INTERROGAR SOBRE JESUS E SER CARTA DE
JESUS
Quinta-Feira da XXV Semana Comum
25 de Setembro de 2014
Evangelho: Lc 9, 7-9
Naquele tempo, 7 o tetrarca Herodes
ouviu falar de tudo o que estava acontecendo, e ficou perplexo, porque alguns
diziam que João Batista tinha ressuscitado dos mortos. 8 Outros diziam que
Elias tinha aparecido; outros ainda, que um dos antigos profetas tinha
ressuscitado. 9 Então Herodes disse: “Eu mandei degolar João. Quem é esse
homem, sobre quem ouço falar essas coisas?” E procurava ver Jesus.
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O modo de viver de Jesus, os valores
que ele vive e prega, a igual maneira de ele tratar as pessoas, sua preocupação
com a vida do povo em geral e de cada pessoa em particular, sua independência perante
a lei religiosa, sua compaixão pelo povo abandonado pelas autoridades chamam
muito atenção de todos, especialmente das autoridades. Por se preocupar com a
vida do povo, a presença de Jesus se torna uma censura viva para as autoridades
que só pensam em sua própria vida e em seu próprio poder. Herodes Antipas, tetrarca
da Galiléia, uma das autoridades, ficou perturbado com a fama de Jesus.
Curiosamente, a pergunta de Herodes
sobre Jesus surge entre o relato da missão dos Doze e o da multiplicação dos
pães. Herodes se pergunta: “Eu degolei João. Quem é, pois, este, de quem
ouço tais coisas? E procurava ocasião de vê-lo”.
A pergunta de Herodes tem outra
profundidade, efetivamente, coincide com a pergunta de todos os que se sentem
interpelados pela pessoa e pelo modo de viver de Jesus e pelo testemunho dos
discípulos. Herodes Antipas estava cheio de curiosidades porque no meio do povo
se falava muito de Jesus, se contava mil coisas sobre Ele, dos seus lábios
saiam palavras com poder e autoridade, se contavam fatos extraordinários como
os milagres realizados por Ele. Herodes que estava no poder queria ver esse
individuo tão “exótico” numa Galiléia tão provinciana. Seu pai, Herodes, o
Grande, tinha a curiosidade de conhecer Jesus - menino, rei recém-nascido, mas
com o intuito de eliminá-lo (cf. Mt 2,1-23). Uma das maneiras de falar de Deus
e com Deus é a “voz de nossa consciência”. Herodes não tinha sua consciência
tranqüila: uma voz do fundo de si mesmo lhe recordava seu pecado, sua maldade.
Por isso, fica inquieto.
A sabedoria popular diz que há
curiosidades maldosas, tais como as de Herodes,... quando permitem abusar de um
poder ou de um interesse que elas atribuíram injustamente; quando alimentam o
escândalo que elas mesmas exploram ou inventaram. Herodes queria ver Jesus para
colocá-lo em sua Corte.
Mas se há curiosidades maldosas, precisamos
estar conscientes de que a curiosidade também é o primeiro passo para o
encontro e para a fé. O assombro, a surpresa, a provocação são o pórtico que
nos introduz no descobrimento dos labirintos da casa e que nos inicia no
mistério de uma morada.
A curiosidade é boa, pois ela
desperta à vida. Uma criança vive na permanente curiosidade, e pergunta
constantemente, pois ela quer saber mais e mais. Para ela o mundo está cheio de
surpresas. O sentido da vida consiste em interrogar, em ser interrogado e em se
interrogar. Curiosidade é sinônimo de descobrimento; é tensão até um objeto
entrevisto ou desejado.
Ao lado da curiosidade há dúvida. A
dúvida é o estado de equilíbrio entre afirmação e negação. Quem tem dúvida fica
impedido de afirmar ou de negar por falta de dados nas mãos. A dúvida nos
empurra para procurar fundamentos para podermos afirmar ou negar ou para
podermos ter certeza daquilo que nos faz duvidosos. A incredulidade é, ao
contrário, uma ausência da crença.
Herodes sentiu curiosidade de querer
ver Jesus. Mas com qual finalidade de ele querer ver Jesus? Para armar alguma
cilada? Para ouvir da própria boca de Jesus de tudo que o povo fala e comenta?
Para pedir de Jesus algum milagre ou alguma ajuda para o povo? Para
desacreditá-Lo diante do povo? O texto não fala e por isso, não sabemos. Ele só
terá oportunidade de ver Jesus na sua Paixão. Mas Jesus se manterá calado
diante de Herodes, pois Herodes agirá de má-fé. Diante do silêncio de Jesus
Herodes morrerá, um dia, sem saber quem é Jesus.
Será que nós, chamados de cristãos,
ainda sentimos curiosidade por Jesus? Será que já descobrimos esse Jesus na sua
profundidade? Será que conhecemos realmente esse Jesus? Será que somente
confessamos em Jesus nas definições sem alma e reconhecê-lo nos dogmas frios e
secos? Será que paramos de ter curiosidade sobre a pessoa e o modo de viver de
Jesus a fim de purificar nossa vida já que somos chamados de cristãos? Podemos
ter certeza de que a Palavra de Deus, os ensinamentos de Jesus nos interpelam
todas vez que os lermos e meditarmos ou ouvirmos pregação ou retiro a respeito
de Jesus.
Dentro deste contexto, podemos dizer
que a fé é curiosidade permanente, isto é, assombro que compromete a
arriscar-se na aventura, num encontro entrevisto e, em conseqüência, desejado.
A fé é curiosidade, de forma que a dúvida lhe é indispensável. Por isso,
somente na coragem de fazer uma aventura cheia de riscos é que chegaremos à
resposta desejada para afirmar ou negar nossa dúvida. A incerteza e a
incompreensão pertencem ao terreno de nossa fé como o oco que espera ser
preenchido, como a espera que aguarda o encontro, como a fome que se alimenta
com o que pode satisfazê-la.
A pergunta continua fica no ar para
cada cristão: “Será que você ainda tem curiosidade de Jesus? Que curiosidade
você tem de Jesus?”. Tenho medo de que quando a curiosidade sobre Jesus morrer,
morrerá também nossa fé. O evangelho que não mais nos incomoda deixa de ser
evangelho. A Palavra de Deus que não nos interroga deixa de ser a Palavra de
Deus.
“Quem é esse home, sobre quem ouço
falar essas coisas?” E procurava ver Jesus.
Somente são os que se aproximarem de
Jesus com simplicidade e com um coração puro conseguirão entender gradualmente
a identidade de Jesus que tem uma missão salvadora. São muitos as pessoas: jovens
e adultos que também em nossa geração desejam ver Jesus. Fisicamente Jesus não está
neste mundo. Somos nós o prolongamento de Cristo, pois livremente escolhemos
ser cristãos. Temos, então, a missão de dar testemunho, com nossa vida e
palavra de que Jesus é a resposta plena de Deus para todas as nossas buscas. Se
no mundo não se vê mais Jesus Cristo é porque não se vê mais na vida de cada cristão.
Talvez as seguintes palavras de São Paulo possam nos despertar para que
voltemos a viver os ensinamentos de Cristo na nossa vida e nos nossos negócios:
“Vós sois uma carta de Cristo... escrita não com
tinta, mas com o Espírito de Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas
de carne, em vossos corações” (2Cor 3,3). “Somos para Deus o
perfume de Cristo entre os que se salvam e entre os que se perdem” (2Cor 2,15).
P. Vitus Gustama,svd
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