SER
LÍDER AUTOCRÍTICO
Sexta-Feira da XXIII Semana Comum
12 de Setembro de 2014
Evangelho: Lc
6,39-42
Naquele tempo, 39 Jesus
contou uma parábola aos discípulos: “Pode um cego guiar outro cego? Não cairão
os dois num buraco? 40 Um discípulo não é maior do que o mestre; todo discípulo
bem formado será como o mestre. 41 Por que vês tu o cisco no olho do teu irmão,
e não percebes a trave que há no teu próprio olho? 42 Como podes dizer a teu
irmão: Irmão, deixa-me tirar o cisco do teu olho, quando tu não vês a trave no
teu próprio olho? Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás
enxergar bem para tirar o cisco do olho do teu irmão”.
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O texto
do evangelho de hoje faz parte do Sermão da Planície de São Lucas. Neste Sermão
encontramos varias sentenças de Jesus sobre como devemos conviver com os
demais, como devemos tratar os outros? E de que maneira podemos olhar para os
defeitos dos outros e os nossos próprios defeitos. O que é indispensável para sermos
bons guias?
Ser
Líder
“Pode um cego guiar
outro cego? Não cairão os dois num buraco?”, disse Jesus no
Evangelho de hoje.
Liderar é
envolver-se seriamente na vida dos outros. Por isso, para saber como você está
se saindo como líder, a resposta está nas pessoas sob a sua liderança. Você deixa
as coisas melhores do que as encontrou? As pessoas se aperfeiçoam por causa do convívio
com você? Você deixa as pessoas e organizações em melhores condições do que as
encontrou? A liderança é a marca que deixamos nas organizações e nas pessoas. Liderança
é uma autoridade, pois o líder faz as pessoas crescerem por causa de sua
influencia. Por isso, alguém pode ser um chefe, mas nem sempre é um líder. Para
ser chefe, alguém precisa ter um cargo. Para ser líder uma pessoa não precisa
ter um cargo. Não é preciso ser chefe para liderar.
Liderar não
tem nada a ver com o que ganha ou com o lugar onde se senta (cargo), mas tem a
ver com a maneira brilhante como alguém trabalha. Todos precisam liderar onde estão
estabelecidos e brilhar no lugar em que se encontram.
“Se um homem tem o dom de varrer ruas, deve varrê-las como Michelangelo
pintava, como Beethoven compunha ou como Shakespeare escrevia. Deve varrê-las tão
bem que todas as hostes dos céus e da terra pararão para dizer: ‘Aqui viveu um
grande varredor de ruas, que fez um bom trabalho’” (Martin Luther King Jr.).
“Pode um cego guiar
outro cego? Não cairão os dois num buraco?”, perguntou Jesus
retoricamente. Jesus pede uma autocrítica para
qualquer liderança. Na ausência da autocrítica qualquer líder é incapaz de
reconhecer suas fraquezas e limitações e ainda se arrogam o direito de ser
juízes para os demais.
Um bom
líder tem um agudo senso de autocrítica. Ele reconhece seus pontos positivos e
seus pontos negativos. Ele aceita qualquer correção quando houver fundamentos.
Ele transforma as críticas em sugestões, pois no seu coração há misericórdia e
mansidão. Quanto mais o líder for transparente tanto mais estará capacitado
para ajudar o próximo. Um líder que ama, é respeitado. Um líber temido não é
respeitado, e ele cria muitos hipócritas e bajuladores ao seu redor. O medo que
os outros têm de um líder não mede a autoridade dele e sim seu poder
autoritário. Quando um líder apela para a força e o poder é porque não tem mais
autoridade nele.
Somente um ser humano livre e
consciente é capaz de guiar os demais. Enquanto a pessoa for dominada pelas
ambições, pelo egoísmo, pela arrogância, ou pela violência será incapaz de ver
melhor e incapaz de guiar os outros. Jesus, precisamente, formou seus
discípulos em uma atitude crítica, serena e responsável que lhes permitem ver e
amar os outros e a realidade com benevolência. Quem quer conduzir seu próximo
pelo caminho do amor, da fidelidade, da retidão, antes deve deixar-se conduzir
por Cristo pelo mesmo caminho.
Ser Autocrítico
“Como
podes dizer a teu irmão: Irmão, deixa-me tirar o cisco do teu olho, quando tu
não vês a trave no teu próprio olho? Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu
olho, e então poderás enxergar bem para tirar o cisco do olho do teu irmão”,
continuou Jesus no Seu Sermão da Planície.
Jesus
quer nos dizer de outra maneira: Abram os olhos sobre vocês mesmos!
Critiquem-se! Sejam vocês mesmos objeto de sua própria crítica! Vocês que
percebem facilmente os defeitos dos outros que não pensam como vocês, procurem
também ter em conta seus próprios defeitos. Que não condenem uns aos outros,
que tratem os outros com mais indulgência. Que vocês sejam compassivos e
misericordiosos como Deus Pai que é compassivo e misericordioso.
As
palavras de Jesus são um chamado para que descubramos nosso próprio pecado, a
“trave” que há em nossos olhos. As palavras de Jesus nos chamam para a
coerência e a autoridade moral que devemos ter na correção fraterna. Se assim
fizermos, nossa correção fraterna será respeitada.
A revisão
de vida é um exercício espiritual eminentemente evangélico: trata-se de
reconsiderar-se a si mesmo, de revisar a própria vida e o próprio caminho e os
próprios compromissos. Não temos que nos fixar tanto nos defeitos dos demais e
sim nos nossos próprios defeitos. Se não, seriamos hipócritas. Muitas de nossas
misérias provém da falta de autocrítica,
de não corrigir nossos erros. Não corrigir os erros é uma forma de cometer
outros erros. Nunca vamos atingir nossos objetivos ou realizar nossos sonhos se
formos incapazes de fazer uma autocrítica.
O
evangelho de hoje nos convida a olharmos para o mundo e para os outros com o
mesmo olhar de Jesus: um olhar de benevolência. Os olhos são como um espelho no
qual se reflete o mundo e os outros. Há pessoas para as quais toda a realidade
é triste e está sujeita para lamentações. Como se tudo fosse mal. O mundo toma
cor de nosso olhar.
Jesus nos
convida a olharmos tudo com seu olhar: um olhar benévolo. Jesus quer nos dizer:
“Sejam pessoas consagradas à misericórdia! Sejam benévolos com vocês mesmos e
com os outros. Aprendam a olhar com menos severidade. Se tiver algum sentimento
de antipatia, que sua antipatia se transforme em humor. Sejam benévolos com o
mundo, pois foi Deus quem criou o mundo. E Deus foi o primeiro que se admirou
da obra saída de Suas mãos nos primeiros dias do universo: ‘Deus viu que tudo
era bom!’ (Gn 1,10b.12b.18b.21b.25b.31). Vivam bem a vida, pois Eu sou a vida
(Jo 14,6)”.
Ser
benévolo não significa ser indiferente nem ser ingênuo. A palavra “benévolo”
deriva de duas palavras: bem e querer. Ser benévolo significa querer sempre o
bem para tudo e para todos. Ser benévolo também significa ser responsável, ser
bom, ser vigilante, denunciar as ilusões, os valores falsos, e as palavras
enganosas. A benevolência é uma responsabilidade e a assunção de um dever. E a razão
de nossa benevolência é o próprio Deus da misericórdia que tem paciência para
conosco que mesmo que cometamos erros na vida Ele perdoa tudo e sua graça
jamais falha.
Enquanto
não adquirirmos um olhar misericordioso e benévolo, nós não estaremos em condições
de guiar os outros e nada mudará na nossa vida. O que se tem por guia deve
“ver” bem, assim também aquele que quer passar de discípulo para mestre.
Na
verdade, o que Jesus nos oferece é um processo educativo ético. Segundo Jesus,
o mais urgente é tomar consciência da própria hipocrisia e trabalhar sobre ela.
Jesus nos apresenta cinco etapas desta pedagogia ética, que para Lucas é uma
pedagogia eclesial:
1. Renunciar a ser juiz dos demais.
2. Abertura para as palavras de Jesus que me interpelam com amor e
esperança.
3. Reconhecimento dos meus próprios defeitos ou pecados.
4. Compromisso de ser um ser humano novo e renovado no espírito de Jesus.
5. Somente assim terei condições de ser guia ou mestre para os outros.
Na vida o viver para os demais,
respeitando e aprovando a verdade, não é somente um dever, mas é uma grande
felicidade. Somente ao fazer os outros felizes, seremos felizes também.
Através do evangelho de hoje Jesus
nos convida a fazermos revisão de nossa conduta, pois muitas vezes vemos e não
queremos saber o que vemos, entendemos e não queremos saber o que entendemos,
está diante de nós a verdade e retiramos o olhar para não sentir feridos. A
verdade liberta, a falsidade dói.
O Senhor nos reúne em torno da mesa
eucarística para nos libertar de nossas diversas escravidões. Ele quer nos
enviar como testemunhas suas, mas quer que façamos a experiência de seu amor
misericordioso. Ele entregou sua vida para o perdão de nossos pecados. Ele nos
fez partícipes de sua vida e derramou em nossos corações o dom de seu Espírito
Santo. Por isso, a participação na Eucaristia não é para nós somente um ato de
culto para Deus, mas também é a aceitação de nos fazer um com Cristo, de nos
identificar com Ele e de anunciá-Lo tanto com as palavras como com a própria
vida.
“Se queres conservar tua inocência, não consintas nas
más ações dos outros, nem julgues precipitadamente suas intenções”
(Santo Agostinho. Epist. Ad cath. 2,4)
P. Vitus Gustama,svd
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