes.
O tempo de Deus é um dom, mas por
sua natureza está ligado a uma tarefa que devemos realizar. Para responder
adequadamente a esse dom é exigido de nós um compromisso no qual estamos
obrigados a empenhar toda nossa força e nossa atuação para praticar o bem. A
liberdade que nos é concedida deve adequar-se ao querer de Deus acerca da
história dos homens e sua salvação. E as leituras bíblicas destes dias são um
aviso para que estejamos preparados e vigilantes permanentemente olhando com
seriedade para o futuro vivendo o presente na sua profundidade e tratar a vida
com carinho, pois a vida é de Deus e Deus está nela.
Deus está aqui e agora na vida de
cada um de nós. Deus se faz homem em Jesus Cristo e Jesus Cristo se faz
alimento para nós na Palavra proclamada, meditada e vivida e na Eucaristia. O
Jesus eucarístico que recebemos na Eucaristia será nosso Juiz, como Filho do
Homem, e, Ele nos assegura: “Quem come minha carne e bebe meu sangue tem a vida
eterna e Eu o ressuscitarei no ultimo dia” (cf. Jo 6,35-57). Aceitar Jesus
Cristo e reconhecê-Lo como nosso Deus (Jo 1,1-3.14), como Caminho, Verdade e
Vida (Jo 14,6) significa não perder a oportunidade de que Aquele que é esperado
como Juiz no final dos tempos, chegará para nós como Pastor misericordioso para
nos levar, nos seus ombros, de retorno para a casa do Pai (cf. Jo 14,1-3).
Então, estaremos certos de que seremos de Deus e estaremos com Ele na
felicidade eterna.
P. Vitus Gustama,svd
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